Origem: Revista O Cristão – Os Ouvidos
Maria… Ouvia a Sua Palavra
Em Lucas 10:38-42, há uma comparação moral entre as duas irmãs que amavam o Senhor. Aquela que escolheu a melhor porção foi aquela cujo coração mais se apegou à Palavra como um elo entre a alma e Deus. Como todos sabemos, é pela Palavra da verdade que qualquer um é gerado de Deus, pois ela é a semente da vida incorruptível, aquela Palavra que vive e permanece para sempre. Mas ela é muito mais que isso. É o meio de crescimento, de purificação do caminho, do desfrute de Deus e, consequentemente, da bênção espiritual dia após dia. Isso ficou muito evidente na diferença entre Marta e Maria.
Eram irmãs de sangue, ambas crentes e amadas por Jesus. No entanto, havia uma diferença, e a principal causa e evidência disso entre as duas era o valor superior que Maria tinha pela Palavra de Jesus. A Palavra de Deus tem um poder educativo sobre a mente e as afeições dela, e ela prova ser a pessoa que mais valoriza o Senhor. O crente que mais realmente O serve, na mais verdadeira comunhão, é aquele que tem o mais profundo valor pela Sua Palavra. Encontramos isso como um princípio geral em outras partes da Escritura (“este é o amor de Deus: que guardemos os Seus mandamentos”), e particularmente em João 14 – “Se alguém Me ama, guardará a Minha Palavra”. No caso de Marta e Maria, vemos o que acontece na prática. Lemos que “uma certa mulher, por nome Marta, O recebeu em sua casa”. Ela reconheceu plenamente que Ele era o Messias. Havia fé no coração de Marta pelo que Deus havia dado, mas ela não via mais n’Ele do que simplesmente o Messias. Sua fé não foi mais longe.
No entanto, “tinha esta uma irmã, chamada Maria, a qual, assentando-se também aos pés de Jesus, ouvia a Sua Palavra”. Maria não é caracterizada por uma recepção ao Senhor como fez Marta, por atenções amorosas e hospitalidade, embora da parte de Marta, tudo isso era fundado, sem dúvida, em um crescimento que vinha de fé. Em vez disso, “Maria sentou-se aos pés de Jesus e ouviu a Sua Palavra”. Alguns podem supor que essa seja uma prova muito menor de amor, mas para Jesus isso era, incomparavelmente, a atitude mais aceitável das duas. Marta honrou a Jesus como faria um judeu crente e justo; ela reconheceu a si mesma como serva, a Ele como Rei, e estava tão feliz quanto sua fé poderia estar ao receber o Senhor em sua casa no dia de Sua humilhação.
Maria ouvia a Sua Palavra
Sua irmã, no entanto, sentou-se aos pés de Jesus e ouviu Sua Palavra. No caso de Maria, não foi tanto o que ela fez pelo Senhor. Em vez disso, ela tinha uma percepção de Sua grandeza e amor que seu único desejo era sentar-se a Seus pés (uma atitude de humilhação muito mais profunda do que Marta jamais teve), com a consciência da plenitude divina que havia n’Ele para ela. Ela ouviu Sua Palavra; Marta “estava afadigada com muitas coisas”. Quantos há que gostam de servir ao Senhor, mas estão muito mais cheios de seus próprios feitos por Ele do que os d’Ele para eles, bem como n’Ele próprio! Isso engana a muitos. Eles medem a fé pela sua jornada de agitação e atividade. Mas, na verdade, tal atitude sempre tem envolvida uma grande parte do ego. Quando é a verdadeira humildade que anima, pode haver muito feito, mas há pouco ruído. Maria sentou-se aos pés de Jesus e ouviu Sua Palavra.
