Origem: Revista O Cristão – Coração
O Coração
Todos estamos familiarizados com a expressão “o coração” e, pelo menos na sociedade ocidental, quase todos nós entendemos o duplo significado que está associado a ela.
O órgão
Em primeiro lugar, podemos pensar no coração em termos médicos, como aquela entidade em nós que bombeia nosso sangue pelo corpo. Como tal, o coração é de fato um órgão maravilhoso, pois precisa continuar batendo para podermos permanecer vivos. Se o coração para de bater e nada é feito para remediar a situação, danos irreversíveis ao corpo ocorrem em menos de cinco minutos, especialmente ao cérebro.
Em uma pessoa normal e saudável, o coração pode bater cerca de 100.000 vezes em um dia de 24 horas, bombeando em média cinco litros por minuto. Durante exercícios vigorosos, esse volume pode aumentar para 10 ou 15 litros por minuto, e mais ainda para quem está em ótimas condições físicas.
O que também é maravilhoso sobre o coração é que ele tem seu próprio marcapasso interno natural, o chamado nodo sinoatrial (ou nó SA). Os impulsos que fazem o coração bater de maneira adequada se originam aqui e são transmitidos para o resto do coração por meio de fibras nervosas. Esses impulsos continuam a ser gerados em uma sequência regular, independente do sistema nervoso central. A velocidade desses impulsos pode ser modificada, é claro, por vários fatores do corpo, sobre os quais não iremos nos estender aqui. Quando eu estava na faculdade de medicina, lembro-me bem de perguntar a um de meus professores o que fazia com que esses impulsos fossem gerados pelo nó SA. A resposta dele foi, “Deus, se você acredita n’Ele”. Respondi que certamente acreditava n’Ele, pois somente Ele poderia criar algo que enviaria impulsos continuamente por toda a vida, para manter o coração funcionando.
Pensamentos e sentimentos
No entanto, como mencionamos, a expressão “o coração” tem outro significado, e é com esse significado que estamos preocupados nesta edição da revista O Cristão. A Palavra de Deus usa o termo “coração” mais de 800 vezes, quase sempre com o significado de “pensamentos e sentimentos”. A expressão é usada pela primeira vez em Gênesis 6:5, onde está registrado que Deus disse: “Toda a imaginação dos pensamentos de seu coração [do homem] era só má continuamente”. O versículo a seguir refere-se ao coração de Deus, onde está registrado que “isso O afligiu [a Deus] no Seu coração” (JND). Se olharmos para as várias referências ao coração na Escritura, veremos que é uma expressão geral para todo o homem interior. Às vezes é mencionado como o centro das afeições e da vontade, enquanto, em outras ocasiões (como no versículo citado de Gênesis 6:5), refere-se ao nosso eu pecaminoso com seus desejos malignos. Quando a Escritura diz: “Se o nosso coração nos condena” (1 Jo 3:20), abrange tanto a consciência quanto as afeições. Quando lemos: “Dá-Me filho Meu, o teu coração” (Pv 23:26), são mais as nossas afeições que estão em vista. Em Jeremias 17:9, lemos que “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e perverso; quem o conhecerá?” Aqui está o homem em toda a sua pecaminosidade como resultado de sua queda. Quando lemos, “o véu está posto sobre o coração deles” (2 Co 3:15), trata-se de percepção espiritual, ou falta dela. Assim, dentro da estrutura da Palavra de Deus, o coração se refere a todo o exercício moral dentro de nós. A palavra deve, é claro, ser interpretada em certa medida pelo contexto em que for usada.
A mente
Na Escritura, a expressão “a mente” pode por vezes coincidir com “o coração” no seu significado, mas há uma distinção; eles não são termos sinônimos. O coração se refere mais ao centro do desejo e da afeição, enquanto a mente está mais relacionada ao pensamento, à percepção e à razão. Dessa forma, meu coração tende a ir em direção ao que é importante para mim (onde estão minhas afeições), porém eu tenho a capacidade de colocar a minha mente em algo como um ato da minha vontade. Assim, a vontade, ainda que, em certo sentido, seja parte da mente, também controla e direciona a mente de diferentes maneiras. Mas quanto ao coração, nosso Senhor Jesus disse: “Porque onde estiver o vosso tesouro, ali estará também o vosso coração” (Lc 12:34). Encontramos as duas expressões usadas em conexão com Nabucodonosor: “Seu coração exaltou-se e sua mente endureceu-se em soberba” (Dn 5:20 – KJV). Seu coração se exaltou em soberba, e, como resultado dessa soberba, ele endureceu sua mente contra Deus. Em outros artigos desta edição, procuramos mostrar um pouco do que a Escritura diz sobre o nosso coração e o coração de Deus.
“O coração”
É interessante notar que, mesmo no mundo em geral, a expressão “o coração” ocupa um lugar de destaque em nossa fala cotidiana, e principalmente no âmbito do afeto e do amor. Falamos de alguém que tem um “grande coração” para uma causa em particular, ou de um indivíduo que “coloca todo o seu coração” em algo. Falamos daqueles que estão apaixonados, dizendo, por exemplo, que alguém “roubou o coração dela”. Figuras de coração são usadas para indicar o amor entre pessoas e aparecem com frequência em cartões de Dia dos Namorados e de aniversário.
Com relação à expressão “o coração”, um escritor do New York Times recentemente fez esta observação:
“Para avaliar com precisão uma situação humana, você precisa projetar uma certa qualidade de atenção que seja pessoal, gentil, respeitosa, íntima e afetuosa – mais se comover e se sensibilizar do que simplesmente observar com indiferença. […] Vejo cada vez menos esse tipo de atenção na América, mesmo em meio às tragédias de 2020. Longe de se sensibilizarem uns com os outros, o país inteiro parece ainda mais dividido, mais endurecido e cada vez mais cego para outras vidas que não a nossa própria”.
É triste ver essa tendência nos invadindo, e, certamente, ela não se limita aos Estados Unidos da América. Mas devemos entender que a familiaridade com o coração de Deus no Cristianismo é que trouxe a filantropia e a boa vontade que se têm visto na Cristandade ao longo dos anos e que, consequentemente, se espalhou para o resto do mundo. Mas ao renunciar a Deus e à Sua Palavra, não surpreende que o homem tenha se tornado mais egocêntrico, narcisista e insensível aos sentimentos e sofrimento dos outros.