Origem: Revista O Cristão – Prioridades
Devoção Cristã
A fonte e origem de toda verdadeira devoção é o amor divino enchendo e operando em nosso coração, como diz Paulo: “Porque o amor de Cristo nos constrange” (2 Co 5:14). Sua forma e caráter devem ser extraídos das ações de Cristo. Portanto, a graça deve primeiro ser conhecida por nós mesmos, pois é assim que conheço o amor e que esse amor é derramado no coração. Aprendemos o amor divino na redenção divina.
O primeiro efeito
O primeiro efeito do amor é conduzir o coração para o alto, santificando-o assim. Bendizemos a Deus e O adoramos, e assim, conhecendo a Ele, nosso deleite adorador está em Jesus. Quando estamos próximos de Deus e em comunhão com Ele, conscientemente unidos a Cristo pelo Espírito Santo, o amor divino flui em nosso coração. Somos animados por esse amor ao desfrutarmos dele. É realmente “Deus habitando em nós”, como João expressa; “o amor de Deus… derramado em nossos corações”, como diz Paulo. Ele flui como fluiu em Cristo. Seus objetos e motivos são os mesmos que os d’Ele, com a diferença de que Ele mesmo é Quem vem e o revela. É o amor de Deus em Cristo Jesus, nosso Senhor; não menos Deus, mas Deus revelado em Cristo, pois ali aprendemos o amor. Assim, em toda verdadeira devoção, Cristo é o primeiro e o principal Objeto; em seguida, “os Seus, que estavam no mundo”, e então os nossos semelhantes: primeiro a alma deles, depois seu corpo e todas as necessidades em que se encontram. Sua vida de bondade para com o homem governa a nossa, mas Sua morte governa o coração. “Conhecemos o amor nisto: que Ele deu a Sua vida por nós” (1 Jo 3:16). “Porque o amor de Cristo nos constrange, julgando nós assim: que, se Um morreu por todos, logo todos morreram. E Ele morreu por todos, para que os que vivem não vivam mais para si, mas para Aquele que por eles morreu e ressuscitou” (2 Co 5:14-15).
Amor ao próximo
Devemos notar, também, que se trata de uma nova vida em nós que desfruta de Deus e para a qual o Seu amor é precioso, a única capaz de se deleitar na bem-aventurança que há n’Ele e na qual o Seu amor divino opera em relação a outros. Não é a benevolência da natureza, mas a atividade do amor divino no novo homem. Sua genuinidade é assim testada, porque Cristo tem necessariamente o primeiro lugar nessa natureza, e sua atuação se dá naquela avaliação do certo e do errado que somente o novo homem possui e da qual Cristo é a medida e o motivo. “Não somente fizeram como nós esperávamos”, diz Paulo (foi mais do que ele esperava), falando do amor ativo, “mas a si mesmos se deram primeiramente ao Senhor, e depois a nós, pela vontade de Deus” (2 Co 8:5).
Mas é mais do que uma nova natureza. Nosso corpo é o templo do Espírito Santo, e o amor de Deus é derramado no coração pelo Espírito Santo que nos é dado. E, assim como o amor jorra como uma fonte em nós para a vida eterna, assim também águas vivas fluem de nós pelo Espírito Santo que recebemos. Toda verdadeira devoção, portanto, é a ação do amor divino nos redimidos, por meio do Espírito Santo que lhes foi dado.
O Objeto correto
Pode haver um zelo que percorra o mar e a terra, mas que esteja a serviço de um preconceito ou seja obra de Satanás. Pode haver benevolência natural revestida de um nome mais nobre e que se irrita se não for aceita por si mesma. Pode haver o senso de obrigação e atividade legalista, que, pela graça, pode levar mais longe, embora seja a pressão da consciência, não a atividade do amor. A atividade do amor não destrói o senso de obrigação no santo, mas altera todo o caráter de sua obra. “Onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade”. Em Deus, o amor é ativo, mas soberano; no santo, é ativo, mas um dever, por causa da graça. No entanto, devemos tudo – e mais do que tudo – Àquele que nos amou. Todo sentimento correto em uma criatura deve ter um Objeto, e, para ser correto, esse Objeto deve ser Deus, e Deus revelado em Cristo como o Pai, pois dessa forma Deus possui nossa alma.
