Origem: Revista O Cristão – Oferta pelo pecado e pela culpa

Queimando e Comendo os Sacrifícios

Havia um duplo caráter nas ofertas que possui seu correspondente para nós em Cristo, e isso é apresentado em Hebreus 13:7-19. É preciso distinguir cada caráter e, ao mesmo tempo, mantê-los unidos, ou haverá fraqueza nos filhos de Deus e muita falta de gozo. O primeiro ponto, e mais fundamental, era que nas ofertas havia aquilo que era consumido. Uma vez identificado com o pecado do homem, ou o sacrifício era consumido sob a ira de Deus, como na oferta pelo pecado, ou subia como cheiro suave, como, por exemplo, no holocausto. Mas, além disso, havia outro caráter que entrava nos sacrifícios; em muitos casos, homens comiam deles. Na oferta de manjares e na oferta pacífica, o fato era esse, e até na oferta pelo pecado o sacerdote tinha uma porção.

É a isso que Hebreus 13 se refere aqui. Esses Cristãos judeus corriam um grande risco de esquecer seus privilégios. Eles haviam abandonado tudo o que antes reverenciavam como a religião dada a eles por Deus. A grandeza, a magnificência, a glória das instituições levíticas – tudo foi deixado para trás. Deus não estava agora trovejando do céu, pois havia operado com glória moral infinitamente maior. Ele havia enviado Seu Filho do céu: foram trazidos perdão e paz, com alegria e liberdade no Espírito Santo, mas tudo isso era invisível, exceto pela fé.

Fidelidade em um tempo de apostasia 

Uma coisa é entrar no conforto da verdade quando tudo é radiante e fresco, e outra coisa é mantê-la firme em tempos de vitupério, vergonha e escárnio, acompanhados da apostasia de alguns. Quando o primeiro gozo diminui um pouco, o coração retorna naturalmente àquilo em que antes repousava. Sempre existe esse perigo para nós, de que, quando o mal é sentido, a bênção não esteja tão presente na alma. Quem de nós que há muito conhece a Cristo e conhece Seus caminhos nunca sentiu essa armadilha?

E qual é o remédio divino? É exatamente aquilo que o Espírito Santo aqui usa: “Jesus Cristo, o mesmo ontem, e hoje, e eternamente” (Hb 13:8 – KJV). Não devemos separar este versículo do seguinte: “Não vos deixeis levar em redor por doutrinas várias e estranhas”. O Espírito Santo guardaria esses crentes judeus contra aquilo que, comparado com as bênçãos Cristãs que nos são próprias, é mero lixo – tal como sacerdócio terrenal, lugares sagrados, ofertas e dízimos. Essas coisas, afinal, eram apenas quinquilharia em comparação com Jesus.

Jesus Cristo o mesmo 

Olhando historicamente, o Cristianismo pode parecer uma coisa nova. Cristo havia Se manifestado recentemente, mas Quem era Ele? E de onde Ele vinha? Ele era “o Primogênito de toda criação” – o Criador! “Tudo foi criado por Ele e para Ele: e Ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por Ele” (Cl 1:15-17). Ele era Aquele a Quem Deus pretendia manifestar desde toda a eternidade. E aqui nós O vemos em Sua Pessoa completa – “Jesus Cristo, o mesmo ontem, e hoje, e eternamente”. Por meio d’Ele, Deus poderia abençoar, e Deus queria que nos ocupássemos com Ele.

No início do capítulo, somos instruídos a lembrar daqueles que foram guias sobre nós – a seguir sua fé, mesmo que eles próprios já tenham partido. Mas tudo isso sai de cena enquanto “Jesus Cristo é o mesmo ontem, e hoje, e eternamente”. Esta é a única coisa que permanece e também estabelece. Cristo era a substância: tudo o mais era sombra. Portanto, Ele prossegue dizendo: “Temos um altar do qual não têm direito de comer os que servem ao tabernáculo” (v. 10), pois o “tabernáculo” foi usado para expressar o sistema judaico. Se outros têm a casca, nós estamos nos alimentando do miolo. Tudo havia cessado em Cristo. Em Filipenses também, o apóstolo podia falar com desdém da circuncisão em contraste com ter a Cristo, embora a circuncisão fosse de Deus. Estar ocupado com ela, agora que Cristo havia vindo, era estar do lado de fora, ser da “circuncisão”.

Comer os sacrifícios 

Comer o sacrifício não era apenas queimar a oferta, mas participar dela. Temos o próprio Cristo e nossos pecados perdoados, pois o pecado – raiz e ramo – foi tratado por Deus. Agora não há nenhuma questão incerta para nós que cremos. No sistema judaico, Deus e o ofertante tinham sua porção nos sacrifícios, e agora podemos dizer que Deus tem Sua própria porção no mesmo Cristo de Quem nos alimentamos. A entrada neste pensamento extremamente abençoado é uma das coisas em que os filhos de Deus falham grandemente – de que estamos assentados pelo próprio Deus na mesma mesa onde Ele tem o Seu gozo e porção. Claro, há aquilo de que não podemos participar. No holocausto tudo subia para Deus. O cheiro suave de tudo o que Cristo era sobe até Ele. Devemos lembrar que Deus tem Seu infinito gozo em Cristo, e não apenas pelo que Ele é em Si, mas pelo que Ele fez pelos meus pecados. Quando pensamos nisso, todo o eu é absorvido e deve afundar diante d’Ele. A velha natureza nós ainda temos, mas ela está em nós para ser esmagada. Temos que tratar tudo, o que a agrada e o que a desagrada, como algo detestável. Mas a nova vida precisa de sustento; ela cresce alimentando-se. Assim como na vida natural, a mera posse de riquezas não sustentará a vida; a vida tem que ser alimentada. Assim, na vida espiritual, não é apenas verdade que Cristo é minha vida na presença de Deus, mas devo fazer de Cristo o meu próprio alimento – comendo d’Ele dia após dia (Jo 6:57). Ele realmente nos é dado para ser transformado pela fé em alimento para nós. E o doce é que temos direito de pensar em Cristo dessa maneira, dado por Deus para ser este Alimento para nós. Não é apenas que Cristo é de Deus, mas Ele também é nosso: nossa comunhão é com o Pai e com Seu Filho Jesus Cristo.

J. N. Darby (adaptado)

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