Origem: Revista O Cristão – Ressurreição
A Primeira Ressurreição
Talvez não haja nenhum ponto em que a Igreja em geral tenha se afastado mais amplamente daqueles hábitos de pensamento, sentimento e expressão, que caracterizaram o Cristianismo apostólico, do que o lugar dado à morte, por um lado, e à ressurreição, por outro. Com os apóstolos e com os Cristãos daqueles dias, a morte foi, por assim dizer, deixada para trás. A Ressurreição, ou melhor, a vinda d’Aquele que eles conheciam como “a Ressurreição e a Vida”, era o único objeto de seu regozijo e triunfante esperança.
O que torna a morte realmente terrível é o fato dela ser a sentença justa de Deus sobre a humanidade como pecadora, e também, a conexão dela com aquela morte eterna que, para os incrédulos, é tanto o tipo quanto o portal, e sua importância como a expressão da escravidão a Satanás que “tinha o poder da morte” contra todos os que eram seus escravos.
Os primeiros Cristãos sabiam como a morte tinha sido suportada por Cristo a favor deles, e assim, tinham sido poupados de todo o seu terror. A sentença contra seus pecados havia sido executada em Jesus; e para eles, a entrada para a morte eterna havia sido assim fechada por Aquele que eles conheciam como o Libertador da “ira vindoura”. Quanto a Satanás, a ressurreição de Cristo foi para os Cristãos a demonstração de que pela morte Ele havia vencido aquele que tinha o poder da morte.
Um inimigo conquistado
Assim, a morte era considerada por aqueles Cristãos como um inimigo conquistado. Eles estavam acostumados a falar de Jesus como Aquele “que anulou a morte e trouxe à luz a vida e a incorruptibilidade pelas boas novas” (2 Tm 1:10 – JND). Participantes conscientes da vida ressuscitada de Cristo – Cristo ressuscitou sendo, de fato, a vida deles – eles olharam para trás para a Sua morte por eles como tendo esvaziado todas as demandas sobre eles, seja da lei ou da justiça divina ou de Satanás ou da morte. Assim, sendo um com Cristo em Sua vida e participando de Sua vitória, eles alegremente procuraram manifestar “o poder de Sua ressurreição” ao morrer, praticamente, para si mesmos, para o pecado, para o mundo e para todas as esperanças ou pensamentos de qualquer descanso ou porção aqui.
O pecado apresentou as suas tentações? Como podemos, nós que estamos mortos para o pecado, vivermos ainda nele? A carne implorou por complacência? “De maneira que, irmãos, somos devedores, não à carne para viver segundo a carne” (Rm 8:12). De onde é tirada essa conclusão? Da declaração que imediatamente a precede: “Se, porém, Cristo está em vós, o corpo, está morto por causa do pecado, mas o Espírito é vida, por causa da justiça” (v. 10 – JND)
O mundo convidou para um caminho mais fácil? Eles se gloriavam unicamente na cruz de Cristo, e por ela foram crucificados para o mundo e o mundo para eles. Havia a consideração do perigo de as ordenanças do Velho Testamento retomarem seu poder sobre a mente? “Se, pois, estais mortos com Cristo quanto aos rudimentos do mundo, por que vos carregam ainda de ordenanças, como se vivêsseis no mundo”? (Cl 2:20).
A posição Cristã
Em suma, toda a posição deles e caminhada era a de homens mortos e ressuscitados. “Portanto, se já ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas que são de cima, onde Cristo está assentado à destra de Deus. Pensai nas coisas que são de cima e não nas que são da Terra. porque já estais mortos, e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus. Quando Cristo, que é a nossa vida, Se manifestar, então também vós vos manifestareis com Ele em glória. Mortificai, pois, os vossos membros que estão sobre a Terra” (Cl 3:1-5).
Os Cristãos ainda estavam na Terra, é verdade, e eles tinham más tendências que precisavam ser colocadas no lugar de morte. Havendo Deus, em Sua graça, os identificado em vida e glória com o próprio Cristo, ressuscitado e ascendido, tornou-se o privilégio deles pensar somente naquelas coisas às quais foram assim introduzidos, considerando-se mortos para todas as demais. Isso levou, necessariamente, a um caminho de renúncia própria que parecia loucura para aqueles que não conheciam o segredo da esperança deles a respeito da ressurreição. Na verdade, o próprio apóstolo diz: “Se esperamos em Cristo só nesta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens” (1 Co 15:19). Mas, a ressurreição era a esperança deles. Cristo, as primícias, havia ressuscitado, e eles sabiam que nunca seriam deixados aqui.
Nem todos dormiremos
Isso não quer dizer que eles não pensaram sobre a certeza da morte no sentido literal. “Nem todos dormiremos”, diz o apóstolo, “mas todos [isto é, adormecidos ou acordados] seremos transformados” (1 Co 15:51). Eles contavam com a ressurreição. Eles poderiam adormecer [morrer], como já ocorrido com alguns de seus irmãos, mas morrendo ou não, o mundo era para eles já selado com o caráter da morte. O que eles procuravam era a comunicação da vida ao corpo, vida já desfrutada pela alma deles em sua unidade com o Cristo ressuscitado e ascendido.