Por isso, Paulo, falando de si mesmo, diz: “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a pela fé do Filho de Deus, o Qual me amou, e Se entregou a Si mesmo por mim” (Gl 2:20). Sua vida era uma vida divina. Cristo vivia nele, mas era uma vida de fé, uma vida vivida inteiramente por um Objeto, e esse Objeto era Cristo, conhecido como o Filho de Deus que o ama e Se entrega por ele. Aqui encontramos o caráter prático e o motivo da devoção Cristã: viver para Cristo.
Comprometidos com Seu amor
O que se supõe aqui não é uma lei contendendo ou impedindo uma vontade que busca seu próprio prazer, mas a bendita e grata entrega de nós mesmos ao amor do bendito Filho de Deus, e um coração que entra nesse amor e em seu Objeto por uma vida que flui de Cristo e do poder do Espírito Santo. Portanto, é uma lei de liberdade. Então, também, ela só pode ter objetos de serviço que essa vida pode ter, e nos quais o Espírito Santo possa fixar o coração, e esse serviço será o livre serviço de deleite. A carne pode tentar impedir, mas seus objetos não podem ser os que o novo homem e o Espírito Santo buscam. O coração se move na esfera em que Cristo Se move. Ele ama os irmãos, pois Cristo os ama, e todos os santos, pois Ele os ama. Busca o bem de todos por quem Cristo morreu, sabendo, porém, que somente a graça pode trazer qualquer um deles, e “tudo sofre por amor dos escolhidos, para que também eles alcancem a salvação que está em Cristo Jesus com glória eterna”. Busca apresentar “todo homem perfeito em Cristo” (ARA) – ver os santos crescerem para Aquele que é a Cabeça em todas as coisas e andarem de modo digno do Senhor. Busca ver a Igreja apresentada a Cristo como uma virgem pura. Persevera em seu amor, embora quanto mais abundantemente ama, menos é amado. Está pronto para suportar as dificuldades como um bom soldado de Jesus Cristo.
O amor se deleita em servir
O motivo que nos governa caracteriza toda a nossa caminhada, pois o Cristão julga tudo por Cristo. Se algo impede Sua glória em nós mesmos ou em outro, é lançado fora. Não é considerado um sacrifício, mas lançado fora como um obstáculo. Quão abençoado ver que o “eu” se foi aqui! “O que para mim era ganho” desapareceu. Que libertação isso é! Temos o privilégio de esquecer o “eu” e viver para Cristo. O “eu” gosta de ser servido; o amor se deleita em servir. Quando estivermos em glória, Cristo Se cingirá e nos servirá. E não devemos nós, se temos esse privilégio, imitá-Lo, servi-Lo e nos entregar a Ele, que tanto nos ama? Viver para Deus interiormente é o único meio possível de viver para Ele exteriormente. Toda atividade exterior não movida e governada por isso é carnal e até mesmo um perigo para a alma; tende a nos fazer agir sem Cristo e introduz o “eu”. Não é devoção, pois a devoção é a Cristo, e isso deve ser no anseio de estar com Ele. Eu temo grande atividade sem grande comunhão, mas creio que, quando o coração está com Cristo, viverá para Ele.
Devoção
A forma da devoção, da atividade exterior, será governada pela vontade de Deus e pela competência para servir, pois a devoção é algo humilde, santo, que faz a vontade de seu Mestre, mas o espírito de serviço indiviso a Cristo é a verdadeira porção de cada Cristão. Queremos sabedoria. Deus a concede liberalmente. Cristo é a nossa verdadeira Sabedoria. Queremos poder. Nós o aprendemos em dependência, por meio d’Aquele que nos fortalece. A devoção é tão dependente quanto é um espírito humilde. Assim ela era em Cristo. Ela espera em seu Senhor. Tem coragem e confiança no caminho da vontade de Deus, porque se apoia na força divina em Cristo. Ele pode fazer todas as coisas. Portanto, ela é paciente e faz o que tem que fazer de acordo com Sua vontade e Palavra, pois então Ele pode operar, e Ele faz tudo o que é bom.
