Origem: Revista O Cristão – O Temor de Hoje

Não Temer o Homem, mas Temer o Senhor

No ensinamento do Senhor, em Lucas 12, Ele define a consciência de Seus discípulos diretamente à luz do tribunal. “E digo-vos, amigos Meus: não temais os que matam o corpo e depois não têm mais o que fazer. Mas Eu vos mostrarei a Quem deveis temer: temei Aquele que, depois de matar, tem poder para lançar no inferno; sim, vos digo, a Esse temei” (Lc 12:4-5). “O temor do homem traz um laço” (Pv 29:25 – TB) e está intimamente ligado ao “fermento dos fariseus”. Mas “o temor do Senhor é o princípio da sabedoria” (Pv 9:10) e faz com que o homem sempre se conduza como se estivesse na plena luz do tribunal de Cristo. Isso conferiria imensa dignidade e um caráter elevado, enquanto efetivamente cortaria, de imediato, o espírito de altiva independência, mantendo a alma sob o poder esquadrinhador da luz divina. O efeito da luz divina é tornar tudo e todos manifestos. Não há nada que tenha mais tendência de roubar, do discípulo de Cristo, a devida dignidade de seu discipulado como andar como que diante dos olhos ou dos pensamentos dos homens. Enquanto o fizermos, não podemos ser seguidores desimpedidos do nosso Mestre celestial. Além disso, o mal de andar diante dos homens é moralmente aliado com o mal de procurar esconder nossos caminhos de Deus. Ambos participam do “fermento dos fariseus”, e ambos encontrarão seu devido lugar diante do tribunal. Por que devemos temer os homens? Por que devemos levar em conta as opiniões deles? Se tais opiniões não suportarão o julgamento na presença d’Aquele que tem o poder de lançar no inferno, elas não valem nada, pois é com Ele que temos que tratar. Paulo pôde dizer: “a mim mui pouco se me dá de ser julgado por vós ou por algum juízo humano” (1 Co 4:3). O homem pode ter um tribunal agora, mas ele não o terá depois. Ele pode estabelecer o seu tribunal no tempo, mas ele não terá tribunal na eternidade. Sendo assim, por que devemos moldar o nosso caminho em referência a um tribunal tão frágil e transitório? Que possamos desafiar nosso coração quanto a isso! Deus nos conceda a graça de agir agora com relação ao depois — a nos conduzir aqui com nossos olhos no futuro; olhar o tempo à luz da eternidade.

Confiança 

“Se eu, portanto, me elevar acima dos pensamentos e opiniões humanas, como devo entrar em uma cena em que esses mesmos pensamentos e opiniões prevalecem?” Essa é uma pergunta muito natural, mas ela encontra sua resposta completa nos lábios do Mestre. Até dá a impressão de que Ele havia gentilmente antecipado essa questão crescente de incredulidade, quando, tendo levado Seus discípulos acima das névoas nebulosas do tempo colocando-os na clara, esquadrinhadora e poderosa luz da eternidade, Ele acrescentou: “Não se vendem cinco passarinhos por dois ceitis? E nenhum deles está esquecido diante de Deus. E até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados. Não temais, pois; mais valeis vós do que muitos passarinhos” (Lc 12:6-7). Aqui, o coração é ensinado não apenas a temer a Deus, mas também a confiar n’Ele; não é apenas alertado, mas também tranquilizado. “Temer” e “não temer” podem parecer um paradoxo para a carne e o sangue, mas para a fé não é um paradoxo. O homem que mais teme a Deus temerá menos as circunstâncias. O homem de fé é, ao mesmo tempo, o homem mais dependente e independente do mundo: dependente de Deus; independente das circunstâncias. A última é a consequência da primeira; verdadeira dependência produz verdadeira independência.

O cuidado do Pai 

E note o fundamento da paz do crente. Aquele que tem o poder de lançar no inferno, o Único a Quem ele deve temer, realmente teve o trabalho de contar os cabelos de sua cabeça. Ele certamente não teve esse trabalho com o propósito de deixá-lo perecer aqui ou no futuro. De forma alguma. O detalhamento dos cuidados de nosso Pai deve silenciar todas as dúvidas que possam surgir em nosso coração. Não há nada muito pequeno, e não pode haver nada muito grande para Ele. As incontáveis órbitas que se movem através do espaço infinito e um passarinho caindo são semelhantes para Ele. Sua mente infinita pode absorver, com igual facilidade, o curso das eras eternas e os cabelos da nossa cabeça. Esse é o fundamento estável sobre o qual Cristo estabelece Seu “não temais” e “não andeis cuidadosos (inquietos, solícitos). Frequentemente falhamos na aplicação prática desse princípio divino. Podemos admirá-lo como um princípio, mas é somente na sua aplicação que sua verdadeira beleza é vista ou sentida.

Liberdade de testemunho 

Agora, descobrimos, nesta Escritura diante de nós, que o testemunho ousado e intransigente para Cristo está conectado com essa elevação santa acima dos pensamentos dos homens, e essa confiança calma no perfeito e terno cuidado de nosso Pai. Se meu coração é elevado acima da influência do temor do homem e suavemente tranquilizado pela certeza de que Deus leva em conta os cabelos da minha cabeça, então estou em uma condição de alma para confessar Cristo diante dos homens (vs. 8-10). Nem preciso ter cuidado com o resultado dessa confissão, pois enquanto Deus me quiser aqui, Ele me manterá aqui. “E, quando vos conduzirem às sinagogas, aos magistrados e potestades, não estejais solícitos de como ou do que haveis de responder, nem do que haveis de dizer. Porque na mesma hora vos ensinará o Espírito Santo o que vos convenha falar” (vs. 11-12). O único fundamento adequado de testemunho para Cristo é ser plenamente liberto da influência humana e firmado na confiança absoluta em Deus. Na medida em que sou influenciado ou devedor aos homens, estou incapacitado para ser um servo de Cristo, mas posso ser efetivamente liberto da influência humana somente por uma fé viva em Deus. Quando Deus enche o coração, não há espaço para a criatura, e podemos estar perfeitamente certos disto, que nenhum homem jamais teve o trabalho de contar os cabelos de nossa cabeça. Provavelmente nós mesmos não tenhamos tido esse trabalho, mas Deus tem, e, portanto, eu posso confiar em Deus mais do que em qualquer outro. Deus é perfeitamente suficiente para cada exigência, grande ou pequena, e só precisamos confiar n’Ele para saber que Ele é. É verdade que Ele pode e usa os homens como instrumentos, mas se nos apoiarmos nos homens em vez de Deus, fazemos cair uma maldição sobre nós, pois está escrito: “Maldito o homem que confia no homem, e faz da carne o seu braço, e aparta o seu coração do SENHOR” (Jr 17:5). O Senhor usou os corvos para alimentar Elias, mas Elias nunca pensou em confiar nos corvos. E assim deve ser sempre. Fé se apoia em Deus, conta com Ele, se apega a Ele, confia n’Ele, espera por Ele, sempre deixa um espaço livre para Ele agir. Fé não obstrui o Seu caminho glorioso por qualquer confiança na criatura, mas permite que Ele Se mostre em toda a realidade gloriosa do que Ele é, deixando tudo para Ele. Além disso, se ela entrar em águas profundas e ásperas, sempre será vista no topo da onda mais alta e, de lá, contemplando em perfeito repouso em Deus e Suas ações poderosas. Isso é fé — esse precioso princípio — a única coisa neste mundo que dá a Deus e ao homem seus respectivos lugares.

C. H. Mackintosh (adaptado)

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