Eles esperavam o aparecimento de Cristo, a Ressurreição e a Vida, quando a mortalidade seria tragada pela vida. Eles sabiam que era por Ele que seus irmãos que haviam partido estavam esperando. E embora os apóstolos e os primeiros Cristãos considerassem melhor partir e estar com Cristo, ausentes do corpo e presentes com o Senhor, eles não consideravam a morte e a felicidade individual, após a morte, como o objeto das esperanças que tinham. Muito menos ela poderia ser o objeto de temores.
Morte como uma serva
A morte pertencia a eles, e eles sabiam isso de tal forma que, em vez de considerar a morte como um oficial de justiça, com poder absoluto sobre eles, puderam vê-la como uma serva que poderia ser empregada por seu Senhor para retirá-los dos conflitos e tristezas da cena atual, e para o descanso com Ele até o momento de Sua vinda. Mas foi para este momento que eles olharam e esperaram. Ou seja, para vê-Lo e ser perfeitamente conformados a Ele, no corpo, bem como no espírito, para que Ele pudesse ser, assim, de acordo com o propósito eterno de Deus, o Primogênito entre muitos irmãos.
Foi essa expectativa viva que tornou os apóstolos, e os primeiros Cristãos, o que eram. Foi por isso que eles foram inspirados com coragem, armados com fortaleza, dotados de mansidão, e se alegraram em perder o que os outros viveram para obter. Isso lhes permitiu o abundante regozijo em meio a aflições que parecem bastante severas para a mente natural. Tinham em si mesmos a sentença de morte, para que não confiassem em si mesmos, mas em Deus, que ressuscita os mortos.
Incerteza atual
Por que o Cristianismo dos dias de hoje se assemelha tão pouco ao deles? Por que a incerteza e a falta de confiança se apresentam como uma queixa quase universal? Por que o medo da morte, o afastamento da cruz, o amor do prazer e da facilidade, e o temor até mesmo da censura do mundo, nos caracteriza tanto nestes dias? Sem dúvida tem havido um grande afastamento da simplicidade de Cristo. Estando o Espírito Santo entristecido, o tom geral do caráter e da experiência Cristã é prejudicado, e o poder da verdade divina, como um todo, grandemente diminuído. Existe uma necessidade solene de juízo próprio e humilhação pessoal em todos esses aspectos.
Embora admitindo isso e orando para que agrade a Deus insistir no sentido disso em nossa alma, não devemos também indagar se as verdades pelas quais os primeiros Cristãos foram tão poderosamente influenciados são mantidas por nós? Ou se, sem dúvida, elas são mantidas por nós quanto à teoria geral, se elas também são mantidas nas mesmas relações e proporções que pelos apóstolos e seus companheiros Cristãos daquela época?
A Igreja tem a sua existência em virtude da morte e ressurreição de Jesus. A vida pela qual ela é animada é a vida d’Ele, como ressuscitado da morte que Ele sofreu pelos nossos pecados, pela infinita eficácia de tal morte esses pecados são aniquilados. Em Efésios 1-2, onde o Espírito Santo revela uma verdade além disso, essa verdade é mais notavelmente desenvolvida. A verdade ali, especialmente revelada, é a da associação da Igreja com Cristo, não apenas como ressuscitado, mas como ascendido também. Mas a ascensão implica ressurreição, e nossa participação na ressurreição de Cristo é, além disso, expressamente declarada.
A sobreexcelente grandeza de Seu poder
“a sobreexcelente grandeza do Seu poder sobre nós, os que cremos, segundo a operação da força do Seu poder, Que manifestou em Cristo, ressuscitando-O dentre os mortos, e pondo-O à Sua direita nos céus” (Ef 1:19-20 – ACF). “Mas Deus, que é riquíssimo em misericórdia, pelo Seu muito amor com que nos amou, estando nós ainda mortos em nossas ofensas, nos vivificou juntamente com Cristo (pela graça sois salvos), e nos ressuscitou juntamente com Ele, e nos fez assentar nos lugares celestiais, em Cristo Jesus” (Ef 2:4-6).
Assim, mesmo agora, a Igreja é participante da vida ressurreta, bem como da exaltação celestial de Jesus. Essa vida ainda não foi comunicada ao nosso corpo e, portanto, ela é em espírito, ainda não estamos de fato nos lugares celestiais. “Carne e sangue não podem herdar o Reino de Deus, nem a corrupção herda a incorrupção [incorruptibilidade – JND]” (1 Co 15:50). A ressurreição de nosso corpo nos colocará realmente onde nossa unidade com Cristo, pelo Espírito Santo, agora nos coloca espiritualmente – nos lugares celestiais para onde nosso Senhor ressuscitado ascendeu e onde Ele Se assentou.
É certamente de toda a importância ter tal testemunho de que a ressurreição da Igreja é, em um princípio comum com o de sua Cabeça glorificada. E isso é em virtude de sua associação com Ele na vida, na herança e na glória!