Origem: Revista O Cristão – Edificando
Uma Grande Casa
Ao olhar para trás, mais de 2.000 anos de história da Igreja, nos perguntamos: Como a Igreja se saiu? Ela tem sido, na prática, um testemunho do um só corpo? Ela cumpriu fielmente suas responsabilidades quanto à casa de Deus? Examinaremos o que a Escritura tem a dizer sobre essas duas questões. No entanto, se nossos olhos estiverem abertos para a condição das coisas, devemos confessar que a Igreja falhou miseravelmente. A Igreja não representou fielmente a si mesma neste mundo – de fato, o fracasso entrou muito cedo em sua história. A ruína da Igreja é completa neste mundo moderno, com a sua multiplicidade de seitas e variedade de doutrinas.
A parte em ruína
Antes de prosseguirmos, será necessário ser claro quanto ao que queremos dizer quando falamos da ruína. É também igualmente necessário saber o que não queremos dizer. Alguns rejeitam a expressão, a ruína da Igreja, não tanto por causa do que ela descreve, mas, antes, por causa da forma como ela é expressada. Por ruína, estamos nos referindo ao testemunho da Igreja neste mundo – o que as pessoas veem e chamam de Igreja; aquilo que professa ser o corpo de Cristo. Não estamos nos referindo ao que Deus está estabelecendo, que é perfeito aos Seus olhos. J. N. Darby, a quem muitos se opuseram sobre este assunto, escreveu: “Em certo sentido, é impossível que a Igreja possa ser arruinada; mas existe confusão em algumas mentes entre os propósitos de Deus e uma presente dispensação na qual o homem é colocado sob responsabilidade. Ao falar da ruína da Igreja, falamos dela enquanto aqui embaixo, estabelecida para manifestar a glória de Cristo em unidade na Terra, e devemos lembrar que ali somos colocados e, uma vez nessa responsabilidade, ali devemos permanecer”.
A parte perfeita
Tire um momento para considerar a Igreja como o corpo de Cristo. Esse corpo é perfeito, indivisível, e Cristo é sua cabeça. No entanto, na prática, a Igreja representou isso perante o mundo? A Igreja honrou a liderança de Cristo? A Igreja foi diligente em manter a unidade do Espírito Santo no vínculo unificador da paz? (Ef 4:3). Quando Paulo escreve, “Para que não haja divisão no corpo” (1 Co 12:25), isso não carrega consigo uma responsabilidade? Paulo tem o cuidado de dizer corpo, não assembleia – o último termo poderia ter ficado ambíguo se alguém escolhesse assim fazê-lo. Não, é aquele corpo do qual ele antes falou: “Porque, assim como o corpo é um e tem muitos membros, e todos os membros, sendo muitos, são um só corpo” (1 Co 12:12).
Vimos anteriormente que Paulo, em sua primeira carta a Timóteo, seu jovem companheiro e cooperador, deu instruções sobre a conduta adequada à casa de Deus (1 Tm 3:15). Nessa carta, Timóteo foi orientado a tratar os erros que estavam avançando (1 Tm 1:3-4, etc.). Havia uma boa luta e um sério empenho no bom combate da fé (1 Tm 1:18; 6:12 – ARA). O caráter da segunda carta de Paulo é notavelmente diferente. Paulo havia combatido o bom combate e sua carreira estava quase no fim (2 Tm 4:7). Timóteo agora estava precisando de encorajamento (2 Tm 1:4-6); ele corria o risco de ser consumido pelas dificuldades do dia. Falatórios profanos estavam levando a uma maior impiedade; mestres tinham se desviado da verdade, e a fé de alguns tinha sido pervertida (2 Tm 2:16-18). Havia uma aparência de piedade, mas o poder dela era negado (2 Tm 3:5). A casa de Deus havia se tornado uma grande casa admitindo doutrinas e pessoas que desonravam a Deus: “Ora, numa grande casa não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de pau e de barro; uns para honra, outros, porém, para desonra” (2 Tm 2:20). Agora não há instrução para que a casa fosse purificada do erro, mas, em vez disso, Timóteo deveria purificar-se de tudo o que fosse contrário à sã doutrina e à piedade. Não podemos sair da casa de Deus, pois somos parte dela; mas podemos encontrar um lugar tranquilo, por assim dizer, no telhado, na presença do Senhor. “É melhor morar num canto de telhado do que ter como companheira em casa ampla uma mulher briguenta” (Pv 21:9 – ACF).
O fracasso durante os dias dos apóstolos
O fracasso começou no tempo dos apóstolos, e eles documentaram isso como aviso e para nossa instrução. Ambos os apóstolos Paulo e João tiveram que contrapor falsos ensinamentos – enquanto uns procuravam misturar princípios judaizantes da lei com o evangelho (Gálatas), outros estavam introduzindo os ensinamentos filosóficos e místicos dos gentios (Colossenses, epístolas de João). Má doutrina leva a uma decadência moral (1 Co 15:32). Os partidos e as dissensões criados por falsos mestres resultaram em conflito e, no final, divisão (1 Co 1:10, 11:18). Por fim, a casa de Deus tornou-se a morada da verdade e do erro, do que é real e da mera profissão, e a expressão prática da unidade do corpo de Cristo se foi.
Ao expor a ruína iminente, os apóstolos não pretendiam nos desanimar; tampouco escreveram para que tivéssemos uma desculpa, mas, sim, para que tivéssemos direção em um dia mau. Não é nosso papel nos ocuparmos com debates religiosos vãos que fomentam contenda e dúvidas (1 Tm 1:4; 2 Tm 2:23). Porém, mais uma vez, o crente não deve se render à maré crescente do erro. Há um caminho seguro de obediência colocado para nós na Palavra de Deus. Timóteo, de sua parte, deveria despertar o dom que estava adormecido (2 Tm 1:6); deveria instruir homens fiéis para que pudessem ensinar a outros (2 Tm 2:2); por fim, ele deveria se purificar dos vasos de desonra. Por si próprio, ele deveria fugir das paixões da mocidade – um caminho de obediência não pode ser mantido enquanto estamos perseguindo nossos desejos naturais – de modo que ele pudesse ser livre para trilhar um caminho de justiça, fé, amor e paz com outros que igualmente invocavam o Senhor com um coração puro (2 Tm 2:22).