Origem: Revista O Cristão – Sonhos e Visões

Manifestações Divinas

O Senhor Se dirigia a Seu antigo povo em visões. Os olhos então, é claro, percebiam a revelação, pois era alguma espécie de forma perceptível aos sentidos que transmitia a revelação.

Agora, é a que é o foco. Mas a fé percebe seu objeto tão certamente quanto a visão ou a audição percebiam no passado. A fé é “a prova das coisas que se não veem”.

Isaías teve uma visão do trono e dos serafins no templo, que se encheu de fumaça, e ele foi convencido e ficou maravilhado. Em seguida, houve a aplicação em seus lábios da brasa viva de purificação do altar, e ele foi restaurado à paz (Is 6). Podemos ver o mesmo processo, embora por outros instrumentos, nas pessoas de Ezequiel e Daniel (Ez 1; Dn 10).

Temos o mesmo sob o ministério do Senhor Jesus, como aqui sob as antigas visões. Para Pedro, em Lucas 5, o Senhor foi manifestado, por meio da pesca, de uma forma que o deixou maravilhado. Ele então foi convencido de ser um pecador, assim como os profetas que mencionei. Mas as palavras de Jesus restauraram-lhe a paz, assim como os profetas foram restaurados por diferentes instrumentos aplicados a eles. E foi assim também com a mulher samaritana. A Palavra do Senhor primeiro a convenceu, tanto quanto revelou a ela, de sua condição como pecadora, assim como a visão da glória havia convencido Isaías. Mas, em seguida, as palavras do Senhor, da mesma maneira, a restauraram.

E ainda mais adiante, temos os mesmos efeitos com a pregação dos apóstolos. A palavra de Pedro em Atos 2 provocou o clamor: “Que faremos, irmãos?” (ARA), e, em seguida, a palavra dele transmitiu alegria e paz aos que creram. O mesmo efeito do falar simples e inteligível na assembleia dos santos, sem nada de maravilhoso ou miraculoso, é contemplado em 1 Coríntios 14:23-25.

Assim, os mesmos efeitos são produzidos, embora as circunstâncias mudem de visões ou toques palpáveis para o ministério pessoal do Senhor, ou disto para um simples testemunho ou pregação.

Tudo o que é necessário é a percepção da coisa revelada, e a fé faz isso por meio da Palavra, como os olhos fariam na presença de uma visão. Obviamente, o Espírito, nós sabemos, precisa dar a fé.

Outra ilustração disso me ocorre. Eliseu seguiu Elias pela estrada que conduzia Elias à sua trasladação. Tentações cercavam o caminho. Dificuldades se aglomeravam ali, e obstáculos se repetiam. Mas o propósito de alma de Eliseu era fixo e único. Ele se propôs a estar com seu mestre durante todo o caminho até o fim. Ele não queria saber de mais nada, e, por isso, obstáculos, dificuldades e tentações receberam dele uma pronta resposta (2 Rs 2).

Os santos em Tessalônica não tinham nada além de um relato em que se apoiar. Eles não receberam visão, nem milagre. Eles não tinham um mestre em sua companhia, como teve Eliseu, que eles sabiam que seria tomado “por sobre a cabeça deles”, nenhum sinal perceptível para alimentar as expectativas do coração deles. Mas os objetos da fé eram tão reais para eles quanto as coisas perceptíveis eram para Eliseu, e o mesmo efeito foi produzido neles. No espírito de vitória, eles se livraram dos obstáculos, como Eliseu havia feito. Eles se converteram dos ídolos mudos. A fé teve neles sua obra; o amor, seu trabalho; a esperança, sua paciência. Eles serviam ao Deus vivo e esperavam o Filho vir dos céus.

Será que tudo isso foi algo menos do que Eliseu seguindo Elias por todo o caminho de Gilgal até o outro lado do Jordão, passando por Betel? Os tessalonicenses, tão certamente quanto o profeta, tinham seus lombos cingidos e suas lâmpadas acesas, e eram como homens que esperavam pelo seu Senhor. A fé em um relato divino operou eficazmente neles tanto quanto a presença palpável de um mestre operou nele.

E o mesmo fruto foi produzido. Tudo o que nos falta é perceber nosso objeto, e a fé faz isso tão bem quanto a visão, o tato ou a audição.

Mas o efeito de uma manifestação de Deus, embora não dependa necessariamente de algo palpável, como uma visão ou um milagre, terá de ser medido pela condição da alma à qual é feita. É assim, e essa é uma importante verdade moral. E isso a Escritura ilustra para nós também.

