Origem: Revista O Cristão – A Defesa da Família

Primeiro Aquilo que é Natural

Uma irmã mais velha um dia estava doando o seu tempo para uma jovem mãe, ajudando com várias coisas que precisavam ser feitas na casa. A mãe também trabalhava enquanto interagia com seus filhos pequenos, e a irmã mais velha ouviu repetidas referências ao “novo homem” e ao “velho homem”, bem como outros termos do Novo Testamento, à medida que a mãe orientava e corrigia as crianças. Finalmente, a irmã mais velha disse à mais jovem: “Irmã, talvez você devesse simplesmente dizer a eles o que fazer. Primeiro o que é natural, depois o que é espiritual”. A passagem citada parcialmente na exortação da irmã mais velha diz o seguinte: “Assim está escrito: O primeiro homem, Adão, foi feito alma vivente. O último Adão espírito vivificante. Mas não é primeiro o espiritual, e sim o natural; depois, o espiritual” (1 Co 15:45-46 – ARA).

O significado primário (a interpretação) dessa passagem refere-se à ordem (sequência) da colocação de Deus do primeiro homem, Adão, na Terra seguido pelo último Adão (nunca haverá outro), e passa a descrever a diferença do caráter e ação do primeiro (natural e terrenal) versus o último (espiritual e celestial). No relato acima, no entanto, a irmã mais velha estava aplicando a passagem, com sabedoria, de maneira prática. A maioria de nós tem responsabilidade e cuidado com outros em nossa vida, sejam nossos filhos e netos em nossa família, jovens na assembleia ou até mesmo funcionários sob nossos cuidados no local de trabalho. Basicamente, o ponto enfatizado por ela era não ignorar a instrução e o treinamento nas coisas naturais, em nosso zelo pelas coisas espirituais.

Temos claro para nós que o homem natural não compreende (nem pode compreender) as coisas do Espírito de Deus (1 Co 2:14) e que sem fé é impossível agradá-Lo (Hb 11:6). Antes de Deus iniciar uma obra em nossa alma, estávamos ainda fracos, sem esperança e sem Deus no mundo (Rm 5:6, 8; Ef 2:12). Toda e qualquer bênção, para qualquer alma a qualquer momento, é com base no sangue derramado de Cristo na cruz do Calvário: “não há diferença. Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (Rm 3:22-23). A fé em Cristo é o único fundamento da nossa aceitação n’Ele.

Orientando os filhos quanto ao bom comportamento 

No entanto, notamos na parábola de Mateus 22 que, depois que o convite do rei para as bodas de seu filho foi recusado por todos os convidados, ele enviou seus servos que, “saindo pelos caminhos, ajuntaram todos quantos encontraram, tanto maus como bons” (v. 10). Será que o fato de haver “tanto maus como bons” entra em conflito com Romanos 3:22-23, que diz que “não há diferença”? De forma alguma; Romanos 3 aborda a condição universal e caída de todos os homens mediante o pecado, enquanto Mateus 22 observa diferenças comparativas no caráter prático dos homens. Tanto os bons quanto os maus precisavam de “uma veste nupcial” fornecida pelo rei, pois a respectiva bondade de alguns não era adequada para aceitação na presença do rei. Mas, mesmo assim, é melhor ter sido bom do que mau. Por quê? Porque o poder transformador do Espírito Santo que habita e guia o crente opera dentro de nós para produzir “frutos de justiça que são por Jesus Cristo, para a glória e louvor de Deus” (Fp 1:11), começando a partir de onde estamos, na prática, em nossa alma. É neste último aspecto que podemos ajudar nossos filhos e os mais jovens a uma fé real em Cristo, na maioria dos casos até mesmo antes da conversão, orientando-os em hábitos práticos e bom caráter. Existem tendências pessoais, familiares ou mesmo nacionais ou étnicas que devem ser superadas em maior ou menor grau, para podermos andar dignos de Deus. “Os cretenses são sempre mentirosos, bestas ruins, ventres preguiçosos”, Paulo citou isso em sua carta a Tito. Ele deveria repreendê-los severamente, não para que a carne deles melhorasse, mas “para que sejam sãos na fé”, não permitindo que essas tendências do pecado reinassem em sua vida (Tt 1:12-13; Rm 6:11-13).

O progresso da instrução 

Novamente, não se trata de melhorar a carne – a natureza interior e caída de um homem, que Deus condenou (Rm 8:3) –, pois “o que é nascido da carne é carne” e “na minha carne, não habita bem algum” (Jo 3:6; Rm 7:18). Somente o Espírito de Deus pode produzir em uma vida aquilo que, do ponto de vista prático, tem a aprovação de Deus. Mas aqueles que se entregaram a uma vida descuidada e indisciplinada, seja antes ou depois da conversão, têm desafios significativos e difíceis de superar para produzir em sua vida prática, pela fé e pelo Espírito de Deus, aquilo que é agradável a Ele. A cova cavada ou o muro quebrado não são reparados automaticamente ao se crer em Cristo, pois “Deus não Se deixa escarnecer; porque tudo o que o homem semear, isso também ceifará” (Ec 10:8; Gl 6:7). Instruir cedo os jovens é vital nesse sentido, como também orientar os jovens adultos. Um muro quebrado não é reparado rapidamente, e uma maior exposição imoral torna difícil para os jovens progredirem em seu crescimento, na santificação prática.

