Origem: Revista O Cristão – Devoção
“A Mim Nem Sempre Me Tendes”
“O segredo do SENHOR é para os que O temem”. Não haveria nenhum testemunho desse mais profundo caráter de Sua glória? Sua graça havia preparado um vaso adequado para isso, em alguém que, de coração, entrou no verdadeiro caráter do que estava acontecendo. Era Maria – aquela que havia aprendido a conhecê-Lo como ninguém mais parecia tê-Lo conhecido nos Evangelhos. O coração dela antecipa o que estava mais profundo em Seu coração, mesmo antes de este encontrar expressão em Suas palavras. O segredo do Senhor estava com Maria, como com todos os que O temem, e assim, com a inteligência adequada do momento, ela “tomando uma libra de unguento de nardo puro, de muito preço, ungiu os pés de Jesus e enxugou-Lhe os pés com os seus cabelos”. “Para cheirar são bons os Teus unguentos; como unguento derramado é o Teu nome”. Assim foi naquele dia: “e encheu-se a casa do cheiro do unguento”.
A estima do Senhor de sua devoção
Mas o que é tão precioso aqui é a maneira como nosso Senhor expressa Sua estima pelo ato de devoção dela, em contraste com os pensamentos de Seus pobres discípulos, que nada entendiam. “E os Seus discípulos, vendo isso, indignaram-se, dizendo: Por que este desperdício?” Judas acrescentou: “Por que não se vendeu este unguento por trezentos dinheiros, e não se deu aos pobres?” Então Jesus disse: “Deixai-a; para o dia da Minha sepultura guardou isto. Porque os pobres, sempre os tendes convosco, mas a Mim nem sempre Me tendes”. Ele não receberá mais o unguento de nossas mãos; Ele passou para além do alcance de tal ato, embora não além da expressão de nosso amor. No entanto, há um sentido em que os Seus O terão para sempre e de uma maneira mais bendita do que eles O tinham enquanto Ele ainda estava com eles na Terra. A porção que Maria escolheu por Sua graça sabemos que nunca será tirada dela. Ainda assim, há uma maneira como O temos agora, neste dia de Sua rejeição, que nunca O teremos em glória. Há uma comunhão em Seus sofrimentos, mais íntima e mais doce, se é que é possível, do que a comunhão em Sua glória. E se perdêssemos isso? É isso que afeta meu coração. Se Maria tivesse falhado em aproveitar aquela última noite, para prestar o testemunho adorador de amor à Sua preciosidade, ela nunca poderia reparar isso por toda a eternidade. Quão perfeitamente adequado ao momento foi aquele testemunho da perfeita fragrância de Sua morte diante de Deus, a Quem os homens consideravam merecedor apenas da cruz de um malfeitor! Ela veio de antemão para ungi-Lo para Seu sepultamento, e quão rapidamente a oportunidade teria sido perdida para sempre! Não é que o amor não encontrará maneiras adequadas de expressar-se a Ele na glória eterna, mas não será da maneira como Ele procura agora, e Ele perde, se faltar.
O despertar do amor
Será que não foi para conquistar nosso coração para Si mesmo que Ele morreu e ressuscitou? Em Lucas 7, Ele descreve cada uma das provas do amor da mulher pecadora, pois o amor dela era precioso para Ele. Podemos nós, como Seus perdoados, ser conhecidos em um mundo frio e sem coração tão claramente quanto ela – pelo amor que procura derramar sua expressão nesse precioso Objeto? “Aquele a quem pouco é perdoado pouco ama”. Não que a ação dessa querida mulher em Lucas 7 deva ser confundida com a de Maria de Betânia, um tanto semelhante exteriormente, como se fosse da mesma ordem de inteligência. Mas ambas eram a expressão do amor, de verdadeiro apego dedicado à Pessoa do Senhor Jesus, cada uma em seu próprio lugar e medida. A primeira foi o despertar inicial do amor, como quando Ele primeiro atrai o coração para Si por toda a Sua bendita graça; a segunda foi o fruto da experiência profundamente provada do que Ele é em Si mesmo.
Talvez perguntemos: “Como podemos saber o que Lhe convém agora?” Ah! O amor descobre, porque estuda seu objeto, como Maria fez, sentada aos pés de Jesus. Assim ela ganhou a inteligência instintiva com a qual agiu. A posse da inteligência da mente e da vontade do Senhor é a primícia e a prova do amor, e o amor precisa ser guiado pela inteligência que ele assim obtém, a fim de se expressar de maneira aceitável ao Senhor. Maria Madalena precisava disso quando pensou em levar o corpo morto do Senhor. Mas ela O amava, e isso a deteve no lugar onde ela adquiriu a inteligência da mais rica maneira. Além disso, o amor tem seu próprio modo de se expressar, que nenhuma mera inteligência poderia imitar. Mas quantos são os inumeráveis detalhes em que esse princípio entra, o amor encontrando sua alegre liberdade somente em realizar Sua vontade sob Seus olhos, em cada aspecto da vida, o amor conferindo seu caráter peculiar e sua aceitação à obediência.
Nossa estima por Ele
A própria maneira como O temos agora, na presença do mundo que O expulsou, oferece constantes oportunidades para que nosso amor se expresse. Na glória, não haverá “eu” para negar, nenhuma cruz para tomar, nenhum mundo para recusar, nenhum rompimento dos laços mais queridos de parentesco, nenhum julgamento equivocado por parte de outros crentes para enfrentar, nenhuma perda de qualquer tipo para sofrer por amor a Ele. Todos os corações fluirão juntos para Ele ali. Agora, essas coisas testam nossa estima por Ele e oferecem o privilégio de provar o que é a excelência do conhecimento de Cristo Jesus, nosso Senhor, para nossa alma.
Infelizmente, na vil traição do nosso coração, é muito fácil escapar de tudo isso. Se você seguir a profissão comum de Seu nome, usar da segurança que a infinita e soberana graça lhe deu do juízo vindouro para se estabelecer e ficar à vontade no mundo que O rejeitou, fizer o bem aos homens, como com o unguento vendido por tanto e dado aos pobres, essas coisas conquistarão para o Cristão o favor e a estima do mundo, e o vitupério de Cristo será desconhecido. Mas com que incalculável perda Suas comoventes palavras nos lembram: “A Mim nem sempre Me tendes”.
Nossa oportunidade
Quando a glória chegar, “os Seus servos O servirão”, perfeitamente então, tão certamente quanto veremos “o Seu rosto”, o amor encontrando novas maneiras de se expressar ao seu Objeto na glória; mas, se Ele viesse hoje à noite para nos levar para ela, nunca mais Ele nos chamaria para sairmos a Ele fora do arraial, levando Seu vitupério; Ele nunca mais pediria: “fazei isto em memória de Mim”, conduzindo nosso coração a anunciar Sua morte; nunca mais esperaria ou receberia, das afeições nupciais da Noiva formadas pelo Espírito, o clamor que Lhe diz “Vem”; nunca mais esperaria que estivéssemos identificados com Seus interesses na Igreja e com Seu testemunho para o mundo. Tudo isso e muito mais teria terminado para sempre e a oportunidade teria passado, se a perdermos agora. “A Mim nem sempre Me tendes”.
Oh! Que conheçamos o poder dessas palavras para despertar nossa alma a mais devoção que aproveitará ao máximo os dias conforme eles vêm, e que tão rapidamente passam, e que nunca mais serão recuperados! Oh! Que sejamos encontrados para Ele, diante de tudo, considerando qualquer coisa em que experimentemos a comunhão de Seus sofrimentos o nosso maior ganho e glória presentes.
