Origem: Revista O Cristão – Ana, Mical, Abigail, Bate-Seba
Abigail
Entrelaçados na história da conturbada vida de Davi, existem muitos excelentes caracteres, mas não há um, talvez, que tenha um caráter mais bonito do que Abigail, a carmelita. Seu nome significa “causa de deleite”, e certamente sua história prova que ela era uma fonte de deleite para o coração de Davi.
No momento em que ela entra em cena, Davi, embora o ungido do Senhor, é um homem perseguido, escondido nas cavernas da Terra, embora cercado por um bando de fiéis seguidores (1 Sm 22:1-2). No decorrer de suas andanças, ele e seus seguidores fizeram o bem, pois os pastores de Nabal, marido de Abigail, reconheceram que Davi e seus homens “têm-nos sido muito bons”. Eles protegeram seus pastores e seus rebanhos noite e dia, de modo que, enquanto Davi e seus homens estivessem por perto, eles não perderam nada.
Nabal
Este Nabal era um homem rico e de alta posição social. Ele era, aos olhos do mundo, um homem “mui poderoso” – alguém que podia receber visita como um rei (1 Sm 25:2-3, 36). Aos olhos de Deus, entretanto, ele era um homem grosseiro e “maligno em obras” – alguém que não tolerava interferência de outros. Ele professa não ter conhecimento de Davi, pois pergunta: “Quem é Davi, e quem é o filho de Jessé?” Sem dúvida, ele sabia da grande vitória de Davi sobre Golias e como as mulheres cantaram seus louvores, mas parece que ele considerava Davi como alguém cuja cabeça foi virada por seus grandes feitos e canções de mulheres e, aspirando ao trono, tornou-se um servo rebelde que se separou de seu mestre, o rei Saul. Se algum relato da unção de Davi por Samuel chegou aos seus ouvidos, ele evidentemente o tratou com total indiferença. Para Nabal, Davi era apenas um servo fugitivo.
Bom entendimento
Quando Davi apela a Nabal, em um dia de abundância, para fazer alguma recompensa pelos benefícios recebidos, os jovens de Davi são expulsos com insultos. Davi, indignado com tal tratamento, se prepara para se vingar. Isso traz Abigail para a cena. Ela é descrita como uma mulher formosa e “de bom entendimento”. Ela evidentemente havia considerado o povo e eventos de sua época, e o Senhor lhe dera entendimento. Ela ouve falar da loucura de seu marido por um dos jovens de sua casa e imediatamente age com fé, sem consultar o marido. A natureza podia ver em Davi apenas um servo fugitivo; a fé vê, no perseguido e necessitado Davi, o rei vindouro. Assim, ela assume seu lugar como súdita do rei e age com deferência em sua presença. Ela prepara seu presente e, tendo encontrado Davi, caiu a seus pés, prostrou-se até o chão e reconheceu Davi como seu senhor. Ela fica do lado de Davi contra seu marido e o rei Saul. Ela reconhece que Nabal, embora seu marido e um grande homem no mundo, está agindo de maneira ímpia e tola, e que Saul, embora seja o rei reinante, é apenas “algum homem” que se opõe ao ungido de Deus. Ela vê que Davi, embora caçado e em pobreza, sua vida está “atada nos feixe dos que vivem” e vindo para uma herança gloriosa.
O dia da rejeição
Como Jônatas, ela tinha uma posição elevada neste mundo como esposa de um homem “mui poderoso”, mas, em contraste com Jônatas, ela não foi impedida, por sua posição social, de se identificar com Davi no dia de sua rejeição. Em vista daquela glória e em confiança no rei, ela pode dizer: “quando o SENHOR fizer bem a meu senhor, lembra-te, então, da tua serva”. Essas palavras lembram aquela cena muito maior, quando um ladrão à beira da morte, olhando além das terríveis circunstâncias do momento para a glória vindoura, com confiança no Rei, pôde dizer: “lembra-Te de mim quando vieres no Teu reino” (Lc 23:42 – ARA). Assim, a nobre Abigail e o ladrão humilde, com a mesma fé, olham além do presente e agem e falam à luz do futuro. O futuro justifica a fé deles. Davi, embora em circunstâncias de deserto, age com dignidade real, como um rei com um súdito. Ele dispensa Abigail com sua bênção depois de ter aceitado seu presente, ouvido seus pedidos e aceitado sua pessoa.
