Origem: Revista O Cristão – Laodiceia

A Carta à Laodiceia

O Senhor Se apresenta à Laodiceia de uma maneira que condena totalmente a condição da Igreja, e ainda assim oferece o maior encorajamento ao vencedor. Ele é “o Amém, a Testemunha fiel e verdadeira, o Princípio da criação de Deus”. Como Amém, Ele é Aquele em Quem todas as promessas de Deus foram assumidas e asseguradas em todos os seus aspectos, para levar a cabo todo bem e derrotar todo mal, e eternamente glorificar a Deus ao fazer isso. Como Testemunha fiel, Ele sempre foi leal Àquele que O enviou. Ele amou o Pai e veio fazer a vontade do Pai. Qualquer que seja o custo para Ele, Ele nunca Se desviou dessa vontade e nunca Se recusou a executá-la. Ele é o Princípio da criação de Deus, que, em toda a sua vasta extensão, será marcada pela vontade de Deus.

Na perfeição de Seu caminho como o Amém, a Testemunha fiel e verdadeira, o Princípio da criação de Deus, Ele eclipsou todos os outros. Ele era mais justo que os filhos dos homens. E, contudo, infelizmente, Aquele que deveria estar exclusivamente diante da Igreja como o Incomparável é Aquele que é excluído pela Igreja dos laodicenses e tratado com insensível indiferença. A Igreja foi preparada para brilhar para Cristo, testemunhar a graça de Deus e exibir as qualidades da nova criação. Infelizmente falhou em todas as suas responsabilidades. Ela deveria ter brilhado para Cristo, em um mundo sombrio, apontando para Ele como Aquele em Quem todas as promessas de Deus têm seu pleno cumprimento – que Ele é o “Sim” e o “Amém”, e que toda bênção que Deus tem para o homem é encontrado n’Ele. Então, de fato, a Igreja foi estabelecida no mundo para ser uma testemunha fiel e verdadeira da graça de Deus. Infelizmente, longe de ser testemunha da graça, no último estágio de sua história a grande massa é estranha à graça e até se opõe a Deus.

Por fim, a Igreja deveria ter sido as “primícias das Suas criaturas”, exibindo os frutos da nova criação – “caridade [amor], gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, temperança” (Tg 1:18; Gl 5:22, 6:15). Quão poucos são esses frutos da nova criação encontrados no círculo Cristão professante! A Cristandade não é marcada por ódio, miséria e guerra, em vez de amor, gozo e paz? Infelizmente não é verdade que nada na face de toda a Terra se opõe diametralmente a Deus como Cristandade não convertida?

Assim, aprendemos, da maneira que Cristo Se apresenta à Igreja de Laodiceia, a maneira pela qual a Igreja deveria ter representado Cristo diante do mundo.

Indiferença a Cristo 

Tão absolutamente a Igreja falhou em seu testemunho de Cristo que, no último estágio, o Senhor não pode encontrar nada para elogiar. Tudo o que Ele encontra é um estado que causa uma completa náusea para Ele. Ele diz: “Eu sei as tuas obras, que nem és frio nem quente”. O Senhor vê uma condição que não tem nem a frieza da morte, como em Sardes, nem o calor da devoção, como em Filadélfia. Há aquilo que, aos Seus olhos, é mais desesperador para o homem e mais desonroso para Ele do que a frieza da morte, pois o Senhor pode dizer: “Tomara que foras frio ou quente!”. Ele resume essa condição, em sua última fase, nas solenes palavras: “Assim, porque és morno”. O que é isso senão a indiferença a Cristo e o que está sempre ligado à indiferença, a não ser a tolerância do mal? Na última fase da Cristandade, existem aqueles que tomam o nome de Cristo e fazem uma profissão de Cristianismo, mas quando testados pela grande pergunta: “O que pensais de Cristo?” são totalmente indiferentes a Ele.

