Origem: Revista O Cristão – O Chamado de Deus

Sofrimentos de Cristo e Chamado ao Sacerdócio

Em Hebreus 4, o apóstolo nos mostrou a esfera em que o sacerdócio de Cristo é exercido – a casa de Deus – e as circunstâncias de Seu povo que exigem Seu serviço sacerdotal – a jornada no deserto. Agora Ele nos revela os sofrimentos pelos quais Cristo passou em vista de Seu serviço sacerdotal e do chamado ao ofício sacerdotal.

O sacerdócio Arônico 

Para desenvolver a bem-aventurança do sacerdócio de Cristo, o apóstolo se refere em Hebreus 5:1-4 ao sacerdócio arônico como estabelecendo princípios gerais quanto ao serviço sacerdotal. Ao mesmo tempo, ele mostra, por contraste, a superioridade do sacerdócio de Cristo sobre o de Arão.

Devemos definitivamente reconhecer que esses quatro versículos se referem, não a Cristo e Seu sacerdócio celestial, mas a Arão e ao sacerdócio terrenal. O apóstolo chama a atenção para a pessoa do sacerdote terrenal, o trabalho do sacerdote, as experiências do sacerdote e a nomeação do sacerdote.

Sua pessoa 

Quanto à sua pessoa, o sumo sacerdote é tirado “dentre os homens”. Isso está em flagrante contraste com o sacerdócio de Cristo. Verdadeiramente Cristo é Homem, mas Ele é muito mais. O escritor deu testemunho, e ainda o fará, de que o Cristo que é nosso Sumo Sacerdote é nada menos que o Filho eterno.

Quanto à sua obra, o sacerdote terrenal é constituído a favor dos homens nas coisas concernentes a Deus, para que ofereça dons e sacrifícios pelos pecados, e possa compadecer-se ternamente dos ignorantes e errados. Aqui está a representação do serviço sacerdotal de Cristo. Como Sumo Sacerdote, Ele age em favor dos homens – os muitos filhos que Ele está levando para a glória – para guardá-los de falhar e mantê-los em uma caminhada prática com Deus. Cristo ofereceu dons e sacrifícios pelos pecados para levar Seu povo a um relacionamento com Deus, e tendo realizado a grande obra que removeu seus pecados, Ele agora exerce Sua obra sacerdotal em intercessão, empatia e socorro em favor de Seu povo ignorante e errante.

Experiência pessoal 

Quanto às experiências pessoais do sacerdote terrenal, lemos: “também ele mesmo está rodeado de fraqueza. E, por esta causa, deve ele, tanto pelo povo como também por si mesmo, fazer oferta pelos pecados”. Aqui há uma analogia parcial e um contraste definido com o sacerdócio de Cristo. É verdade que, nos dias de Sua carne, Cristo foi encontrado em circunstâncias de fraqueza e cercado por enfermidades, mas, em contraste com Arão, Ele era sem pecado, e não se poderia dizer que Ele para Si mesmo fez oferta por pecados.

A nomeação 

Quanto à nomeação do sacerdote terrenal, “ninguém toma para si essa honra, senão o que é chamado por Deus, como Arão”. Aqui, novamente, há uma analogia, como somos imediatamente lembrados, com o sacerdócio de Cristo. Ninguém pode realmente tomar o lugar do sacerdote, em qualquer sentido da palavra, que não seja chamado por Deus. A intensa solenidade de negligenciar essa grande verdade é vista no julgamento que alcançou Corá e aqueles associados a ele, que buscavam se estabelecer a si mesmos no sacerdócio sem serem chamados por Deus. Judas nos adverte que na Cristandade haverá muitos que, da mesma maneira, se nomearão sacerdotes sem o chamado de Deus e perecerão na contradição de Corá (Nm 16:3, 7, 10; Jd 11).

Aqui, então, temos o caráter do sacerdócio terrenal de acordo com a mente de Deus, e não como ilustrado na história do fracasso de Israel, que termina com dois homens ímpios ocupando o lugar de sumo sacerdote ao mesmo tempo e conspirando juntos para crucificar seu Messias.

A glória de Sua Pessoa 

No versículo 5, o escritor passa a falar de Cristo como Sumo Sacerdote. Ele traz diante de nós a grandeza de Sua Pessoa como chamado para ser um Sacerdote, as experiências pelas quais Ele passou para assumir a posição de Sacerdote e a nomeação de Deus para esse lugar de serviço.

A glória de Sua Pessoa: Cristo, que é chamado para ser nosso Grande Sumo Sacerdote, é verdadeiramente tirado dentre os homens para exercer Seu sacerdócio em favor dos homens. No entanto, na condição de Homem, Ele é reconhecido como o Filho: “Tu és Meu Filho; hoje Te gerei”. É esta Pessoa gloriosa – Aquele que é verdadeiramente Deus e verdadeiramente Homem, e em Quem a Divindade e a Humanidade são perfeitamente expressas – que é nomeado Sacerdote de acordo com a Palavra: “Tu és Sacerdote eternamente, segundo a ordem de Melquisedeque”. Quanto ao caráter dessa ordem do sacerdócio, o apóstolo terá mais a dizer. Aqui, o Salmo 110:4 é citado para mostrar não apenas a grandeza do Sacerdote, mas também a dignidade do sacerdócio.

