Origem: Livro: Para Que Te Vá Bem

Apaixonando-se

Até agora, eu não disse uma palavra sobre romance ou sobre apaixonar-se. Talvez alguns estejam perguntando: Não devemos seguir nosso coração? Apesar dessa fala ter sido usada inúmeras vezes na mídia popular, a resposta curta é: não! “Enganoso é o coração, mais do que todas as cousas, e perverso: quem o conhecerá” (Jr 17:9). Dito isto, no entanto, não significa necessariamente que não haverá romance, ou que ninguém irá se apaixonar. Seria um relacionamento triste se tudo fosse conduzido como se fosse uma transação comercial, onde há uma lista de requisitos, certas qualidades que devem ser atendidas, e o acordo é então fechado. De fato, se não houver afeto, se o coração não estiver comprometido – se não houver química, como as pessoas dizem, certamente algo estará faltando.

Em Cantares de Salomão, a sulamita (Ct 6:13) está tão tomada por seus sentimentos que ela diz: “Desfaleço de amor” (Ct 2:5) – ou como diríamos: Estou doente de amor. É um estado que ela não deseja perturbar: “não acordeis nem desperteis o meu amor, até que ele o queira” (v. 7 – AIBB). As três vezes em que encontramos essa última expressão em Cantares de Salomão (Ct 2:7, 3:5, 8:4), marcam o fim de uma cena. Em cada caso, no entanto, segue-se um tempo de atividade renovada, e vemos um maior desenvolvimento nos afetos da noiva e na compreensão do noivo. Por mais que desejemos, não se pode andar em estado de euforia, sem apetite e incapaz de dormir. Em última análise, a realidade deve retornar e pensamentos racionais devem nos guiar.

Infelizmente, estar doente de amor geralmente acompanha a paixão, especialmente quando os sentimentos de alguém não são correspondidos. A pessoa acredita que não pode viver sem o outro; que aquela pessoa é a única que a fará feliz. Sem ele(a), estará incompleto – ele(a) me faz uma pessoa completa. Tais sentimentos não são apenas exagerados, mas prejudiciais. Somente Deus pode nos fazer completos, só Ele é suficiente para atender às nossas necessidades. O mundo retrata esse amor como um ideal elevado. É o tipo de amor Romeu e Julieta, o amor pelo qual vale a pena morrer[7]. Tais sentimentos, no entanto, não são a representação do amor verdadeiro. Esse tipo de amor é superficial e egoísta, como uma nuvem no meio dos relâmpagos. Uma garota ou um rapaz em tal condição não é de todo racional, de fato, eles carregam as características de alguém cuja mente está como que embriagada. Como resultado, as ações são mal interpretadas, os pontos fortes e fracos são julgados erroneamente, e a paixão prospera em sua própria ilusão. O amor verdadeiro corre fundo como um rio transbordando suas margens.
[7] N. do A.: Romeu e Julieta eram dois adolescentes imaturos e impetuosos.

A maioria está ciente de que as palavras gregas para o amor, agape e phileo, ocorrem com frequência no Novo Testamento. De fato, existem outras duas palavras gregas que também significam amor. A primeira raramente aparece no grego antigo e seria desconhecida para a maioria, enquanto a segunda sem dúvida será reconhecida por todos. Eros é um amor apaixonado com desejo sensual. Também é esse amor à primeira vista, a paixão que temos considerado. A palavra erótico deriva de eros. É interessante notar que eros não aparece sequer uma vez no Novo Testamento. Isso não quer dizer que maridos e esposas não devam sentir paixão ou desejo um pelo outro. No entanto, quando tais sentimentos são mencionados nas Escrituras, formas alternativas de expressão são usadas no lugar de eros.

Quando a natureza do amor verdadeiro é assim desvirtuada, então o desejo de realizar esse amor será equivocado. Paixão desta natureza pode levar a escolhas muito ruins. Amnon, filho de Davi, acreditava que amava sua meia-irmã Tamar; sua beleza o cativou (leia 2 Samuel 13). Ele ficou tão atormentado por ela que ficou doente. Ele desejava Tamar para si mesmo, mas não via como obtê-la. Infelizmente, Amnon tinha um amigo, Jonadabe, que sabia exatamente como se aproveitar dos sentimentos de Tamar. Apelando à sua compaixão feminina, Tamar é atraída para o quarto de Amnon, onde ele estava deitado fingindo estar doente. Sozinho com Tamar, forçou-a a deitar-se com ele. Tendo obtido seu objetivo, o ódio de Amnon por Tamar excedeu sua paixão anterior.

Existem inúmeras lições a serem aprendidas dessa história. Esse tipo de amor não é confiável. É egoísta, enquanto o amor verdadeiro se preocupa com a outra pessoa. Quem conscientemente machucaria alguém que amasse? O ódio de Amnon ao final não é atípico; já tendo satisfeito sua luxúria com Tamar, ele não precisa mais dela. Rapazes – por nem um minuto acreditem na mentira de que garotas secretamente desejam ser maltratadas. O “não dito por Tamar deveria ter sido suficiente – e certamente teria sido para qualquer homem que realmente a amasse. Davi deveria ter protegido Tamar, em vez disso, ele a enviou para Amnon. De sua parte, Tamar deveria ter deixado o quarto com todos os demais, como José fez (Gn 39:12), em vez de ficar sozinha com Amnon.

Nesta história, Deus revela a crueldade que se esconde no fundo do coração do homem. Alguns podem achar que este é um exemplo extremo, e que a paixão geralmente não termina em estupro – e eu concordo. No entanto, não vamos ignorar os muitos princípios a serem extraídos dessa passagem. Deus em Sua sabedoria a registra para nosso aprendizado. Mesmo quando essa paixão ardente não termina de modo tão terrível, é equivocada e levará alguém a um beco sem saída; não a confunda com amor verdadeiro.

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