Origem: Revista O Cristão – Leia, Raquel, Joquebede e Miriã
Raquel e Leia – Caráter da Família e Graça
Em uma edição anterior de ‘O Cristão’ (setembro de 2019), consideramos o caráter da família de Rebeca, que foi passado para seu filho mais novo, Jacó, por ela. Ao olhar cronologicamente para as mulheres na Escritura, encontramos Raquel e Leia, que faziam parte da mesma família. Elas se tornaram esposas de Jacó, mas na verdade eram suas primas de primeiro grau, filhas do irmão de Rebeca, Labão. Eles também exibem esse caráter da família, e é instrutivo ver como ele é exibido.
A história é bem conhecida de como Jacó foi obrigado a deixar sua casa para escapar da ira de seu irmão Esaú, a quem enganou para obter a bênção pertencente a ele como filho mais velho. Ele foge para Harã, para o irmão de sua mãe, e se apaixona por sua filha mais nova, Raquel. Ele faz uma barganha com Labão para trabalhar para ele por sete anos para ter Raquel, de quem a Escritura diz que era “de formoso semblante e formosa à vista” (Gn 29:17). De sua irmã mais velha, Leia, a Escritura diz: “tinha olhos tenros [ou enfermos]” (Gn 29:17).
Esquemas e decepções
Aqui começa uma triste história de esquemas e decepções da parte de Labão, mas com permissão da parte de Deus para ensinar a Jacó uma lição muito necessária. No entanto, estamos lidando aqui com Raquel e Leia. Depois de trabalhar por sete anos, Jacó reivindica Raquel como sua esposa, mas, para obter outros sete anos de trabalho “gratuito” de Jacó, Labão entrega Leia a Jacó – um truque que ele não descobre até a manhã seguinte ao banquete do casamento, porque Leia estava, sem dúvida, velada na cerimônia de casamento. Embora possamos entender a obediência que Leia poderia ter sentido que devia a seu pai, ela deve ter participado desse esquema cruel e poderia ter alertado Jacó antes que o casamento fosse consumado. Tudo isso dá frutos tristes mais tarde, pois ela e sua irmã Raquel estão evidentemente afastadas do pai, novamente devido à avareza dele. Muitos anos depois, quando Jacó propõe que eles deixem Harã, elas respondem: “Não nos considera ele como estranhas? Pois vendeu-nos e comeu todo o nosso dinheiro” (Gn 31:15). O relacionamento normal entre o pai e elas havia sido prejudicado por relações avarentas da parte de Labão.
Raquel
No caso de Raquel, seu caráter é, de certa forma, pior que o de Leia. Embora ela tenha conquistado o coração de Jacó com sua beleza física, permaneceu um aspecto pecaminoso de seu caráter que se manifestou em mais de uma ocasião. Quando o Senhor abençoou Leia com filhos, Raquel, vencida pela inveja, culpou o marido pela falha dela em conceber. Então, depois de dar a Jacó sua serva, Bilá, que teve dois filhos, seu comentário foi: “Com lutas de Deus, tenho lutado com minha irmã e também venci” (Gn 30:8).
Mais tarde, ela é culpada de um pecado muito maior, pois quando Jacó e sua família secretamente fugiram de Labão escondido, ela roubou os deuses pagãos pertencentes a seu pai. Aqui estavam dois pecados graves: valorizar imagens pagãs em vez de adorar o Deus verdadeiro e roubá-las de seu pai, possivelmente na tentativa de ‘equilibrar as contas’ das injustiças de Labão contra ela. Mas outro pecado estava por vir, pois mais tarde, quando Labão perseguiu Jacó e o acusou de roubar esses deuses, Raquel mentiu para ele, escondendo-os na albarda de um camelo e sentou-se sobre eles. Jacó havia pronunciado uma sentença de morte àquele com quem esses deuses fossem encontrados, sem saber que sua amada Raquel era a culpada. Sem dúvida, eles foram descobertos mais tarde, pois encontramos Jacó diante do Senhor para tratar sobre o assunto e, finalmente, dizendo à sua família: “Tirai os deuses estranhos que há no meio de vós” (Gn 35:2).
Se houve algum arrependimento da parte de Raquel, isso não está registrado na Escritura, e não podemos deixar de sentir que a morte subsequente no parto pode muito bem ter sido o governo de Deus sobre ela. No entanto, o evento foi evidentemente usado por Deus para restaurar Jacó, pois enquanto Raquel chamava o filho de Benoni (filho da minha tristeza), Jacó o chama de Benjamin (filho da mão direita).
Leia
Em toda essa demonstração de caráter pecaminoso da família, também vemos a graça de Deus sendo demonstrada. Deus estava de olho não apenas em Jacó, mas também em Leia e Raquel. Leia, a pessoa que fez parte do engano de Labão e que mais tarde luta desesperadamente com Raquel pela afeição de Jacó, é mãe de seis filhos de Jacó e também de sua filha Diná. Entre seus filhos está Judá, o pai da tribo real, que nos mostra um exemplo de pecado extremo, mas depois do maravilhoso arrependimento e restauração. Isso apenas acrescenta a Leia como uma figura da Igreja, que não foi a primeira a ser escolhida por Deus (no tempo), mas a primeira a ser trazida à bênção com base na graça. Ela não tem o apelo natural de Israel, pois lemos em 1 Coríntios 1:26: “Vede, irmãos, a vossa vocação, que não são muitos os sábios segundo a carne, nem muitos os poderosos, nem muitos os nobres que são chamados”. Não, pois “Deus escolheu […] as coisas fracas do mundo” e “coisas vis” e “as desprezíveis” (vs. 27-28) para formar Sua Igreja. Mas tudo isso abunda apenas para a glória de Deus.
Figura de Israel
No entanto, Deus não Se esqueceu do Seu povo terrenal. Raquel, uma figura de Israel, também entra em bênção com base na graça. Israel não é obrigado a sofrer a penalidade total de sua idolatria e mentira, mas é perdoado. Os dois filhos dela são figuras de Cristo. José, o primogênito dela, é provavelmente a figura mais bonita de nosso Senhor Jesus no Velho Testamento, sofrendo injustamente de sua própria família e também dos gentios, mas depois elevado para ter uma glória ainda maior entre os gentios. Benjamin também é uma figura de Cristo, mas no caráter daquele que realizará julgamento na Terra num dia vindouro. Assim, nas bênçãos de seus filhos, Jacó poderia dizer a respeito de Benjamim: “Benjamim é lobo que despedaça; pela manhã, comerá a presa e, à tarde, repartirá o despojo” (Gn 49:27). É por essa razão que José e Benjamim são reunidos nessas bênçãos de Jacó, pois juntos completam a figura de Cristo. Primeiro, Ele deve sofrer e depois ser exaltado, mas depois deve julgar antes de poder reinar em justiça.
Raquel, a primeira amada na Terra, recebe bênção depois de Leia, uma figura da Igreja, mas ambas são finalmente abençoadas puramente no terreno da graça. Neste dia da graça de Deus, o pecado delas é um aviso para que não deixemos que um caráter pecaminoso da família ofusque nossas vidas, enquanto em suas bênçãos vemos a graça de Deus superabundando, pois “onde o pecado abundou, superabundou a graça” (Rm 5:20).