Fim de Nabal
Voltando para o marido, Abigail o encontra se rebaixando em um banquete de bebedeira. Quando sóbrio, ele é informado do que aconteceu, e imediatamente “se amorteceu nele o seu coração, e ficou ele como pedra”. Cerca de dez dias depois o Senhor o feriu. Tendo obtido sua liberdade pela morte, Abigail se torna a esposa de Davi. Ela deixa sua alta posição, com sua facilidade e conforto, para se associar a Davi em seus sofrimentos e peregrinações. Nesse novo caminho, ela realmente conhecerá sofrimento e privação, até ser levada cativa pelos inimigos de Davi em Ziclague. Mas ela também compartilhará seu trono no dia de seu reinado em Hebrom (1 Sm 30:5; 2 Sm 2:2).
Filho Maior de Davi
Nesta comovente história, vemos um prenúncio do Filho maior de Davi – Aquele que foi desprezado e rejeitado pelos homens. É verdade que há muito em Davi que o revela como um homem de paixões semelhantes às nossas; ele pode, em um momento precipitado, cingir sua espada para se vingar de Nabal. Pedro, com o mesmo espírito, desembainhará sua espada para defender seu Mestre. Mas o próprio Cristo, na presença de Seus inimigos, dirá: “Mete a tua espada na bainha”. Em cada figura existem esses contrastes, servindo apenas para mostrar que nenhuma figura pode apresentar plenamente a perfeição de Jesus. Cristo é a substância, e somente Ele é perfeito.
Se em Davi podemos ver uma figura de Cristo, vemos em Nabal uma imagem da atitude do mundo para com Cristo, seja nos dias de Sua carne ou durante Sua posição atual à direita de Deus. É um mundo voltado para o ganho presente, festa e prazer. Por tal mundo, Cristo é um Homem desprezado e rejeitado – Aquele em Quem não vê beleza e de Quem não sente necessidade. De fato, pode assumir uma profissão cristã, mas, embora se revista do nome de Cristo, coloca o próprio Cristo fora de suas portas. No entanto, tal é a longanimidade da graça de Cristo que, como Davi apelou a Nabal, mesmo assim Ele está à porta da igreja professa e bate.
Comunhão com os sofrimentos de Cristo
Se, no entanto, no meio desta Cristandade que rejeita a Cristo, houver alguém que ouça Sua voz e abra a porta para Cristo, quão rica será sua bênção! No presente, tais pessoas conhecerão a doce comunhão com Ele no dia de Sua rejeição, pois o Senhor pode dizer àquele que Lhe abre a porta: “entrarei em sua casa e com ele cearei, e ele, Comigo” (Ap 3:20). No futuro, aqueles que cearam com Cristo no dia da Sua rejeição reinarão com Ele no dia da Sua glória, pois o Senhor pode dizer: “Ao que vencer, lhe concederei que se assente Comigo no Meu trono” (Ap 3:21).
De tudo isso, Abigail foi um exemplo brilhante. Quando o mundo de sua época bateu a porta na cara de Davi, ela abriu sua porta e colocou sua generosidade à disposição dele. Ela teve sua brilhante recompensa, pois desfrutou de doce comunhão com Davi como sua esposa, no dia de sua reprovação; ela se sentou com ele em seu trono, no dia de sua glória.
Feliz é o vencedor
Feliz de nós se aceitarmos o aviso de Nabal e seguirmos o exemplo de Abigail. Felizes, de fato, se nos separarmos de todo o coração das corrupções da profissão Cristã, a fim de nos reunirmos a Cristo no lugar exterior de Sua reprovação. A Cristandade está fazendo grandes esforços para produzir uma unidade profana, na qual o próprio Cristo estará fora. Eles terão se unido para serem vomitados da boca de Cristo. É bom que os verdadeiros santos sejam despertados para a solenidade do dia em que vivemos e ouçam a voz do Senhor quando Ele diz: “Sai dela, povo Meu, para que não sejas participante dos seus pecados e para que não incorras nas suas pragas” (Ap 18:4).
Aqueles que obedecem às palavras do Senhor descobrirão, assim como Abigail em seus dias, que os laços da natureza, posição social e autoridades religiosas mundanas terão de ser superados. Se, no entanto, como Abigail formos vencedores, encontraremos o lugar exterior com Cristo, uma das mais profundas bênçãos presentes e da mais alta glória futura.