Origem: Revista O Cristão – Governo

Governo Gentio e Seu Final

Há uma grande diferença entre legislar e governar. A lei expressa a vontade de um governante; o governo exige cumprimento. Após o dilúvio de Noé, Deus instituiu o governo; a partir do qual a violência deveria ser contida e a vida humana deveria ser respeitada. “Quem derramar o sangue do homem, pelo homem o seu sangue será derramado” (Gn. 9:6). A inquisição por sangue foi colocada nas mãos do homem, e Deus o apoiou nisso.

A necessidade de governo 

A necessidade de governo aponta para seu uso: a contenção da ilegalidade e o apoio àquilo que é correto. “Sujeitai-vos, pois, a toda ordenação humana por amor do Senhor; quer ao rei, como superior; quer aos governadores, como por Ele enviados para castigo dos malfeitores e para louvor dos que fazem o bem” (1 Pe 2:13-14).

Para apreciar corretamente o presente uso do governo por parte de Deus, devemos ter em mente que é apenas uma provisão temporária até que o cetro seja dado ao “Príncipe da Paz”. “Seu reino não terá fim” (Lc 1:33). Nesse ínterim, Deus tem dois objetos de interesse na Terra – Israel e a Igreja. Mas Israel, a semente natural de Abraão, deve esperar até que a Igreja seja reunida em casa. Paulo podia dizer: “O Senhor […] guardar-me-á para o seu Reino celestial” (2 Tm 4:18). Mas um remanescente da nação judaica será preservado para o reino terrenal.

Até que Seus desígnios para ambos sejam cumpridos, Deus fará com que o mundo seja mantido em uma medida de ordem, embora, se achar necessário, Ele pode permitir perseguições, conflitos nacionais ou levantes comerciais para impedir que tanto os judeus como a Igreja se estabeleçam aqui na Terra, pois, nenhum deles ainda está na posição para a qual foram destinados. O lugar de Israel é Canaã; a casa da Igreja é o céu, e Deus está nos bastidores agindo por ambos.

O ideal de Deus no governo 

O ideal de Deus no governo é ter todo o poder colocado nas mãos de um homem – o único Cabeça (Ef 1:10; Sl 2:6-8). Ele deu a Nabucodonosor o controle absoluto, mas em vez de usá-lo para a glória de Deus e a bênção do homem, ele usou tal controle para sua própria glória e destruição do homem. Em pouco tempo o domínio absoluto será dado a outro homem – Cristo. Então a vontade de Deus “será feita na terra como é no céu”, e “os homens serão abençoados n’Ele” (Sl 72:17,19).

Considere a estátua no sonho de Nabucodonosor. Nela, vemos num relance todo o propósito do governo gentio como Deus previu até o seu fim. Quatro potências imperiais são representadas na estátua pelos quatro materiais principais que a formam (Dn. 2:38-43). A cabeça é de ouro fino, o peito e os braços de prata, o tronco e as coxas de cobre, as pernas de ferro, com uma combinação de “barro de oleiro” na extremidade mais baixa — “seus pés parte de ferro e parte de barro” (v. 33).

A cabeça de ouro 

O poder de Nabucodonosor foi absoluto. Ouro fino representa isso (Dn 2:38; 5:18-19). “Tu és a cabeça de ouro.” Os poderes posteriores vão ficando cada vez mais inferiores, até os dedos dos pés. É importante notar isso, pois podemos medir a presente posição do governo gentio apenas à luz do verdadeiro segredo de seu declínio.

Diz-se de Nabucodonosor, rei da Babilônia, “A quem queria matava e a quem queria dava a vida” (Dn 5:19). Mas Dario o medo-persa não tinha tal autoridade suprema. Ele tentou ao máximo libertar Daniel da cova dos leões, mas falhou (Dn 6). Por quê? Pela interferência de outros interesses. Esse princípio tem se desenvolvido gradualmente desde sempre, até hoje não são poucos os interesses apoiados por consentimento real (ou outro chefe de estado), mas milhões de interesses – fortes e fracos (ferro e barro). Esses interesses estão fazendo sua voz ser ouvida por representação, para fazer leis que se adéquem a eles mesmos, e as quais o rei (chefe de estado) deve colocar seu selo! “Quando os súditos governam e os reis se submetem, nós estamos nos aproximando do exato oposto do ideal de Deus e, de acordo com a estátua, o fim do governo gentio”

Mas, pare aqui um momento para notar uma coisa. A figura do “barro de oleiro” está associada na Escritura com a supremacia da vontade de Deus sobre o homem. “Não tem o oleiro poder sobre o barro?” (Rm 9:21), Deus terá a última palavra; Aquele que estabeleceu o governo gentio irá, em Seu próprio tempo, colocá-lo de lado para sempre. É quando a extremidade máxima da “estátua” é alcançada, que a “pedra cortada sem mão” destruirá completamente a estátua inteira, e os átomos serão levados como palha (Dn 2:35).

