Origem: Livro: As Epístolas de JOÃO e JUDAS
Seis Exemplos do Velho Testamento que Retratam o Mal que Caracterizaria a Apostasia na Cristandade
Vs. 5-16 – Esses homens ímpios que se introduziram na profissão Cristã são identificados nesta próxima série de versículos por vários pronomes de terceira pessoa: “aqueles”, “estes”, “deles”, “os quais”, “suas”, “os tais” (ARA). Eles se colocam em contraste com os verdadeiros crentes que Judas abordará nos versículos 17-25. Para designar aqueles santos, ele usa os pronomes de primeira e segunda pessoa: “vos”, “vós” “vossa” e “nosso”. Eles constituem um remanescente de verdadeiros crentes em meio à massa de ímpios, crentes meramente professos.
Nesta passagem, Judas descreve o estado decaído do testemunho Cristão usando seis exemplos do Velho Testamento. Assim, ele começa com: “Mas quero lembrar-vos, como a quem já uma vez soube isto” (v. 5). Isso mostra que ele assumia que eles estavam familiarizados com as Escrituras do Velho Testamento.
1) Os Filhos de Israel – Incredulidade (v. 5).
Toda apostasia começa com incredulidade – não ter fé pessoal no Senhor Jesus Cristo. Como um exemplo disso, Judas aponta para os incrédulos entre os filhos de Israel. Ele diz: “havendo o Senhor salvo um povo, tirando-o da terra do Egito, destruiu, depois, os que não creram” (Nm 14:28-35; Dt 2:14; 1 Co 10:5-10). Os filhos de Israel tinham sido fisicamente “salvos” pelo Senhor em uma libertação exterior do exército de Faraó no Mar Vermelho (Êx 14:30-31), mas ter essa salvação temporal não significava que eles eram nascidos de Deus. Muitos não eram, e eles manifestaram sua incredulidade quando testados no deserto e, consequentemente, Deus os “destruiu”. Essas pessoas haviam sido batizadas em Moisés no mar (1 Co 10:1-2) e estavam em um relacionamento de aliança com o Senhor (Hb 9:19-21), e assim estavam em uma favorável posição de privilégio. Mas estas eram coisas exteriores; eles precisavam de um trabalho interior de fé em sua alma para apresentarem aqueles sinais exteriores de favor – mas era exatamente isso que lhes faltava.
Esta é a coisa mais importante que caracteriza a Cristandade. Ser batizado e/ou ter feito algum tipo de profissão de fé, coloca a massa de Cristãos professos em uma posição de proximidade exterior a Deus. No entanto, eles carecem de fé pessoal e salvadora da alma no Senhor Jesus Cristo (At 16:31, 20:21; Ef 2:8). Assim como os filhos de Israel que caíram sob o julgamento de Deus no deserto, eles também terão seu fim sob o julgamento de Deus.
2) Os Anjos Caídos – Rebelião (v. 6).
A incredulidade leva à rebelião; é disso que Judas trata a seguir. Para ilustrar isso, ele aponta para os anjos que pecaram na época do dilúvio. Ele diz: “e aos anjos que não guardaram o seu principado [seu estado original – ARA], mas deixaram a sua própria habitação, reservou na escuridão e em prisões eternas até ao juízo daquele grande dia”. Aqueles que ensinam sobre a Bíblia em geral acreditam que quando Satanás foi expulso do céu (Ez 28), houve outras criaturas angélicas que caíram com ele, porque depois disso lemos sobre “o diabo e seus anjos” (Mt 25:41). Este versículo em Judas não está se referindo a esse evento, mas ao que aconteceu na época do dilúvio. Alguns desses anjos caídos manifestaram descontentamento quanto ao seu estado como anjos e coabitaram com as filhas dos homens, na tentativa de criar uma espécie de raça superior de homens e anjos (Gn 6:1-4). O “estado original” (ARA) em que Deus os criou era assexuado; eles não procriavam (Lc 20:35-36). Mas sendo rebeldes e descontentes com seu estado como tal, eles “deixaram sua própria habitação” nos céus e desceram entre os homens para realizar seu plano maligno. Mas no dilúvio, Deus exterminou os gigantes e homens poderosos que tinham saído dessas uniões impuras, e tomou aqueles anjos maus e os colocou em “cadeias da escuridão”. Pedro chama esse lugar especial de confinamento no abismo “o poço mais profundo da escuridão” (2 Pe 2:4 – JND).
Alguns têm questionado se o versículo 6 está falando de uma segunda queda de anjos. J. N. Darby foi perguntado sobre isso da seguinte maneira: “Houve duas quedas de seres angélicos em dois momentos diferentes?” Ele respondeu: “Sua pergunta supõe duas quedas de anjos das quais as Escrituras não falam, embora seja muito possível” (Letters of J. N. Darby, vol. 2, pág. 447). Assim, tendo cuidado para não ir além do que é revelado na Escritura, geralmente se considera que esta passagem se refere a uma rebelião entre alguns dos anjos caídos. Deus os tirou da Terra e os confinou no abismo porque eram tão diabolicamente corruptos. Eles serão lançados no lago de fogo (Inferno) no grande dia do julgamento (Mt 25:41; Ap 20:10). O resto dos anjos caídos sob Satanás ainda estão soltos e praticam o mal hoje. Eles serão levados e confinados ao poço do abismo no começo do Milênio (Ap 20:1-3). Depois do Milênio, no grande dia do julgamento, o diabo e seus anjos serão lançados no lago de fogo.
