Origem: Revista O Cristão – Batalha Espiritual
Conflito Celestial
Leia Josué 5:13-15; Josué 6:1‑16
Nessas passagens em Josué temos uma figura da guerra celestial, e é importante que entendamos, porque o filho de Deus nunca está fora da guerra. Se você traçar o caminho dos filhos de Israel verá que foi assim. Há Faraó no Egito; Amaleque no deserto; Balaão quando você deixa o deserto; e na terra há a maior força do inimigo, as sete nações aparelhadas contra a posição celestial (a terra prometida).
Conflito no deserto
No mundo, Satanás é contra até mesmo um pobre pecador, pois o apóstolo diz: “Mas, se ainda o nosso evangelho está encoberto, para os que se perdem está encoberto, nos quais o deus deste século cegou os entendimentos dos incrédulos” (2 Co 4:3-4). Depois que Faraó é vencido, você entra no deserto e encontra Mara [águas amargas]; você bebe a morte, mas é sustentado por Cristo naquele lugar. E então Amaleque sai para lutar – para intimidar – para contestar o fato de que você está tomando esta posição. Aqui você encontrará duas coisas: uma, a intercessão de Cristo para apoiá-lo; e a outra, você expõe a luta. Josué escolheu os homens e saiu para lutar contra Amaleque, e entretanto a intercessão foi a verdadeira ajuda.
Deixe-me dar uma ilustração. O Senhor disse a Pedro – “Satanás vos pediu para vos cirandar como trigo. Mas Eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça” (Lc 22:31). Houve intercessão, não para a sua salvação – ele era salvo: foi para que a fé de Pedro não falhasse. Mas Pedro estava pronto para a luta? Pelo contrário, ele confiou em si mesmo ao ir para a casa do sumo sacerdote, e lá estava satisfeito ao encontrar um fogo. Mas o diabo também estava lá. Eles não viram o diabo, mas ele estava lá para evitar que Pedro fosse um homem dependente. Essa era a batalha celestial. Satanás busca por todas essas armadilhas para nos manter longe do lugar de dependência, que é necessário quando estamos no deserto.
Conflito fora da terra
Agora vá para Números 21; lá está o povo fora do deserto. Você encontra um grande número de crentes agora, realmente firmados na graça, sabendo o que Deus fez por eles e neles, tendo a vida em Cristo, e o Espírito Santo habitando neles, como em João 3 e 4. A serpente de bronze estava na borda do deserto; os crentes estão fora, quanto ao seu estado, e pensando, talvez, que tudo será um simples velejar agora. Seom, rei dos amorreus, vem contra eles, eles lutam com Seom, e o Senhor os livra. Isso também foi uma batalha, mas não foi uma batalha celestial. O povo está agora fora do deserto e indo para Canaã, e eles têm esta batalha desesperada no caminho. Eles são como um homem no livro de Hebreus; ele está indo para o céu, mas ainda não está lá. Um santo logo descobre se está indo para o céu; mas há algo como estar no céu e estar indo para lá no mesmo momento. “Ainda não resististes até ao sangue, combatendo contra o pecado” (Hb 12:4). Isso fala de morte – de martírio, e sem dúvida muitos homens devotos de Deus têm tido suas batalhas neste lado do Jordão. Eles sofrem muito, porém, buscam uma posição religiosa aqui onde estão, assim como as duas tribos e meia, que escolheram um lugar para se estabelecer antes de cruzarem o Jordão.
Adquirindo possessões
O que descobrimos praticamente nisso é que não devemos adquirir possessões nessas batalhas; embora haja conquistas no lugar, não devemos ocupar o lugar. Por outro lado, quando chegamos às batalhas celestiais, tudo o que ganhamos é possessão – nosso direito. Por exemplo, Lutero foi apoiado pelo Eleitor [Príncipe] da Saxônia, e como resultado ele tinha uma posição aqui. Isso, porém, estava completamente errado. Se você estabelece um sistema religioso no mundo você está completamente errado. Você não deve adquirir possessões onde a batalha é ganha, a menos que seja do outro lado, além do Jordão.
