Origem: Revista O Cristão – Laodiceia

A Carta à Laodiceia

“E ao anjo da Igreja que está em Laodiceia escreve: Isto diz o Amém, a Testemunha fiel e verdadeira, o Princípio da criação de Deus”. O caráter de Cristo dado aqui é notável. Encontramos uma nova revelação especial de Si mesmo, de acordo com as circunstâncias da igreja endereçada. Não são os mesmos traços de Seu caráter como aqueles da visão de João; uma nova revelação de Cristo é feita para a necessidade da Igreja. Quando o que leva o nome da Igreja de Deus for vomitado, serão necessários uma dupla medida e um caráter peculiar de graça para sustentar os fiéis no caminho estreito e muitas vezes solitário em que serão chamados a andar.

O Senhor aqui vai julgar a Igreja professa, que toma o lugar da Igreja de Deus, como o testemunho de Deus no mundo. Se a Igreja como um vaso de testemunho de Deus é deixada de lado pelo Senhor em desgosto, então o Senhor apresenta a Si como “o Amém, a Testemunha fiel e verdadeira”, não tanto na dignidade de Sua Pessoa, como é mostrado no capítulo 1, mas como Aquele que tomará o lugar daquilo que havia falhado inteiramente como testemunho de Deus na Terra.

A igreja professa ainda não está totalmente amadurecida na condição final de Laodiceia; se estivesse, não adiantaria avisá-la. Deus está segurando as rédeas e ainda não permite que o mal seja tão completamente desenvolvido. Tudo começou em Éfeso, no momento em que a Igreja se afastou de seu primeiro amor, mas não o achamos desenvolvido até o estado de Laodiceia. Lembremo-nos de que é a igreja professa que será assim vomitada, e não a Igreja do Deus vivo, o corpo e a noiva de Cristo.

“O Amém” 

No momento em que Laodiceia é vomitada, Deus termina com a Igreja como testemunho. Então, Cristo a substitui como a “Testemunha fiel e verdadeira” de Deus. Cristo é o Grande Amém de todas as promessas de Deus; a Igreja deveria ter mostrado como todas as promessas de Deus são em Cristo Jesus o Sim; e por Ele o Amém, mas ela falhou em colocar o seu Amém nas promessas de Deus.

Amém significa “firme veracidade e verdade” – ver Isaías 7:9. “Se o não crerdes, certamente, não ficareis firmes”, isto é, “se não crerem [ou amém, porque é a mesma palavra – אָמַן], não ficareis firmes [ou amém]. O significado é que, se você não confirmar Minhas promessas, você não será confirmado. Certamente, não há um pensamento da possibilidade de Deus falhar em Seus propósitos em Cristo, e, portanto, a Igreja, o corpo de Cristo, estará em glória com sua Cabeça, mas se for uma questão de testemunho na Terra, então, verdadeiramente, a Igreja não colocou seus améns de maneira prática nas promessas de Deus em Cristo. A Igreja foi chamada para manifestar o poder de seu chamado celestial na Terra, mas em sua conduta não correspondeu àquilo que Deus afirmou. Portanto, Cristo Se apresenta imediatamente como a Pessoa que selará todas as promessas e profecias, Aquele que coloca o Grande Amém em tudo como “a Testemunha fiel e verdadeira, o Princípio da criação de Deus”. Como se costuma dizer, “a corrupção da melhor coisa é a pior das corrupções”; então não há nada na Terra tão diametralmente oposto a Deus, como o Cristianismo professo.

“O Princípio da criação de Deus” 

Cristo aparece aqui como a bendita Testemunha de que Deus ainda estabelecerá a criação de acordo com Sua própria vontade, sendo o próprio Cristo o Principal e o Centro de tudo – veja Provérbios 8. Nesse caráter, Cristo substitui a Igreja na manifestação dos propósitos e promessas de Deus, que não podem falhar. Se a Igreja tiver irrevogavelmente desaparecido, Cristo como testemunha permanece, e isso será o suporte dos fiéis. É aqui que a fé é sustentada; aqui está um terreno sólido que nada pode tocar, a força sobre a qual a alma pode permanecer, pois o suporte de toda alma é confiar n’Ele.

É realmente muito assustador pensar na apostasia ostentando um caráter religioso como ela faz! Quão cedo o espírito dela se manifestou! Quão cedo houve motivo para dizer que “todos buscam o que é seu e não o que é de Cristo Jesus”! Que o Senhor graciosamente abra os olhos de Seus santos para ver o verdadeiro caráter desses últimos dias! Embora Ele tenha tido muita paciência enquanto recolhe almas para a salvação, Seu julgamento, embora postergado, não muda. O único remédio para o mau presente é o julgamento.