As experiências de Cristo 

Nos versículos 7-8 a seguir, aprendemos das experiências pelas quais Cristo passou para que Ele pudesse exercer Seu serviço sacerdotal. Quão necessário é que Ele seja a Pessoa gloriosa que é – o Filho – para exercer o Sumo Sacerdócio no céu. Mas era preciso mais. Se for para Ele socorrer e apoiar Seu povo em sua jornada no deserto, Ele mesmo precisa entrar nas tristezas e dificuldades do caminho.

Imediatamente, então, o apóstolo recorda “os dias de Sua carne”, quando Ele participou de nossas fraquezas, trilhou o caminho que estamos trilhando, enfrentou as mesmas tentações que temos que enfrentar e foi cercado de enfermidades semelhantes. O escritor se refere especialmente aos sofrimentos finais do Senhor, quando o inimigo que, como alguém disse, “desde o início procurou seduzir Jesus, oferecendo-lhe as coisas que são agradáveis ao homem (Lc 4), estava se apresentando contra Ele com coisas terríveis”. No Getsêmani, o inimigo buscou desviar o Senhor do caminho da obediência, pressionando sobre Ele o terror da morte. Na presença desse ataque, o Senhor age como o Homem perfeito. Ele não exerceu Seu poder divino e expulsou o diabo ou salvou a Si mesmo da morte, mas como o Homem perfeitamente dependente, Ele encontrou Seu recurso em oração e, assim, enfrentou a provação e venceu o diabo. No entanto, Sua própria perfeição como Homem O levou a sentir o terror de tudo o que estava diante d’Ele e a expressar Seus sentimentos em forte clamor e lágrimas. Ele enfrentou a provação em perfeita dependência de Deus, que era capaz de salvá-Lo da morte.

Sua piedade 

Em toda essa dolorosa provação, Ele foi ouvido por causa de Sua piedade, que trouxe Deus a todas as circunstâncias por dependência e confiança n’Ele. Ele foi ouvido na medida em que foi fortalecido na fraqueza física, e capacitado no Espírito, para Se submeter a tomar o cálice da mão do Pai. Assim, Ele venceu o poder de Satanás e, embora fosse Filho, aprendeu a obediência pelas coisas que sofreu. Nós temos que aprender a obediência porque temos uma vontade perversa; Ele, porque Ele era Deus sobre todos os que, desde a eternidade, sempre havia comandado. Muitas vezes aprendemos a obediência pelo sofrimento que trazemos sobre nós mesmos por causa de nossa desobediência, Ele aprendeu a obediência pelo sofrimento implicado por causa de Sua obediência à vontade de Deus. Ele aprendeu por experiência própria o que custava obedecer. Nenhum sofrimento, por mais intenso que fosse, poderia afastá-Lo do caminho da perfeita obediência. Alguém disse: “Ele Se submeteu a tudo, obedeceu em tudo e dependia de Deus para tudo”.

Os sofrimentos aos quais o apóstolo se refere estavam nos “dias de Sua carne”, não no dia de Sua morte. Na cruz, Ele sofreu sob a ira de Deus, e lá Ele precisa estar sozinho. Ninguém pode compartilhar ou entrar em Seus sofrimentos expiatórios. No jardim, Ele sofreu com o poder do inimigo, e ali outros estavam associados a Ele. Podemos, em nossa pequena medida, compartilhar esses sofrimentos quando tentados pelo diabo, e assim fazendo, temos toda a empatia e apoio d’Aquele que sofreu antes de nós.

Ele foi ouvido em ressurreição 

Além disso, nos versículos 9-10, não só Ele foi ouvido no jardim, mas, tendo sofrido, Ele também foi ouvido em ressurreição e aperfeiçoado em glória. Ele toma Seu lugar como o Homem glorificado, de acordo com Suas próprias palavras: “eis que Eu expulso demônios, e efetuo curas, hoje e amanhã, e, no terceiro dia sou consumado [aperfeiçoado – JND] (Lc 13:32). Nada poderia aumentar a perfeição de Sua Pessoa, mas, tendo passado pelos sofrimentos dos dias de Sua carne, tendo consumado a obra da cruz e tendo sido ressuscitado e glorificado, Ele está perfeitamente preparado para exercer Seu serviço em favor dos muitos filhos a caminho da glória. Sendo aperfeiçoado, Ele é chamado por Deus como Sumo Sacerdote de acordo com a ordem de Melquisedeque. Na encarnação, Ele é chamado para assumir o sacerdócio de Melquisedeque (v. 5); quando ressuscitado e aperfeiçoado em glória, Ele é chamado como tendo assumido o chamado (v. 10).

H. Smith (adaptado)

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