Batalha com Balaão e com o mundo
Em consequência destas grandes batalhas, surge outro terrível inimigo. Esse terrível inimigo é Balaão, e muitos homens fortes caíram por meio dele. O que Balaão representa? Balaão age sobre a suscetibilidade da natureza que você tem. Você é convidado para uma festa social, e aceita o convite porque lhe convém naturalmente, e você é levado para longe. A maioria dos casamentos inadequados resulta de Balaão. Se a atitude natural de sua mente o leva a um círculo ou classe de sociedade onde esses gostos são satisfeitos, essa é a armadilha de Balaão. Eu tenho pavor da palavra “social”, pois uma série de prejuízo moral está sob essa palavra. Primeiro, as pessoas são convidadas a sair, e isso as leva a associações mundanas com suas loucuras que as acompanham. Olhe para as crianças, de onde elas tiram as noções que muitas delas têm? Na escola, de seus companheiros. É surpreendente as coisas que as pessoas aprendem em companhia de outras. Se você estivesse do outro lado do Jordão – portanto um homem morto – não seria convidado a sair, pois um homem morto não teria interesse nas coisas daqui. Se tivermos tomado a posição de estamos mortos, obtemos maior felicidade do lado de lá do Jordão do que possivelmente poderíamos deste lado. Esse é o ponto. Não é pressupor nada, mas as coisas aqui não têm interesse para nós.
Coisas melhores substituindo coisas ruins
Muitos de vocês, se convidados a participar de algum tipo de diversão, não achariam nada divertido, e por quê? Porque têm prazeres mais elevados. Como a rainha de Sabá, são as melhores coisas que me permitem desistir de coisas aqui. Não adianta censurá-los. Eu mesmo fiz isso, mas descobri que era inútil. Você pode aliviar sua consciência, mas não libertará ninguém deles dessa maneira. Deixe-os se apegarem a coisas melhores, e as outras cairão como folhas mortas. É da mesma forma com uma criança pequena. Se você quiser tirar uma coisa perigosa da mão dela, ofereça-lhe algo brilhante. Essa é a coisa superior, o poder eclipsante. Eu disse a mim mesmo antes: “Isso é uma coisa que eu nunca posso desistir”, mas a deixei quando consegui a coisa melhor, e eu não me ressenti por isso porque eu tinha gozos celestiais. Assim como no caso de certos arbustos e árvores, a folha velha não cai até que a nova seja formada. É o poder expulsivo de uma nova Pessoa. Não é uma coisa agora, mas uma Pessoa. Uma pessoa contém muito mais do que qualquer número de coisas pode conter. Há uma grande variedade sobre uma pessoa, e há uma infinidade de variedade na Pessoa do Senhor Jesus Cristo. Se O conhecêssemos melhor e O estudássemos mais, estaríamos constantemente fazendo novas descobertas de Seu valor todos os dias.
Conflito Cristão adequado na Terra
Subimos, então, para a terra, e aqui está o conflito Cristão apropriado, que é realmente trazer o Cristo celestial à Terra. Você diz, eu não estou à altura dessa batalha? Eu nunca estive nela, e, ela está muito além de mim? Bem, eu digo, você está pronto para isso, ou você gostaria apenas de olhar para isso? Muitas pessoas gostam de ver resenhas, pois apresentam a ideia de uma batalha, e temo que essa seja geralmente a maneira pela qual a batalha em Efésios é lida. É apenas uma revisão para muitos, não o conflito real.
Bem, para que serve o conflito? É para ser um homem celestial, pois temos uma pátria celestial. Israel lutou pela “terra”. Os cruzados são para mim um povo muito interessante, porque arriscaram suas vidas para tirar a terra santa das mãos dos pagãos e dos sarracenos. Eles morreram por isso, e suas guerras foram chamadas de “guerras santas”. A ideia era boa, mas foi realizada de forma errada. A ideia era conseguir espaço para Cristo nesta Terra. Qual seria o certo então? O certo é conseguir espaço moral para Cristo. Eles lutaram para obter a Palestina para Cristo. Nosso conflito é permanecer aqui como homens celestiais por um Cristo celestial.
