Origem: Revista O Cristão – Um Caminho Solitário

Solidão e Cuidados

Bem no fundo, nos recônditos mais íntimos de todo espírito humano, a solidão é sentida, até que se saiba a verdade de que Deus Se importa. O homem perdeu Deus, e ele está fadado a se sentir sozinho até encontrar-se com Deus novamente. Ele deve se encontrar com a Pessoa d’Aquele que Se apresentou como o bom samaritano. “Mas um samaritano que ia de viagem chegou ao pé dele”. A verdade subjacente aqui é que Deus está sempre buscando o homem, e Ele o está buscando para ajudá-lo, pois é tão verdade que Deus perdeu o homem como é verdade que o homem perdeu Deus. O homem sem Deus é uma anomalia, já que Deus fez o homem e deu a ele todas as suas faculdades, morais e físicas. Por mais que tente, o homem não pode continuar sem o seu Criador, assim como não pode continuar sem o seu semelhante. A declaração de Marta ao Senhor Jesus, “Não Te importas”, expressa essa verdade. Por mais que tentemos escondê-lo, um sentimento de solidão e abandono nos tomará conta em algum momento, e é justamente esse sentimento de solidão e abandono que é a fonte frutífera de toda inquietação. A vida é grande demais para nós cuidarmos dela sozinhos, sua tensão é muito severa, suas demandas são maiores do que podemos suportar, e a questão final é maravilhosa e abrangente demais, para qualquer um de nós resolver sem ajuda.

O cuidado do bom samaritano 

É exatamente isso que nos ajuda a ver quão maravilhosamente o ensinamento de Cristo se encaixa no estado existente de coisas. A parábola do bom samaritano nos apresenta precisamente um quadro de absoluta solidão e abandono, bem como Àquele que nos alivia de ambos. Quem poderia ser mais solitário e estar sem cuidado do que o homem que caiu nas mãos de ladrões? Eles o despiram, o feriram e o abandonaram. Ele deve ter sentido sua solidão, especialmente, quando outros se aproximaram e, tendo olhado para ele, passaram longe dele. No entanto, quem poderia estar menos sozinho ou mais bem cuidado depois? Levado para a estalagem e deixado a cargo do hospedeiro, nada faltou para ele. “Cuida dele, e tudo o que de mais gastares eu to pagarei, quando voltar”. Se ao menos crermos que isso representa Deus e que Ele está perfeitamente disposto a prestar muito mais assistência a todos os que O permitirem prestar, poderíamos ter alguma preocupação?

Sem dúvida, estamos a ponto de dizer: “Parece bom demais para ser verdade. Há alguém tão grande, tão poderoso, disposto a tomar conta de mim?” Só há uma resposta: Ele está disposto e é capaz. Então talvez a pergunta se torne extremamente pessoal: Ele fará isso por mim? Não tenho direito a tão grande benevolência. Nem tinha o homem à beira da estrada, qualquer direito sobre o samaritano, exceto que a necessidade sempre tem direito ao amor. É este o ponto principal. Deus agora está agindo por Si mesmo, de acordo com os desejos ditados pelo Seu próprio amor. É graça, e a parábola tem a intenção de nos mostrar o que não poderíamos exigir e não merecíamos – Seu amor. Deus está demonstrando o fato de que Ele pode nos amar apesar de nossa imperfeição. A ação do Bom Samaritano foi toda feita por graça. Era assim que Deus trataria conosco. Quão lentos somos para entender isso!

O cuidado de Marta 

Marta não entendia isso e, consequentemente, estava ansiosa e afadigada com muitas coisas. Dentro de sua pequena esfera, ela pensava que devia cuidar de tudo, como se não houvesse ninguém no controle e ninguém para cuidar de homens e mulheres. Ela estava dando o melhor de si, mas não estava em descanso. Ela representa não poucos, que, embora desejem agradar a Deus e servi-Lo, não apreenderam quão grande prazer é para Ele o servi-los e que Seu serviço deve preceder o deles. A diferença entre Marta e Maria – uma estava atarefada, a outra descansava aos pés de Jesus – era, principalmente, a diferença entre o homem à beira da estrada e o homem na estalagem. O homem à beira da estrada poderia muito bem ter dito ao sacerdote e ao levita: “Você não se importa que eu fique aqui sozinho?” O homem da estalagem não poderia ter dito isso ao samaritano. Não poderíamos imaginar tal coisa. Podemos imaginá-lo sentado aos pés de seu benfeitor, olhando para seu rosto, e talvez se perguntando em sua mente: Há algo que eu possa fazer por ele quando eu ficar forte o suficiente? Cristo não nos pede nenhum serviço até que saibamos, por experiência pessoal, como Ele nos serviu. É um fato notável que, embora o homem ferido tenha recebido tanta bondade e receberia ainda mais, seu benfeitor não pediu a ele que fizesse uma única coisa em troca.

A tripla lição 

Será que aprendemos a tripla lição desta parábola? Será que conhecemos Àquele que pode remover nossa culpa, nos fortalecer e aliviar nossa inquietação? Nas palavras da parábola, “atou-lhe as feridas”; “pondo-o sobre a sua cavalgadura”; “levou-o para uma estalagem”. Assim sendo, não teremos menos cuidado [ansiedade]? Deus não nos faria suportar as nossas ansiedades, tal como não nos faria suportar os nossos pecados. “Lançando sobre Ele toda a vossa ansiedade, porque Ele tem cuidado de vós”. Este único verso da Escritura não atende à dupla necessidade de estar sozinho e sem preocupações, expresso no apelo de Marta? “Não Te importas que minha irmã me deixe servir só?” “lançando sobre Ele toda a vossa ansiedade” – isso vai de encontro à solidão – “porque Ele tem cuidado de vós” – isso satisfaz os cuidados. Nós todos O temos e Ele se importa.

“Nunca sozinho e sempre cuidado” descreve a condição feliz do homem na estalagem enquanto ele esperava para ver o rosto do seu amigo. Pode ser, e deve ser, a experiência daqueles que esperam para ver a Sua face.

R. Elliott (adaptado)

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