Origem: Revista O Cristão – Todo o Conselho de Deus
Os Conselhos Secretos de Deus
A Igreja é o Corpo e a Noiva de Cristo. Ela ocupa um lugar excepcional nos tratamentos de Deus, sendo celestial em seu chamado e difere de tudo relacionado ao Velho Testamento ou predito nele. Não somente a Igreja não existia nos tempos do Velho Testamento, como também não foi predita. Embora os propósitos de Deus sobre o assunto tenham sido formados “antes da fundação do mundo”, eles estiveram ocultos “desde todos os séculos e em todas as gerações” até chegar o Seu próprio tempo para revelá-los.
Na Escritura, esses conselhos secretos de Deus são chamados de “mistérios”. Na linguagem do Novo Testamento, um mistério é simplesmente um segredo revelado apenas a pessoas específicas. Deus reservou um segredo para ser comunicado a nós – um segredo que Ele não havia divulgado nem mesmo aos homens mais favorecidos de épocas passadas. Como é bom ver isso! Deus nos adotou como Seus filhos, Cristo nos comprou como Sua Noiva, e os segredos, escondidos até mesmo dos mais honrados de Seus servos e amigos, agora são soprados no ouvido e no coração da Igreja.
Este Mistério
Esses mistérios dizem respeito em parte ao reino e em parte à Igreja. Era um segredo desconhecido dos profetas que haveria um reino dos céus, no qual o mal seria permitido durante a sua formação. Esse é o Mistério revelado na parábola do trigo e do joio. Mas há também um segredo relacionado à Assembleia ou Igreja. Lemos que Deus “visitou os gentios, para tomar deles um povo para o Seu nome” (At 15:14), pois havia anunciado pelos profetas que Seu nome seria invocado pelos gentios. Mas as Escrituras são citadas aqui apenas para provar que Deus nunca pretendeu limitar Suas bênçãos a Israel. Ao escrever aos romanos, o apóstolo diz: “Porque não quero, irmãos, que ignoreis este segredo [mistério – ARA] (para que não presumais de vós mesmos): que o endurecimento veio em parte sobre Israel, até que a plenitude dos gentios haja entrado” (Rm 11:25). Havia sido revelado que Deus seria misericordioso com os gentios, mas era um “Mistério”, sobre o qual as Escrituras do Velho Testamento estavam totalmente em silêncio, que Deus estava colocando de lado os Judeus, com o propósito justamente de reunir um povo dentre os gentios, e que, até que isso fosse completamente cumprido, a bênção de Israel devia ser adiada,
A bênção de Israel
O Velho Testamento, que revela os planos de Deus em relação ao mundo, mostra o inverso disso. Lá, Deus está tratando com Seu povo terrenal, Israel, e os gentios são usados para provocá-los ao ciúme. Mas o Novo Testamento revela os propósitos celestiais de Deus. A reunião da Igreja, em vez de ocupar uma mera lacuna nos desígnios terrenais de Deus, é o grande objetivo de todos os Seus conselhos. No Velho Testamento, a bênção dos gentios é mencionada, mas como algo que aguarda os pensamentos de Deus sobre Israel. No Novo Testamento, a bênção de Israel é mencionada, porém aguardando os pensamentos de Deus sobre a Igreja. O Velho Testamento mostra um povo que foi objeto dos conselhos de Deus “desde a fundação do mundo”, mas o Novo Testamento mostra um povo que foi objeto dos conselhos de Deus “antes da fundação do mundo” (Mt 25:34; Ef 1:4). Nos planos terrenais de Deus, tudo dá lugar a Israel; em Seus planos celestiais tudo dá lugar à Igreja. Mas, como o povo celestial ocupou o primeiro e mais alto lugar nos pensamentos de Deus, o povo terrenal precisa ficar de lado até que Seus propósitos a respeito do povo celestial sejam plenamente cumpridos.
A dispensação de Deus
Ao escrever aos colossenses, Paulo fala da “dispensação de Deus, que me foi concedida para convosco, para cumprir [completar – JND] a Palavra de Deus: o Mistério que esteve oculto desde todos os séculos e em todas as gerações e que, agora, foi manifesto aos Seus santos; aos quais Deus quis fazer conhecer quais são as riquezas da glória deste Mistério entre os gentios, que é Cristo em [entre – KJV] vós, esperança da glória” (Cl 1:25-27). Portanto, o Mistério era necessário “para completar a Palavra de Deus”. Era a presença de Cristo nos crentes ou entre eles como a esperança da glória. A Palavra não diz que o Mistério era a presença de Cristo entre os gentios, mas “entre vós” – isto é, a Igreja. A presença de Cristo entre os Judeus era predita, mas agora Sua presença é revelada na assembleia fora do Judaísmo, onde Judeu e gentio são desconhecidos.
Mais do que isso, a presença de Cristo, predita pelos profetas, não era a esperança da glória, mas a própria glória. Quando Cristo reinar entre os Judeus, Ele será sua glória – “luz para alumiar as nações e para glória de Teu povo Israel” (Lc 2:32). Agora, entretanto, ao invés de glorificar aqueles entre os quais Ele tomou Sua habitação, Ele apenas dá a eles “a esperança da glória”. No presente eles são membros de Seu corpo. Mas os sofrimentos desse corpo ainda não foram completados, e os crentes agora são chamados à comunhão com Seus sofrimentos, embora com a esperança bendita e garantida de compartilhar Sua glória em breve. Essa é outra característica do Mistério agora revelado aos santos.