Não é Cristo em humilhação que devemos apresentar, mas o Cristo celestial. O que Paulo diz? “ainda que também tenhamos conhecido Cristo segundo a carne, contudo, agora, já O não conhecemos desse modo” (2 Co 5:16). É o Homem em glória que devemos apresentar. É do grão da terra do ano antecedente que devemos nos alimentar e, então, saímos para a batalha. Tome o antítipo – devemos estar fortalecidos “no Senhor e na força do Seu poder” (Ef 6:10). Esse é o grão da terra. Devemos apresentar um homem celestial em cada círculo e relacionamento aqui. Nem nas epístolas de Pedro nem em Romanos temos algo sobre a família. Por que é assim? Porque lá você não está alto o suficiente. Ali vemos um pecador liberto na terra. Em Efésios vemos um homem celestial, então ele pode descer ao ponto mais baixo. É a altura em que está que lhe permite descer, com o poder que pertence a essa posição elevada. Ele passou para os céus, e não apenas para os céus, mas Ele é mais alto que os céus. Portanto, tudo deve ser feito de acordo com essa posição. Esse é o caráter maravilhoso da prática de Éfeso.
Poder celestial para uma luta celestial
Nada pode ser mais claro de que o conflito deve trazer à tona um homem celestial, nos vários círculos em que você se encontra na Terra. Conto sete círculos em Efésios, mas não importa quantos sejam, se você ler Efésios 4 e 5, descobrirá que não há uma única coisa ali que possa ser realizada exceto no poder celestial.
Paulo diz: “Para conhecê-Lo”, isto é, como Ele é agora. E eu pergunto, você não gostaria de conhecê-Lo como Ele é agora? Você acha que iria contentar se caso uma esposa ou um filho dedicado pudesse dizer: “Conheci meu marido ou meu pai há dez anos, mas não sei como é agora”? Ora, nunca ouvimos falar de tal coisa. No entanto, essa é realmente a maneira como alguns crentes pensam sobre Cristo. Eles O conhecem como o Salvador que morreu aqui, mas não O conhecem como Ele é agora – o Homem glorificado.
Mas talvez você pergunte: Quem está à altura desse conflito? Eu sei o quão pouco estou apto a isso, mas não podemos fugir do que Deus nos chamou. Não podemos fugir de Filipenses 3:10 – “para conhecê-Lo, e a virtude da Sua ressurreição, e a comunicação de Suas aflições” (v. 10). Outra vez, “tenho também por perda todas as coisas, pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor” (v. 8). Isso não era salvação; Paulo tinha isso. Verdade, Ele é nosso Salvador, mas a graça de Deus é tão grande que o levaria adiante, a conhecê-Lo como a Cabeça de Seu corpo, a Igreja, e quando você O conhecer como sua Cabeça, oh, que felicidade!
E agora o que você é chamado a fazer é exibir a Ele na Terra e, portanto, há conflito. Satanás incitou o homem ao clímax da maldade – para colocar Aquele bendito Ser sobre a cruz. O primeiro pecado do homem foi dar as costas a Deus; para o segundo, não há desculpa; ele tirou o Filho de Deus da Terra. Acho que as pessoas não são sensíveis o suficiente para perceber isso. Eles não andam com o senso disso sobre eles. Eles admitem o primeiro, mas não o segundo. E agora o que Deus diz, em Sua maravilhosa graça: Eu te escolhi antes da fundação do mundo para que você fosse santo e irrepreensível diante de Mim em amor. Vocês são membros do corpo de Cristo, e quero que O demostrem aqui na Terra. Para que serve todo o ensino? Qual é o ponto visado no ministério? “Até que todos cheguemos à unidade da fé e ao conhecimento do Filho de Deus, a varão perfeito, à medida da estatura completa de Cristo” (Ef 4:13). Isso não é algo futuro; aplica-se a nós aqui e agora. Falando dos dons, Paulo diz, você deve trabalhar para alcançar isso. Talvez você responda que nunca levaremos as pessoas a fazer isso. Bem, não vamos parar de trabalhar nisso. Esse é o fim de todo ensino; e se é o fim do ensino, é também o resultado da guerra.
