Origem: Revista O Cristão – O Chamado de Deus
O Chamado de Deus
No primeiro período da vida de Abraão, em Gênesis 12, somos apresentados ao caminho de fé e àqueles que andam por ele em resposta ao chamado de Deus. Também vemos os obstáculos no caminho, a fé que toma o caminho e as bênçãos no caminho, bem como os fracassos, as tentações e os conflitos encontrados lá.
Pensemos primeiro no caráter do chamado pelo qual o Senhor começou a conduzir Abraão de Ur para a cidade de Deus.
Um chamado divino
A primeira grande verdade que aprendemos na parte inicial da história de Abraão é o caráter abençoado do chamado de Deus. Do discurso de Estêvão, registrado em Atos 7, aprendemos que “o Deus da glória apareceu a Abraão, nosso pai, estando na Mesopotâmia”. O que distingue o chamado de todos os outros chamados é o seguinte: Ele vem de Deus – o Deus da glória. A civilização humana, com suas cidades e torres chegando ao céu, não tem nada que fale de Deus, mas apenas aquilo que exalta e exibe a glória do homem. “O Deus da glória” fala de outro mundo em que não há nada do autoengrandecimento do homem, mas tudo aquilo que exibe o caráter de Deus. Esse é o Deus que, em maravilhosa graça, aparece a um homem que vive em um mundo afastado de Deus e mergulhado na idolatria.
Portanto, é a glória d’Aquele que aparece a Abraão que dá tanta importância ao chamado e dá à fé a sua autoridade e poder para responder a esse chamado.
Um chamado que separa
Em segundo lugar, aprendemos que o chamado é um chamado para a separação. A palavra a Abraão é: “Sai-te da tua terra, e da tua parentela, e da casa de teu pai”. Abraão não é instruído a permanecer na cidade de Ur e lidar com a impiedade do homem, ou tentar melhorar sua condição social, ou reformar seus costumes locais, ou tentar tornar este um mundo melhor e mais radiante. Ele é chamado para sair da cidade de todas as formas. Ele deve deixar o mundo político (“tua terra”), o mundo social (“tua parentela”) e o mundo doméstico (“a casa de teu pai”).
O apelo de hoje é igualmente definitivo. O mundo ao nosso redor é um mundo que tem a forma de piedade sem o poder – o mundo da religião corrupta – e a epístola que nos diz que somos participantes do chamado celestial nos exorta a nos separarmos de sua corrupção. Temos, pois que sair “a Ele [Jesus] fora do arraial, levando o Seu vitupério” (Hb 13:13). Isso não quer dizer que devemos desprezar o governo – ele é ainda estabelecido por Deus. Somos instruídos a orar por aqueles que estão em autoridade (1 Tm 2:1-2), a abster-nos de falar mal das autoridades (2 Pe 2:10; Jd 1:8), a pagar nossos impostos (Mc 12:17; Rm 13:6-7) e obedecer às leis da terra (Rm 13:1-5).
Também não podemos negligenciar os laços familiares – eles são ordenados por Deus. Nem devemos deixar de ser cordiais, bondosos e fazer o bem a todos os homens à medida que tivermos oportunidade. Mas, como crentes, somos chamados a não participar das atividades políticas do mundo, dos encontros sociais e de toda a esfera em que os membros não convertidos de nossa família encontram prazer sem Deus. Não nos é pedido para reformar o mundo ou procurar melhorar a sua condição, mas para sairmos dele. A palavra ainda é, “pelo que saí do meio deles, e apartai-vos, diz o Senhor, e não toqueis nada imundo; e Eu vos receberei, e Eu serei para vós Pai, e vós sereis para Mim filhos e filhas, diz o Senhor Todo-Poderoso” (2 Co 6:17-18).
Um chamado que assegura
Terceiro: se o chamado de Deus separou Abraão deste mundo atual, isso foi feito com a finalidade de levá-lo para outro mundo – “para a terra”, Deus disse: “que Eu te mostrarei”. Se o Deus da glória apareceu a Abraão, foi para levá-lo para a glória de Deus. Assim, o maravilhoso discurso de Estevão (At 7) que começa com o Deus da glória aparecendo a um homem na Terra (v. 2) termina com um Homem aparecendo na glória de Deus no céu (v. 55). Ao encerrar seu discurso, Estevão olhou firmemente para o céu e viu a glória de Deus e Jesus em pé à direita de Deus, e ele diz: “Eis que vejo os céus abertos e o Filho do Homem que está em pé à mão direita de Deus”. Olhando para Cristo em glória, vemos o maravilhoso propósito que Deus tem em Seu coração quando nos chama para fora deste mundo presente. Ele nos chamou para a glória, para sermos como Cristo e com Cristo em uma cena em que tudo fala de Deus e tudo o que Ele é no amor infinito de Seu coração.
