Origem: Revista O Cristão – Temor e Ousadia
José e Seus Irmãos
José, o homem tão honrado no final de sua história, poderia muito bem dizer: “Temo a Deus”, pois foi isso que o caracterizou durante toda a sua vida. Foi apenas o eco de suas primeiras palavras registradas no Egito quando ele encontrou o tentador com: “como, pois, cometeria eu tamanha maldade e pecaria contra Deus?” (Gn 39:9). Os irmãos de José careciam completamente desse tipo de temor. José procurou criar esse amor neles. Quando desceram pela primeira vez para comprar cereal, eles ousadamente falavam de sua retidão e fidelidade, dizendo que eram homens verdadeiros e alegavam inocência a uma acusação tão grosseira quanto a de serem “espiões”. Ele lhes disse que temia a Deus, levando-os à Sua presença que é luz, e as trevas foram imediatamente reveladas, a consciência deles foi alcançada e verdadeiros frutos são produzidos. Que mudança! Que contraste! “somos homens honestos” é a linguagem de Gênesis 42:11 (ARA); “Na verdade, somos culpados” é a confissão do versículo 21. Não poderia haver extremos maiores “homens honestos” ou “culpados”; é o entrar na presença de Deus que fez a diferença. Que estado era o deles! E as coisas só iriam piorar até que tudo estivesse na presença de José. Antes que pudesse haver comunhão, os pecados ou falhas devem ser confessados. Esses homens tinham a ver com alguém que conhecia sua história e pecado, mas não conheciam nada de comunhão com ele até que a consciência deles foi alcançada, até que ele se revelou a eles, e sendo admitido por eles todo o pecado, foi perdoado.
O medo de uma má consciência
Má consciência fez estes homens miseráveis serem covardes! Suas jumentas estavam cheias de trigo, e lhes foi dada provisão para o caminho, mas ao parar para dar provisões às jumentas em uma estalagem, um deles viu seu dinheiro em seu saco e exclamou: “Devolveram o meu dinheiro”. Se tivessem sido “homens honestos”, certamente teriam encontrado nisso motivo de gozo e gratidão. Mas, ao contrário, lemos: “Então, lhes desfaleceu o coração, e, pasmavam, dizendo um ao outro: Que é isso que Deus nos tem feito?” (Gn 42:28). Este não era o mesmo temor de Deus que José teve; o temor deles era o temor criado por uma má consciência. Eles temiam porque eram ofensores; José temia que pudesse ofender. Eles tinham o medo da distância de Deus; o de José era o temor da proximidade desfrutada e a comunhão muito valorizada para ser tratada levianamente. Eles tinham o medo do julgamento; José tinha uma qualidade em perfeita conformidade com o favor em que ele estava. Que Deus aumente este temor piedoso em todos os Seus que conhecem a proximidade e queiram mantê-la em todo seu doce prazer!
As feridas de um amigo
José havia ferido seus irmãos, mas eram “as feridas dum amigo” (Pv 27:6) que ele lhes fazia, e muito melhores que beijos, enquanto estavam em tal estado. Era o tato divino de seu paciente serviço, e ele sabiamente os feriu para que uma cura pudesse ser efetuada, o que os deixaria eternamente gratos pela ferida. A natureza poderia ter sugerido dois outros cursos para José. A vingança o teria levado a dizer-lhes o quanto eles eram ruins e, agora que ele tinha a preeminência acima deles, ele a exercitaria em sua destruição. Ou a natureza poderia ter trabalhado em seu outro caráter, exibindo apenas mel.
Medo de Deus e medo do homem
Se José houvesse tratado com seus irmãos da primeira forma mencionada, com juízo e não graça, ao invés de ter sido produzido o “temor de Deus”, somente haveria produzido “o temor do homem”, que é o que arma um laço (Pv 29:25). Por outro lado, se o amor é exibido à custa da verdade, enquanto o erro permanece sem ser confessado, esse amor reflete apenas o descrédito do seu possuidor. José não faria paz à custa da justiça.
Não pode haver verdadeira paz onde não há uma base de justiça, e tanto na justiça como na paz, a dignidade moral de José foi um tanto grandiosa. Nessas três palavras, “temo a Deus”, havia verdadeiro poder moral. O “temor de Deus” é o caminho mais elevado do Cristão para o benefício mais verdadeiro e é tudo o que precisamos para enfrentar as dificuldades ao longo do nosso caminho. Se deixarmos isso de lado, a estrada que eu chamei de “temor de Deus” é substituída pela estrada do “medo dos homens ou das circunstâncias”, onde a incredulidade produz tristeza e desapontamento.
Mas, voltando aos irmãos de José, eles foram a seu pai Jacó e contaram sua história, e quando os sacos foram abertos em sua presença e “viram as trouxinhas com seu dinheiro, eles e seu pai” temeram. Jacó manifesta o mesmo caráter de seus filhos, e ele estava cheio de temor, incredulidade e pressentimentos de calamidade. Pobre Jacó! Quando essas coisas aconteceram com ele, ele orou? Não, “todas estas coisas vieram sobre mim” foi o seu clamor de lamento, pois ele não foi capaz de ver a mão de Deus em nada disso. Mas Deus estava trabalhando em todas essas coisas para que tivesse aquele final que fez Jacó chorar de alegria, e então se ele olhasse para trás, que desperdício encontraria à sua vista! Tudo o que ele havia feito contribuiu somente para dificultar, ao invés de facilitar, o cumprimento dos propósitos de Deus.