A pedra 

A pedra que fere a estátua encherá toda a Terra. Davi nos Salmos (Sl 118:22), Isaías (Is 8:14-15), e os apóstolos Pedro (At 4:11-12) e Paulo (Rm 9:33), todos declararam que a “Pedra” é Cristo. E isso é confirmado pelo próprio Senhor, pois Ele diz: “[…]e aquele sobre quem ela [Pedra] cair, será feito em pó” (Lc 20:18).

Se ter comunhão com a estátua e a “Pedra” será uma impossibilidade absoluta portanto, por que tentar isso agora? Gastar o nosso melhor naquilo que certamente será demolido não é verdadeira sabedoria e só pode diminuir nosso interesse pelo Reino “que jamais será destruído” (Dn 2:44). É muito melhor seguir o conselho do bendito Salvador: “Buscai primeiro o reino de Deus, e a Sua justiça, e todas essas coisas vos serão acrescentadas” (Mt 6:33). Uma grande ajuda para isso é ver a importância do sonho de Daniel no capítulo 7 do seu livro.

O sonho de Daniel 

Neste sonho, os mesmos quatro poderes são apresentados a nós, mas dessa vez sob a figura de quatro animais. O “animal” neste contexto é o símbolo de Deus do governo terrenal, mas a figura não tem a intenção de sugerir qualquer desprezo pessoal pelo próprio rei (ou governante), pois Deus diz: “Honrai o rei” (1 Pe 2:17). Os primeiros três poderes são claramente identificados: babilônico, medo-persa e grego. O quarto e último, o Império Romano, é identificado no Novo Testamento (Lc 2:1). Esse poder prevaleceu durante a vida do Senhor e de Seus apóstolos. Foi criado um pouco antes da primeira Aparição de Cristo e será encerrado por Sua segunda Aparição. Esse grande império foi dividido em muitos reinos, mas será novamente unido sob um chefe político, chamado em Apocalipse 13 de besta que emerge do “mar”. A massa saudará de bom grado seu advento como o homem certo que estavam procurando!

Os animais 

Na “estátua” de Daniel 2, o pensamento proeminente parece ser a soberania da vontade de Deus no governo terrenal. Nos “animais”, é mais a devastação da vontade do homem. O símbolo é simples. Com exceção do quarto animal, eles são todos animais predadores: impuros, mas com poder de dominar.

Um animal segue naturalmente a inclinação de sua própria vontade, sem qualquer referência a Deus, ou mesmo ao homem, a não ser para sua própria proteção. O próprio Senhor fornece-nos uma chave para o entendimento dessa figura de um animal. O juiz injusto em Lucas 18 “nem temia a Deus, nem considerava o homem”, e um juiz é claramente representante do poder governante. Por questão judicial, o juiz ignorou o recurso da viúva. Foi só quando ela lhe importunou, que ele interferiu por ela. Quanto à motivação, ele quis servir a si mesmo; como resultado, ele a serviu. Assim acontece com esse símbolo de Deus.

Os homens no poder podem pensar que suas políticas servem seus próprios fins. Mas eles esquecem que, muito antes do esquema deles ser pensado, Deus tinha Seus próprios desígnios secretos para o futuro. Por meio da vinculação oculta com o plano deles, pode dar cumprimento aos Seus próprios desígnios. “Se os poderes governantes não realizarem, por escolha, a vontade de Deus conscientemente, eles deverão, pela força de suas próprias vontades, realizá-la inconscientemente”.

As regras mais elevadas 

Se os governantes são homens tementes a Deus, tanto melhor, mas enquanto as coisas estão em desordem, Deus não se limita a homens bons para o governo terrenal. “O Altíssimo tem domínio sobre os reinos dos homens, e os dá a quem quer, e até ao mais baixo dos homens constitui sobre eles” (Dn 4:17). Como exemplo, sabemos que uma das maiores bênçãos da história britânica veio para a nação por meio de um dos mais indignos de seus reis. Quando, para seus próprios fins, Henrique VIII desafiou a autoridade papal, a própria Bíblia, que condenava sua maldade, foi aberta a milhões de seus súditos. Pela vontade de Deus, por mais sombrio que fosse o motivo do monarca, o resultado brilhante foi uma Bíblia aberta e plena liberdade para lê-la. “Como ribeiros de águas, assim é o coração do rei na mão do SENHOR: a tudo quanto quer o inclina” (Pv 21:1).

Ainda que seja uma combinação de poderes, é tudo o mesmo. Se dez reis finalmente se unirem para dar seu poder à besta e destruir a prostituta, será porque Deus colocou no coração deles cumprir Sua vontade (Ap 17:16-17). Foi assim com nosso bendito Senhor. […] se ajuntaram, não só Herodes, mas Pôncio Pilatos, com os gentios e os povos de Israel.” Eles fizeram isso para seus próprios fins perversos, mas nos desígnios de Deus tudo aconteceu para “fazerem tudo o que Tua mão e Teu conselho tinham anteriormente determinado que se havia de fazer” (At 4:27-28). Em todas as coisas é assim: “quem quer que Ele queira”, “para onde quer que Ele queira”, e “tudo o que Ele predeterminar”.

G. Cutting (adaptado)

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