Deus não diz a Abraão: “Se você atender ao chamado, eu imediatamente lhe darei a posse da terra”. Mas Ele diz: ”Eu te mostrarei (a terra)”. Se respondermos ao Seu chamado, Deus nos permite, junto com Estêvão, “ver o Rei na Sua formosura” e “a terra que está longe” (Is 33:17). Olhamos para cima e vemos Cristo em glória.
Um chamado vantajoso
Há uma grande bênção presente para aquele que atende o chamado. Separado deste presente mundo mau, Deus diz a Abraão: “Far-te-ei uma grande nação, e abençoar-te-ei, e engrandecerei o teu nome”. Os homens deste mundo procuram fazer um grande nome para si mesmos; eles dizem: “Façamos um nome para nós”. Mas, Deus diz ao homem separado: “Abençoar-te-ei, e engrandecerei o teu nome”.
A tendência de nosso coração natural é sempre procurar fazer um nome para nós mesmos, e a carne se apoderará de qualquer coisa, até mesmo das coisas de Deus, para se exaltar. Essa tendência foi vista entre os discípulos do Senhor quando debateram entre si sobre qual deles deveria ser considerado o maior.
A dispersão do homem em Babel e as divisões da Cristandade, bem como toda contenda entre o povo de Deus, podem ser atribuídas a esta única raiz – a vaidade da carne que procura se tornar grande. “Da soberba só provém a contenda” (Pv 13:10).
A mente humilde do Senhor Jesus fez com que Ele Se fizesse de nenhuma reputação. “Pelo que também Deus O exaltou soberanamente e Lhe deu um nome que é sobre todo o nome”. Deus tornou Seu nome grande (Ap 15:4), e para aquele que tem Sua mente humilde e O segue fora do arraial em resposta ao chamado, Deus diz: “fiz para Ti um grande nome”. Deus pode fazer um nome muito maior para o crente em Seu mundo de glória do que podemos fazer para nós mesmos neste presente mundo mau.
Se confessado honestamente, pode-se muito bem descobrir que o verdadeiro motivo para alguns Cristãos permanecerem em um sistema religioso, o que enfraquece a alma, é o desejo oculto de ser grande. Assim, eles se afastam do caminho do anonimato fora do mundo religioso. Será que não podemos ver na Escritura, assim como na experiência diária, que aqueles que foram espiritualmente grandes entre o povo de Deus foram pessoas separadas – homens e mulheres que responderam ao chamado de Deus –, ao passo que qualquer desvio do caminho separado tem levado à perda da verdadeira influência e da grandeza espiritual entre o povo de Deus?
Um chamado que beneficia
Deus diz a Abraão: “e tu serás uma bênção”. No caminho da separação, não apenas o próprio Abraão seria abençoado, mas ele também seria uma bênção para os outros. Fazemos bem em notar a importância dessas palavras. Quantas vezes um crente permanece em uma associação, que ele admite não estar de acordo com a Palavra de Deus, alegando que ele seria mais útil aos outros ali do que fora, no lugar de separação. No entanto, Deus não diz a Abraão: “Se você ficar em Ur dos Caldeus ou na casa provisória em Harã, será uma bênção”, mas, respondendo ao chamado de Deus, lhe é dito: “tu serás uma bênção”. Talvez Ló sentisse que poderia ter influência sentado no portão de Sodoma, mas o homem que tinha influência lá – que quase poupou a cidade por suas intercessões – era o homem sob os carvalhais de Manre.
Um chamado que preserva
Sexto: Abraão é informado de que, no lugar de separação teria o cuidado preservador de Deus. Ele poderia, de fato, ter que enfrentar oposição e provação, pois é sempre verdade que “quem se desvia do mal é tratado como presa” (Is 59:15 – ARA). Mas Deus diz ao homem separado, “amaldiçoarei os que te amaldiçoarem”. O homem separado é preservado de muitas provações que atingem o crente que permanece em associação com o mundo. A misericórdia do Senhor salvou Ló da condenação de Sodoma, mas nessa falsa associação ele perdeu tudo – esposa, família, riqueza e testemunho.
Um chamado efetivo
Agindo com fé na palavra de Deus, foi dito a Abraão: “Em ti serão benditas todas as famílias da Terra”. Sabemos o uso que o Espírito de Deus faz dessa promessa. Ele diz, “Ora, tendo a Escritura previsto que Deus havia de justificar pela [no princípio de – JND] fé os gentios, anunciou primeiro o evangelho a Abraão, dizendo: Todas as nações serão benditas em ti” (Gl 3:8). Abraão não previu e não pôde prever o efeito de longo alcance do princípio de fé sobre o qual ele agiu ao responder ao chamado de Deus, mas Deus previu que era o único caminho de bênção para todas as famílias da Terra. Portanto, agora, ninguém, exceto Deus, pode prever o efeito de longo alcance na bênção para os outros que pode resultar quando nós, em fé simples e sincera, respondemos ao chamado de Deus.