“Marta, porém, andava distraída em muitos serviços e, aproximando-se, disse: Senhor, não Te importas que minha irmã me deixe servir só? Dize-lhe, pois, que me ajude” (v. 40). Assim, não só havia uma grande quantidade de importância própria em Marta, mas, como costuma ser, ela se sentia constantemente desprezada e incomodada pelos outros. O espírito do egoísmo mede por si mesmo, e não pode apreciar um amor que é mais profundo do que o seu próprio, e que se mostra de maneiras e formas que não têm beleza aos seus olhos. Portanto, Maria, em vez de ser um objeto de complacência para Marta, a perturbava. Por que Maria não a ajudou? Os pensamentos de Marta giravam em torno de si mesma. Se ela estivesse pensando em Jesus, não teria dado ordem a Ele, a não ser reclamado de Maria. “Senhor, não Te importas que minha irmã me deixe servir só? Dize-lhe, pois, que me ajude” Que falta de amor e humildade! Ela nem sequer deixa que o Senhor dirija a situação. O eu é sempre crítico, assim como importante, e tão rápido para culpar aos outros quanto para arrogar a si mesmo o que é impróprio. Ela esqueceu que era apenas a serva do Senhor. Quem era ela para desejar controlá-Lo? Marta estava cheia de zelo, mas de seus próprios caminhos (para não dizer sua própria vontade) em servir a Cristo.
Jesus justificou o coração fiel
Jesus, no entanto, responde com a dignidade que Lhe era própria, e com o amor, que sempre O caracterizou, que vê a verdade, mas que ao mesmo tempo defende o coração fiel diante daqueles que os entendem mal. Ele amou a ambas de fato, e diz em resposta: “Marta, Marta, estás ansiosa e afadigada com muitas coisas”. Ele trata primeiro com ela. Ela não deveria estar tão ansiosa e preocupada. Marta não sabia o que Paulo sabia tão bem – “mas uma coisa faço” (Fp 3:13). Nunca houve um homem com tão numerosas ocupações como o apóstolo, nunca houve outro com tal coração para a Igreja. E, no entanto, ele poderia empregar alegremente suas mãos em fazer tendas, porque ele não queria ser pesado, embora tivesse o direito de o ser como um apóstolo de Cristo. O que foi que o fez tão concentrado e feliz por meio de todo o seu trabalho e sofrimento? A razão era que uma Pessoa, o único objeto digno, encheu e governou coração de Paulo. Isso o fez completamente feliz no meio das mais profundas aflições. Aquela “uma coisa” é precisamente o que é necessário para o filho de Deus, e a mesma coisa que Marta praticamente não tinha. Não era que ela não cria no Senhor, mas ela também tinha seus próprios pensamentos. A natureza era forte. Ela mantinha os fundamentos da tradição e dos sentimentos judaicos; todas essas coisas operavam ativamente em sua mente. Para tal pessoa, receber o Senhor Jesus não era apenas uma questão de honrá-Lo, mas de honrar a si mesma também. Nesses casos, o ego sempre se mistura numa maior ou menor medida, até mesmo com o desejo de exibir o respeito apresentado a Jesus.
“Entretanto, pouco é necessário ou mesmo uma só coisa; Maria, pois, escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada” (v 42). Não há nada mais como isso. Essa boa parte significa valorizar a Cristo e Sua Palavra; não pensar o que Maria poderia fazer por Ele, mas o que Ele poderia fazer por Maria. Receber tudo do Senhor para sua alma, em vez de recebê-Lo em sua casa, estava diante da alma de Maria. Esta era a única coisa necessária – era o próprio Cristo. Ele é tudo, e Maria sentiu isso. Essa “boa parte … não lhe será tirada” – é eterna. As honras de Marta passaram; elas estavam próximas do fim, pois logo Jesus não seria conhecido segundo a carne. Mas a posição de Maria, de fé humilde em ouvir Sua Palavra, duraria para sempre. Mesmo no céu a essência disso não será perdida. A comunhão com Jesus, o deleite em Jesus, a humildade de coração diante de Jesus, serão sempre verdades; é a parte da verdadeira dedicação e do amor mais profundo. Por maior que seja a fé e a esperança, o amor é o que permanece para sempre, e o amor agora é proporcional ao poder de fé e de esperança. Todas essas coisas eram incomparavelmente mais ricas e mais fortes no coração de Maria do que no de Marta, e isso porque Cristo encheu o coração de Maria — essa única coisa que é necessária.