Origem: Revista O Cristão – Abraão
A Provação da Fé de Abraão –Gênesis 22
As circunstâncias pelas quais Abraão passou nos capítulos 20‑21 foram realmente mais importantes. Um mal que há muito estava abrigado em seu coração havia sido colocado de lado; a escrava e seu filho, que há tanto tempo mantinham posse tranquila de sua casa, foram expulsos, e ele agora se apresenta como “vaso para honra, santificado e idôneo para uso do Senhor, e preparado para toda a boa obra”.
“E aconteceu depois destas coisas, que provou Deus a Abraão” (Gn 22:1). Aqui Abraão é, imediatamente, introduzido em um lugar de verdadeira dignidade e honra. Quando Deus prova um indivíduo, é uma certa evidência de Sua confiança nele. Nunca lemos que “Deus provou Ló” – não, os bens de Sodoma forneceram uma provação suficientemente forte para Ló, mas não com Abraão. Ele viveu mais na presença de Deus e, portanto, era menos suscetível à influência daquilo que havia enlaçado seu sobrinho.
O teste
Agora, o teste ao qual Deus submete Abraão – a fornalha na qual Ele o prova – marca imediatamente um metal puro e genuíno. Se a fé de Abraão não tivesse sido do mais alto caráter, ele certamente teria estremecido sob a ardente prova pela qual o contemplamos passando neste belo capítulo. Quando Deus prometeu a Abraão um filho, ele creu na promessa e “isso lhe foi imputado (contado) como justiça”. “E não duvidou da promessa de Deus por incredulidade, mas foi fortificado na fé, dando glória a Deus”. Mas então, tendo recebido esse filho, tendo percebido a verdade da promessa, não havia o perigo de ele descansar na dádiva em vez de descansar no Doador? Não havia o perigo de ele confiar em Isaque, pensando na futura descendência e herança futura, em vez de no próprio Deus que lhe havia prometido a descendência? Certamente havia, e Deus sabia disso. Ele, portanto, prova Seu servo de uma maneira, mais do que qualquer outra, calculada para prová-lo quanto ao objeto no qual sua alma estava descansando.
A grande questão dirigida ao coração de Abraão, nessa transação maravilhosa, foi: “Você ainda está andando diante do Deus Todo-Poderoso, o vivificador dos mortos?” Deus queria saber se ele poderia reconhecê-Lo como Aquele que era tão capaz de suscitar filhos das cinzas de seu filho sacrificado, quanto do ventre amortecido de Sara. Em outras palavras, Deus queria provar que a fé de Abraão se estendia, como alguém observou, até a ressurreição, porque se ela parasse aquém disso, ele nunca teria respondido ao surpreendente comando: “Toma agora o teu filho, o teu único filho, Isaque, a quem amas, e vai-te à terra de Moriá, e oferece-o ali em holocausto sobre uma das montanhas, que Eu te direi” (Gn 22:2). Mas Abraão “não duvidou”. Ele imediatamente responde ao chamado. Deus pediu Isaque, e Isaque deve ser dado, e isso também sem um suspiro de murmuração. Ele poderia desistir de qualquer coisa ou de tudo, contanto que seus olhos permanecessem fixos no “Deus Todo-Poderoso”.
Adoração
Observe o ponto de vista em que Abraão coloca essa jornada até o Monte Moriá: “Eu e o moço iremos até ali; e, havendo adorado, tornaremos a vós”. Sim, era um ato de adoração, pois ele estava prestes a deitar sobre o altar do Vivificador dos mortos, aquele em quem todas as promessas de Deus estavam centradas. Foi um ato de adoração – a adoração mais elevada, pois ele estava prestes a provar que nenhum outro objeto encheu sua alma, a não ser o Deus Todo-Poderoso. Portanto, que calma! Que domínio próprio! Que pura devoção! Que elevação de mente! Que renúncia própria! Ele nunca vacila por toda a cena. Ele sela o jumento, prepara a lenha e vai para o Monte Moriá, sem dar expressão a um pensamento ansioso, embora, até onde os olhos humanos pudessem ver, estivesse prestes a perder o objeto da mais terna afeição de seu coração – aquele de quem, por toda a aparência exterior, dependiam os interesses futuros de sua casa.
O Bem-Amado
Abraão, no entanto, mostrou plenamente que seu coração havia encontrado um objeto mais próximo e mais precioso do que Isaque, por mais querido que ele fosse. Ele mostrou também que sua fé estava repousando sobre um Outro objeto completamente distinto, com respeito aos interesses futuros de sua descendência e que, após o nascimento de Isaque, ele estava tão simplesmente repousando na promessa do Deus Todo-Poderoso como antes. Contemple, pois, este homem de fé subindo o monte, levando consigo o seu “bem-amado”! Que cena de fascinante interesse!
Parece-me que temos, na jornada de Abraão ao monte Moriá, uma figura notável da cena que depois seria manifestada no Calvário, quando Deus realmente estava provendo para Si mesmo um Cordeiro. Podemos ver o Pai e o Filho que, em companhia, sobem ao monte e realizam a graciosa obra da redenção na solitude ininterrupta daquele lugar.
Ressurreição
Quão intensamente devem as hostes angélicas ter assistido esse ilustre pai, etapa por etapa de sua maravilhosa jornada, até que finalmente viram sua mão estendida tomando o cutelo para matar seu filho – aquele filho pelo qual ele havia por tanto tempo e ardentemente desejado, e no qual havia confiado tão firmemente em Deus. E então, novamente, que oportunidade para Satanás usar seus dardos inflamados! Que espaço abundante para sugestões como: “O que será das promessas de Deus quanto à descendência e à herança, se você sacrificar seu único filho? Cuidado para que você não seja desviado por alguma falsa revelação”. Ou: “Se é verdade que Deus disse isso e aquilo, acaso Deus não sabe que, no dia em que você sacrificar seu filho, todas as suas esperanças serão destruídas? Além disso, pense em Sara; o que ela fará se ela perder Isaque, depois de ter induzido você a expulsar Ismael de sua casa?” Todas essas sugestões, e muitas outras, o inimigo poderia lançar ao coração de Abraão. Tampouco o próprio Abraão estaria isento desses pensamentos e raciocínios que, num momento como esse, provavelmente surgiriam dentro dele. Qual foi então sua resposta a todas essas sugestões sombrias? Ressurreição! “Pela fé ofereceu Abraão a Isaque, quando foi provado; sim, aquele que recebera as promessas ofereceu o seu unigênito. Sendo-lhe dito: Em Isaque será chamada a tua descendência, considerou que Deus era poderoso para até dentre os mortos o ressuscitar; E daí também em figura ele o recobrou” (Hb 11:17-19).
A ressurreição é o poderoso remédio de Deus para todos os danos e ruínas introduzidas por Satanás. Quando chegamos a esse ponto, terminamos com o poder de Satanás, cujo último exercício é visto na morte. Satanás não pode tocar na vida que foi recebida em ressurreição, pois o último exercício de seu poder é visto na sepultura de Cristo; além disso, ele não pode fazer nada. Daí a segurança do lugar da Igreja: Sua “vida está escondida com Cristo em Deus” (Cl 3:3). Bendito esconderijo! Que nos regozijemos mais e mais a cada dia.