Jacó havia agido muito errado ao lado da cama de seu pai (Gn 27), e em Betel ele estava provando a amargura de seus atos, agora um andarilho da casa de seu pai, sem amigos e desabrigado. Na glória da bondade, Deus Se manifesta a ele. Os céus abertos, a escada e os anjos proporcionaram uma maravilhosa resposta da graça de Deus a alguém como Jacó naquele momento. Mas assim foi. O Senhor é maravilhoso para os Seus santos, mesmo quando eles sofrem debaixo das repreensões d’Ele por causa de seus malfeitos.

Jacó foi, depois disso, muito incrédulo em Peniel (Gn 32). Ele temeu o exército de Esaú na presença do exército de Deus. Ele desviou seu olhar do Senhor para a criatura; ele tremeu, calculou e orou, como se Aquele que era por ele não fosse mais do que aquele que era contra ele, mesmo Um sendo Deus e o outro, homem. O Senhor repreende isso – certamente repreende. Ele resiste a Jacó. Mas, Jacó se mantendo firme diante dessa repreensão, com sua fé reavivada, e agarrando-se ao Senhor, o Senhor lhe dá uma maravilhosa manifestação de Sua graça, permitindo-lhe prevalecer sobre Ele e lhe dando então um novo nome e uma nova bênção.

Esses foram os elementos da história de Jacó nessas duas grandes ocasiões, em Betel e em Peniel. Mas a experiência desse santo de Deus foi diferente em cada ocasião.

Em Betel, a experiência de Jacó foi de natureza mista. Ele disse que o lugar era “terrível” e, ainda assim, “a porta do céu” (TB). Ele foi encorajado pela visão, mas dificilmente podemos dizer que se alegrou com ela. Mas em Peniel tudo foi alegria para ele. Ele tem um júbilo, um triunfo santo, em seus lábios e se dirige à sua jornada como que à luz da face de Deus. Aqui está uma diferença, e uma diferença que se explica pela condição do próprio santo (não pela manifestação), pois a de Betel foi superior.

Em Betel não havia nele nenhum exercício de espírito como houve em Peniel. Lá, ele estava dormindo; aqui, ele estava acordado. Lá, ele simplesmente sofreu uma ação; aqui ele se recuperou e se mexeu. Havia diferenças morais na mesma alma e, consequentemente, experiências diferentes. Peniel foi mais para Jacó do que havia sido Betel, pois uma manifestação de Deus é mais para um santo que está acordado do que para um que está adormecido. Assim é hoje, da mesma forma como é visto que foi nos primórdios dos patriarcas.

E aqui deixe-me contrastar Moisés na visão na penha (ou rocha) fendida com Jacó em Betel ou Peniel (veja Êxodo 33-34). Moisés suplica ao Senhor e roga para que lhe seja mostrado “o Teu caminho”. O que ele até então tinha ouvido sobre o Senhor não serviria para Moisés. Ele já O tinha visto como o Legislador e como o Senhor da aliança condicional, e até mesmo comeu e bebeu em Sua presença junto com 70 dos anciãos de Israel (Êx 19, 24). Mas tais manifestações de Deus não serviriam. Moisés não estava satisfeito. E com razão, pois Israel estava naquele momento, debaixo de seus próprios olhos, em ruínas morais; estava tudo acabado para eles nos termos da lei ou sob sua própria aliança. Moisés, portanto, precisava ver Deus à Sua própria maneira. Precisava conhecê-Lo, como ele agora diz a Deus – conhecê-Lo em soberana graça.

O Senhor promete fazer como Seu servo assim ansiava. Ele deixará Sua glória passar diante dele, “toda a Minha bondade”, Sua soberana graça, a graça que, como no evangelho, é abundante. E Ele assim o faz.

Moisés está profunda e plenamente satisfeito. Ele se curva e adora. Ele não pede mais nada – não pede mais manifestações de Deus –, apenas deseja que Deus, que agora havia descido, e permanecido com ele, e passado em Sua própria glória, pudesse seguir o caminho com ele e com Israel.

Essa foi, de fato, uma experiência abençoada. Foi como “um transbordar e derramar numa corrente viva e vivificante”. E por que esse rico prazer? Moisés havia buscado isso. Ele não estava dormindo sob a visão, como Jacó em Betel, nem tinha simplesmente se recuperado sob ela, como Jacó em Peniel; ele próprio a havia buscado. Foi o exercício de espírito que o levou à visão e, portanto, ele estava preparado para o poder total dela; e o poder total dela foi o que ele teve.

J. G. Bellett

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