Defendendo um Cristo celestial onde Ele foi rejeitado
Em Efésios 6:18-19 encontramos: “Orando em todo tempo… e por mim; para que me seja dada, no abrir da minha boca, a palavra com confiança, para fazer notório o mistério do evangelho”. Isto é, não apenas o evangelho, mas o mistério do evangelho. O que Paulo realmente queria era divulgar esta verdade: Cristo – o Cristo celestial; esse é o conflito. Quando Satanás trouxe o homem ao clímax da maldade, para recusar o Filho de Deus nesta Terra, e Deus O exaltou à Sua própria mão direita, Deus demonstrou, que o corpo de Cristo estava aqui. Nós somos membros dele, agora pertencendo ao lugar onde Ele está, e devemos ser a expressão d’Ele aqui embaixo no mesmo lugar onde Ele foi recusado. Você percebe que toda a força do inimigo deve ser direcionada contra isso? Bem, esse é o conflito.
Deus sustenta os Seus que sustentam o Seu Cristo
Deus tem Seu objetivo, e Ele apoiará os Seus mantendo esse objetivo. E é um grande conforto para nós saber que é O objetivo de Deus nos manter para Cristo aqui. Se sabemos disso, não precisamos temer nenhuma oposição. Pois não importa quem se oponha, posso ter o objetivo de Deus diante de mim, não minha própria vontade. Mas haverá uma oposição amarga. Sim, o objetivo de Deus sempre foi resistido por Satanás. Você descobrirá que qualquer que seja o objetivo de Deus no momento, ele é o que mais se opõe; nada é mais marcante. Quando Deus enviou Seu Filho ao mundo; quem mais se opôs a Ele? Ora, os fariseus. Aqueles homens piedosos que defendiam a observância da lei em seu sentido mais estrito; aqueles diante dos quais outros homens se curvaram por causa de sua piedade; estes foram os homens que se opuseram a Cristo. Os fariseus se opuseram a Ele quando esteve aqui, e os saduceus quando Ele deixou o mundo.
Quem teria pensado que aqueles que eram os defensores da lei, os mais estritos e os mais rígidos quanto à religião – os judeus – seriam aqueles que se oporiam ao Senhor? Tanto que quando o Senhor cura um homem no dia de sábado, eles declaram que Ele não está em condições de ficar aqui. Você pode entender o caráter enraizado e implacável da oposição contra o que o coração de Deus está estabelecendo? Paulo foi deixado sozinho; todos os homens o abandonaram; mas o Senhor ficou ao lado dele. E Paulo não estava nem um pouco perplexo. Leia o que ele diz a Timóteo em sua segunda epístola a ele. Ele escreveu essa epístola depois de ser assim abandonado, e você verá que ele não está nem um pouco desanimado. Pelo contrário, ele diz a Timóteo que confiasse as coisas que ouviu a homens fiéis, que também fossem capazes de ensinar a outros.
Bem, este é o conflito, e se você entrar nele, você pode ter batalhas duras para lutar enquanto se levanta pelo Senhor, ou segue em frente como um homem celestial, pois Satanás é um inimigo implacável. Se lermos Pedro ou Hebreus, veremos que ali aos santos está escrito para enfrentar o diabo, mas não como aqui; ali estava “bramando como leão”. O caráter temerário da oposição de Satanás nos lugares celestiais é que ela é invisível.
O grande poder de Deus para a batalha
“Quando vier o Consolador… testificará de Mim” (Jo 15:26). Esse é o objeto do nosso conflito. Esta passagem se refere a Cristo em glória, não estando na Terra. Quando Ele subisse ao céu, o Espírito Santo testificaria d’Ele na Terra. O que estou pensando agora não é o conflito, mas o apoio que temos quando estamos nele. O Espírito Santo desceu aqui para estar conosco, a fim de manter os de Cristo aqui. Como isso é maravilhoso! Mas a Igreja falhou como testemunho. Por quê? A Igreja muito cedo se atraiu pelo mundo, e o Espírito Santo não a ajudaria em coalizão com o mundo. Ele é contra este mundo, pois ele rejeitou a Cristo. O Espírito Santo está aqui para manter os interesses de Cristo. Graças a Deus, foi recuperada a verdade de que o Espírito Santo está aqui com este propósito. Amados amigos, no serviço de Cristo devemos ser independentes do mundo. Se o mundo me ajuda a pregar o evangelho, não devo aceitá-lo. Não podemos tê-lo, pois temos um poder maior, que é contra o mundo.
