Origem: Revista O Cristão – O Dia do Senhor
A Vinda e o Dia do Senhor
Em 2 Pedro 3, pode parecer estranho que o Espírito de Deus, em vez de entrar no assunto da vinda do Senhor [para os crentes], deva imediatamente se afastar dele para falar do Seu dia [o dia do Senhor]. Muitos leitores desta e de outras partes do Novo Testamento, por pressa, foram levados a confundir as duas coisas, por causa dessa mesma circunstância. Mas Pedro está escrevendo para aqueles que eram Judeus anteriormente, e eles estariam, portanto, um pouco familiarizados com o pensamento do “dia do Senhor”, pois muito é dito no Velho Testamento sobre o tremendo dia do tratamento divino com todo o mundo. Não é apenas o momento em que os homens serão ressuscitados dos mortos para serem julgados diante do grande trono branco. O dia do Senhor é que Deus tratando com o mundo como ele é – parando todas as suas rodas, prendendo homens no meio de todas as cenas agitadas da vida, e chamando-os a prestar contas. O Velho Testamento, ao lidar com o homem na Terra, naturalmente dá grande importância “aquele dia”. O grande julgamento do trono branco está completamente fora do mundo. O céu e a Terra terão então desaparecido; será um julgamento não relacionado ao tempo, mas que dará início à eternidade.
Os escarnecedores
Observe a sabedoria de Deus aqui. Os homens não zombam do dia do Senhor; mesmo um Judeu não convertido, com as Escrituras do Velho Testamento em suas mãos, teria medo de fazer pouco caso dele. Em vez disso, eles dizem: “Onde está a promessa da Sua vinda?” Vocês Cristãos estão esperando a vinda de Cristo para serem felizes. Vocês são as pessoas mais miseráveis do mundo; vocês não desfrutam de nada. Vocês se separam de todos os nossos interesses e prazeres. Vocês encontram falhas em tudo, não apenas em nossos maus caminhos, mas em nossos melhores esforços e, no final, Ele não vem. “Onde está a promessa da sua vinda?” Este é exatamente o lugar em que a vinda de Cristo coloca o Cristão. O que diz o Espírito de Deus para aqueles que zombam da esperança dos santos? Creio que Sua resposta, com efeito, equivale a isso: “Não falarei com você sobre a esperança do Cristão, um tema que você traz a tona. Mas Eu lembrarei você de uma cena terrível que você esqueceu. Existe algo como ‘o dia do Senhor’ chegando”. Ou seja, ele deixa de lado o assunto da esperança da Igreja e do Cristão, a vinda do Senhor para nos receber para Si mesmo, o que nos tirará de toda essa cena, nos levará ao céu e nos colocará em paz e bênção diante do Pai. O Espírito Santo em 2 Pedro não entra nisso.
Em Judas, ele apenas nos dá um pequeno vislumbre da bem-aventurança dos santos diante de Deus. “Ora, Àquele que é poderoso para vos guardar de tropeçar, e apresentar-vos irrepreensíveis, com alegria, perante a Sua glória”. Lá você tem um olhar para a profunda alegria interior dos santos de Deus, sobre a qual o mundo nada saberá. Ele nunca pode ver o que o Cristão mais apreciará na presença de Deus Pai, nem conhecerá nada da vinda de Cristo que nos introduzirá nessa cena. Mas o mundo deve ver o dia do Senhor, e quando esse dia chegar, o Senhor terá todos os Seus santos no céu, no pleno brilho e intimidade do desfrute da casa do Pai. Depois, Ele os trará para fora e os manifestará na glória de Seu Pai e na dos anjos diante do mundo, e então virá um julgamento retributivo. O Senhor virá do céu e tratará com os homens no meio de seus afazeres, de suas obras e planos aqui embaixo. É isso que vemos tratado em 2 Pedro 3. Ele diz: “Vocês zombam, de nossa esperança, mas vou lembrá-los do seu temor e, quando vocês ouvirem falar dele, poderão estremecer.”
O Senhor é longânimo
“Mas, amados, não ignoreis uma coisa (e que os amados santos de Deus se lembrem disso bem), que um dia para o Senhor é como mil anos, e mil anos como um dia”. O Senhor pode, de forma admirável, concentrar eventos que poderiam ter se estendido por mil anos em um único dia, ao passo que, por outro lado, pode prolongar os de um só dia na paciência de mil anos. O Senhor não retarda Sua promessa. Ele não está disposto a dar o golpe terrível que está prestes a cair no mundo. Deus “não [quer] que alguns se percam, senão que todos venham a arrepender-se”. Essas palavras deixaram inteiramente de lado a ideia horrível (tecnicamente chamada reprovação) de que qualquer homem jamais foi feito com o propósito de ser lançado no inferno. Deus, pelo contrário, deseja salvar. Seu coração anseia pelos homens. Ele espera por eles, roga a eles e envia o evangelho a eles para que possam recebê-lo. Sem dúvida, é pura graça e somente a graça que desperta uma alma para o amor de Deus. Mas é o pecado – a incredulidade do homem (qualquer que seja o endurecimento judicial em certos casos) – que os encerra na rejeição de Sua misericórdia.
