Origem: Livro: A EPÍSTOLA DE PAULO AOS ROMANOS

Justiça Prática Para com os Fracos na Fé

Cap. 14:1–15:13 – Outra particularidade judaica que os judeus convertidos tendiam trazer consigo para a comunhão dos Cristãos era a de manter certos princípios quanto às regras judaicas referentes a alimentos e à observância de dias santos que eram guardados no judaísmo. Dois exemplos são dados:

1) Regras alimentares judaicas – alimentos kosher (vs. 2-4).

2) A observância dos dias santos judaicos – o sábado, etc. (vs. 5-6).

Romanos 14 se refere à nossa responsabilidade para com um judeu fraco recém-convertido do judaísmo; enquanto 1 Coríntios 8 se refere à nossa responsabilidade para com um gentio fraco recém-convertido do paganismo. Essas passagens mostram que temos uma responsabilidade em relação a ambos.

V. 1 – A maioria dos judeus convertidos naqueles dias anteriores não estavam totalmente livres do judaísmo (Hb 13:13) e estavam apegados a certos costumes e práticas judaicas por uma questão de consciência (At 21:20). O que os irmãos deveriam fazer quando pessoas assim eram salvas e entravam na comunhão Cristã? Eles deveriam menosprezar suas preocupações e condená-los? Isso certamente não seria amor em ação! Pelo contrário, Paulo diz: “ao que é fraco na fé, acolhei-o” (AIBB) “não, porém, para discutir opiniões” (ARA).

“Fraco na fé” é alguém deficiente em seu entendimento quanto à posição e liberdade Cristãs (Gl 5:1) e, consequentemente, tem costumes infundados sobre assuntos de importância secundária na vida Cristã. (como regra, quando o artigo “a” é usado nas Escrituras em conexão com “fé”, está se referindo à revelação Cristã da verdade. Veja Judas 3, etc. Quando o artigo não é mencionado, está se referindo à energia interior da confiança da alma em Deus. Veja Atos 20:21; Romanos 14:22, etc.)

A resposta de Paulo a essa dificuldade é que devemos “receber” todas essas pessoas cordialmente. Isso não se refere à recepção de uma pessoa em comunhão à mesa do Senhor (recepção da assembleia), mas ao seu recebimento entre os santos na comunhão social prática. (Mencionamos isto porque este versículo tem sido frequentemente aplicado fora do seu contexto e usado indevidamente para apoiar a falsa ideia de que pelo fato de alguém ter sido recebido de Deus, sendo um crente no Senhor Jesus (v. 3), estamos obrigados a recebê-lo à Mesa do Senhor, sem levar em consideração suas associações e seu estado espiritual de alma). Assim, o irmão excessivamente escrupuloso não deve ser evitado entre os santos. Ao acrescentar: “Não, porém, para discutir opiniões” (ARA), Paulo está nos alertando para evitar envolver essas pessoas em argumentos a respeito de seus costumes. Poderia romper desnecessariamente a harmonia que deveria existir na comunhão Cristã normal. Isso não significa que eles deveriam adotar essas práticas judaicas para não as ofender. Isso faria com que os equívocos do irmão fraco governassem e ditassem como os outros deveria viver. Em vez disso, eles deveriam ter o cuidado de não fazer deliberadamente na presença do irmão fraco as coisas que poderiam causar-lhe ofensa

Vs. 2-3 – Ele diz: “Porque um crê que de tudo se pode comer, e outro, que é fraco, come legumes” Ao apontar isso, Paulo quer que percebamos que nem todos os crentes estão no mesmo nível de espiritualidade, maturidade e entendimento; alguns são “fracos” e alguns são “fortes” (cap. 15:1). Assim, devemos fazer concessões e não forçar as pessoas contra suas consciências nesses assuntos. Ele diz: “Quem come, não despreze àquele que não come; e quem não come, não julgue àquele que come, porque Deus o acolheu” (TB). Isso mostra que devemos respeitar as consciências e os exercícios pessoais uns dos outros e não passar por cima deles. Isso poderia ofendê-los. Se certos princípios relativos a estas questões não são claros a alguém, não devemos julgá-lo naquilo que ele se permite ou não se permite fazer. Cada um é responsável por andar diante do Senhor na maneira em que acredita que o Senhor queria que ele andasse (Gn 17:1). Paulo diz: “Para seu próprio Senhor ele está em pé ou cai”. Isto é, em última análise, ele é responsável perante o Senhor pelo que faz. Se ele está enganado sobre algum assunto, e se ele está fazendo isso com fé, acreditando que é a vontade de Deus, Deus honrará sua fé e o impedirá de sair do caminho – pois “poderoso é Deus para o firmar”. Assim deve haver mútua tolerância nesses assuntos.

