Origem: Revista O Cristão – As Semelhanças do Reino, Parte 3

Graça em Recompensas

Mateus 19 termina com a frase: “muitos primeiros serão derradeiros, e muitos derradeiros serão primeiros”. Isso claramente nos traz um senso de graça e, de acordo com esse tema, o Espírito de Deus Se refere neste capítulo (Mateus 20) à soberania de Deus – o contra-ataque à justiça própria que é encontrada até no coração de um discípulo. Pedro pôde dizer: “Eis que nós deixamos tudo e Te seguimos”, e o Senhor pode assegurar-lhe que isso não seria esquecido, mas imediatamente acrescenta a parábola do pai de família. Aqui você encontra, não o princípio de recompensas ou o justo reconhecimento de Deus pelo serviço prestado por Seu povo, mas Seus próprios direitos, Sua própria soberania. Portanto, não há diferenças aqui – ninguém é especialmente lembrado porque ganhou almas para Cristo ou deixou tudo por Cristo. O princípio é este, que embora Deus infalivelmente reconheça todo serviço e perda por causa de Cristo, ainda assim Ele mantém Seu próprio direito para fazer o que quiser. Pode haver alguma pobre alma trazida ao conhecimento de Cristo no dia de sua morte. Agora, Deus, o Pai, reivindica Seu próprio direito para dar o que Lhe apraz; a pessoa pode não ter feito nenhum trabalho, mas o direito de Deus Lhe é reservado para dar àqueles que não fizeram absolutamente nada (como podemos pensar) exatamente o que é bom aos Seus próprios olhos. Este é um princípio muito diferente do que tivemos no último capítulo, e extremamente contrário à mente do homem: “Porque o Reino dos céus é semelhante a um homem, pai de família, que saiu de madrugada a assalariar trabalhadores para a sua vinha. E, ajustando com os trabalhadores a um dinheiro (ou denário) por dia, mandou-os para a sua vinha” (Mt 20:1-2).

Nossa contribuição 

A aplicação comum desta parábola à salvação da alma é um erro. Pois é para isso que Cristo trabalhou, sofreu e vive, independentemente do homem. O pobre pecador tem apenas que se entregar para ser salvo por Cristo. Quando levado ao fim de si mesmo, reconhecendo que não merece nada além do inferno, quão doce Deus traz diante de tal alma que Jesus Cristo (e esta é uma palavra fiel) veio ao mundo para salvar os pecadores! Quando contente em ser salvo como nada além de um pecador e por nada além de Cristo, ali e somente então o verdadeiro descanso é dado por Ele. Sempre que sentirmos que devemos contribuir com a nossa parte, haverá apenas incertezas, dúvidas e dificuldades. E onde brilha a salvação de Deus? Somente Cristo é a salvação. O homem que é salvo não contribui com nada além de seus pecados. Mas Deus Se deleita (e não menos porque é fruto de Sua graça) em ouvir um pobre pecador reconhecer que Jesus é digno de levá-lo, liberto do pecado, ao céu. Mas nesta parábola a questão não é esta. Não há nada nisso sobre crer em Cristo ou em Sua obra. É um trabalho prático que é feito. Aí você pode pensar: Certamente o Senhor recompensará o trabalho de acordo com seu tipo e grau. Isso nós vimos, mas há outro princípio nem sempre entendido, a saber, que Deus reserva em Suas próprias mãos o direito de fazer o que Lhe apraz, e Ele nunca comete um erro. Pode parecer difícil que um homem esteja trabalhando duro por 50 anos e que outro, trazido apenas no final de sua vida, seja honrado no céu tanto quanto ele. Mas Deus é o único Justo, o único Sábio, Juiz do que é para Sua própria glória. Se Ele quiser, Ele colocará todos em pé de igualdade. Ele recompensará o trabalho que for feito, mas dará o que quiser.

A bondade de Deus 

“E, ajustando com os trabalhadores a um dinheiro (ou denário) por dia, mandou-os para a sua vinha. E, saindo perto da hora terceira, viu outros que estavam ociosos na praça. E disse-lhes: Ide vós também para a vinha, e dar-vos-ei o que for justo. E eles foram” (Mt 20:2-4). Não é graça no sentido de salvação aqui. “dar-vos-ei o que for justo” É Deus Quem julga o que é adequado. “Saindo outra vez, perto da hora sexta e nona, fez o mesmo” E, surpreendentemente, “E, saindo perto da hora undécima”. De que coração isso fala! Que bondade infinita, esse Deus, que reconhece cada serviço e sofrimento feito por Si mesmo, mas mantém intacta a prerrogativa de sair no último momento para trazer as almas e ocupá-las com o que pode parecer um pequeno serviço! Mas Ele pode dar graça para fazer bem aquele pequeno serviço.

