Origem: Revista O Cristão – Tempo e Eternidade

Agora e Depois, ou Tempo e Eternidade

Os princípios da verdade estabelecidos em Lucas 12 são do caráter mais solene e profundo. Na prática, os torna da maior importância em um dia como o presente. A mente mundana e a carnalidade não podem viver à luz da verdade aqui apresentada, pois elas estão com as raízes murchas. Se alguém nos pedisse para dar um título breve e abrangente a essa porção da Palavra de mais preciosa inspiração, ela poderia ser intitulada “Tempo à luz da eternidade”. O Senhor evidentemente planejou colocar Seus discípulos à luz daquele mundo onde tudo era diretamente o oposto ao que estava aqui embaixo – para colocar o coração deles sob a santa influência de coisas invisíveis e a vida deles sob o poder e a autoridade dos princípios celestiais.

Hipocrisia 

Sendo esse o fiel objetivo do divino Mestre, Ele estabelece os alicerces sólidos de Sua superestrutura de doutrina com estas palavras penetrantes: “Acautelai-vos, primeiramente, do fermento dos fariseus, que é a hipocrisia” (Lc 12:1). Não deve haver corrente oculta na alma. As profundas fontes de pensamento devem ser expostas. Devemos permitir que os raios puros da luz do céu penetrem no mais profundo de nosso ser moral. Não devemos ter nenhuma discrepância entre o julgamento oculto da alma e o estilo de nossa fraseologia, entre a inclinação da vida e a profissão dos lábios. Em uma palavra, precisamos especialmente da graça de “um coração honesto e bom” (Lc 8:15), a fim de tirar proveito desse maravilhoso livro de verdade prática. Estamos muito aptos a dar uma atenção indiferente ou uma fria concordância às verdades que nos perturbam; nós não gostamos disso. Preferimos especulações interessantes sobre a mera letra da Escritura, pontos de doutrina ou questões de profecia, porque podemos satisfazê-las em conexão imediata com todos os tipos de mentalidade mundana, práticas ambiciosas e indulgência própria. Mas quem pode suportar princípios ponderados da verdade, que pesam sobre a consciência em toda a sua magnitude e poder de corte da carne, a não ser aqueles que, pela graça, procuram purificar-se do “fermento dos fariseus, que é hipocrisia”? Este fermento é de caráter mais ilusório, assume várias formas e, portanto, é mais perigoso. De fato, onde quer que exista, há uma inegável e intransponível barreira colocada diante da alma em seu progresso no conhecimento experimental e na santidade prática. Se eu não exponho toda a minha alma à ação da verdade divina, se estou alimentando alguma reserva secreta, se estou desonestamente buscando acomodar a verdade ao meu próprio padrão de prática, então certamente estou contaminado pelo fermento da hipocrisia, e meu crescimento em semelhança a Cristo é uma impossibilidade moral. Portanto, é imperativo que todo discípulo de Cristo procure e veja que nada desse fermento abominável seja permitido nas câmaras secretas de seu coração.

Agora e depois 

Mas a hipocrisia não é apenas totalmente subversiva do progresso espiritual, mas também falha inteiramente em atingir o objetivo que propõe a si mesma, pois “nada há encoberto que não haja de ser descoberto; nem oculto, que não haja de ser sabido” (Lc 12:2). Todo homem encontrará seu nível, e todo pensamento será trazido à luz. O que a verdade faria agora, o tribunal fará depois. Todo grau e sombra de hipocrisia serão desmascarados pela luz que brilhará do tribunal de Cristo. Tudo será realidade depois, embora haja muita falácia agora. Além disso, tudo terá o seu nome próprio, embora agora seja mal nomeado. A mente mundana é chamada prudência, um espírito avarento e ganancioso é chamado de previsão e a indulgência própria e engrandecimento pessoal são chamados de administração criteriosa e diligência louvável nos negócios. Todas essas coisas serão vistas em suas verdadeiras cores e chamadas por seus verdadeiros nomes perante o tribunal. Portanto, é sensato o discípulo agir agora à luz daquele dia em que os segredos de todos os corações serão revelados. Sobre isso, ele é colocado em uma posição privilegiada, pois, diz o apóstolo, “todos nós [santos e pecadores, embora não ao mesmo tempo nem no mesmo terreno] seremos manifestados diante do tribunal de Cristo” (2 Co 5:10 – JND). Isso deveria perturbar a mente do discípulo? Certamente que não, se seu coração está tão purificado do fermento da hipocrisia e sua alma tão profundamente fundamentada pelo ensino de Deus, o Espírito Santo, que Cristo é sua vida e Cristo sua justiça; para que ele possa dizer, […] somos manifestados a Deus, e espero que, na vossa consciência, sejamos também manifestos” (2 Co 5:11). Mas se ele é deficiente nessa paz de consciência e na honestidade transparente do coração, não há dúvida de que o pensamento do tribunal irá perturbar seu espírito.

O Tribunal de Cristo 

Por isso, vemos que, nos ensinamentos do Senhor, em Lucas 12, Ele coloca a consciência de Seus discípulos diretamente à luz do tribunal. “E digo-vos, amigos Meus: não temais os que matam o corpo e depois não têm mais o que fazer. Mas Eu vos mostrarei a Quem deveis temer: temei Aquele que, depois de matar, tem poder para lançar no inferno; sim, vos digo, a Esse temei” (Lc 12:4-5). “O receio do homem armará laços” (Pv 29:25) e está intimamente ligado ao “fermento dos fariseus”. Mas “o temor do Senhor é o princípio da sabedoria” (Pv 9:10) e faz com que o homem sempre se comporte como no completo brilho da luz do tribunal de Cristo. Isso daria imensa dignidade e elevação ao caráter, enquanto efetivamente atacaria, logo no início, o espírito de altiva independência, mantendo a alma sob o penetrante poder da luz divina, cujo efeito é tornar tudo e todos manifestos. Não há nada que possa roubar ao discípulo de Cristo a dignidade apropriada de seu discipulado, como andar diante dos olhos ou dos pensamentos dos homens. Enquanto estivermos fazendo isso, não poderemos ser seguidores destemidos de nosso Mestre celestial. Além disso, o mal de andar diante dos homens é moralmente aliado ao mal de procurar esconder de Deus os nossos caminhos. Ambos participam do “fermento dos fariseus” e ambos encontrarão seu devido lugar diante do tribunal. Por que devemos temer aos homens? Por que devemos considerar suas opiniões? Se as opiniões deles não serão provadas na presença d’Ele, que tem poder de lançar no inferno, elas não valem nada, pois é com Ele que devemos tratar. “Todavia, a mim mui pouco se me dá de ser julgado por vós ou por algum juízo humano” (1 Co 4:3). O homem pode ter um assento no tribunal agora, mas não o terá depois. Ele pode estabelecer seu tribunal no tempo, mas não terá tribunal na eternidade. Por que, portanto, devemos moldar nosso caminho em referência a um tribunal tão frágil e de vida curta? Deus nos conceda graça para agir agora, em referência ao futuro – nos portar aqui com nossos olhos no futuro; olhar o tempo à luz da eternidade.

C. H. Mackintosh (adaptado)

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