Origem: Revista O Cristão – Vales
Vivificação – O Vale dos Ossos Secos
Nosso estado natural é estabelecido em Efésios 2:1 – como “mortos em ofensas e pecados”. O versículo seguinte, no entanto, continua falando de andar naquelas ofensas e pecados, mas isso é porque a morte de que se fala é a morte para com Deus. Aqueles que estão assim mortos, estão muito vivos para “o curso deste mundo” e para “o príncipe das potestades do ar”, que opera nos “filhos da desobediência”. Estar morto em relação a Deus é inteiramente consistente com estar vivo em relação ao mundo e ao diabo; de fato, um brota do outro. Este é o fato que está por baixo da declaração solene feita em Romanos 3:11, de que “não há ninguém que entenda; não há ninguém que busque a Deus”. Para o homem natural, não há nada que seja desejável em Deus. Em uma palavra, ele está morto com respeito a Deus.
Uma vez que esses fatos solenes se apossam de nós, percebemos que nossa única esperança está em Deus tomar a iniciativa por nós, em Sua soberana misericórdia. Deus então deve agir. Mas como Ele deve agir? Será que reforma, educação ou instrução atenderão ao nosso caso? De maneira alguma. Não pode haver nada até que Ele desperte, pois vivificar significa simplesmente dar vida. A própria palavra traduzida como “vivificar” no Novo Testamento é composta do substantivo vida e do verbo fazer – fazer viver.
O Espírito dá vida
Assim, é um fato impressionante que Ezequiel 36 nos mostre a corrupção e sujeira moral em que Israel repousava, e profetiza sobre o novo nascimento que consequentemente deve haver neles, seja seguido pela visão do vale dos ossos secos em Ezequiel 37. Isso expõe a morte com relação a Deus, na qual Israel se encontra como nação, e profetiza a respeito da obra de vivificação de Deus, que deve tocá-los antes que eles entrem na bênção milenar. Serão trazidos por Ele dos túmulos entre as nações onde jazem. Haverá uma ressurreição nacional e, diz o Senhor: “E vivereis, e vos porei na vossa terra, e sabereis que Eu, o SENHOR, disse isso e o fiz, diz o SENHOR” (Ez 37:14). Uma vez vivificados, entenderão e imediatamente buscarão o Senhor.
O “vento” (ou “sopro”) do versículo 9 parece estar identificado com o “Meu Espírito” do versículo 14, e, de fato, a mesma palavra hebraica é traduzida como “vento”, “sopro” ou “espírito”, de acordo com o contexto. É interessante comparar esses versículos com João 3:8. Lá, o sopro do vento está conectado à ação do Espírito em um novo nascimento. Aqui está conectado com Sua ação de vivificar. Isso deve nos mostrar o quão estreitamente o novo nascimento e a vivificação estão conectados e que eles não devem ser separados um do outro, embora devam ser distinguidos e considerados separadamente, como em Ezequiel 36 e 37.
Vivificação e poder
Agora, se João 3 corresponde a Ezequiel 36, João 5 corresponde a Ezequiel 37. João 5 começa com a cura do homem paralítico. Foi como se um novo fluxo de vida entrasse em seus membros inválidos, e ele pegou sua cama e andou. Quando questionado sobre esse milagre, o Senhor Jesus passou a falar de obras muito maiores do que essa as quais Ele deveria fazer – a vivificação de quem Ele desejasse e a ressurreição de todos os homens. O primeiro é um trabalho limitado. Aqueles dentre os mortos espirituais que ouvem a voz do Filho de Deus – e somente eles – viverão espiritualmente. O último é universal. Todos os túmulos ouvirão a sua voz e sairão em duas classes, para a vida e para o julgamento, respectivamente. Isso acontecerá em momentos diferentes, conforme aprendemos com outras Escrituras.