“E, saindo perto da hora undécima, encontrou outros que estavam ociosos e perguntou-lhes: Por que estais ociosos todo o dia? Disseram-lhe eles: Porque ninguém nos assalariou. Diz-lhes ele: Ide vós também para a vinha e recebereis o que for justo. E, aproximando-se a noite, diz o senhor da vinha ao seu mordomo: Chama os trabalhadores, e paga-lhes o salário, começando pelos derradeiros [últimos – ARA] até aos primeiros” (Mt 20:6-8), “começando pelos últimos”. na perfeita sabedoria de Deus. E por que os “últimos” são tão enfatizados nesta parábola? O que torna ainda mais impressionante é que, no final do capítulo anterior, não era assim. Lá, “muitos primeiros serão últimos; e os últimos, primeiros” (Mt 19:30 – ARA). Mas aqui os últimos sempre são mencionados primeiro. Assim, o mordomo é instruído a começar do último até ao primeiro. E novamente, quando o próprio dono da vinha tem que falar, é a mesma coisa: “os últimos serão primeiros e os primeiros últimos”.

A soberania da graça 

É a soberania da graça em dar o que Lhe agrada; não apenas em salvar, mas em recompensar no tempo de glória, pois é disso que se fala. Claro, os últimos receberam seus salários com gratidão. Mas quando os primeiros ouviram sobre isso, começaram a pensar que tinham direito a mais – eles que suportaram o fardo e o calor do dia. Mas o mestre os lembra que tudo estava combinado antes de iniciarem seu trabalho. Em seu egoísmo, esqueceram-se tanto dos termos quanto da justiça daquele com quem tinham de tratar. Se, pela liberalidade de seu coração, o pai de família quis dar aos últimos, que trabalharam 1/12 (um doze avos) do que eles fizeram, tanto quanto ele deu aos primeiros, o que isso lhes importava? Era assunto inteiramente do pai de família. Deus mantém Seus próprios direitos.

É da maior importância para nossa alma que nos apeguemos aos direitos de Deus em tudo. As pessoas vão argumentar se é justo que Deus eleja esta ou aquela pessoa. Mas se você considerar o terreno da justiça, todos estarão perdidos e perdidos para sempre. Agora, se Deus Se apraz em usar Sua misericórdia de acordo com Sua sabedoria, e para Sua glória, dentre esses pobres perdidos, quem deve disputar com Ele? Quem és tu, ó homem, que a Deus replicas? Deus tem o direito de agir de acordo com o que está em Seu coração, e “não faria justiça o Juiz de toda a Terra?” Ele tem o direito de agir por Si mesmo? Ele não pode agir a partir do homem com base na justiça. Não há fundamento sobre o qual Ele possa lidar dessa maneira; é inteiramente uma questão de Seu próprio beneplácito (ou bom prazer). E devemos lembrar que não há um homem que esteja perdido, que não rejeite a misericórdia de Deus – a despreze ou a use para seus próprios propósitos egoístas neste mundo. O homem que é salvo é o único que tem um verdadeiro senso de pecado, o único que se entrega a Deus como realmente perdido, mas depois recorre à Sua infinita misericórdia em Cristo para salvar um pecador perdido.

A queixa dos judaizantes 

No caso que temos aqui, quando os primeiros vieram e reclamaram contra o pai de família, ele respondeu: “Amigo, não te faço injustiça; não ajustaste comigo um denário? Toma o que é teu, e vai-te; eu quero dar a este último tanto como a ti. Não me é lícito fazer o que quero do que é meu? Ou é mau o teu olho porque eu sou bom?” (Mt 20:13-15). Aí vem todo o segredo. O homem, mesmo um discípulo professo do Senhor, um trabalhador em Sua vinha, pode estar discutindo porque não deve ter mais do que outro que, em sua opinião, fez pouco em comparação com ele. Foi o mesmo princípio que deixou os judaizantes tão enciumados com a introdução dos gentios. Portanto, diz o Senhor, “os últimos serão os primeiros e os primeiros os últimos”.

Os “últimos” e os “primeiros” 

Deixe-me apenas perguntar: Por que no capítulo 19 está escrito: “muitos que são primeiros, serão os últimos; e muitos que são últimos, serão os primeiros” (v. 30 – TB), e aqui, “os últimos serão primeiros, e os primeiros serão últimos”? Ao falar sobre recompensas, de acordo com o trabalho realizado, o fracasso do homem é anunciado, pois de fato a fraqueza logo se mostra; o primeiro será o último. Mas nesta nova parábola está a soberania de Deus que nunca falha. Consequentemente, aqui “os últimos serão os primeiros e os primeiros os últimos”. “Demas me desamparou, amando o presente século [o mundo presente – TB]. Houve um primeiro, podemos dizer, que se tornou o último – um trabalhador para o Senhor, que não desistiu do Cristianismo, mas se cansou do caminho do serviço incessante a Cristo. Se, em vez de honra agora, os milhares daqueles que estão empenhados no serviço de Cristo recebessem apenas desprezo e perseguição, haveria um verdadeiro enfraquecimento de suas fileiras. A presente retribuição deveria ser vergonha e sofrimento. Isso deve ser buscado por aquele que inteligentemente procura servir fielmente ao Senhor neste mundo. Demas pode ter sido um crente, mas a provação e reprovação, o amor pela facilidade e outras coisas vieram fortemente sobre seu espírito, e ele abandonou o serviço do Senhor. “Todos buscam o que é seu, e não o que é de Cristo Jesus”: Existe um princípio semelhante.

W. Kelly (adaptado)

Compartilhar
Rolar para cima