Origem: Revista O Cristão – Primogênito

O Princípio

Desejamos chamar a atenção para um novo princípio ou começo, que nos introduz à perspectiva de um dia eterno de radiante gozo. Este novo começo é CRISTO – Cristo em ressurreição, Cristo como o Primogênito dentre os mortos. Para entender isso, uma consideração deve feita acerca do termo, “o primogênito dentre os mortos” (Cl 1:18). A morte é, portanto, apontada como o fim do antigo período, e a ressurreição como o início da nova ordem das coisas. A morte foi a consequência do pecado, e a cruz de Cristo foi realmente o término da provação de Deus para com o homem sob responsabilidade. O primeiro homem chegou ao fim ali, sob o justo julgamento de Deus. Até que isso seja visto, não pode haver apreensão adequada do significado da ressurreição de Cristo.

O início da nova criação 

Juntamente com o desaparecimento do primeiro homem de diante dos olhos de Deus, o mundo em que ele viveu foi julgado, e seu príncipe foi expulso. Houve, portanto, se assim podemos dizer, uma “limpeza completa”, o término de tudo. O primeiro homem e seu mundo caíram sob uma condenação comum. Mas isso apenas deu ocasião para a revelação dos conselhos eternos de Deus. Antes da fundação do mundo, Deus, na soberania de Sua graça, havia escolhido um povo em Cristo, para que eles fossem santos e irrepreensíveis diante d’Ele em amor. O fundamento para o cumprimento desses conselhos foi estabelecido na morte e ressurreição de Cristo. Sua morte foi o fim da história do homem responsável na carne. Sua ressurreição, embora tenha sido a demonstração de Seu poder vitorioso sobre o pecado, a morte e Satanás, foi também o início da nova criação, da qual Ele é o centro e a glória, e na qual todas as coisas se fazem novas, adequadas à Sua condição tanto quanto o Segundo Homem, que é do céu.

Cristo em encarnação 

Não se deve esquecer que Cristo, em encarnação, era o Segundo Homem, e é somente quando nos lembramos disso que podemos entender a linguagem de João, que fala d’Ele como “desde o princípio”. Esse “princípio” datava de Sua introdução neste mundo. Mas, embora Ele fosse o Segundo Homem quando Se tornou carne e habitou entre nós, Ele não estava na condição do Segundo Homem antes de Sua ressurreição. Em Sua vida aqui, Ele estava na forma de Servo, na forma de homem, “em semelhança da carne do pecado”. Na ressurreição, tudo isso foi mudado, e agora, pela primeira vez, o pensamento eterno de Deus para o homem em redenção foi realizado e estabelecido. É por esse motivo que Ele é denominado “o princípio” nessa Escritura (Cl 1:18), e as palavras, “o Primogênito dentre os mortos”, são adicionadas para destacar o fato de que Ele Se tornou o Primogênito na ressurreição. A expressão semelhante em Apocalipse 3:14, “o princípio da criação de Deus”, difere apenas nisso, que aqui nossa atenção é direcionada à natureza e ao caráter da nova criação, vistos em Cristo ressuscitado e glorificado.

Primogênito de toda a criação 

Uma palavra deve ser dita quanto ao contexto em Colossenses. Imediatamente após descrever nosso bendito Senhor como o Primogênito dentre os mortos, ele prossegue: “para que em tudo tenha a preeminência”. O apóstolo já havia falado d’Ele como o “Primogênito de toda a criação” (Cl 1:5) e explica que este lugar pertence a Ele em virtude de Ele ser o Criador: “porque n’Ele foram criadas todas as coisas que há nos céus e na Terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades; tudo foi criado por Ele e para Ele. E Ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por Ele” (Cl 1:16-17). Se o próprio Criador entra, por assim dizer, em Sua própria criação, Ele deve, necessariamente, ocupar o primeiro lugar, e esta é uma das glórias de Sua supremacia. Então, ao nos introduzir no novo círculo da Igreja, somos também lembrados de que Ele tem o primeiro lugar nela, pois Aquele que é a Cabeça do Seu corpo, a Igreja, é o Princípio, o Primogênito dentre os mortos, para que em todas as coisas Ele tenha a preeminência. Assim, onde quer que Cristo esteja, seja considerado em conexão com a primeira criação ou com a nova, Ele é o Primeiro, na preeminência absoluta de Suas glórias pessoais e adquiridas.