Eles estarão profundamente interessados no aperfeiçoamento do homem, na elevação das massas, na melhoria das condições sociais; mas as boas novas a respeito de Cristo, os interesses de Cristo e o povo de Cristo despertam dentro deles, apenas um interesse apático, e para Cristo mesmo, eles são totalmente indiferentes. Enquanto as pessoas forem sinceras, caridosas e respeitáveis, os laodicenses não se importam com o que acreditam a respeito de Cristo. Sua Divindade pode ser negada e Sua Humanidade perfeita difamada; Laodiceia é bastante indiferente. A expiação pode ser deixada de lado, as palavras inspiradas de Cristo negadas, a vinda de Cristo ser feito um motivo de escárnio, e, no entanto, tudo é da maior indiferença ao laodicense “de mente aberta”, descontraído e morno.

Tal condição é absolutamente nauseante para Cristo. O Senhor expressa sua aversão alertando esta Igreja que o fim será sua completa rejeição como Igreja. Ele diz: “Vomitar-te-ei da Minha boca”.

Satisfação própria 

Há, no entanto, uma condenação adicional, pois, ligada à indiferença a Cristo, existe a mais arrogante suposição e satisfação própria. Laodiceia diz: “Rico sou, e estou enriquecido, e de nada tenho falta”. Embora indiferente a Cristo, a Igreja de Laodiceia está cheia de si mesma e de suas reivindicações. A Igreja que foi deixada aqui para testemunhar por Cristo caiu a tal profundidade que não apenas deixa de testemunhar por Cristo, mas começa a testemunhar de si mesma. A Igreja deixa de falar de Cristo e fala sobre a Igreja. A assembleia é exaltada e Cristo é menosprezado. A assembleia procura atrair para si mesma e não para Cristo. Usurpa o lugar de Cristo, alegando ser o vaso de riquezas e graça. Cristo está fora, e ainda assim pode dizer: “Eu de nada tenho falta”.

Essa é então a condição da Igreja de Laodiceia, indiferente a Cristo, ocupada e satisfeita consigo mesma, e ainda assim totalmente ignorante de sua verdadeira condição perante o Senhor. “Eu sei”, o Senhor pode dizer, mas “você não sabe”. Segundo a estimativa deles, os laodicenses não precisavam de nada; aos olhos do Senhor, eles precisavam de tudo, pois Ele tem que dizer: “não sabes que és um desgraçado, e miserável, e pobre, e cego, e nu”.

“De Mim compres” 

Tendo exposto sua terrível condição, o Senhor os aconselha. Ele diz: “Aconselho-te que de Mim compres” – palavras que mostram a necessidade deles de Cristo e que não há bênção fora de Cristo. Eles devem vir a Cristo para obterem as riquezas verdadeiras. Que graça é essa que convida, não apenas os pecadores confessos, mas esses professos ocupados e satisfeitos consigo mesmos a virem a Ele! Será que isto não demonstra de forma bendita a atitude de graça que Cristo ainda mantém em relação à profissão de fé que está sem Cristo? Eles professam ter riquezas, então o Senhor, tomando-os em seu próprio terreno, os convida a vir e comprar. O único custo será o abandono de sua justiça própria, pois, afinal, as bênçãos positivas que o Senhor deve dispensar são sem dinheiro e sem preço.

Eles são convidados a comprar “ouro provado no fogo”, que fala da justiça divina assegurada pelo julgamento da cruz; “vestes brancas”, que fala da justiça prática, que, se vestida, cobrirá a vergonha de sua nudez. A falta de justiça prática diante dos homens era uma prova solene da falta de justiça divina diante de Deus. “Por seus frutos os conhecereis” (Mt 7:15-20). Além disso, eles precisam de colírio para que os olhos pudessem ver, que fala da unção do Espírito que nos permite ver nossa necessidade de Cristo, bem como a perfeição de Sua Pessoa e obra para satisfazer nossa necessidade e nos suprir com verdadeira riqueza e adequação à glória de Deus.