O inverso disso aparece em 2 Tessalonicenses, mas confirma fortemente a mesma distinção. O apóstolo introduz, em 2 Tessalonicenses 1, o caráter solene “daquele dia”, com suas questões justas e retributivas tanto para os santos quanto para os pecadores. No capítulo 2, ele está desenvolvendo seu enfoque especial na destruição do iníquo, o homem do pecado, que deve surgir no final, fruto amadurecido da Cristandade apóstata. Seu assunto é “o dia do Senhor”, sobre o qual os tessalonicenses tiveram sua mente abalada e alarmada por falsas afirmações, mas ele se afasta para exortá-los quanto à “vinda do Senhor”, que estava cheia das associações mais doces e mais reconfortantes, para que não dessem ouvidos a esses rumores infundados. Compare também 1 Tessalonicenses 4‑5. Sua porção especial, pelo menos a sua reunião ao Senhor, está ligada à “Sua vinda”, enquanto “Seu dia” é reservado para o julgamento de Seus adversários.
Seja a prorrogação curta ou longa, mil anos ou um dia, o dia do Senhor virá como ladrão de noite. Virá de repente e será muito indesejado neste mundo. Por tudo o que está implícito aqui, Ele faz o dia do Senhor abranger todo o intervalo desde a vinda do Senhor em julgamento, por todo o milênio, até o grande trono branco. “Os céus passarão com grande estrondo… e a Terra, e as obras que nela há, se queimarão” devem ocorrer antes que esse dia se encerre.
Piedade enquanto Deus é paciente
“Havendo, pois, de perecer todas estas coisas, que pessoas vos convém ser em santo trato, e piedade”. Podemos sentir, e devemos sentir, o que o homem é em seus escárnios contra a verdade de Deus. No entanto, a melhor resposta para tudo isso é a de uma comunhão piedosa – o efeito sobre nossa alma e em nossa caminhada do conhecimento dessa esperança e da nossa percepção da terrível condenação que aguarda aqueles que desprezam não apenas a justa vontade de Deus, mas a Sua misericórdia. O Senhor aqui nos mostra a importância disso. “Que pessoas vos convém ser… aguardando e apressando-vos para a vinda do dia de Deus”. Ou seja, não queremos que este dia seja adiado por nós mesmos, mas amamos a paciência de Deus para com os homens. Esse conhecimento reconcilia nosso coração com o retardamento enquanto, pessoalmente, ansiamos que o Senhor venha, porque sabemos que quando Ele vier e nos levar embora, o dia do Senhor deverá se aproximar rapidamente da Terra.
“Mas nós, segundo a Sua promessa, aguardamos novos céus e nova Terra, em que habita a justiça”. Isso nos dá a chave para entender Pedro – a justiça é o pensamento tanto nesta epístola quanto da primeira. A vinda do Senhor para o Seu povo não é a manifestação de justiça, mas a revelação de Sua graça. Ele começou e terminará conosco agindo em graça plena e celestial, pela qual Ele nos escolheu para estarmos com Ele mesmo. Mas aqui temos o dia do Senhor, que tem um aspecto de justiça até mesmo para nós. Quando esse dia chegar, seremos manifestados. O dia vai revelar. É o momento em que teremos recompensas pelos sofrimentos especiais ou fidelidade de qualquer tipo; é o tempo que, portanto, revelará onde fomos infiéis e por que falhamos. O dia do Senhor não terminará até que todo o mal tenha sido banido e a justiça introduzida e estabelecida, havendo desaparecido todos os inimigos. O dia do Senhor é tão enfaticamente justiça quanto Sua vinda é graça. Nunca se diz que o mundo verá algo da vinda do Senhor para Seus santos. Sem dúvida notará a ausência deles. A advertência do dia da graça terá sido encerrada, embora possa ser levantado um testemunho do reino vindouro e dos julgamentos, e alguns corações possam ser abertos para recebê-lo. Mas a Escritura não contém nem uma palavra sequer de esperança para aqueles que agora recusam o evangelho.
Bible Treasury, 3:58