Judas menciona esta rebelião entre os anjos caídos para nos mostrar o espírito das pessoas ímpias que será encontrado no testemunho Cristão em seus últimos dias. Elas ficarão descontentes com a ordem natural de Deus na criação e se rebelarão contra ela. Este espírito se manifesta de várias maneiras hoje, variando de: mulheres ensinando publicamente na casa de Deus (1 Tm 2:12), deixando de cobrir a cabeça (uso do véu), o significado dos papéis próprios dos homens e das mulheres (1 Co 11:2-16), a submissão de esposas aos seus maridos no lar (Ef 5:22-23), etc. Tal é o espírito que permeia a Cristandade hoje.
3) Sodoma e Gomorra – Imoralidade (vs. 7-10).
O descontentamento e a rebelião contra a ordem natural de Deus na criação terminarão em imoralidade. Sodoma e Gomorra são citadas para ilustrar esse mal (Gn 19). Judas diz: “assim como Sodoma, e Gomorra, e as cidades circunvizinhas, que, havendo-se corrompido como aqueles e ido após outra carne, foram postas por exemplo, sofrendo a pena do fogo eterno”. Judas se refere à homossexualidade deles por terem “ido após outra carne [carne estranha – KJV]”. A versão King James chama de “carne estranha” porque essa união profana é completamente estranha à ordem moral de Deus na criação. Seu ponto é que a Cristandade será marcada por ter aqueles que terão se entregado a esse tipo de pecado, mas, ao mesmo tempo, professarão ser Cristãos! Quão inconcebivelmente incongruente é associar tal pecado ao santo nome de Cristo! Isso não significa que toda pessoa estará envolvida em imoralidade, mas será tão predominante nas fileiras Cristãs nos últimos dias que as pessoas a tolerarão e até a defenderão. Hoje, muitos pastores da Igreja, embora não estejam pessoalmente envolvidos em imoralidade, permitem isso em suas igrejas, e até desculparão aqueles que estão assim engajados – até mesmo o pecado da homossexualidade!
Vs. 8-10 – Esses “sonhando, contaminam a sua carne” com suas práticas imorais. Esse pecado é descrito pelo apóstolo Paulo em Romanos 1. A diferença entre as duas passagens é que Paulo está falando dos pagãos fora da comunidade Cristã, enquanto Judas está falando daqueles que professam ser Cristãos. Essas pessoas dizem ser Cristãs!
Eles também “rejeitam a dominação [autoridade – AIBB]”. Sendo rebeldes contra Deus, eles naturalmente se rebelam contra as instituições governamentais que são estabelecidas por Deus (Rm 13:1). Eles manifestam quando “vituperam as dignidades [difamam autoridades superiores – ARA]”. Judas nos diz que isso é algo que o arcanjo Miguel não ousaria fazer – mesmo que fosse em relação ao nosso inimigo, o diabo! Isso mostra que o diabo, embora já caído, havia outrora sido de alta dignidade entre os anjos e, até que ele seja finalmente julgado por Deus, sua dignidade deve ser respeitada. Mesmo uma dignidade angélica tão alta como a do arcanjo Miguel, respeitava isso. Por isso, ele não se encarregou de repreender o diabo, mas deixou que o Senhor o fizesse, dizendo: “O Senhor te repreenda” (v. 9). Embora caído, Satanás ainda tem imenso poder. Devemos respeitar seu poder, mas não precisamos temê-lo. De fato, nos é dito: “resisti ao diabo, e ele fugirá de vós” (Tg 4:7). Mas em nenhum momento devemos trazer “juízo de maldição contra ele”.
O motivo de discórdia naquela ocasião foi o local de enterro de Moisés. O propósito de Satanás era provavelmente erigir um santuário em memória de Moisés e assim enlaçar o povo de Israel na idolatria (compare 2 Rs 18:4). Deus, portanto, conduziu um enterro secreto de seu corpo no “vale de Moabe” (Dt 34:5-6). (Nota: “arcanjo” está no singular; há apenas uma dessas criaturas. Da mesma forma, “diabo” na Escritura está sempre no singular. A versão King James (e a ARC em Dt 32:17), no entanto, ocasionalmente dirá “diabos”, mas deve ser traduzido como “demônios”. Há um diabo, mas muitos demônios).
Judas acrescenta: “Estes, porém, dizem mal do que não sabem; e, naquilo que naturalmente [por mera natureza – JND] conhecem, como animais irracionais, se corrompem” (v. 10). A palavra “por mera natureza” refere-se aos instintos animais. Isso mostra que essas pessoas moralmente corruptas deveriam conhecer melhor ao observar o reino animal (Jó 12:7), pois os animais não se rebaixam dessa maneira. Mas eles desconsideram o testemunho da natureza e se corrompem. Em resumo, seu mal é duplo:
- Em coisas espirituais, eles trazem “juízo de maldição” contra a verdade (v. 9).