Começamos com este grande poder que não operará em conjunto com o mundo. Você pode tanto esperar que o fogo coopere com a água, quanto esperar que o Espírito Santo coopere com o mundo. O Espírito Santo está aqui marcando o mundo com o pecado; como então Ele poderia cooperar com isso? Ele convence o mundo do pecado como um criminoso no banco dos réus. O criminoso pode não reconhecer, mesmo assim é condenado. Não precisamos ler o jornal para saber quão perverso é o mundo. A presença do Espírito Santo aqui nos diz quão perverso é o mundo. Sua presença aqui declara o pecado do mundo. Porque Cristo foi rejeitado, o Espírito Santo está aqui vindicando em favor de Cristo. Vemos o mundo inteiro como um deserto moral. Sinto que perdemos um pouco o sentido disso, e que a verdadeira causa de todo o colapso é que a Igreja perdeu a dependência do Espírito Santo, aquele maravilhoso poder com o qual ela começou.
Em João 15, o Senhor nos diz como o mundo O aborreceu e que nos aborreceria. Podemos perguntar: Por que o mundo deveria nos odiar? É uma coisa amarga quando estamos tentando fazer o bem a eles, trazer a eles o mais alto tipo de benevolência – as riquezas de Cristo – que eles nos odeiem. Qual é a razão? É porque Satanás não O quer. Você não pode explicar a inimizade a menos que entenda que o ódio do diabo a Cristo está na base dela.
Bem, que coisa maravilhosa é para Josué poder dizer, não vou guerrear com minhas próprias forças! Como um grande general sai com seus supridores, suas munições e suas reservas, assim sai Josué. Ele não vai guerrear por conta própria.
Então podemos dizer que temos o poder: “Fortalecei-vos no Senhor e na força do Seu poder” (Ef 6:10). Nossa atitude é, não vamos desistir. Devemos ser aquilo que na guerra é chamado de “a esperança perdida”. Isso nos dá a ideia, embora seja um nome infeliz. A “a esperança perdida” é um número de homens que se aventuram a abrir uma brecha na fortaleza, mesmo que isso lhes custe a vida. Eles colocam suas vidas em jogo para ter sucesso, e por isso são chamados de “a esperança perdida”. Não há esperança para eles, a menos que sejam bem-sucedidos, mas geralmente são bem-sucedidos. No nosso caso não gosto do título, mas esse é realmente o nosso lugar; arriscamo-nos por assim dizer a abrir a brecha, mas é com plena confiança, porque temos um poder que não é nosso. Conhecemos a oposição que vamos encontrar, mas mesmo assim avançamos bem-dispostos e somos bem-sucedidos.
Josué contra Jericó
Agora me volto para o que está contra nós; Josué contra a cidade de Jericó (Josué 6) ilustra isso em tipo[1]. É muito importante que conheçamos a doutrina de Paulo, pois se não a conhecermos, não poderemos entender o tipo. O valor do tipo é que em sua prática você nunca deve estar abaixo dele. Você pode dizer que não está à altura do antítipo, mas o antítipo sozinho pode explicar o tipo, porque é espiritual. O antítipo de Jericó são os espíritos malignos nos lugares celestiais (Efésios 6). O tipo é uma cidade, e a ideia de cidade é uma concentração de tudo que se encontra neste mundo. Podemos falar de Paris como representante da França, porque a cidade é a concentração do país. Assim é aqui; Jericó é o tipo dessa oposição – essa resistência organizada. O que Israel viu diante deles foi uma cidade murada; nenhuma probabilidade de obter possessão dela. O conflito conosco é representar Cristo aqui, e a força contra nós é tipificada por esta cidade. Você não faz idéia do caráter da demasiada oposição que existe contra você.
