Origem: Revista O Cristão – A Presença do Senhor

Comunhão

O que é comunhão? É ter algo em comum com alguém sobre uma condição apresentada. A palavra em grego, traduzida por comunhão, é usada vinte vezes no Novo Testamento e em todos os casos tem esse significado. Em algumas passagens trata-se de comunhão em ações e não de sentimento, enquanto em outras passagens a palavra é aplicada ao sentimento e não ao ato, e isso determina mais claramente seu significado moral. Primeiro encontramos em Atos 2:42, onde lemos: “E perseveravam na doutrina dos apóstolos, e na comunhão, e no partir do pão, e nas orações”. Assim, eles expressaram, pela primeira vez na história do povo de Deus na terra, a percepção de que estavam interagindo em um sentimento coletivo. Isso é ainda transmitido de maneira mais plena em 1 Coríntios 10:16, nas palavras “comunhão do sangue de Cristo”, que nos ensina que devemos ter um sentimento em comum com o que o sangue de Cristo indica e fornece.

A palavra é usada em sua mais alta enunciação doutrinal em 1 João 1: 3: “Ora, a nossa comunhão é com o Pai e com seu Filho, Jesus Cristo”. Nosso sentimento nisso pode ser fraco e ambíguo, mas permanece o fato de que o que temos de maneira imperfeita vai ao encontro do que o Pai e o Filho têm perfeitamente.

Introdução à Comunhão 

Êxodo 29 apresenta de uma forma muito bela todo o assunto da comunhão: nossa introdução nela e nosso progresso para a mais alta ordem e experiência dela. Primeiro, há expiação e o lavar de tudo o que a alma requer para sua aceitação, sem a qual não poderia haver comunhão. Então há consagração, transmitindo que, como aceito, estamos agora prestes a ser introduzidos em um sentido completo e perfeito de nossa bem-aventurança, e isso como sendo algo preliminar e essencial para o serviço. Havia dois carneiros, um é totalmente oferecido, o que tipifica nosso Senhor indo a Seu Pai e nosso Pai, Seu Deus e nosso Deus. O outro é o carneiro da consagração, que também O representa, mas apreendido e apresentado por nós enquanto O possuímos e O mantemos em nossas mãos. Nós temos a gordura e o ombro direito. A gordura fala de Sua excelência e a glória que é declarada na ressurreição em consequência da Sua morte, enquanto o ombro direito transmite o poder de Sua ressurreição. Estes eram apresentados pelo Sumo Sacerdote e aceitos por Deus como cheiro suave, enquanto o peito era movido por Moisés (tipificando a Cristo como sendo o Filho de Deus) e representando as afeições do coração daqu’Ele que foi enviado, não queimado, mas eternamente entregue por nós. Terceiro, o resto do carneiro era comido por Arão e seus filhos no lugar santo.

Três Ordens 

Baseado nesta figura, eu sugeriria que existem três ordens ou divisões, por assim dizer, de nossa comunhão, que embora consequentes umas das outras, ainda podem ser vistas como sendo distintas. Primeiro, temos comunhão com Cristo onde Ele está, nos lugares celestiais. Em segundo lugar, compreendemos e entramos em Suas excelências. Terceiro, temos a consciência da força e do apoio que vêm d’Ele, pois nos dá de Si mesmo como apoio aqui embaixo: Isso é comer no lugar sagrado. Essas três divisões são estabelecidas no primeiro carneiro (totalmente oferecido) e nas duas partes do segundo (o carneiro da consagração).

Eu disse que a primeira ordem é a comunhão com Cristo onde Ele está. A alma tem consciência de participação com aqu’Ele que é a nossa vida e naquele lugar para o qual Ele foi. Mas a segunda ordem é ainda maior, que é a consagração ou preenchimento. A compreensão da excelência, do poder e das afeições de Cristo dá força e habilidade às nossas almas para julgar e determinar todos os caminhos de Deus na Terra e fazer de um homem o que o apóstolo chama de “espiritual, julgando todas as coisas”. Essa é uma participação de Sua mente, uma partilha de Seu julgamento das coisas.

É evidente que essas duas ordens de comunhão são muito diferentes e bastante distintas. Em ambos os casos eu estou, por assim dizer, na companhia de Cristo, mas posso ter uma grande medida de apreciação de minha posição sem aquela intimidade com Sua mente. Podemos ilustrar os dois em um sentido inferior pelo exemplo de Pedro e João em João 13. Ambos estavam na presença do Senhor, mas Pedro não conhecia a Sua mente, enquanto João desfrutava de intimidade. Assim também foi com os dois discípulos indo para Emaús, quando o coração deles “ardia […], quando ele, […] nos expunha as Escrituras”. Embora não soubessem, eles estavam em comunhão tanto com Sua presença quanto com Sua mente, avançando mais profundamente nela. Muitos são os abençoados pela consciência de sua participação com Ele lá, mas que não conhecem a intimidade que os capacita a entrar nos Seus sentimentos, gostos e julgamentos de todas as coisas. Essa é a diferença entre piedade e espiritualidade: A piedade se refere em tudo a Ele, já a espiritualidade, aos sentimentos e pensamentos d’Ele.

A Terceira Divisão 

E agora, quanto à terceira divisão de nossa comunhão, que é intimamente ligada à segunda, é o resto do carneiro da consagração, comido por Arão e seus filhos no lugar santo (v. 32). Aqui obtemos a força e nutrição para nossas almas vindas da compreensão e comunhão tipificadas pela outra parte do carneiro, queimada e movida. É a comunhão uns com os outros, assim como com o Sumo Sacerdote. Nós nos alimentamos dela juntos, “Se, porém, andarmos na luz, como ele está na luz, mantemos comunhão uns com os outros” (1 Jo 1:7). É o efeito de compreender com todos os santos “qual é a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade”, e o efeito deve ser o de estar “tomados de toda a plenitude de Deus” (Ef 3:18-19).

Em conclusão, este capítulo (Êxodo 29) nos apresenta, em figura, os meios pelos quais somos introduzidos, nessa posição e experiência abençoadas, em nosso caráter sacerdotal. A primeira coisa é aceitação, a segunda, comunhão, da qual temos três divisões, a saber, a primeira que é a participação posicional com Cristo, o poder do qual a alma entra na oferta do primeiro carneiro. A segunda, o da compreensão de Sua excelência, interação mental de pensamento e sentimento, como estabelecido pela gordura, ombro e peito do carneiro da consagração. E a terceira, aquela de força e nutrição derivada d’Ele, com Ele e uns com os outros, enquanto permanecemos com Ele no céu, comendo o que sobrou, no lugar santo.

Girdle of Truth (adaptado)

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