- Em coisas naturais eles “se corrompem” com práticas imorais (v. 10).
4) Caim – Religião das obras sem sangue (v. 11a).
Caim é então apresentado para indicar outra característica da Cristandade apóstata – a religião sem derramamento de sangue. Judas diz: “Ai deles! Porque entraram pelo caminho de Caim”. O caminho de Caim é se aproximar de Deus com base em boas obras, em vez de com base em um sacrifício (Gn 4:3). Ele buscou aceitação com Deus no que ele havia realizado por meio do trabalho de suas mãos e, nesse terreno, sua oferta foi rejeitada. Isso mostra o quanto a Cristandade se degenerou, no que diz respeito ao conceito básico de como uma pessoa é considerada justa diante de Deus. Muitas denominações Cristãs questionam, e até rejeitam, a expiação vicária de Cristo. Sua obra consumada na cruz como sendo o único caminho de salvação pela fé (Jo 19:30) é substituída pela realização de boas obras para aceitação diante de Deus. A morte de Cristo é reduzida a ser um modelo de humildade, nada mais. Como resultado, as pessoas são intimadas a amar o próximo e fazer boas obras para a aceitação divina. Tal é um evangelho sem derramamento de sangue, que é realmente “outro evangelho” que não é de Deus (2 Co 11:4). É o caminho de Caim.
5) Balaão – A Comercialização do Cristianismo (v. 11b).
Judas diz que esses ímpios “se precipitaram no erro de Balaão” (ARA), que busca honra e glória na esfera das coisas divinas (Nm 22-24). O apóstolo Pedro fala do “caminho de Balaão”, que era o amor de Balaão pelo “prêmio [recompensa – JND] da injustiça” (2 Pe 2:15). Assim, ele não era apenas um homem egoísta, mas também um homem cobiçoso que estava disposto a prostituir seu dom profético para obter riqueza, embora ele fizesse todos os esforços para que a coisa parecesse de outra maneira (Nm 22:18). Esses homens também ensinariam “a doutrina de Balaão”, que viria encorajar o mundanismo entre o povo de Deus (Ap 2:14).
Colocando essas três coisas juntas, temos uma imagem composta da Cristandade do seu lado que é movido pelo dinheiro e que busca glória. Os gananciosos procuraram transformar o Cristianismo em um negócio lucrativo, e tiveram sucesso nisso de muitas maneiras. Eles não veem nada de errado em servir no púlpito por salário, tirar dinheiro dos perdidos, etc. Muitos pregadores se tornaram surpreendentemente ricos. O apóstolo Paulo denunciou isso, afirmando: “Pois não estamos, como muitos, mercadejando com a Palavra de Deus” (2 Co 2:17 – TB). W. T. P. Wolston salientou que, se dinheiro e entretenimento fossem retirados dos sistemas eclesiásticos da Cristandade, muitos deles entrariam em colapso. Ele disse que se o entretenimento fosse retirado, eles perderiam seu grande público, e se o dinheiro fosse retirado, eles perderiam muitos dos homens e mulheres no púlpito.
6) Coré – Erro Eclesiástico (v. 11c)
Judas traz mais um exemplo do Velho Testamento para ilustrar outra coisa que marca a Cristandade – o erro eclesiástico. Isso é, um erro nas coisas referentes à doutrina e prática da Igreja. Judas expõe isso ao mencionar “a contradição (contestação) de Coré”. Coré e seu grupo de homens (Nm 16) queriam uma posição acima do povo que pertencia apenas a Moisés e Arão, que são um tipo duplo de Cristo, o Apóstolo e Sumo Sacerdote da nossa confissão (Hb 3:1). Não estando contentes com o lugar que Deus lhes havia dado como levitas, eles queriam um ofício de sua própria autoria, e sua insurreição contra a ordem de Deus naquela economia mosaica foi recebida com Seu desagrado e julgamento.
Os homens na Cristandade levantaram-se de maneira semelhante e introduziram o ofício do clérigo. Esta é uma posição na Igreja que é puramente uma invenção humana, pois a Palavra de Deus não fala sobre isso. Dá ao possuidor daquele ofício (seja homem ou mulher) um lugar distinto entre Deus e Seu povo. No entanto, Deus nunca pretendeu que deveria haver tal classe de pessoas presidindo uma congregação no Cristianismo. De fato, tal coisa é condenada em Sua Palavra (1 Pe 5:3). Esses homens são presunçosos nisso, frequentemente chamando o rebanho de Deus como sendo o rebanho deles próprios. Inflados por um senso de importância, eles negligenciaram a ordem de Deus para adoração e ministério Cristão nas epístolas e introduziram sua ordem feita pelo homem. Como resultado, o sistema do clero/leigos pode ser encontrado em graus variados na maioria das denominações da Cristandade, se não for em todas elas. Uma diferença entre Coré e seus homens e suas contrapartes na Cristandade é que os homens de Coré não chegaram a tomar posse, enquanto os clérigos na Cristandade têm funcionado nesse lugar criado pelo homem por mais de mil anos.