[1] N. do T.: Tipo e antítipo: Aquilo que é prefigurado no tipo, é visto de forma plena no antítipo. ↑
Nunca subestime o inimigo e suas artimanhas
Um bom general nunca subestima seu inimigo, e uma grande causa de fracasso conosco é que não estimamos adequadamente a oposição do mundo. Creio que é uma grande coisa quando a alma tem o senso do enraizado caráter de oposição a Cristo que há no mundo. É uma ajuda maravilhosa, porque o mantém em guarda. Você lê sobre batalhas e, geralmente, em caso de fracasso, descobrirá que o general subestimou seu inimigo. Não subestimemos a oposição do mundo. Você sempre descobre que o homem que tem mais de Cristo é aquele que tem a mais aguda apreensão de Satanás. Não me refiro ao medo comum, mas que ele prevê o perigo. “Não ignoramos”, diz o apóstolo, “dos seus ardis”, (2 Co 2:11 – JND). É contra suas artimanhas que temos que lutar, e esse é o caráter perigoso disso. Se vejo um homem vindo para me derrubar, vejo claramente o que ele está prestes a fazer. Mas agora são as artimanhas de Satanás – como uma mina na terra; uma pessoa andando toca uma mola escondida, e a bomba explode. Tal é o caráter desesperador da guerra que temos que enfrentar. Ele é um inimigo invisível; ele não mostra o rosto. Ele é um inimigo desesperado, que sabe tudo sobre mim e sabe como me tocar no ponto em que sou mais fraco. É no meu ponto fraco que ele trabalha, mas ele faz isso com suas artimanhas. Esse é o tipo de inimigo com o qual temos que lidar, e seu grande objetivo é impedir que sejamos uma representação de Cristo.
Verdade do evangelho e verdade da Igreja
Você pode pregar a justificação pela fé; que será tolerado em grande medida. Mas se você ensinar sobre o corpo de Cristo, com certeza enfrentará oposição. Você estará em guerra. Se um Cristão quer ter um caminho fácil, que ele não se envolva com a Igreja. Se você deseja ter um caminho suave e fácil, não se envolva com a Igreja. Você pode pregar o evangelho e ter tempos fáceis comparativamente, mas se a Igreja for seu interesse, você terá muitas tristezas.
Agora, tendo comentado sobre essas duas coisas – o poder por nós e o poder contra nós – eu confio que você vai fazer isso como o Israel daquele dia.
A armadura e a oração
Passaremos agora às características do guerreiro. Existem duas, e você as vê tanto no tipo quanto no antítipo. Em Josué, a primeira eram os homens armados, e a segunda, os que tocavam cornetas. Assim, em Efésios 6 encontramos armadura e oração: armadura para Satanás e oração para Deus. Armadura contra Satanás sempre será bem-sucedida. A oração é que estou sempre dependendo de Deus, nunca independente dEle. Independência é quando um homem faz algo para Deus por sua própria vontade. Uzá era independente quando colocou a mão na arca. Quem mandou ele fazer isso? Você diz que ele fez isso por Deus. Mas era contrário à Palavra de Deus. Ele era independente. A independência é um pecado pior do que o que é chamado de carnalidade. O último é uma desgraça para você, mas no primeiro caso de independência, você tentou fazer algo para Deus, deu um bom nome para isso talvez, e fez exatamente o que Deus não queria que você fizesse.
Agora vou apenas tocar na armadura. Eu não quero passar por toda ela, embora seja muito interessante, e Satanás quer estragá-la se puder. Primeiro, esteja cingido com a verdade; depois a couraça da justiça; ser honesto e correto. Mas isso não é tudo. Você pode ter isso, e agora, Satanás pode dizer, eu vou te incitar e fazer você perder a paciência. Agora você estragou tudo, perdeu a calma. Seus pés deveriam ter sido calçados com a preparação do evangelho da paz. Muitas vezes testemunhamos isso.
Soldados mais certos e mais intemperantes
É triste até certo ponto que o homem, que pode estar mais correto, seja muitas vezes o mais intemperante, por estar tão indignado com o errado. Mas “a ira do homem não opera a justiça de Deus” (Tg 1:20). Você pode estar indignado, mas não por sua conta. Você se irrita com o mal, e então perde a calma porque há um ponto não armado; seus pés não estão calçados “na preparação do evangelho da paz”. Depois, há o escudo da fé, o capacete da salvação e a espada do Espírito. Existem várias partes diferentes na armadura, e nenhuma é agressiva, mas todas protetoras, exceto a última. A última é “a espada do Espírito, que é a palavra de Deus”.