Cristo nossa vida em ressurreição 

Mas o ponto a ser enfatizado neste momento é que, se Deus agora data tudo (falamos com reverência) a partir da ressurreição de Cristo, nós também devemos fazer isso, se desejamos estar em comunhão com Sua mente. Pense por um momento no indizível significado dessa verdade. Todos os homens estão em um estado de morte espiritual, e os Cristãos estão, pela graça de Deus, associados à morte de Cristo, de modo que se pode dizer deles: “porque já estais mortos, e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus” (Cl 3:3). Há apenas um Homem, portanto, diante dos olhos de Deus, apenas Um em vida, a própria Vida, e Esse é Aquele que é o Primogênito dentre os mortos. Que é Ele que é a nossa vida, também é abençoadamente verdade, mas é Ele que é isso, e Ele é a nossa vida em ressurreição. Ele é, consequentemente, o nosso novo começo, e Sua ressurreição será investida de nova luz e poder para nossa alma. Ao adentrarmos nisso, não estaremos ocupados com nosso nascimento neste mundo ou com tempos e estações, mas tudo para nós estará associado a Cristo ressuscitado da morte e glorificado.

Cristo é o nosso começo 

Todos admitirão essa verdade como doutrina, mas o que queremos é estar no poder da verdade. Depois que uma nova língua é aprendida, muitos continuam a pensar em sua própria língua e a traduzir seus pensamentos para a nova, conforme necessário. Muitos Cristãos são assim. Eles vivem a velha vida, professam ter morrido com Cristo, mas se esforçam para usar a nova vida, a vida no Cristo ressuscitado, como o veículo para a expressão de seus antigos pensamentos, sentimentos e afeições. Não é de se admirar que o seu caminho seja marcado por constante fracasso e que sua vida Cristã seja caracterizada por tristeza e decepção! O vinho novo deve, como nosso Senhor ensina, ser colocado em odres novos. A velha vida deve ser recusada, e deve se buscar graça para sempre trazermos no corpo o morrer de Jesus, para que a vida de Jesus também possa ser manifestada em nosso corpo. Possuindo Cristo, temos então que aprender que chegamos ao nosso fim diante de Deus em Sua cruz e que nossa verdadeira vida é Ele mesmo, que é o Primogênito dentre os mortos. Então, de fato, apreenderemos que Ele, o Ressuscitado, também é o nosso começo.

Cristo o Padrão 

Pode-se ainda observar que Cristo, como assim apresentado a nós, é o Padrão e Modelo de todos os redimidos. Como observado antes, em Cristo ressuscitado e glorificado contemplamos o pensamento eterno de Deus para todos os Seus redimidos, e Seu servo Paulo nos ensinou que Deus nos predestinou para sermos conformados à imagem de Seu Filho, “a fim de que Ele seja o Primogênito entre muitos irmãos”. Nada menos que isso corresponderia ao Seu propósito ou satisfaria Seu coração. Nosso próprio Senhor fala da mesma coisa quando diz: “por eles Me santifico a Mim mesmo, para que também eles sejam santificados na verdade” (Jo 17:19). A verdade do que Ele é como o Homem glorificado, embora sempre o Filho Eterno, é o meio, trazido para a alma no poder do Espírito Santo, de nos levar a uma crescente conformidade moral com Ele agora e à Sua semelhança realmente quando nosso corpo também participa da eficácia da redenção. “E, qual o celestial, tais também os celestiais. E, assim como trouxemos a imagem do terreno, assim traremos também a imagem do celestial” (1 Co 15:48-49). Que perspectiva é assim aberta diante dos olhos da fé! E que revelação da graça do nosso Deus, em que Ele assim tenha proposto ter-nos sempre diante de Si, em eterna associação com Seu Filho amado e em perfeita conformidade com Sua imagem!

Christian Friend, 1896

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