“Um avalia um dia mais que outro dia; outro avalia todos os dias iguais” (TB). Alguns tomaram esta declaração como sendo sua liberdade de fazer o que quiserem no Dia do Senhor, mas não é isso a que Paulo está se referindo aqui. Uma vez que a passagem está tratando principalmente com judeus convertidos fracos, isso seria em relação aos dias de sábado, etc. W. Kelly observou: “Um Cristão não considerar o Dia do Senhor seria uma desonra direta atribuída ao Seu próprio encontro especial com Seus discípulos naquele dia, um desprezo aberto àquele testemunho da graça”. Paulo acrescenta: “esteja cada um plenamente convencido em sua mente”. O problema em muitos casos, é que quando uma pessoa não está realmente convicta de algum exercício que tenha sobre a vida Cristã, tentará convencer os outros a respeito disso – até mesmo impondo tal exercício sobre outros. Elas parecem pensar que, se mais pessoas as virem da maneira como o fazem, então seria um sinal de que estariam certas. Às vezes as pessoas usam seus exercícios pessoais para tentar distinguir-se entre seus irmãos como extremamente santos e piedosos, mas na realidade é a carne em ação. Esse tipo de coisa tende ao legalismo e significa um desastre entre os santos. Muitas vezes coloca os irmãos em polos opostos, separando os que “veem” tal exercício daqueles que não o “veem”. E é tudo porque as pessoas não fizeram o que Paulo recomenda no final do capítulo – “tem-na para ti mesmo perante Deus” (v. 22).

Quatro Princípios Orientadores 

Caps. 14:6–15:7 – Paulo menciona quatro princípios que nos guiarão em conexão com as diferenças que os irmãos podem ter em seus exercícios pessoais. Esses princípios podem ser aplicados a todos os Cristãos, não apenas aos judeus convertidos.

Viver Sob o Senhorio de Cristo 

Cap. 14:6-9 – O primeiro princípio que deve regular nossa conduta nesses assuntos é que devemos viver nossas vidas sob a direção do senhorio de Cristo. Isso é visto no fato de que em quatro pequenos versículos, Paulo menciona “o Senhor” sete ou oito vezes – dependendo de qual tradução é usada. É claro, portanto, que Paulo está enfatizando o senhorio de Cristo aqui.

O ponto de Paulo nesta passagem é que em assuntos onde não há desobediência direta à Palavra de Deus, cada um deve ser deixado livre para agir diante do Senhor como o Senhor dirigir, sem a interferência de outros. A pergunta que cada um de nós precisa fazer é: “Com relação a isso que eu permito (ou me recuso a permitir) em minha vida, o que o Senhor quer que eu faça?” Se considerarmos certo dia, ou comermos (ou nos abstermos de comer) um determinado alimento, devemos fazê-lo como “para o Senhor”. Isto é, devemos fazê-lo acreditando que Ele nos dirigiu no assunto (Cl 3:17, 21).

Paulo acrescenta: “Porque nenhum de nós vive para si, e nenhum morre para si. Porque, se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos. De sorte que, ou vivamos ou morramos, somos do Senhor”. Isso significa que a vida toda do crente não somente é aberta diante do Senhor, mas também que sua vida pertence ao Senhor. De fato, uma das razões pelas quais Cristo morreu e ressuscitou é que Ele tenha o título e o direito de ser o Senhor sobre todos (At 2:36). Assim, somos, em última instância, responsáveis perante o Senhor por tudo o que fazemos na vida e na morte.

Viver em Vista do Tribunal de Cristo 

Cap. 14:10-12 – Isso leva Paulo a falar de uma segunda coisa que deve governar a forma como nos conduzimos em questões relativas à nossa consciência. Ele diz: “Mas tu, por que julgas teu irmão? Ou tu, também, por que desprezas teu irmão? Pois todos havemos de comparecer ante o tribunal de Cristo”. Assim, devemos abster-nos de julgar ou menosprezar aqueles que não veem as coisas como nós, porque se aproxima um dia em que nossas vidas serão revistas no tribunal de Cristo e todos esses exercícios pessoais serão examinados pelo Senhor. Naquele momento Ele manifestará se eles estavam de acordo com a Sua vontade ou se eram meramente da carne.

