Origem: Revista O Cristão – A Verdade e o Erro

A Verdade É o Teste

Dificilmente pode-se ler as duas pequenas epístolas de 2 e 3 João sem se impressionar com o número de vezes que o apóstolo usa a palavra “verdade”. Se lembro bem, isto ocorre cinco vezes na segunda epístola e seis vezes na terceira.

No primeiro capítulo do seu evangelho, ele nos diz que “a lei foi dada por Moisés; a graça e a verdade vieram por Jesus Cristo” (Jo 1:17). Obviamente, Deus mostrou tolerância e graça nos tempos do Velho Testamento, pois Ele sempre foi um Deus gracioso. Muitas coisas que eram verdadeiras e reais foram dadas a conhecer a Israel por meio de Moisés, mas quando se trata dos padrões absolutos, temos que nos voltar a Cristo. N’Ele, a graça de Deus foi plenamente revelada e a verdade de Deus totalmente manifesta. Muitas coisas verdadeiras foram apresentadas na lei, mas a própria realidade brilhou em Cristo. N’Ele, a revelação da graça e da verdade foi completa.

Ensinamentos falsos 

Todos nós descobrimos que estamos vivendo em um mundo que é muito irreal, onde a imitação muitas vezes acaba com o artigo genuíno. O homem é muito inteligente e inventivo e existe um grande elemento de irrealidade. Pôncio Pilatos reconheceu isso, pois sendo juiz romano, ele estava continuamente preocupado com a desonestidade da vida humana. Tendo feito sua famosa pergunta, “Que é a verdade?” deu as costas para Aquele que era a verdade e se voltou para o mundo falso e volúvel. Poucas horas antes o Senhor Jesus tinha dito: “Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida”. Ele é o caminho para Deus Pai; A verdade referente a Ele e a vida na qual Ele pode ser verdadeiramente conhecido.

Quando o apóstolo João escreveu estas duas epístolas, o adversário estava chegando com muita força, de duas formas. Primeiramente, homens apareceram propagando erros a respeito da pessoa de Cristo, e se o ensinamento sobre Ele fosse falsificado todo o resto estaria comprometido, já que Ele é a verdade. Esses enganadores do primeiro século eram conhecidos como “gnósticos”, um termo derivado da palavra grega que significa conhecimento. Eles alegaram ser os conhecedores. Quanto às coisas do mundo, os apóstolos de nosso Senhor eram “homens sem letra e indoutos”, de modo que os gnósticos afirmavam ser capazes de conduzir a um ensino aperfeiçoado e mais intelectual. Eles não permaneceram naquilo que foi “desde o princípio”. A palavra traduzida como “prevarica” em 2 João 9 realmente significa “avança”, isto é, eles alegaram estar realizando um avanço em relação às ideias anteriores. Na realidade, seus avanços imaginários eram destrutivos. Sendo assim, o apóstolo escreveu para uma certa mulher Cristã e seus filhos, advertindo-os contra esses falsos mestres. Evidentemente, eles foram de casa em casa, exatamente como fazem hoje. Definitivamente eles deveriam ser impedidos de entrar e nenhuma comunhão deveria ser concedida a eles, mesmo de maneira verbal.

O Espírito é a verdade 

Então, novamente, pode ser dito dos verdadeiros santos que a verdade “habita conosco e estará entre nós para sempre”. Em sua primeira epístola, João nos diz que “o Espírito é a verdade” (1 Jo 5:6). Sendo assim, a verdade habita em nós, já que somos a morada do Espírito. Mas Cristo também é a verdade e, como para sempre estaremos em Sua presença, a verdade estará conosco para sempre. Em Cristo tudo é ajustado em sua verdadeira luz. Deus é totalmente revelado e o homem foi totalmente exposto. Os pensamentos e propósitos de Deus se tornaram manifestos e todas as coisas estão colocadas na perspectiva correta. Por isso a graça e a misericórdia nos alcançam vindas do Pai e do Filho em verdade e amor.

Verdade objetiva e subjetiva 

Algo mais permanece, trazida em 3 João 4. A verdade que é colocada diante de nós objetivamente em Cristo e que habita em nós subjetivamente pelo Espírito, deve governar nossas ações. Todas as nossas atividades, seja em pensamento, palavra ou ação, devem ser governadas pela verdade. Se esses filhos da “senhora eleita” eram governados pela verdade, uma vida semelhante à deles será exigida de todos nós. Um santo, jovem ou velho, andando na verdade é algo belo de se ver. Não é de admirar que João se regozijou muito quando viu esta cena e é igualmente adorável quando é vista hoje.