Pretensão às riquezas espirituais 

Desde o início, vemos os princípios de corrupção entrando. O joio foi semeado e o mistério da iniquidade estava operando. Como resultado, descobrimos que há dois pontos de importância especial ao caracterizar esta Igreja de Laodiceia – grande pretensão de riquezas espirituais em si mesma, e nem quentes nem frias em relação a Cristo. Não é um ódio declarado a Cristo, mas não é um zelo declarado por Cristo. É a Igreja que segue em mundanismo e, ao mesmo tempo, faz grandes pretensões de riquezas espirituais, que é um indubitável sinal de pobreza. E por quê? Porque essas riquezas só podem ser encontradas em Cristo. Quando a Igreja se orgulha de riquezas em si mesma, ela não coloca seu “amém” nas promessas de Deus em Cristo Jesus, nem é a testemunha verdadeira e fiel de Deus, pois no momento em que estou olhando para a igreja e não para Cristo, estou olhando para ELA em vez de para ELE, por mais que eu finja honrá-Lo.

Em Filadélfia, eles tinham pouca força, e o Senhor poderia dizer que eles haviam guardado Sua Palavra e não haviam negado Seu nome. Enquanto havia pobreza sentida na Igreja, Cristo Se deleitava neles. Mas quando há a pretensão de riqueza em si mesma, há uma expressão de verdadeiro nojo: “vomitar-te-ei da Minha boca”. A Igreja de Laodiceia, tendo o pensamento de plenitude e riqueza dentro de si mesma, era perfeitamente ignorante de seu estado diante de Deus. Portanto, diz o Senhor: “Aconselho-te que de Mim compres ouro provado no fogo, para que te enriqueças, e vestes brancas, para que te vistas, e não apareça a vergonha da tua nudez; e que unjas os olhos com colírio, para que vejas” (Ap 3:18).

A igreja não estava buscando essas coisas no Senhor e, portanto, carecia de cada uma delas. O ouro é a justiça divina – aquilo que caracteriza a posição e o fundamento dos santos. “As vestes brancas” são as obras dos santos, que decorrem da possessão da justiça divina. Os que estavam em Laodiceia careciam até da justiça dos santos, pois, estando sem a justiça divina, não podiam ter justiça prática, espiritual, nem obras santas, pois “o linho finíssimo são os atos de justiça dos santos” (Ap 19:8 – ARA).

Eles também estavam em falta de “colírio”, pois eram cegos quanto às coisas de Deus e não tinham discernimento espiritual em nada. Assim, não tendo a justiça divina nem os frutos consequentes do Espírito, e ainda permanecendo na cegueira da natureza, Laodiceia carecia de tudo.

O Senhor fora 

Havia abundância de pretensão, mas o Senhor ainda não desiste de todo o tratamento com eles. Aqui em Laodiceia, o Senhor assume um caráter exterior, pois quando a igreja nominal praticamente entra em uma posição Judaica, o Senhor Se posiciona do lado de fora e chama individualmente as almas que estão dentro: “Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a Minha voz”. O Senhor deseja ganhar atenção; Ele quer ser acolhido. Ele adverte a Igreja do julgamento certo, mas até que esse julgamento seja executado, Ele continua necessariamente no exercício de Sua própria graça abençoada. Mas seus objetivos são individuais, pois a Igreja é abandonada. “Se alguém ouvir a Minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e com ele cearei, e ele, Comigo”; ele terá sua porção à Minha mesa.

A promessa 

“Ao que vencer, lhe concederei que se assente Comigo no Meu trono”. Aparentemente, essa é uma grande promessa, mas para mim parece a menor, pois é meramente um lugar na glória celestial. Não lhes é dito nada sobre uma associação especial com Cristo, como encontramos na promessa a Pérgamo, ou mesmo aos fiéis em Sardes ou em Tiatira, nem qualquer pensamento de proximidade individual, exclusivamente da parte da noiva, revelado como motivo. Reinar com Cristo é meramente uma demonstração pública de recompensa e glória, o que é muito diferente da intimidade secreta do “maná oculto” e da “pedra branca”. A batida na porta foi ouvida e pela graça obedecida, e eles subiram para a glória celestial. Eles venceram e, portanto, certamente devem receber sua recompensa: “se assente Comigo no Meu trono”. Mas não há a mesma intimidade, não há o mesmo deleite especial, não há a alegria que Filadélfia tem de ver Cristo tendo a Igreja por causa do que isso é para ela, e de ver a Igreja tendo Cristo por causa do que isso é para Ele. Ainda assim, eles obtêm seu lugar na glória.

A igreja professa é vomitada 

O solene testemunho do Senhor é que a igreja professa será vomitada da Sua boca, e isso deve causar mais tristeza em nosso coração do que o julgamento do mundo, tendo um caráter muito mais terrível para o coração do que o julgamento do próprio anticristo. É algo que repugna a Cristo – que é nauseante para Ele – por ela ter tido uma espécie de conexão exterior Consigo mesmo. A igreja professa no dia em que vivemos, comumente chamada Cristandade, carrega o nome de Cristo, mas O nega com suas obras. A igreja professa pode agora ser o orgulho e a jactância do homem, mas no final será vomitada da boca de Cristo. Ela tem toda a pretensão, mas nada que dê a Cristo o Seu valor, mas atribui todo o valor a si mesma, creditando-se com isso.

Que o Senhor nos guarde na condição de Filadélfia – pode ser com pouca força – mas ainda assim guardando a palavra de Sua paciência e no gozo sensível de uma perfeita associação com Ele mesmo, que colocou diante de nós uma porta aberta e a manterá aberta até que Ele venha e nos leve para Si mesmo.

J. N. Darby, selecionado

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