A primeira destas duas perguntas – “por que julgas teu irmão?” – é dirigida ao Cristão fraco cuja tendência é julgar aqueles que permitem certas coisas que sua consciência não lhe permite fazer. Ele provavelmente verá as liberdades que seu irmão toma como sendo permissividades e o condenará por isso. A segunda pergunta – “por que desprezas teu irmão?” – é dirigida ao Cristão forte cuja tendência é rebaixar aqueles que não têm a luz e a liberdade que ele tem. Paulo lembra a ambos o fato de que todos nós vamos “comparecer ante o tribunal de Cristo” algum dia e veremos essas coisas manifestadas. Paulo cita Isaías 45:23 para mostrar (em princípio) que então “cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus”, pelas coisas que permitimos ou não permitimos em nossas vidas.

É significativo que cada vez que o tribunal de Cristo é mencionado no Novo Testamento, ele é visto de um ponto de vista diferente. Quando reunimos essas referências, aprendemos que o Senhor examinará todos os aspectos de nossas vidas. O que será revisto são:

  • Nossos caminhos em geral (2 Co 5:9-10).
  • Nossas palavras (Mt 12:36).
  • Nossas obras de serviço (1 Co 3:12-15).
  • Nossos pensamentos e motivos (1 Co 4:3-5).
  • Nossos exercícios pessoais sobre questões de consciência (Rm 14:10-12).

Assim, está chegando um dia de avaliação quando o Senhor pesará os “porquês” e os “para quês” de nossas vidas. Esse exame trará à luz a realidade das coisas que assumimos como exercícios pessoais. Algumas destas coisas podem se manifestar como sendo carnais, e outras podem provar ser exercícios que eram verdadeiramente do Senhor. O argumento de Paulo aqui é que devemos deixar essas coisas até esse dia, porque não temos a imagem completa agora e somos incapazes de fazer uma avaliação precisa dessas coisas entre nós. Mesmo se o fizéssemos, não podemos pesar os motivos do coração como o Senhor o fará (1 Sm 2:3). Portanto, devemos agora parar e desistir de fazer avaliações dos exercícios pessoais de nossos irmãos – podemos estar errados. Além disso, fazendo julgamentos desnecessários de nossos irmãos agora, corremos o risco de causar uma ruptura na comunhão dos santos.

Viver em Vista de Não Causar Tropeço a Nossos Irmãos 

Cap. 14:13-23 – Paulo continua e dar uma terceira coisa que deve regular nossa conduta nessas questões de exercício pessoal. Devemos andar “conforme o amor” para com nossos irmãos e, assim, ter cuidado para não fazer nada que seja “tropeço ou escândalo” em seu caminho. Paulo, portanto, sugere que, em vez de julgar nosso irmão, devemos julgar a nós mesmos (julgamento próprio) nesse assunto e renunciar a tomar liberdades que ofendam um irmão fraco. Já que nada do que é material é “de si mesmo imunda” – mas apenas o é aquilo que é estimado como tal na consciência de cada um (v. 14) – se sabemos que algo que permitimos em nossas vidas aflige um de nossos irmãos, o princípio do “amor” por nosso irmão deve ditar que devemos renunciar a fazer tal coisa. Devemos fazer isso porque nos é dito: “Não destruas por causa da tua comida aquele por quem Cristo morreu” (v. 15). “Destruir”, no sentido de que Paulo usa a palavra aqui, não está se referindo à morte física ou ao juízo eterno. Significa simplesmente destruir a confiança de um irmão no Senhor, pela qual ele fica confuso quanto ao que é certo e o que é errado, e se afasta de segui-Lo no caminho de fé. Assim, Paulo menciona três tipos de julgamento neste capítulo:

  • O julgamento de nossos irmãos de forma crítica (v. 3-4, 10a).
  • O justo julgamento do Senhor (vs. 10b-12).
  • O julgamento próprio do crente (v. 13).

O amor pensa nos outros e nos fará renunciar aos direitos legítimos que temos para promover uma feliz comunhão Cristã. A declaração “por quem Cristo morreu” não deve ser tomada levianamente. Ela aponta para o custo incalculável que Cristo pagou para salvar aquele irmão. Portanto, precisamos deixar que isso penetre profundamente em nossos corações e pensemos seriamente sobre o nosso cuidado mútuo. Se, por outro lado, eu egoisticamente exibir meus direitos Cristãos nesses assuntos, poderei muito bem causar danos irreparáveis na vida de um irmão fraco. Ostentar nossa liberdade diante daqueles que são fracos na fé manifesta um espírito não-Cristão. Estamos realmente deixando ser “censurado o nosso bem” (v. 16). No entanto, não devemos deixar que o que é bom e correto para nós se torne um objeto de crítica, mal-entendido e ofensa (v. 16).

