Origem: Revista O Cristão – Temor e Ousadia

O Espírito de Poder, Não de Medo

Em 2 Timóteo 1:6-7, Paulo lembra a Timóteo “que despertes o dom de Deus, que existe em ti Porque Deus não nos deu o espírito de temor, mas de fortaleza, e de amor, e de moderação”. Tais exortações jamais são dadas a menos que existam circunstâncias que requeiram tais palavras. Elas pretendem ir ao encontro a algumas tendências da carne, para que possamos estar em guarda contra elas. Devemos lembrar que o Senhor lida conosco como somos e leva em conta as circunstâncias em que nos encontramos.

Com relação aos nossos cuidados e provações, Cristo não nos tira deles. Ele nos deixa no mundo e sujeitos a tudo o que é passível ao homem, mas, pela nova natureza, nos ensina a confiar em Deus. Nosso pensamento muitas vezes é que (porque somos Cristãos) iremos escapar das provações, ou então, se estivermos nelas, não iremos senti-las. Este não é o pensamento de Deus a nosso respeito.

O Cristão teórico pode ser sereno e calmo, com bons livros e bons dizeres, mas quando algo de Deus atrapalha sua tranquilidade, você descobrirá que ele é um Cristão mais consciente das dificuldades que existem no mundo e da luta para superá-las. Quanto mais próximo de Deus um homem anda , pela graça, mais terno se torna quanto às faltas dos outros; quanto mais ele vive como um santo, mais consciente ele é da fidelidade e ternura de Deus e de como ela tem sido aplicada a si mesmo.

Jesus no Getsêmani 

Na vida do Senhor Jesus, tomemos o Getsêmani: E o que nós encontramos? Nunca uma nuvem sobre Sua alma – calma uniforme. Você nunca O vê fora de Seu centro; Ele é sempre Ele mesmo. Mas tome os Salmos: Não achamos nada dentro d’Ele pronto para romper essa placidez? Os Salmos trazem o que estava se passando por dentro. Nos Evangelhos Ele é apresentado ao homem como o testemunho do poder de Deus com Ele, naquelas mesmas coisas que teriam afligido o homem. Ele falou com Deus sobre eles, e assim O encontramos em perfeita paz, dizendo com calma: “A Quem buscais?”“Sou Eu”. Quão pacífico! Quão dominante (pois a paz no meio das dificuldades comanda)! Quando sozinho, em agonia, Ele pôde suar, por assim dizer, grandes gotas de sangue; Sua calma não era porque Ele não tinha sentimentos em Seu coração. Ele sentiu a provação no espírito, mas Deus estava sempre com Ele nas circunstâncias e, portanto, Ele estava uniformemente calmo diante dos homens.

Não devemos esperar nunca ser exercitados, perturbados ou rejeitados, como se não tivéssemos sentimentos. “Deram-Me fel por mantimento, e na Minha sede Me deram a beber vinagre” (Sl 69:21). Ele sentiu tudo completamente. O ferro entrou em Sua alma. “Afrontas”, diz Ele, “Me quebrantaram o coração”. Mas há essa diferença entre Cristo, no sofrimento e aflição, e nós: Com Ele nunca houve um lapso sequer por um momento entre a provação e Sua comunhão com Deus. Esse não é o nosso caso. Temos primeiro que descobrir que somos fracos e não podemos ajudar a nós mesmos, e então nos voltamos e olhamos para Deus.

Paulo 

Onde estava Paulo quando ele disse: “todos me desampararam”? Sua confiança em Deus não foi abalada, mas, olhando ao seu redor no momento em que chegou ao fim de seu ministério, seu coração se partiu por causa da infidelidade. Ele viu a inundação do mal chegando (2 Tm 3-4) e o perigo de Timóteo sendo deixado sozinho, olhando para o mal e sentindo sua própria fraqueza. Para que Timóteo não entrasse em espírito de medo, ele disse: “despertes o dom de Deus, que existe em tiPorque Deus não nos deu o espírito de temor, mas de fortaleza (poder), e de amor, e de moderação [sábia discrição – JND]. Portanto, não te envergonhes do testemunho de nosso Senhor, nem de mim, que sou prisioneiro seu; antes, participa das aflições do evangelho, segundo o poder de Deus” (2 Tm 1:6-8). Se temos o espírito do medo, isso não está vindo de Deus, pois Deus nos deu o espírito de poder. Em Cristo, Deus encontrou todo o poder do inimigo na fraqueza dos homens, e Cristo está agora assentado à direita da Majestade nas alturas.

Era para Timóteo ser participante de aflições? Sim, mas não haveria livramento do sentimento delas? Não; ele deveria ser participante das aflições que devem ser sentidas como um homem, mas “segundo o poder de Deus”.

Isso não quer dizer que não devemos sentir a pressão das tristezas e das fraquezas. Paulo tinha um “espinho na carne” (2 Co 12), e será que ele não o sentia? Sim, ele o sentia diariamente, e era como “um mensageiro de Satanás, para [o] esbofetear”. E o que ele disse? “De boa vontade, pois, me gloriarei nas minhas fraquezas [naquelas coisas que eu sou mais fraco], para que em mim habite o poder de Cristo” (2 Co 12:9). O poder de Deus intervindo ao nosso lado não diminui nossa percepção das fraquezas, mas podemos lançar “sobre Ele toda a vossa ansiedade, porque Ele tem cuidado de” nós. Não que no exato momento em que consultamos a Deus, sempre obteremos uma resposta. Daniel teve que esperar três semanas completas por uma resposta de Deus, mas desde o primeiro dia que ele propôs em seu coração entender e se humilhar diante de Deus, suas palavras foram ouvidas (Dn 10). O que frequentemente fazemos é pensar sobre o problema e já começarmos a trabalhar nele sem que antes o apresentemos diante de Deus. Não havia nada desse comportamento em Cristo. “Naquele tempo, respondendo Jesus, disse: Graças Te dou, ó Pai” (Mt 11). Nós acabamos nos cansando pela importância que damos aos nossos próprios caminhos.

“Não estejais inquietos por coisa alguma” (Fp 4:6) 

Isso é facilmente dito, mas não deveríamos estar inquietos com o estado da Igreja ou com a pressão que vem sobre uma família? Não! Não devemos “estar inquietos [ansiosos – ARA] por coisa alguma”. Tudo o que produz inquietação [ansiedade] em nós, produz um cuidado de Deus por nós; por isso “Não estejais inquietos por coisa alguma; antes, as vossas petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus, pela oração e súplicas, com ação de graças” (Fp 4:6). Deste modo, “a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os vossos corações e os vossos sentimentos em Cristo Jesus” (Fp 4:7). Note, não é que seu coração guardará a paz de Deus, mas a paz na qual o próprio Deus está – Sua paz, a estabilidade imutável de todos os pensamentos de Deus – guardará seu coração.

Além disso, quando não estamos ansiosos, a mente é colocada em liberdade; com a paz de Deus guardando o coração, Deus faz com que a alma pense em coisas felizes. “Quanto ao mais, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é honesto, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se há alguma virtude, e se há algum louvor, nisso pensai. O que também aprendestes, e recebestes, e ouvistes, e vistes em mim, isso fazei; e o Deus de paz será convosco” (Fp 4:8-9) Deus está lá, o Companheiro da alma, não apenas “a paz de Deus”, mas “o Deus de paz”.

Quando a alma conta com Deus, o Senhor está com a alma na provação e a mente fica em perfeita calma.

J. N. Darby (adaptado)

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