Coerdeiros – Um corpo
Em Efésios, o Mistério é assim descrito: “Os gentios são coerdeiros, e de um mesmo corpo, e participantes da promessa em Cristo pelo evangelho” (Ef 3:6). Isso é chamado “o Mistério de Cristo”. O que, então, isto ensina? Aprendemos no contexto imediato o que é esse corpo, no qual Judeus e gentios são incorporados, e descobrimos que ele não é outro senão o corpo do próprio Cristo. “Porque Ele é a nossa paz, o qual de ambos os povos fez um; e, derribando a parede de separação que estava no meio, na Sua carne, desfez a inimizade, isto é, a lei dos mandamentos, que consistia em ordenanças, para criar em Si mesmo dos dois um novo homem” (Ef 2:14-15). Tanto Judeus como gentios são tirados de suas antigas condições e trazidos para uma condição totalmente nova. Essas duas classes – Judeus e gentios – ainda existem no mundo, mas Deus tirou um número de cada uma e formou uma nova classe, o corpo de Cristo, no qual todas as distinções são eliminadas. As três divisões que Deus vê agora são os Judeus, os gentios e a Igreja de Deus (1 Co 10:32).
Depois, na mesma epístola, Paulo escreve: “porque somos membros do Seu corpo, da Sua carne, e dos Seus ossos. Por isso deixará o homem seu pai e sua mãe, e se unirá a sua mulher; e serão dois numa carne. Grande é este Mistério; digo-o, porém, a respeito de Cristo e da Igreja” (Ef 5:30-32 – ACF). Aqui, então, o Mistério é expressamente declarado como sendo a união de Cristo e da Igreja, de modo que eles são “uma só carne” e que os crentes são “membros do Seu corpo, da Sua carne, e dos Seus ossos”.
Características distintivas do Mistério
Sob qualquer luz, portanto, a Igreja é considerada, é mencionada como um Mistério. Seja como aquilo que Deus está realizando agora entre os gentios durante o tempo da rejeição de Israel, ou como o lugar no qual Cristo agora faz Sua morada espiritual, ou como o corpo no qual Judeus e gentios são igualmente incorporados em um terreno inteiramente novo, ou como a Noiva, unida em uma só carne ao próprio Cristo, trata-se de uma coisa nova, um segredo “oculto desde todos os séculos e em todas as gerações”. Esse Mistério está fora da esfera dos tratamentos terrenais de Deus e é reservado aos ouvidos daqueles a quem Deus colocou em relacionamento com Seu Filho em glória celestial.
Tal era então o Mistério agora revelado à Igreja. Sem dúvida, existem outros mistérios revelados no Novo Testamento também. Há “o Mistério da iniquidade”, “o Mistério da piedade” e o Mistério do retorno especial e particular de Cristo para Seus santos. Nesses, assim como em outros casos em que a palavra é usada, trata-se de uma nova revelação adequada ao caráter celestial da Igreja ou à natureza atual do tratamento de Deus, visto como uma interrupção do curso dos eventos terrenais preditos pelos antigos profetas.
Celestial e terrenal
Mas por que esse Mistério especial, confiado ao apóstolo Paulo, foi mantido em segredo? Porque é uma coisa celestial – o assunto dos conselhos celestiais de Deus –, enquanto o propósito das profecias do Velho Testamento é tornar conhecidos Seus conselhos terrenais. Isso é de grande importância, pois mostra quão completamente a Igreja está fora do mundo. Ela tem uma origem diferente, é revelada em um momento diferente, se alimenta de uma esperança diferente, pertence a uma esfera diferente. Em vez de herdar as promessas do Velho Testamento e cumprir as profecias do Velho Testamento, a Igreja forma com elas o mais absoluto contraste que a mente possa conceber. São tão diferentes que as duas coisas não podem existir juntas. Enquanto os propósitos de Deus sobre a Terra estavam sendo revelados, o Mistério da Igreja estava oculto. Quando o Mistério da Igreja foi revelado, os propósitos sobre a Terra foram suspensos. A Igreja está associada a Cristo no céu; Israel está associado a Ele na Terra. A Igreja O conhece em Seus sofrimentos e paciência; Israel O conhecerá em Sua exaltação e poder. A Igreja se alegra n’Ele como a noiva se regozija em seu noivo; Israel se regozijará n’Ele como uma nação em seu soberano. A Igreja aguarda por Ele para levá-la ao céu; a nação de Israel aguarda por Ele para estabelecê-la na Terra. Tal é a nossa porção celestial, em contraste com até mesmo o mais favorecido dos povos terrenais.
O ministério de Paulo
Por mais diligente que Paulo fosse em buscar almas, esse magnífico assunto do “Mistério de Cristo” nunca esteve ausente de seu coração. Se ele orava pelo estabelecimento de santos, era de acordo com o Mistério. Se ele desejava que estivessem “unidos em caridade (ou amor) e enriquecidos da plenitude da inteligência”, é “para conhecimento do Mistério”. Se ele pede que eles orem, é “para que Deus nos abra a porta da Palavra, a fim de falarmos do Mistério”. Se ele queria que fosse entendido o verdadeiro caráter da verdade confiada a ele, era porque Deus, por revelação, lhe havia dado a conhecer o Mistério. Certamente, se nosso coração estivesse mais sintonizado com a mente de Deus e com as afeições de Cristo, esse maravilhoso tema nos encheria de incessante adoração e deleite.