Vs. 17-18 – Paulo declara que as coisas importantes na vida Cristã têm a ver com “o reino de Deus”. Essas são coisas morais, e não coisas que pertencem a “comida” ou “bebida” – isto é, coisas naturais externas da religião terrena. Portanto, o que realmente conta no reino de Deus não são as regras quanto aos alimentos e as observâncias religiosas de certos dias, mas as coisas concernentes à “justiça, paz e gozo no Espírito Santo”. Portanto, não é o que um homem come que é importante, mas viver uma vida santa para a glória de Deus. Se definirmos isso como uma prioridade em nossas vidas e buscarmos o bem de nossos irmãos, serviremos a Cristo de um modo que seja “agradável a Deus e aprovado pelos homens” (ARA).

Vs. 19-21 – Paulo, portanto, conclui que devemos “perseguir” (JND) “as coisas que contribuem para a paz e as que são para a edificação mútua” (TB). Já que a carne não destrói “a obra de Deus” na alma de uma pessoa, se sabemos de algo que permitimos em nossas vidas que poderia ofender nossos irmãos, então o princípio em que devemos viver é este: “Bom é não comer carne, nem beber vinho, nem fazer outras coisas em que teu irmão tropece, ou se escandalize, ou se enfraqueça”. Isso significa que não devemos atropelar a consciência de um irmão quando ele não está claro sobre um assunto. Por exemplo, não devemos convidar para jantar uma pessoa que acabou de se converter do judaísmo ou do islamismo e servir carne de porco assada.

Vs. 22-23 – O conselho de Paulo, portanto, é que se tivermos “fé” para fazer certas coisas que não são diretamente proibidas nas Escrituras – mas que são coisas que poderiam ofender e fazer tropeçar alguém – então, “Tem-na em ti mesmo diante de Deus”. Isto é, não ostente nossa liberdade, mas faça essas coisas em particular diante de Deus onde e quando não correremos o risco de ofender alguém. Paulo acrescenta: “Bem-aventurado [feliz – KJV] aquele que não se condena a si mesmo naquilo que aprova”. Em outras palavras, é bom andar no pleno gozo de nossa liberdade, não estando preso por costumes infundados.

Note que Paulo não nos diz para tentar levar aqueles que não são claros sobre essas questões além do que sua consciência dita, persuadindo-os a participar de algo que é duvidoso para eles. Ao ter uma consciência a respeito de algo “aquele que tem dúvidas, se come, está condenado” porque “tudo que não é de fé é pecado”. Ao forçar uma pessoa dessa maneira, poderíamos levá-la a pecar, e isso poderia dar início a que ela se desvie de Deus. Nós o ensinamos a ir em frente e violar sua consciência, e uma vez que tenha feito isso, poderia muito bem continuar a fazê-lo em outros assuntos mais sérios.

Devemos Seguir o Exemplo de Cristo em Tudo 

Cap. 15:1-7 – Paulo dá uma quarta coisa que nos ajudará a andar corretamente nessas situações – é seguir o exemplo de Cristo em Sua vida.

Vs. 1-2 – Ele diz que aqueles que são “fortes” na fé devem “suportar as fraquezas dos fracos” e, assim, deixar de se agradar em coisas relativas à comida e bebida, e considerar a “edificação” dos irmãos, em vez de seus próprios prazeres. Ele coloca diante de nós o mais elementar princípio Cristão – o bem-estar dos outros antes do nosso! Ele diz: “Portanto cada um de nós agrade ao seu próximo (nosso irmão no Senhor), visando o que é bom para edificação” Se “cada um” na comunidade Cristã tivessem essa atitude e disposição, toda essa questão de ofender e fazer alguém tropeçar com nossas liberdades seriam resolvidas de uma só vez.

