Origem: Revista O Cristão – Alimento Espiritual
O Pão de Deus: João 6:43-69
Existem três posições nas quais o bendito Senhor é apresentado na parte doutrinal deste capítulo: primeiro, como Aquele que desceu do céu para cumprir a vontade do Pai que O enviou; depois, como dando Sua carne para a vida do mundo; e por último, como ascendendo para onde Ele estava antes. No primeiro, Ele é o pão de Deus – não apenas o pão que Deus dá, mas aquele do qual Ele Se alimenta a Si mesmo. Agora, pela primeira vez, o caminho do homem foi encontrado se abrindo em Cristo em toda a sua perfeição diante do Pai, cujos olhos e coração somente podiam penetrá-lo. Que perfeita dependência, obediência e amor dedicado ao Pai havia ali – uma vida governada apenas pela vontade de Seu Pai em todos os detalhes de palavras e ações, com a recusa absoluta de qualquer outro objeto, exceto a glória de Seu Pai. Não é de se admirar que os céus se abrissem para Ele e a voz do Pai declarasse Seu perfeito deleite n’Ele. Assim, Ele era o pão, ou alimento, do próprio regozijo de Deus. Mas que maravilha saber que esse pão não era para si só: “Meu Pai vos dá o verdadeiro pão do céu”. Em Sua infinita graça, o Pai gostaria que outros entrassem em Sua estima pelo Filho a Quem amava. Ele era o pão da vida, e aquele que vem a Ele pela fé nunca terá fome ou sede. Isso nos leva à segunda posição que o Senhor assumiu – que Aquele que era o pão de Deus pode ser o pão da vida para nós.
Vida para nós
Quanto mais perfeição brilhava n’Ele entre os homens, mais o estado de todos os outros homens se revelava em Sua presença. “A luz resplandece nas trevas”, “n’Ele nenhuma beleza víamos, para que O desejássemos”, e “Não é este Jesus, o filho de José, cujo pai e mãe nós conhecemos?” foi a resposta dos Judeus (v. 42) à revelação graciosa de que foi a vontade d’Aquele que O enviou que Ele não perdesse nenhum daqueles que Lhe foram dados, e que todo aquele que visse o Filho e cresse n’Ele tivesse vida eterna e fosse elevado à esfera apropriada daquela vida quando o fim da era atual houver chegado. Essa incompetência moral para entrar em tudo aquilo que O tornava o Selado (v. 27) do deleite do Pai foi a última e conclusiva prova de que não havia nada em nós para Deus e a necessidade absoluta da anterior sentença de Deus sobre o homem, “O fim de toda carne é vindo perante a Minha face”, para que qualquer um possa comer do pão que desceu do céu e não morra, mas viva para sempre, lemos: “o pão que Eu der é a Minha carne, que Eu darei pela vida do mundo” (v. 51), e a condição essencial para termos vida n’Ele é que comamos Sua carne e bebamos Seu sangue (v. 53).
Até esse ponto no evangelho, havia a apresentação objetiva da vida n’Ele, mas agora é a questão de nossa entrada subjetiva nela. Isso depende de termos sido levados a se curvar ao julgamento de Deus, não apenas de nossos pecados, mas de tudo o que somos segundo a carne, em Sua morte. Certamente é pela fé, mas ter comido Sua carne e bebido Seu sangue expressa mais do que isso (os verbos no versículo 53 indicam um ato definitivo – algo feito de uma vez por todas). É que nos identificamos solenemente com Ele na morte que Ele sofreu por nós, e que colocou um fim, diante de Deus e pela fé, em tudo aquilo que éramos como filhos de Adão. Nós, como na figura da oferta pelo pecado, impusemos as mãos sobre a cabeça da vítima e reconhecemos a Sua morte como sendo a nossa. É um ponto definitivo para o qual devemos ser trazidos para a história da alma, para nunca mais voltar: A libertação do domínio do pecado é encontrada nisso.
Mas comer a Sua carne e beber o Seu sangue não é simplesmente uma coisa do passado – como se já não precisássemos mais disso – pois agora começa a necessidade da alimentação habitual da morte do Filho do Homem, para que possamos possuir a vida eterna em toda a sua realidade como uma vida de comunhão com o Pai e o Filho. À medida que Sua morte está assim diante de nossa alma, somos soltos e de forma prática libertados de tudo aquilo que é da carne em nós do homem e de seu mundo, que o Senhor Jesus teve que levar à morte sob o julgamento de Deus. Como poderíamos, na presença dos infinitos sofrimentos do Getsêmani e da cruz, tolerar qualquer coisa em nós mesmos do que envolvia aqueles sofrimentos por Ele que, em um tal amor tão insondável, Se entregou por nós? Com Sua morte assim aplicada continuamente a nossa alma, nada impedirá o desfrute daquela vida de relacionamento divino e celestial que é “eterna” (v. 54). Mas habitar ou permanecer n’Ele, como a percepção contínua de nosso ser n’Ele, depende também de comermos Sua carne e bebermos Seu sangue, que é verdadeira carne e bebida.
E agora o versículo 57 nos leva ao que o versículo 33 nos apresentou: “Quem come a Minha carne”. Já não é mais simplesmente Sua morte, mas Ele mesmo conhecido pessoalmente como alimento e gozo de nossa alma, que é o Pão de Deus. Só poderíamos participar desse maravilhoso pão nos identificando com Ele em Sua morte, mas é Ele mesmo, sobre Quem agora podemos nos alimentar. “Assim como o Pai, que vive, Me enviou, e Eu vivo pelo [ou por causa do] Pai, assim quem de Mim se alimenta, também por [ou por causa de] Mim viverá” (Jo 6:57). Ele viveu somente pelo Pai e por nada mais: O Pai era toda a razão de Sua existência aqui, o Objeto que absorveu toda Sua vida. E assim, quando Ele Se eleva diante de nossa alma em toda a Sua perfeição, cada vez mais entrando em contato com Ele, Ele Se tornará o Objeto que absorve toda a nossa vida: Iremos viver apenas para Ele.
Cristo elevado
No final, o Senhor indica que Ele subiria para o lugar onde estava antes. Que imensa importância para nós tem isso, pois é assim que toda a verdade preciosa se tornou disponível para nós. A luz da glória em que Ele está foi derramada sobre tudo o que Ele foi no caminho humilde e perfeito de Sua humilhação e sobre a cruz em que Deus foi infinitamente glorificado e a história do homem fechada em julgamento, para que nada além de Cristo permaneça diante de nossa alma nesta comunhão bendita de gozo e satisfação divinos.
Que cada um de nós saiba cada vez mais o que é comer Sua carne e beber Seu sangue, e se alimentar d’Ele pessoalmente, que é o Pão de Deus.
