Origem: Revista O Cristão – Graça e Governo

Graça e Governo

Há dois princípios distintos nos quais Deus lida com o homem como tal e no qual também lida com o Seu povo – graça e governo. A primeira é a característica bendita de Deus, pois Ele é o “Deus de toda graça”. O evangelho é a grande demonstração desse princípio, Deus toma uma pessoa e a abençoa, sem qualquer referência a como ela se comportou ou ao que ela merece. Para que isso possa ser feito consistentemente com as reivindicações de justiça contra o pecador, a cruz era necessária. O governo é o contrário disso. Ele está consciente do comportamento da pessoa sobre a qual governa e regula sua conduta em relação à pessoa de acordo com os méritos dela. Nós temos este princípio em 1 Pedro 2:14: “Governadores são para castigo dos malfeitores e para louvor dos que fazem o bem”. Esta palavra aplica-se ao governo humano, mas o princípio é o mesmo, seja qual for a esfera em que o governo é exercido.

Desespero e descuido 

É muito importante que nos lembremos de que Deus age em relação a nós como Seu povo em ambos os princípios. Se eu esquecer Sua graça quando tiver falhado, talvez eu me desespere. Se eu esquecer o Seu governo, meu descuido pode aumentar, não me lembrando de que “se viverdes segundo a carne, morrereis” (Rm 8:13), e de que nossa colheita depende da nossa semeadura.

Vemos um exemplo da atuação de Deus nesses dois princípios na história de Abrão. Primeiramente, o chamado de Abrão foi uma demonstração da graça soberana, e o mesmo vale para todos os santos de Deus, mas quando Deus o trouxe para Si mesmo, Ele o trouxe para onde o governo, assim como a graça, seria exercido para com ele, e a mesma coisa acontece conosco quando somos trazidos a Deus.

Abrão não se demorou muito no lugar de favor, antes que, sob a pressão severa das circunstâncias, desistisse de agir sobre o princípio da fé e adotasse o princípio mundano da vista. Ele tinha ido a Canaã em fé, mas lá ele encontrou a fome. Sem consultar Deus, ele fez o que a prudência sugeria e deixou a terra da fome para o Egito, a terra do suprimento.

Agora, Egito e Canaã, respectivamente, representam os dois princípios da vista e da fé. O Egito é um país que extrai seus recursos de si mesmo, tem um rio que o fornece, por assim dizer, independentemente do céu. Canaã, por outro lado, era regada de cima. As características físicas dos países são contrastadas em Deuteronômio 11:10-12. Assim, quando Abrão desceu de Canaã para o Egito, sua ação foi simbólica do que seu coração estava realmente fazendo. Ele estava indo da posição de ser um homem de fé para se tornar um homem do mundo.

Devemos notar que Abrão conseguiu o que ele procurava, pois quando ele retornou do Egito, o vemos e seu companheiro Ló em circunstâncias favoráveis (Gn 13:2; 5). Outra coisa que deve ser destacada é que durante o momento que Abrão estava no caminho da vista, ele renovou um pacto falso com sua esposa Sarai, sugerido pelo príncipe da prudência humana. “Dize, peço-te, que és minha irmã” (Gn 12:13). Isso não o livra de problemas, mas Deus o livra. Isso é pura graça.

A graça reafirma – O governo separa 

Mas a graça de Deus é mais claramente mostrada no capítulo 13, pois Deus não o trouxe apenas para fora do Egito, mas a Betel, ao lugar onde sua tenda estava no princípio. E ali, no lugar do altar que ele fez no princípio, ele invocou o nome de Jeová. A graça restabelece a alma em seu brilho original. Mas agora devemos notar os caminhos governamentais de Deus com Abrão em relação a este desvio. Embora sua própria alma tenha sido restaurada a Deus e o princípio da vista fosse julgado em seu coração, ainda assim a marca do Egito apareceu em sua família quando não é mais vista em si mesmo. Abrão era um homem de fé. Ele havia saído do Egito sem qualquer amor pelo Egito, mas não foi assim com seu sobrinho Ló, que ele levou para o Egito com ele. Isso nós vemos no final de Gênesis 13.

Ló é separado 

Havia uma parte da terra de Canaã que era como o Egito. Era como o jardim do Senhor, bem regado em toda parte, não pela chuva do céu, mas por um rio “como a terra do Egito” (Gn 13:10). Ló tinha um gosto por uma terra como a do Egito, uma terra que Abrão o tinha levado para ver. Era um lugar onde um homem poderia viver sem depender do céu. Que lugar atraente para nosso coração natural! Abrão poderia abandonar tudo ali, mas não Ló. Ainda se pensa que deve ter sido um dia amargo para Abrão quando ele viu Ló tomando o caminho da vista que ele, infelizmente, tinha uma vez mostrado a ele. O princípio de que marcou o tio por um momento, marcou o sobrinho permanentemente.

Eles se separaram, Ló adotando princípios mundanos, ou egípcios, e Abrão ainda andando diante de Deus, um semeia problemas para si mesmo por causa do governo de Deus, o outro trilhando o caminho, embora tentado pela carne, mas do qual está escrito: “Os seus caminhos são caminhos de delícias, e todas as suas veredas, paz” (Pv 3:17). Que o Senhor nos ajude a andar neles!

Agar é expulsa 

Mas este era o fim dos princípios egípcios na família de Abrão? Infelizmente não. A próxima pessoa em quem eles aparecem é Sarai, e aqui o próprio Abrão cai sob eles. Havia na família de Abrão uma serva de Sarai, uma egípcia, e vemos que o princípio que governa a mente de Sarai agora é o mesmo que governava a mente de Abrão naquela época. Ela deu sua empregada para ser a esposa do seu marido. Era um ato que parecia a única saída para uma dificuldade. Não havia pensamento de Deus nisso. O resultado foi um longo problema novamente sob o governo de Deus. Passaram quinze anos até que o resultado desse ato fosse retirado da casa de Abraão, na expulsão da serva e de seu filho. Mas foi com o coração partido que Abraão agiu. Foi apenas neste ponto que o último traço do Egito desapareceu de sua casa.

Tudo isso não é o conto da graça de Deus, mas é uma ilustração do Seu governo. Se Abrão encontrou alivio abandonando os princípios divinos, encontramos nisto dois resultados. Em primeiro lugar, o bendito poder de Deus restaura a alma e, no segundo, o governo de Deus o faz provar a amargura daqueles princípios sobre os quais ele agiu, quando eles aparecem em outros membros de sua família.

Mundanismo 

Uma coisa é entrar no mundo e outra completamente diferente é tirar o mundanismo da casa depois de ter permitido que ele entre nela. Ainda assim, a disciplina de Deus não age em ira, mas é a de um pai, a fim de que possamos ser participantes da Sua santidade. “Não nos sujeitaremos muito mais ao Pai dos espíritos, para vivermos?” (Hb 12:9) É preciso muita graça para sustentar o espírito ao passar pelas consequências governamentais de nossas ações. Ainda assim, é aqui que a graça é ocasionalmente exibida da maneira mais brilhante, humilhando-nos sob a potente mão de Deus, para que Ele nos exalte a Seu tempo (1 Pe 5:6).

C. D. Maynard (adaptado)

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