V. 3 – O modelo que ele coloca diante de nós é o próprio Cristo, que “não agradou a Si mesmo”. Se imitarmos o amor abnegado de Cristo pelos outros, estaremos contentes em renunciar coisas para agradar ao nosso próximo. O apóstolo João disse: “Nisto conhecemos o amor: que Cristo deu a Sua vida por nós; e devemos dar nossa vida pelos irmãos” (1 Jo 3:16). A atitude que diz: “Eu tenho o direito de fazer isso, e vou fazê-lo independentemente do que os outros pensam; e eles terão que me aceitar do jeito que eu sou” certamente não é semelhante à de Cristo. O Senhor Jesus era o Único na Terra que realmente tinha o direito de fazer o que quisesse, e escolheu não agradar a Si mesmo. A lição aqui é que devemos estar dispostos a nos abster do direito que legitimamente tenhamos a qualquer liberdade, em vez de arriscar fazer alguém tropeçar. Levar adiante esse direito é violar o próprio espírito do Cristianismo.

Cristo estava tão comprometido com a honra e a glória de Deus que, se alguém reprovasse a Deus, Cristo mesmo suportaria a reprovação. Ele poderia dizer a Deus: “as afrontas dos que Te afrontam caíram sobre Mim”. Esta é uma citação do Salmo 69:9. Da mesma forma, se houver alguma fraqueza no entendimento de nosso irmão concernente à liberdade Cristã, e isso o tem levado a ter restrições infundadas, e, isso trouxer censura e críticas sobre ele, deveríamos estar dispostos a nos identificar com ele no assunto, e suportar a consequente reprovação com ele.

V. 4 – Temos também a “paciência [perseverança – ARA] e consolo [encorajamento – JND] das Escrituras”, nas quais podemos aprender com as atitudes de santos de outras épocas cujas vidas manifestaram um cuidado abnegado pelos outros. As Escrituras a que Paulo se refere aqui são o Velho Testamento; o Novo Testamento ainda não havia sido escrito. Note que ele não diz que aquelas Escrituras do Velho Testamento foram escritas “para” nós, mas sim, “por” (JND) nós – isto é, por causa do nosso aprendizado. Isso mostra que a maioria das Escrituras não foram escritas para nós Cristãos, mas toda a Escritura foi escrita por causa da nossa “instrução” (2 Tm 3:16-17). O Velho Testamento é escrito para Israel; enquanto as 21 epístolas do Novo Testamento foram escritas para os Cristãos. É nelas que encontramos a doutrina e a prática Cristãs. Aqueles que querem juntar Israel e a Igreja em uma única companhia de crentes (Teologia Reformada do “Pacto”) se opõem a isso. Eles (em seu ensino equivocado) pensam que Israel é a Igreja no Velho Testamento e que a Igreja é Israel no Novo – e, portanto, acreditam que toda Escritura é escrita “para” nós. No entanto, não é isso que Paulo diz aqui. O tipo de aprendizado (“instrução”) que devemos obter do Velho Testamento tem a ver com princípios morais e práticos. O resultado é que nos é dada “esperança” que nos ajuda a seguir no caminho de fé.

Vs. 5-7 – Paulo conclui suas exortações sobre a liberdade Cristã, lembrando-nos do apoio divino que temos em Deus. Ele diz: “Ora o Deus de paciência [perseverança – ARA] e consolação [encorajamento – JND] vos conceda o mesmo sentimento uns para com os outros, segundo Cristo Jesus”. Assim, nós ganhamos “perseverança e encorajamento” das Escrituras (v. 4), mas também “o Deus de perseverança e encorajamento” (JND) nos ajuda no caminho (v. 5). E o objetivo divino em tudo isso é que andemos juntos em unidade prática, tendo “o mesmo sentimento uns para com os outros”. Ao acrescentar, “segundo Jesus Cristo”, Paulo está nos dando uma palavra de cautela; essa afinidade é estar de acordo com o Senhor e ao relacionamento com Ele para o qual fomos chamados. Isto porque é possível ter um mesmo pensamento de acordo com a carne. Ananias e Safira são um exemplo disso. Eles tinham o mesmo pensamento em uma coisa má (At 5:1-11).

Seu desejo é que tenhamos um testemunho único diante do mundo, glorificando a Deus “unânimes e a uma boca” (TB). Isso é bastante surpreendente; as bocas que antes estavam cheias de amargura e maldição (cap. 3:14) agora são vistas cheias de ações de graças e louvor! Se é dada atenção à esta exortação, judeus e gentios salvos seriam encontrados juntos louvando a Deus com “uma boca”. Que quadro é esse – um triunfo da graça de Deus! Assim, isso nos leva a um círculo completo de onde Paulo começou no capítulo 14:1, a saber, que devemos “receber” uns aos outros. O modelo para nós nisso é Cristo – “como também Cristo nos recebeu para glória de Deus”.

