Origem: Revista O Cristão – Os Mistérios

Os Mistérios nas Escrituras

Ao abordar o assunto dos mistérios na Palavra de Deus, é importante entendermos o que a palavra significa na Escritura. Em vez de transmitir a ideia de enigma ou algo difícil de entender, a palavra tem o sentido de algo que é conhecido por alguns, mas não por outros. Entre os gregos antigos, havia cerimônias e ritos relacionados a certas sociedades secretas, e somente aqueles iniciados no grupo possuíam o conhecimento deles. É nessa conotação que devemos entender a palavra “mistério” na Escritura. Vale ressaltar que, embora a palavra ocorra vinte e três vezes no Novo Testamento, ela nunca ocorre no Velho Testamento. Veremos que isso é significativo.

Na Escritura, a palavra também dá o pensamento daquilo que está fora do domínio da compreensão natural e que, portanto, só pode ser conhecido pela revelação divina e no momento em que Deus decide revelá-la. Está sempre conectada com algo que Deus escolheu revelar. Como alguém já disse de maneira apropriada: “No sentido comum, um mistério implica conhecimento retido; seu significado bíblico é a verdade revelada”. O Senhor Jesus primeiro usa a palavra em Mateus 13:11, ao falar dos “mistérios do reino dos céus”. Aqui Ele afirma claramente que a alguns foram dados conhecer esses mistérios, enquanto a outros não. Outros mistérios seguem no Novo Testamento, notadamente o mistério de Cristo e a Igreja, mas também o mistério da iniquidade, o mistério da piedade e outros. Nesses e em outros casos em que a palavra é usada, é uma nova revelação adequada ao caráter celestial da Igreja, ou à natureza atual do tratamento de Deus, visto como uma interrupção do curso dos eventos terrenais preditos nos profetas antigos. Esses mistérios não foram revelados em outros momentos, mas na sabedoria de Deus eles são revelados agora. No entanto, mesmo agora, eles são revelados a alguns, mas não a outros.

Os caminhos de Deus 

Em vista de tudo isso, alguns podem perguntar por que Deus escolheu ter esses mistérios e revelar certas coisas em determinados momentos para alguns, mas não para outros. Além disso, por que essas coisas não foram reveladas no Velho Testamento? A resposta exalta os caminhos de Deus, de modo que somos levados a dizer, como Paulo disse: “O profundidade das riquezas, tanto da sabedoria, como da ciência de Deus! Quão insondáveis são os Seus juízos, e quão inescrutáveis os Seus caminhos!” (Rm 11:33). Ainda que Deus certamente pudesse ter revelado, no Velho Testamento, certas verdades como fatos, elas teriam sido apenas verdades no intelecto e sem o efeito moral sobre aqueles a quem foram reveladas. A revelação completa aguardava a vinda de Cristo ao mundo. O Novo Testamento é conectado com os conselhos celestiais de Deus, enquanto o propósito das profecias do Velho Testamento é tornar conhecidos Seus conselhos terrenais. Em vez de herdar as promessas do Velho Testamento e cumprir as profecias do Velho Testamento, a Igreja forma o contraste mais absoluto com eles. São tão diferentes que os dois não podem existir juntos. Enquanto os propósitos de Deus sobre a Terra estavam sendo revelados, o mistério da Igreja estava oculto. Enquanto o mistério da Igreja está sendo revelado, os propósitos de Deus sobre a Terra estão suspensos.

Os propósitos de Deus em Cristo 

Mas o desejo de Deus é sempre conectar a revelação, antes de tudo, com Sua glória, e depois com um relacionamento conhecido e desfrutado com Sua criatura. Quando Cristo veio a este mundo, Deus foi totalmente revelado, e então, por meio de Paulo, Seus propósitos em Cristo foram totalmente revelados. O entendimento dos mistérios está ligado primeiramente com essa preciosa verdade – que Deus agora é revelado em Cristo. Os mistérios revelados, em vez de serem meros fatos, estão agora conectados com Aquele que é o Objeto de todos os propósitos de Deus e em Quem “também fomos feitos herança” (Ef 1:11).

Além disso, a revelação do supremo mistério, o de Cristo e a Igreja, não foi dada até que Cristo tivesse sido glorificado e assentado à destra do Pai. Em vez de termos sido levados ao bem de uma verdade que simplesmente conhecemos, podemos agora olhar para os céus abertos e ver “a luz para iluminação do conhecimento da glória de Deus, na face de Jesus Cristo” (2 Co 4:6). Assim, a revelação dos mistérios – e, em particular, o mistério de Cristo e a Igreja – está ligada à completa revelação de Deus em Cristo e com Cristo glorificado. Que substância e plenitude tudo isso dá à revelação de Deus! É no pleno conhecimento do mistério de Deus (que diz respeito aos Seus propósitos em Cristo) que “estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência” (Cl 2:3). Assim, a revelação desse mistério, e outros que a ele estão relacionados, não poderia ocorrer até que Cristo, e todos os propósitos de Deus n’Ele, tivessem sido manifestados.

Conhecimento e conformidade moral 

Ao dizer que esses mistérios, mesmo agora, são conhecidos por alguns e não por outros, precisamos deixar claro que Deus, neste momento, não está deliberadamente mantendo alguns em ignorância, enquanto ilumina outros. Assim como foi nos dias em que nosso Senhor estava na Terra, assim é hoje; ou seja, há alguns que de boa vontade gostariam de ter o conhecimento do que Deus está fazendo, mas sem o efeito moral disso em sua vida. Havia aqueles nos dias de nosso Senhor que procuravam sinais e maravilhas, e até apreciavam Seu ensino, mas que não queriam seguir um Cristo rejeitado. Com relação a eles, nosso Senhor diria, como Ele faz hoje: “Porque àquele que tem, se dará, e terá em abundância; mas àquele que não tem, até aquilo que tem lhe será tirado” (Mt 13:12). Este versículo, com pequenas variações, é repetido cinco vezes nos quatro evangelhos, nos mostrando que não podemos ter a teoria da verdade em nossa cabeça sem o efeito prático dela em nossa vida. O mero conhecimento intelectual será tirado de nós, mas Deus está pronto para revelar esses mistérios hoje a todos que vieram com uma fé simples, reconhecendo Seu Filho como Salvador e Senhor, e desejando segui-Lo. Contudo, Deus não revelará Seus mistérios ao homem natural (que “não compreende as coisas do Espírito de Deus” – 1 Co 2:14), nem os revelará ao Cristão infiel e mundano.

Os santos do Velho Testamento 

Mas aqueles santos piedosos do passado, que viveram antes de todos esses mistérios serem revelados, perderão? Não, de maneira nenhuma. Os santos do Velho Testamento, embora não estejam no local de proximidade de que a Igreja desfruta, certamente apreciarão e gozarão, como “amigos do noivo”, a revelação eterna do mistério. Quando Deus cumprir plenamente Seus propósitos em Cristo de “congregar em Cristo todas as coisas tanto as que estão nos céus como as que estão na terra” (Ef 1:10), todos os remidos, seja no céu ou na Terra , apreciarão o mistério. Tudo será revelado, para a glória de Deus e nossa bênção. Nós apreciamos o mistério agora; naquele dia todos os remidos entrarão nele. Em verdade, podemos dizer, com Paulo: “Porque d’Ele e por Ele, e para Ele, são todas as coisas; glória, pois, a Ele eternamente. Amém” (Rm 11:36).

“Deus e o Cordeiro lá estarão
A luz e o templo serão,
E os exércitos radiantes pra sempre compartilharão
O mistério revelado”.

W. J. Prost

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