O desejo de experiência sexual 

O fracasso em instruir nossos filhos de forma eficaz nas coisas naturais pode ter um efeito cascata na vida deles. Por exemplo, a maneira bíblica de acomodar o desejo de experiência sexual é o casamento: é melhor casar do que abrasar-se. Sinto que muitos rapazes não levam isso muito a sério, até perceberem que estão com um problema e agindo de forma imprópria em sua virgindade e se envolvendo com fornicação ou impureza. Muitas vezes, a causa raiz desse problema está nas primeiras fases da vida; é preciso diligência para agir conforme Provérbios 24:27: “Cuida dos teus negócios lá fora, Põe o teu campo em condições, E depois edifica a tua casa” (TB). Quem poderia prever que nossa diligência como estudantes de seis, dez ou doze anos, ou talvez trabalhando para nossos pais quando meninos, estabeleceria as bases para a ordem e felicidade futuras, para nos regozijarmos com a esposa de nossa mocidade? Deus antecipa isso e estabelece orientação em Sua Palavra “para se dar prudência ao simples, conhecimento e discrição ao mancebo” (Pv 1:4 – TB). A instrução na juventude acerca das coisas naturais, que pode ser apresentada num contexto espiritual tal como na Palavra, pode permitir que os jovens evitem severos desafios após a conversão mais tarde na vida (isto serve também para aqueles que já são salvos).

Depravação moral e a imagem de Deus 

Pode haver entre nós uma tendência a enfatizar em excesso a verdade sobre a depravação moral do “velho homem”, a ponto de excluir a apropriada apreciação do homem como sendo “a imagem e a glória de Deus” (1 Co 11:7). O homem é a criação especial de Deus, em quem Ele colocou qualidades que refletem as Suas próprias, com um espírito projetado para interagir com o Seu próprio Espírito, com poderes intelectuais capazes de pensamentos complexos e abstratos, e com sentimentos de uma natureza sensível e elevada relacionados a essas outras habilidades. Quão maravilhoso é saber que os deleites de Deus nos filhos dos homens “antes de existir a Terra” (Pv 8:23 – TB) se realizarão “naquele dia” na nova criação e continuarão mesmo após esta “Terra e tudo o que nela há” deixarem de existir. Os homens redimidos terão a imagem d’Aquele que é celestial, o último Adão, tendo sido restaurados à semelhança de Deus pela obra da cruz do Calvário e pelo poder transformador do Espírito Santo neles. Como Deus ama o homem!

Manifestando o fruto do Espírito 

À luz do propósito de Deus de congregar todas as coisas em Cristo para Sua glória eterna, Seu desejo (e o nosso) hoje é que os Seus sejam “em tudo, ornamento da doutrina de Deus, nosso Salvador” (Tt 2:10) por meio de uma vida prática que manifeste o fruto do Espírito em correta ordem e na firmeza da fé em Cristo (Cl 2:5). Hoje, os esforços de Satanás no mundo ocidental não são apenas para bloquear a manifestação e o entendimento das coisas espirituais, mas para atacar a ordem da vida natural no homem. A crescente promoção da confusão de gênero, o desprezo dos papéis tradicionais de homem e mulher e jovens e velhos, a aceitação cultural da promiscuidade e impureza sexual, a relutância em casar e ter filhos e a falta de vontade de aprender e “exercer ocupações honestas” (Tt 3:14 – ARA margem), tudo isso serve à desonra de Deus em Sua criação do homem e ao aumento da confusão e sofrimento do homem.

A importância da instrução 

Tudo isso aponta para a importância de instruir nossos filhos e jovens nessas coisas naturais, conforme apresentado no livro de Provérbios e nas porções práticas do Novo Testamento – em diligência, integridade, pureza e ordem. A fé pessoal em Cristo é o fundamento da eterna e abençoada posição que temos em Cristo; o fundamento de uma vida prática que honra a Cristo agora neste mundo começa para os mais jovens nas coisas mais simples do lar, continuando ao longo do tempo nos círculos familiar e da assembleia e no local de trabalho. Tomando emprestada uma expressão, que o Senhor não faça uma rotura em nós como resultado de não O buscarmos segundo a ordenança (1 Cr 15:13). “Primeiro o natural; depois o espiritual” (1 Co 15:46 – ACF).

B. Conrad

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