As Escrituras Ensinam que Judeus Convertidos e Gentios Serão Abençoados Juntos sob Cristo 

Cap. 15:8-13 – Nos capítulos 1 a 3, vimos os judeus e gentios em posições bem diferentes – na verdade, em polos opostos, naturalmente falando. Mas tendo falhado em sua responsabilidade para com Deus, seus pecados os reduziram a um denominador comum como pecadores. Nos capítulos 3:21-8:39, vimos crentes dentre os judeus e gentios juntamente abençoados pela justiça de Deus. Então, nos capítulos 12-15:7, os judeus e gentios crentes foram exortados a caminhar juntos em unidade prática, não permitindo que preconceitos e estilos de vida antigos interferissem.

Vs. 8-12 – Para ajudá-los com isso, nos próximos cinco versículos, Paulo mostra que o ministério de “Jesus Cristo” à “circuncisão” na verdade inclui judeus e gentios. De fato, sempre foi Sua intenção “que os gentios glorifiquem a Deus por causa da Sua misericórdia” (ARA) e assim fossem abençoados em conexão com Israel. Quatro Escrituras são citadas das três partes principais do Velho Testamento – a Lei, os Salmos e os Profetas (Lucas 24:44) – para provar isso.

V. 9 – No Salmo 18:49, Davi antecipou um dia em que o Senhor “cantará” a Deus no meio de uma multidão de gentios crentes.

V. 10 – Em Deuteronômio 32:43, Moisés anuncia que chegaria o tempo em que os gentios convertidos se “alegrariam” nas bênçãos da salvação “com o seu povo” Israel.

V. 11 – No Salmo 117:1, ouvimos Israel convidando os gentios a “louvar ao Senhor” com eles.

V. 12 – Em Isaías 11:10, o profeta fala da inclusão dos gentios no reinado do Messias de Israel.

Essas Escrituras não ensinam que os crentes dentre os gentios seriam parte da Igreja – o que é revelado no Mistério. Mas elas mostram que Deus quer que judeus e gentios convertidos se regozijem juntamente ao confiarem em Cristo. Ao afirmar isso, Paulo dá a entender que nossos corações, portanto, devem ser largos o suficiente para incluir ambos (judeus e gentios) em assuntos de comunhão prática. Já que muitas das diferenças entre crentes na Igreja primitiva tinham se originado de suas vidas anteriores como judeus e gentios, ele desejava que essa verdade os encorajasse a usar a diligência para caminhar juntos em união prática. Isso encerra formalmente as exortações da epístola.

V. 13 – Paulo conclui com uma bendição recomendando os santos romanos ao “Deus de esperança” que os encheria de “gozo e paz” e “crendo” com confiança de que eles “abundariam em esperança” até o fim. Essencialmente, seu desejo por eles é que fossem encontrados em um bom estado espiritual de alma, e assim serem capazes, “pelo poder do Espírito Santo” (ARA), de colocar em prática as exortações que ele havia dado.

Resumo da Justiça Prática Demonstrada na Vida Cristã 

Esta seção prática da epístola mostrou que há agora motivos e atitudes inteiramente novos no crente, e eles se manifestam:

  • Cap. 12:1-8 para com Deus.
  • Cap. 12:9-13 para com os crentes.
  • Cap. 12:14-21 Para com o mundo.
  • Cap. 13:1-14 Para com as autoridades civis.
  • Caps. 14-15:13 Para com aqueles fracos na fé.

ITINERÁRIO DE PAULO – Cap. 15:14-33 

Esta última seção é suplementar à doutrina anterior na epístola. Paulo informa os santos romanos de suas circunstâncias pessoais e suas intenções no serviço em relação ao evangelho “nos lugares que estão além” (2 Co 10:16).

Assim, ele encerra a epístola declarando suas razões para escrever a eles e expressa seu grande desejo de visitá-los. Ele explica que não lhes escreveu por causa de alguma falta particular da parte deles, mas simplesmente para comunicar-lhes o evangelho que pregou entre os gentios; prometendo que quando chegasse a eles, lhes daria “a plenitude da bênção de Cristo” (v. 29 – ARA) – o que ele não expôs nesta carta. Esta é uma referência à verdade do “Mistério”, que foi uma revelação especial dada a ele e a outros apóstolos e profetas (Ef 3:5), para comunicar aos santos. Ele menciona isso no capítulo 16:25.

