Origem: Revista O Cristão – Perdão
Julgamento próprio, Confissão e Perdão
“Enquanto eu me calei, envelheceram os meus ossos pelo meu bramido em todo o dia. Porque de dia e de noite a Tua mão pesava sobre mim; o meu humor se tornou em sequidão de estio (Selá)”.
“Confessei-Te o meu pecado e a minha maldade não encobri; dizia eu: Confessarei ao SENHOR as minhas transgressões; e Tu perdoaste a maldade do meu pecado (Selá)” (Sl 32:3-5).
Onde uma consciência culpada pode encontrar alívio? O próprio esforço para ocultar só agrava o fardo. Quantos corações quebrantados existem, e quantos espíritos pesarosos, que não ousam contar suas tristezas a outro! Quantos encontraram desapontamentos amargos em tudo e em si mesmos, e ainda são ignorantes da causa real, porque ignoram sua condição como perdidos. Eles não sabem que Deus olhou para o caso deles e forneceu o remédio. Eles mantêm o silêncio, embora isso apenas agrave a violenta febre interior. Nisso eles estão percebendo qual é a estrutura do homem como uma criatura moral. Ele é insuficiente para suprir sua própria felicidade, e outras criaturas também são insuficientes para fazê-lo feliz. Embora ele não possa sentir normalmente essa atitude como sendo pecado, ainda assim este é talvez o princípio mais profundo do pecado, porque estão, de fato, honrando e servindo “mais a criatura do que o Criador” (Rm 1:25).
Nenhum alívio até…
Não há alívio até que a alma possa revelar sua tristeza a Deus. Mesmo que a mão de Deus seja sentida e reconhecida, o próprio Deus é frequentemente considerado inacessível. A alma continua carregando seu próprio fardo, todo o ânimo se vai e o indivíduo está totalmente miserável. A mão de Deus pode tocar algum ídolo ou algo em que a alma estava procurando repouso, mas essa intervenção pode produzir irritação por si mesma contra Deus.
A primeira coisa sob todas as circunstâncias da miséria é o reconhecimento de Deus. Então ele descobre que Deus vai ao encontro dele onde ele está, e com a mensagem: “Vinde a Mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e Eu vos aliviarei” (Mt 11:28). O evangelho traz uma mensagem de perdão – eterno perdão –, mas também traz o homem a Deus para fazê-lo feliz em Deus. Então o pecador descobre que “bem-aventurado aquele cuja transgressão é perdoada, e cujo pecado é coberto” (Sl 32:1).
Silêncio e miséria
No entanto, existem certos princípios que se aplicam com igual verdade tanto ao homem como pecador quanto ao que é nascido de Deus. O versículo citado no começo do artigo é um deles. Se o guardar silêncio traz miséria ao pecador, quanto mais ao santo que conhece a Deus em graça, mas não usa a verdade adequadamente para aprofundar seu conhecimento de si mesmo! Tal pessoa realmente esqueceu sua posição diante de Deus, e tendo astúcia em seu espírito, não está sendo aberto com Deus. Precisamos chegar ao ponto em que dizemos, praticamente, bem como posicionalmente: “Miserável homem que sou!” (Rm 7:24).
Ocultação
Quando Deus é realmente conhecido como Aquele que imputa justiça sem obras, qualquer ocultação de pecado d’Ele necessariamente produzirá pesar de espírito. Não podemos nos aproximar d’Ele por causa da nossa ocultação, e então a frieza entra em cena. Quantas vezes, nesse caso, colocamos a culpa em qualquer coisa, até mesmo no próprio Deus, em vez de em nós mesmos por continuarmos guardando silêncio! Quando ficamos inquietos, em espírito, abatidos e infelizes, isso não tem surgido muitas vezes do orgulho mortificado? Nossa autoestima foi reduzida ao descobrirmos algum pecado insuspeito, como se nossa bem-aventurança consistisse em nosso caráter, em vez de termos nossa justiça imputada sem obras. Deus não permitirá que tenhamos confiança em nosso caráter ou em nossa fidelidade a Ele, mas em Seu próprio caráter revelado e Sua fidelidade para conosco. Essa tendência de justiça própria no crente explica em grande parte a miséria encontrada nos Cristãos. Quando eles retêm isso em si mesmos, mesmo que de forma sutil, eles se afastam do verdadeiro e único fundamento de sua bem-aventurança. Se o pecado não for confessado, se for tratado brandamente na confissão, ou se for confessado apenas de modo geral e não especificamente, isso acarretará em miséria.
Confissão
“Se confessarmos os nossos pecados, Ele é Fiel e Justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (1 Jo 1:9).
Que alívio – alívio imediato – acompanha a confissão! O silêncio é quebrado pela confissão e não se faz mais nenhum esforço para ocultar o pecado! Somos trazidos à presença de Deus e temos comunhão com Deus. Deus é justificado pela confissão e o pecado é revelado em seu caráter mais profundo em Sua presença. Mas então percebemos que Seu amor já providenciou o remédio, e o pecado para o crente é perdoado por causa da obra de Cristo na cruz. O crente experimenta o perdão restaurativo e mais uma vez tem uma feliz comunhão com Deus.
Julgamento próprio
Muitas das angustias espirituais que os santos experimentam surgem de eles não se exercitarem em julgamento próprio. O correto entendimento da verdade da justiça sem obras me coloca no lugar de julgamento próprio, um lugar elevado e maravilhoso. Estamos na luz e a luz detecta o que é inconsistente com esse lugar. Que privilégio ser capacitado a julgar isso na luz! No entanto, um santo pode se preocupar demais com seu próprio caráter aos olhos de seus irmãos ou mesmo do mundo, e assim ele inconscientemente pode ser levado a desempenhar um papel em vez de ter sua vida fortalecida a partir da fonte e do manancial da vida. Nosso caráter se torna nosso objetivo em vez de Cristo. Mas por mais que o exercício da alma em julgamento próprio seja sempre tão humilhante, mesmo assim ele levará a Cristo, e nós realmente seremos fortalecidos. Ah! Se os santos apenas soubessem quão trabalhoso é o processo a justificação própria! Se eles justificassem a Deus em vez de se justificarem a si mesmos, quantas tristezas eles evitariam!
Em 1 Coríntios 11:31, lemos: “Porque, se nós nos julgássemos [discerníssemos] a nós mesmos, não seríamos julgados”. Acho que vemos o objetivo de Paulo em usar a palavra “discernir”, não simplesmente julgar. O discernimento próprio, obter uma percepção positiva das verdadeiras fontes que movem a atividade da carne, não pode ser feito a menos que conheçamos a bendita verdade que Deus julgou a carne na cruz. É pelo poder do Espírito Santo que nos discernimos a nós mesmo, e isso na presença imediata de Deus. O novo mal, que discernimos em nós mesmos, Deus já viu desde o início e agora nos permite ver para que possamos justificar a Ele em Sua total condenação desse mal.
É de fato um incentivo abençoado para a alma ter certeza de que não há nada que não possamos dizer a Deus. Ele fez tudo para ganhar nossa confiança! É por causa da conexão entre confissão e perdão que podemos chegar a Deus, mesmo no conhecimento de algum pecado recém-descoberto. Lembremo-nos de que, para o crente, não há empecilho para nossa comunhão com Deus, exceto nós mesmos. Que não nos calemos quando pecarmos, mas cheguemos a Ele em confissão e desfrutemos do perdão, comunhão e felicidade mais uma vez!
“Righteousness Without Works”, The Present Testimony, vol. 1 (adaptado)