No versículo 21 deste maravilhoso capítulo de João, a vivificação é atribuída ao Pai e ao Filho, enquanto no verso seguinte se diz que a obra do julgamento está totalmente nas mãos do Filho. O Filho, e somente o Filho, veio a este mundo para sofrer e ser desprezado. Somente a Ele pertencerá a majestade e a honra de executar o julgamento. Ao dar a vida, no entanto, o Filho age de acordo com Sua própria vontade, igualmente com o Pai e em total acordo com o Pai. Igualmente com o Pai, Ele é a Fonte da vida, pois o versículo 26 é evidentemente paralelo ao versículo 21 em seu sentido. Como 1 Coríntios 15:45 diz: “O Último Adão, em espírito vivificante”.
Os versículos 24-25 de João 5 nos mostram como o Filho age com poder vivificante no momento presente. Ele vivifica por meio de Sua Palavra. Existem aqueles que realmente ouvem a Sua Palavra, isto é, eles ouvem nela “a voz do Filho de Deus” e, consequentemente, creem no Pai que O enviou e vivem. A vivificação não é apresentada aqui como uma obra do Filho completamente à parte do uso de instrumentos para fazê-la. Se fosse assim concedida, deveríamos ler: “Os que vivem ouvirão”. Mas o que lemos é: “Os que ouvem viverão”. A vida é, de fato, Seu dom, mas nos alcança ao ouvir Sua voz em Sua Palavra.
O Pai e o Filho
À luz deste capítulo, acreditamos que podemos falar de vivificação como o aspecto mais profundo e fundamental da obra de Deus em nós. Tal é a sua importância, que o Pai e o Filho agem juntos quanto a isso de uma maneira especial. Às vezes, é feito um uso incorreto das declarações de nosso Senhor nos versículos 19 e 30: “O Filho por Si mesmo não pode fazer coisa alguma, se o não vir fazer ao Pai” e “Eu não posso de Mim mesmo fazer coisa alguma”. Essas palavras não significam que Ele renunciou a todo poder, assim como um mero profeta poderia ter feito. Elas expressaram, em primeiro lugar, o fato de que, ao tornar-Se Homem, o Filho tomou o lugar do serviço dependente, agindo totalmente pelo Espírito em sujeição ao Pai. Esse pensamento parece especialmente proeminente no versículo 30. Mas, em segundo lugar, elas também enfatizaram o fato de que Seu lugar essencial na unidade da Divindade era tal, que era impossível que Ele agisse à parte do Pai. Esse pensamento parece especialmente proeminente no versículo 19.
Deste aspecto interno e mais oculto das coisas, era como se Ele dissesse: “Eu sou tão essencialmente um com o Pai que é impossível que Eu agisse à parte d’Ele”. Foi realmente a afirmação mais forte possível de Sua própria Deidade. O Pai e o Filho devem sempre agir juntos, como diz o final do versículo 19. Assim, o Senhor aceitou a acusação de fazer-Se “igual a Deus”, e não apenas a aceitou, como ampliou seu pensamento. Assim, tanto o Pai como o Filho agem juntos no poder de dar vida.
O Espírito de Deus
Em João 6:63, descobrimos que o Espírito de Deus também vivifica. A primeira ocorrência da palavra “Espírito” nesse versículo evidentemente deve ser impressa em maiúscula, a segunda ocorrência da palavra é impressa corretamente sem maiúscula. A comparação pode ser feita com o versículo 6 do capítulo 3, onde a distinção é feita corretamente. As próprias palavras do Senhor são espírito e vida, mas é o próprio Espírito que vivifica. Podemos dizer, portanto, que toda a plenitude da Divindade – Pai, Filho e Espírito Santo – está envolvida no trabalho de nos dar vida.
Mais uma coisa deve ser observada. Encontramos isto em Efésios 2:5 e Colossenses 2:13 – fomos vivificados “juntamente com Cristo”. Estando “mortos em nossas ofensas” (Ef 2:1) e “mortos nos pecados e na incircuncisão da vossa carne” (Cl 2:13), nada a menos do que a vivificação poderia atender nossa situação. A vivificação era, portanto, uma necessidade, mas não havia necessidade de sermos vivificados juntamente com Cristo: Esse foi o fruto dos conselhos de Deus em graça.