Vs. 14-15 – Ele disse: “Eu mesmo estou persuadido a vosso respeito, irmãos meus, que também vós mesmos estais cheios de bondade, cheios de toda a ciência e capazes de admoestar uns aos outros. Mas vos escrevo em parte mais ousadamente, como trazendo-vos isto de novo à memória, por causa da graça que me foi dada por Deus”. Vemos disto que Paulo estava convencido de que os irmãos em Roma estavam em um bom estado – “cheios de bondade” – e assim receberiam suas admoestações. Portanto, ele escreveu a eles com considerável ousadia. Ele também estava confiante de que eles eram Cristãos maduros e bem capazes de admoestarem-se mutuamente em amor, e assim orientarem-se em relação às dificuldades que pudessem surgir entre eles, sem que ele estivesse presente para fazê-lo. Este é um sinal de uma assembleia saudável. Paulo, portanto, não tinha intenção de chegar a eles como árbitro ou regulador. Os que se imaginam ser árbitros ou reguladores podem causar dano entre o povo do Senhor. Não é que uma assembleia não possa pedir ajuda e conselho, mas sob condições normais, as assembleias locais devem resolver suas próprias dificuldades no temor de Deus (Fp 2:12). Uma assembleia que habitualmente tem seus problemas resolvidos por irmãos de outras localidades pode perder a bênção prática e a educação espiritual que o Senhor pretende para eles no problema.

Note que ele menciona “cheio de bondade” antes de ser capaz de “admoestar uns aos outros”. Para admoestarmos com eficiência, primeiro precisamos ter corações cheios de bondade para com aqueles a quem procuramos ajudar, e também precisamos ter o “conhecimento” prático dos princípios bíblicos sobre a situação da pessoa. Sem essa graça e conhecimento, poderíamos causar danos à pessoa e agravar o problema.

Cap. 15:16-17 – Paulo tinha outra razão para ir até eles, e isso porque ele tinha sido “oficialmente empregado” (v. 16 – nota de rodapé JND) por Deus como um “ministro de Cristo Jesus entre os gentios” (TB). Ele tinha uma comissão especial de Deus para os gentios (At 9:15, 22:21; Gl 2:7; Ef 3:8; Cl 1:27). Como eles eram predominantemente uma assembleia de gentios – se não exclusivamente gentios, pois Cláudio César expulsara todos os judeus de Roma (At 18:2) – Paulo sentia que deveria se certificar de que “a oferta dos gentios pudesse ser aceitável” (JND) para Deus. Isto é, que eles ficariam diante de Deus em toda a verdade do evangelho e do Mistério. Ele acrescenta: “santificada pelo Espírito Santo”, porque ele entendeu plenamente que esta obra entre os gentios era realmente uma obra de Deus pelo Espírito, e ele queria dar a Deus o crédito pelo que Ele havia concebido. Paulo estava, portanto, justificado em seu desejo de ter “glória em Jesus Cristo nas coisas que pertencem a Deus”.

Vs. 18-19 – Se houvesse alguma dúvida se ele realmente tinha essa comissão, isso poderia ser facilmente resolvido pelas suas provas. Ele disse: “Porque não ousarei dizer coisa alguma, que Cristo por mim não tenha feito, para fazer obedientes os gentios, por palavra e por obras” (ARF). Isto é, ele não quis comentar sobre o que os outros estavam fazendo para o Senhor, mas daquilo que ele sabia em primeira mão pelo Senhor trabalhando por meio dele. Houve uma demonstração de “força de sinais e prodígios, pelo poder do Espírito Santo” (ARA). E isso acontecera em muitos lugares – “desde Jerusalém, e arredores, até ao Ilírico” (norte da Macedônia, no Mar Adriático). Essencialmente, isso aconteceu em todos os lugares onde ele “pregou plenamente as boas-novas de o Cristo” (JND). Este é um relato da extensão geográfica de seu ministério, não da ordem cronológica do mesmo.

Vs. 20-21 – A intenção de Paulo era continuar pressionando os gentios com o evangelho, “não onde Cristo já fora anunciado” (ARA). Seu ministério consistia mais em penetrar em novas regiões e deixar o trabalho de pastoreio e de ensinar seus convertidos a outras pessoas. Ele não tinha intenção de trabalhar onde outros haviam trabalhado e edificado sobre o “fundamento” – que é Cristo (1 Co 3:11). Ele cita Isaías 52:15 para mostrar que o princípio de alcançar os gentios dessa maneira era segundo Deus – “como está escrito: Aqueles a quem não foi anunciado, o verão, e os que não ouviram o entenderão”. O ministério de Paulo não foi o cumprimento desta profecia. Ele não diz que foi – afirmando apenas que o princípio sobre o qual ele agiu estava de acordo com o que havia sido “escrito” no Velho Testamento. (Como regra geral, quando algo do Velho Testamento é cumprido no Novo Testamento, isso é declarado. Veja Mateus 1:22, 2:23; João 19:36-37, etc.)