Diótrefes e Gaio 

Mas há uma segunda coisa que põe em perigo a verdade e que vem à luz em 3 João, que é a manutenção rígida do status oficial e o que é considerado como correto exteriormente. Diótrefes foi um triste exemplo disto, enquanto Gaio, a quem a epístola foi endereçada, era conhecido por andar na verdade e ser um companheiro de grande ajuda para a verdade. Ao lermos esta epístola, vemos novamente que a verdade é o mais importante e que todas as demais coisas são testadas e medidas por ela. Gaio andou na verdade porque a verdade estava nele e tudo isso foi fonte de grande alegria para o apóstolo.

Naqueles dias havia homens de zelo fervoroso que saíam pregando a Palavra. Quando chegavam ao lugar onde Gaio morava, ele os recebia hospitaleiramente e dava a eles condições de seguir sua jornada, embora não os conhecesse anteriormente. Gaio não recebeu e ajudou a esses irmãos estranhos porque os conhecia e já gostava deles, mas porque eles eram devotos ao nome de Cristo, separados do mundo, e porque estavam publicando a verdade.

Este último ponto é muito claro no final de 3 João 8. Ao ajudar esses servos de Deus, Gaio estava ajudando a verdade, e todos nós deveríamos fazer o que ele fez.

A importância da verdade – Não do homem 

E isso enfatiza outra coisa: O importante não é o homem, mas a verdade que ele traz. Havia a tendência então, e certamente há a tendência hoje em dia, de dar ao homem grande importância, de modo que, se ele é reconhecido como “espiritual”, o que ele diz deve ser aceito. O homem credencia a mensagem que ele traz. O que vemos aqui é o contrário disso. A mensagem da verdade que é trazida credencia o homem que a traz, assim como na segunda epístola que o erro trazia descredito ao homem que o propagava.

O mesmo pensamento fundamenta o que é dito sobre Demétrio em 3 João 12, já que ele não tinha apenas um bom relato de todos, mas “até da mesma verdade”. Note, não é que ele deu testemunho da verdade, mas que a verdade deu testemunho dele. Demétrio não era o padrão pelo qual a verdade era testada. A verdade era o padrão pelo qual Demétrio foi testado, e tendo sido testado, foi aprovado.

Porém a situação do pobre Diótrefes era muito diferente. A razão de ele ter tido uma posição tão forte contra esses irmãos estranhos e os outros que os receberam, e até contra o próprio João, não nos é dito. Pode ter sido o surgimento do clericalismo, o zelo excessivo por pontos imaginários de ensinos, ou procedimentos e assim por diante, mas o que sabemos são as bases de suas ações arrogantes. Ele amava ter a preeminência entre os santos. Ele estava prestes a estabelecer uma posição dominante por si mesmo.

Dominação do povo 

Assim como o apóstolo João, nós condenamos Diótrefes, mas não nos esqueçamos do fato que nos confronta em Jeremias 5:31. No meio de Israel havia muito ensino falso e, por meio disso, os sacerdotes adquiriram um lugar dominante, mas o Senhor disse: “meu povo assim o deseja”. As pessoas queriam seus prazeres pecaminosos e estavam muito contentes em deixar os sacerdotes cumprirem seus deveres religiosos por eles.

Isso foi reencenado na história da Igreja e um Diótrefes moderno e vigoroso pode ser muitas vezes bem-vindo, mesmo para os santos, se eles quiserem evitar o exercício pessoal do coração e viverem com tranquilidade e como quase mundanos. A história se repete, pois, as tendências humanas são sempre as mesmas. Se seguirmos Diótrefes negaremos a verdade em vez de ajudá-la, mas em última análise a verdade prevalecerá.

Estamos vivendo em dias em que a verdade está sendo atacada por todos os lados. Que nos lembremos que Cristo é a Verdade e, como Ele mesmo disse ao Pai: “A tua Palavra é a verdade”. Essa verdade nos alcançou na “fé que uma vez foi dada aos santos” (Judas 3). Que lutemos fervorosamente por ela, uma vez que é de valor inestimável. E que todos nós possamos ter graça para sermos caracterizados por isso, que é andarmos na verdade. O olho do Senhor está sobre nós, e é isso que Ele procura, enquanto esperamos por Ele.

F. B. Hole (adaptado)

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