Origem: Revista O Cristão – Eva, Sara e Rebeca

Caráter Familiar – Rebeca

Há uma lição sobre caráter e mentalidade na história de Rebeca, à qual eu chamaria sua atenção. Rebeca aparece pelo chamado do servo de Abraão, mas um caráter já havia sido formado, como acontece com todos nós, mais ou menos, antes de sermos convertidos. Podemos ouvir o chamado e o poder de separação do Senhor, mas o caráter e a mente derivados da natureza, da educação ou dos hábitos familiares levamos conosco depois que nascemos do Espírito, e eles podem ser levados em nós da Mesopotâmia até a casa de Abraão.

Eu preciso apenas falar brevemente do que aconteceu. A história de Rebeca traz tristemente o que podemos chamar de caráter familiar. Labão, seu irmão com quem havia crescido, era um homem sutil, sábio e mundano, e a única grande ação em que Rebeca foi chamada a participar, dá-lhe ocasião de exercer os mesmos princípios. Na obtenção da bênção para seu filho Jacó, vemos esse fermento de Labão trabalhando poderosamente. Sua mente estava muito pouco acostumada a repousar na suficiência de Deus e muito viciada em calcular e depositar suas esperanças em suas próprias invenções.

Nós também devemos observar a tendência peculiar de nossa própria mente e repreender a natureza bruscamente, para que sejamos sólidos ou moralmente saudáveis na fé (Tt 1:13). Não devemos dar desculpas para termos essa tendência de nossa natureza, mas mortificá-la por Sua causa, que nos deu outra natureza.

Essas lições aprendemos da história dessa distinta mulher. Além disso, seu caminho não é muito rastreado pelo Espírito. Ela colhe nada além de decepção com a semente que plantou. Ela perde seu filho favorito, Jacó, e nunca mais o vê depois que seus próprios planos e artifícios culminaram em seu longo exílio.

O caráter de Jacó 

Mas tem mais. Jacó teve sua mente formada pela mesma influência antiga. Ele era, todos os dias, um homem de coração lento e calculista. Seu plano para obter a primogenitura primeiro e depois a bênção, sua confiança em seus próprios arranjos, e não na promessa do Senhor, quando conheceu seu irmão Esaú, e sua permanência em Siquém e seu estabelecimento ali em vez de seguir a vida de um peregrino na terra como a seus pais – tudo isso traz a natureza e o funcionamento do velho caráter da família. Quão importante é observar as primeiras sementes postas no coração!

O nascimento de Esaú e de Jacó nos é mostrado no final de Gênesis 25. À medida que crescem, surge a ocasião para vermos a cena da família, que é realmente humilhante. Essa era uma das famílias de Deus na Terra naquela época – a mais distinta, na qual estavam as esperanças de todas as bênçãos para toda a terra e onde o Senhor havia posto Seu nome. Mas o que vemos? Isaque, o pai, havia afundado na corrente de desejos humanos, ele amava seu filho Esaú, porque comia sua carne de caça! Esaú, como filho da família, tinha o direito de cuidar e prover a casa, mas Isaque o tornava seu favorito porque ele comia sua carne de caça. Não vemos aqui mais uma ilustração do nosso assunto? Isaque foi criado com ternura. Ele nunca esteve longe do lado de sua mãe, ele era filho de sua velhice. Sua educação talvez o tenha relaxado demais, e ele aparece diante de nós como um homem suave e autoindulgente.

Que triste prejuízo se abre para nossa visão nesta cena familiar! Estamos falando muito para dizer que um dos pais estava cuidando da natureza em um dos filhos e a mãe do outro filho? O amor de Isaque pela carne da caça pode ter encorajado Esaú na perseguição, pois a esperteza de Rebeca, trazida da casa de seu irmão em Padã-aram, parece ter formado a mente e o caráter de seu filho favorito, Jacó. Que tristeza e causa de humilhação vemos aqui! Esta é uma família de fé? Esta é uma família temente a Deus? Sim, Isaque, Rebeca e Jacó são filhos da promessa e herdeiros do Seu reino, mas deram precedência a seus próprios desejos ao invés de agir com fé e obediência às promessas de Deus.

As consequências 

Em outro momento e em outras ações, essa família se deleita e nos edifica. Veja Isaque na maior parte do capítulo 26, sua conduta é totalmente digna de um estrangeiro celestial na terra. Ele sofre e faz isso pacientemente, e seu altar e sua tenda testemunham seu caráter santo e sobrenatural. O mesmo acontece com Rebeca no capítulo 24, com fé, ela consente em atravessar sozinha o deserto com um estranho, porque seu coração estava posto no herdeiro das promessas. Mas aqui no capítulo 27, que vergonha enche a cena, e ficamos corados e confusos ao pensar que herdeiros da promessa e filhos de Deus pudessem se comportar assim!

Mas nos resta ver a graça assumindo seu lugar e atitudes elevadas e triunfantes. Isaque perde seu propósito em relação a Esaú, Rebeca tem que se separar de Jacó, e o próprio Jacó, em vez de obter a primogenitura e a bênção à sua maneira, tem que partir para um exílio sem um tostão do lugar de sua herança. O único salário do pecado é a morte, mas a graça toma seu lugar alto e brilha através da ardente santidade de Jeová.

Jacó, filho e herdeiro, tem que se deitar sozinho, sem cuidados, sem abrigos, tendo as pedras do lugar como seu único travesseiro. Mas a graça está preparando um descanso glorioso para ele. Ele ouve a voz do maravilhoso amor e é mostrado mundos de luz neste lugar de solidão e escuridão. Ele se vê, embora tão errante, tão pobre e vil, assim associado a uma glória onipresente, cheia de misericórdias e consolações presentes. A santidade da graça ainda o deixa errante, mas as riquezas da graça lhe dirão da consolação presente e das futuras glórias que são certas.

Existe então o caráter familiar, e a lembrança disso, quando estamos lidando com nós mesmos, deve nos deixar vigilantes e zelosos de todos os nossos hábitos e tendências peculiares. Quando estamos lidando com outras pessoas, isso deve nos tornar atenciosos e com um espírito intercessor, lembrando que existe uma força de hábitos e educação precoces trabalhando mais ou menos em todos nós. Mas não devemos esquecer que, se certo caráter familiar se apega a nós ou hábitos com os quais o nascimento nos conectou, também devemos exibir aquele caráter com o qual nosso nascimento e educação na família celestial nos ligaram desde então.

J. G. Bellett (adaptado)

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