Vs. 22-24 – Sendo assim ocupado no serviço, Paulo, que muitas vezes procurara oportunidade para vir a eles, disse: “muitas vezes tenho sido impedido de ir ter convosco” (compare o capítulo 1:13). No entanto, tendo sido especialmente comissionado com um ministério para os gentios, Paulo esperava que uma ocasião se abrisse para que ele viesse a eles em breve. E agora, como seu ministério de apresentar o evangelho em novas áreas estava em grande parte concluído “nestas regiões” (ARA) – Ásia Menor (Turquia) e Acaia (Grécia) – ele estava livre para avançar em novas regiões, e assim chegar até eles em seu caminho para a Espanha.

Vs. 25-27 – Mas Paulo teve uma última responsabilidade para cuidar antes que ele fosse para os gentios. Ele estava indo para Jerusalém com a coleta dos irmãos da “Macedônia e Acaia” (províncias do norte e do sul da Grécia) para dar aos “pobres dentre os santos que estão em Jerusalém”. Lemos sobre isto em 2 Coríntios 8-9. Paulo e Barnabé entregaram uma oferta semelhante para os santos de Jerusalém em seus primeiros dias (At 11:29-30). Parece haver duas razões para a pobreza dos judeus na Judéia:

  • Houve uma grande fome naquela terra (At 11:28).
  • A vida comunitária que eles haviam praticado em Jerusalém os deixou sem terras e meios para se sustentar (At 2:44-45, 4:34-35). (As escrituras não dizem que isso foi algo que o Senhor pediu para que fizessem.)

Os gentios crentes estavam “realmente bem satisfeitos” (JND) em encaminhar a seus irmãos judeus essa oferta porque eles se viam como “devedores” para com eles. Eles haviam participado de suas “coisas espirituais” (TB) (as Escrituras, a presença do Espírito de Deus, etc.) e achavam que era justo que lhes enviassem alívio em coisas temporais.

Vs. 28-29 – “E havendo-lhes consignado este fruto” (colocado a oferta em suas mãos), Paulo pretendia realmente ir aos santos romanos a caminho da Espanha. E prometeu dar-lhes “a plenitude da bênção de Cristo” (v. 29 – ARA) quando lá chegasse. As versões King James e Almeida Corrigida acrescentam a palavra “evangelho” de Cristo, mas ela não está no texto grego. Paulo havia acabado de expor a verdade do evangelho para eles nesta mesma epístola. A “plenitude” a que ele se refere aqui é a verdade do “Mistério”, para “completar” (JND) a revelação Cristã da verdade (Col. 1:25). Ele menciona isso no capítulo 16:25. É uma revelação especial da verdade sobre Cristo e a Igreja. O Sr. Darby menciona que não há registro de que Paulo tenha chegado à Espanha (Sinopse of the books of the Bible, on Romans 15).

Um Pedido Triplo de Oração 

Vs. 30-33 – Por último, Paulo pede as orações dos romanos em vista deste trabalho. Isso, diz ele, seria “pela causa do Senhor Jesus Cristo” (KJV) e estaria de acordo com “o amor do Espírito”, que é a comunhão mútua dos santos. Seu pedido triplo de oração é baseado na palavra “que”.

  • “Que” ele pudesse ser livre dos judeus incrédulos da Judéia que desesperadamente queriam matá-lo (1 Ts 2:14-16).
  • “Que” a oferta que ele estava trazendo para os crentes judeus fosse aceita em boa graça e seria vista como uma expressão verdadeira do amor de seus irmãos gentios. E, assim, eles seriam unidos como crentes em Cristo. (Paulo pediu isso porque sabia que ainda havia algum preconceito religioso nos santos judeus, e ele esperava que isso acabasse com esses sentimentos).
  • “Que” ele chegasse a Roma com gozo e pela vontade de Deus, e que eles fossem mutuamente renovados. Esta oração foi respondida, mas de um modo muito diferente do que Paulo imaginou; Ele chegou a Roma como prisioneiro.

Ele termina a parte principal da epístola dizendo aos santos romanos que ele desejava que “o Deus de paz” estivesse com eles, acrescentando um “Amém” de coração.

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