Nossa família sofre se nossa armadura não está colocada
Encontramos uma coisa interessante em Pedro: uma mulher pode conquistar seu marido sem palavra; isto é, pelo efeito da Palavra sobre si mesma. Mesmo isso não seria agressivo; seria o que ela é por meio da Palavra. Gostaria de insistir sobre a importância de usar a armadura. Não há nada talvez em que falhemos tanto, mesmo em nossa família, como estar sem a armadura. Não há lugar onde somos descobertos tão rapidamente quanto em nossa própria família, porque ela conhece bem nossos pontos fracos. A grande coisa é estar armado. Se eu estiver invulnerável, sou invencível.
Minha armadura e minha consciência
Tome uma ilustração. Se eu fosse um filho Cristão ou esposa Cristã em uma família mundana, estaria em completa sujeição ao meu pai ou meu marido. Ou seja, eu abriria mão da minha liberdade em qualquer medida, mas não da minha consciência em nenhuma medida. Se ele me dissesse: Você não deve sair desta casa em nenhum domingo, eu poderia dizer: Muito bem, você será obedecido totalmente. Mas se ele me disser: Você deve ir a tal e tal lugar no dia do Senhor – algo que comprometeria minha fidelidade a Cristo, eu respondo: Não, isso envolve minha consciência, e isso é para Deus; você não tem autoridade sobre isso. Você pode ter o direito sobre mim em qualquer medida, mas nunca sobre minha consciência. Eu não podia ir lá. Você pode abrir mão de sua liberdade em qualquer medida, mas não de sua consciência, em nenhuma medida.
O Senhor nunca foi a lugar algum para agradar a Si mesmo, mas para prestar um serviço aos outros. Estou falando agora da caminhada celestial; que está além da caminhada no deserto. A diferença entre a caminhada celestial aqui e a caminhada no deserto é que, na celestial, você sempre é superior às suas circunstâncias.
A segunda característica é o hábito de dependência de Deus, e aí, como em Efésios 6:18-19, o clímax é alcançado. “orando em todo tempo com toda oração e súplica no Espírito e vigiando nisso com toda perseverança e súplica por todos os santos e por mim; para que me seja dada, no abrir da minha boca, a Palavra com confiança”.
Perseverança e paciência na guerra
Uma grande coisa para distinguir você é a paciência. Todos sabemos como precisamos disso quando enfrentamos oposição. Quando há grande oposição, então é o momento em que precisamos especialmente de paciência, e aqui, muitas vezes, falhamos. A paciência é uma coisa maravilhosa. Nós vemos isso aqui. Durante sete dias Josué e Israel rodearam a cidade de Jericó, e deve ter sido uma coisa muito cansativa para eles; nenhum grito se ouve até o sétimo dia. Que maravilhoso senso eles devem ter tido da Palavra de Deus e da dependência d’Ele! Como uma criança em uma família mundana, eles dependiam de Deus. Eles circundam a cidade sete dias, e no último dia sete vezes. Paciência, maravilhosa paciência. Nada mantém mais nossa confiança em Deus como a paciência. Raramente vemos isso em nossos dias. Acredito que não confiamos em Deus o suficiente. Eu acredito que o incidente dado em 1 Samuel 7:9-12, no final daquele período, é um encorajamento para nós. Deus apareceu, com trovões, quase no final. Josué estava no princípio. Deus trouxe Samuel quase no final. E nós temos o mesmo Deus. Está dito, Deus trovejou, e houve uma grande derrota.
Em Atos 16, temos um exemplo mostrando todos os princípios apresentados, e recomendo a sua atenção. Foi a primeira vez que Paulo veio à Europa, e creio que o Espírito de Deus apresenta aqui o que era especialmente necessário na Europa. Na Europa, a Igreja primeiramente aceitou o apoio do mundo. Mas o livro de Atos é um livro das ações do Espírito Santo, pelo qual temos que percorrer todos os dias. Em Josué vemos a rota que percorremos e os princípios trazidos à tona.