A repreensão do amor 

O Senhor, no entanto, não se contenta em falar com a consciência desses laodicenses mornos. Ele procurará alcançar o coração de qualquer verdadeiro crente que ainda possa ser encontrado em Laodiceia. Ele diz “Eu repreendo e castigo a todos quantos amo; sê, pois, zeloso e arrepende-te”. A Igreja há muito deixou o primeiro amor, mas o Senhor nunca deixou Seu primeiro amor pela Igreja. Ele não pode mais falar do amor deles, mas ainda pode falar de Seu amor. Não é, no entanto, o amor à complacência, mas um amor que deve agir em repreensão.

Batendo à porta 

Além disso, o Senhor permanece em graça à porta deles. Ele fala à consciência; Ele apela ao coração; Ele está à porta; Ele bate à porta. Existe o chamado ao arrependimento, mas não há expectativa de que a massa se arrependa, pois esse último apelo é apenas para o indivíduo. “Se alguém ouvir a Minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e com ele cearei, e ele Comigo”.

Esse é o último estágio da história da Igreja na Terra. Aquilo que foi estabelecido para dar testemunho de Cristo na Terra se torna testemunho de sua própria miséria e fecha Cristo do lado de fora de sua porta. Será que não vemos na condição de Laodiceia, o resultado completo do primeiro desvio em Éfeso? O começo de todo declínio foi deixar o primeiro amor por Cristo; o final é total indiferença a Cristo em uma Igreja que está bem contente em ter Cristo do lado de fora de sua porta. O último estágio da Cristandade, que com calma indiferença fecha a porta a Cristo, parece quase pior em sua insensibilidade do que o último estágio do Judaísmo que, em sua hostilidade, pregou Cristo em uma cruz.

Assim como Cristo Se demorou diante do Judaísmo corrupto com lágrimas, assim Ele aguarda do lado de fora da porta da Cristandade com infinita paciência, se acaso houver “algum homem” na profissão Cristã que lhe abra a porta. Para a massa, não há esperança; está prestes a ser vomitada de Sua boca, mas até que esse ato solene de rejeição final aconteça, existe esse convite amoroso feito ao indivíduo que ouvir a voz de Cristo. Se alguém cuja consciência foi alcançada pela exposição da condição da Cristandade pelo Senhor, que foi despertada por Suas advertências, que ouviu Seus conselhos e foi tocado por Seu amor, deixe que apenas abra a porta e, mesmo neste último estágio, Cristo entrará para ele e ceará com ele, e ele ceará com Cristo. O que é isso senão a doce comunhão do primeiro amor? Será que isso não prova que, no último estágio da história da Igreja na Terra, quando o julgamento está prestes a cair sobre a grande massa da profissão, é possível que o indivíduo seja trazido de volta ao primeiro amor? O Senhor não fala de alguma recuperação do testemunho público para Si mesmo, mas de comunhão secreta Consigo mesmo.

Ao vencedor 

Ao vencedor há a promessa de assentar-se com Cristo em Seu trono, assim como Cristo também Se assentou com o Pai em Seu trono. Aquele que vencer a indiferença de Laodiceia e abrir a porta para Cristo, no dia em que a grande massa fechar a porta sobre Cristo, desfrutará, não apenas da comunhão secreta com Cristo, no dia de Sua rejeição, mas será associado com Cristo em manifestação no dia de Sua glória. Cristo venceu um mundo que rejeitou o Pai e Se assentou no trono de Seu Pai; quem vencer um mundo que rejeitou a Cristo se assentará com Cristo em Seu trono.

A carta termina com o apelo àquele que tem ouvido que ouve. É bom que prestemos atenção ao que o Espírito diz à Igreja de Laodiceia, pois não estabelece uma condição que possa se desenvolver mesmo entre os de Filadelfia? Mas, pela graça de Deus, a própria luz e privilégios dados podem levar à autocomplacência própria de Laodiceia. Que tenhamos a graça necessária para ouvir o que o Espírito tem a dizer às Igrejas.

H. Smith

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