Paulo é chamado em visão para descer à Macedônia para ajudá-los, e ele vai, mas não encontra homem algum. Era preciso paciência. Ele esperava um homem, pois um homem lhe apareceu, não um anjo. Então ele vai para um lugar onde as mulheres costumavam orar, e aqui ele tem que esperar, e por fim uma mulher, que não era do lugar, mas de Tiatira, com o coração aberto, atendeu às coisas que Paulo disse, e sendo batizada com sua família, ela disse a Paulo: “Se haveis julgado que eu seja fiel ao Senhor, entrai em minha casa e ficai ali”. Ainda não há nada sobre um macedônio; mas Paulo entra na casa dela e fica lá. Satanás, vendo-o neste aparente dilema, envia-lhe um de seus instrumentos, uma mulher que possui um espírito de adivinhação, e ela diz: Eu te darei apoio. Assim, ela os seguiu por muitos dias e clamou dizendo: “Estes homens, que nos anunciam o caminho da salvação, são servos do Deus Altíssimo” (At 16:17).
Veja a paciência de Paulo; por muitos dias ele suporta isso, mas por fim ele não aguenta mais e ordena que o espírito saia dela. Ele se recusou a ser apoiado por Satanás, e qual foi a consequência? Não havia um poder naquele lugar que não estivesse sobre ele, e a coisa mais impressionante e mais terrível sobre isso é que o próprio Satanás, que algumas horas atrás o proclamava servo do Deus Altíssimo, é aquele que agora desperta o povo para destruí-lo. A cidade inteira está incitada contra ele – população, magistrados, polícia, para colocar Paulo na prisão, e Satanás parece ganhar o dia. Talvez Satanás estivesse exultante, mas foi feito da maneira mais ilegal, para não usar um termo mais forte. Foi a coisa mais injusta já feita a um homem que não fez nada de errado colocá-lo na prisão, e depois prender seus pés no tronco. Mas ele não perdeu sua coragem ou energia. Pelo contrário, à meia-noite ele e Silas estão orando e dando graças a Deus, tão contentes como se estivessem em casa. O que você pensaria se tivesse passado por aquela prisão? Muitas vezes penso que se tivéssemos paciência para andar em simples confiança em Deus, como Ele interferiria por nós e nos livraria! Que coisa maravilhosa ter essa confiança! O pequeno Paulo sabia, trancado na prisão na silenciosa hora da meia-noite, quando tudo estava quieto, como Deus iria interferir por ele. Que um grande terremoto viria e sacudiria todas as suas ligaduras e abriria todas as portas. O carcereiro que se retirou para descansar em sua indiferença finalmente é despertado. Pulando para dentro, ele pede uma luz e, caindo aos pés deles, diz: “que é necessário que eu faça para me salvar?” Suponho que ele era o homem para quem Paulo foi enviado. Ele é o primeiro homem da Macedônia de que lemos. Que mudança! Como a população deve ter se sentido na manhã seguinte quando soube que Paulo e Silas eram os hóspedes do carcereiro!
A mesa de Deus para nós na presença de nossos inimigos
Acredito que mesmo agora, se realmente nos levantarmos pelo Senhor, Ele traria algo notável no ponto exato em que nos levantamos por Ele. Deus prepara uma mesa para nós no deserto na presença de nossos inimigos. Você não acha que Ele nos dá muito mais neste mundo presente? Eu acredito nisso da forma mais absoluta. Por que não distinguimos isso? Porque não acreditamos nisso. Não caminhamos com paciência simples e abençoada, esperando, com confiança em Deus. Ele preparará uma mesa para nós na presença de nossos inimigos, e que mesa maravilhosa estava aqui! Ora, as mesas estão completamente viradas. Por quê? Porque eles creram em Deus; eles sabiam que Ele apoiaria Seu próprio Objeto, e que Ele Se levantaria por eles todo o tempo que eles permanecessem em simples confiança n’Ele.
Que o coração de cada um de nós seja movido a uma maior fidelidade a Ele. Alguns aqui são jovens; você ainda não entrou no campo de batalha. Bem, é tudo para que o coração de uma pessoa seja conduzido em simples afeição pelo Senhor. Se assim for, ele logo será encontrado no conflito por Ele, testificando de um Cristo celestial, no próprio local onde Ele foi rejeitado.
TBS (adaptado), Food for the Flock, Vol. 9