Origem: Livro: O Que Acontece Depois da Morte

CAPÍTULO 4 – Cristo e a glória

Para o Cristão que dormiu, despojado momentaneamente de sua morada terrena, a qual não é senão uma fraca tenda, qual será o destino de sua alma separada do corpo? A Palavra de Deus fala com clareza sobre este tema. A alma está com Cristo. “Mas de ambos os lados estou em aperto – disse o apóstolo – tendo desejo de partir, e estar com Cristo, porque isto é ainda melhor” (Filipenses 1:23). Também acrescenta: “mas temos confiança e desejamos antes deixar este corpo, para habitar com o Senhor”, ainda que não deseje ser despido de seu corpo mortal, mas revestido de um corpo glorioso “para que o mortal seja absorvido pela vida” (II Coríntios 5:4,8).

Que futuro mais feliz! Pleno de paz para os Cristãos de idade madura que tenham crescido no conhecimento do Senhor, que tenham gozado durante a vida de Sua comunhão e cuja confiança tenha sido: “Para mim o viver o Cristo”. Isto alenta, conforta e traz regozijo às almas jovens na fé que, sem experiência ainda, confiam tal qual cordeiros nos braços do Bom Pastor. Porém, por outro lado, que angustiosa perspectiva para os que, mesmo sendo filhos de Deus, vivem com o mundo e para ele, sem compreender que seu único dever é viver para o Senhor!

Estar com Cristo é, pois, a primeira e suprema benção da alma do Cristão separado do corpo. Mais adiante, Cristo será seu único fim. Nada virá se interpor entre a alma e seu Salvador; a comunhão com Ele, tão facilmente destruída neste mundo, é, contínua em sua sucessão. Todavia, isto não constitui a perfeição, a qual somente será alcançada na ressurreição dentre os mortos (Filipenses 3:11, 12).

Nenhum crente chegará desacompanhado, nem se adiantará em relação aos demais, mas todos entraremos juntos. Ao falar dos crentes do Antigo Testamento, o apóstolo disse que eles “não receberam a promessa, provendo Deus alguma coisa melhor a nosso respeito, para que eles sem nós, não fossem aperfeiçoados” (Hebreus 11: 39 40)[1]. Então, a perfeição – isto é, a mesma glória de Cristo – será alcançada ao ressuscitarmos dentre os mortos, quando seremos “semelhantes a ele; porque assim como é o veremos (I João 32). Tal estado não é o da alma depois da morte; mas o que sabemos é que ela está com Cristo.
[1] N. do T.: Hebreus 11:39, 40 também pode ser traduzido como “para que sem nós não chegassem eles à perfeição” (versão francesa de Darby).

Nos basta saber isso quando pensamos na possibilidade de morrer? Necessitamos de outra coisa? Desejaríamos substituir a suprema benção de estar com o Senhor pelas miseráveis ilusões com os quais alguns querem ocupar nossa mente? Se lhes dermos ouvidos é porque o Senhor não ocupa em nós o lugar que somente Ele deve ter; é porque não temos posto em prática: “Para mim o viver é Cristo”.

O Paraíso 

“Em verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso” (Lucas 23:43). Estas palavras, dirigidas ao malfeitor que se converteu na cruz, nos levam a falar do lugar onde se encontram as almas depois da morte. No Antigo Testamento, este lugar está incluído num termo muito vago: “Seol”[2] 0 lugar invisível, o qual não demonstra distinção entre o lugar ao qual vão almas dos bem-aventurados e aquele ao qual vão as dos condenados. Esta indefinição se explica pelo caráter das promessas que foram feitas a Israel, tendo em vista uma glória terrena e não celestial e invisível.
[2] N. do T.: Conforme Gesenius-Tregelles, é “um lugar subterraneo” (de onde vem “inferno”: lugar inferior) pleno de densas trevas (Jó 10:21 ,22), lugar de sombra de morte onde moram os mortos. (Provérbios 9:18, Isaías 38: 10; Ezequiel 31:16-17).

Quando Jesus estava na terra, sua presença foi a revelação das coisas invisíveis. Em certa ocasião levantou um pouco o véu que escondia o Seol (ou Hades), lugar ao qual vão as almas depois da morte. O Senhor mostra em uma parábola que certas almas são consoladas em lugar de repouso e delícias, mencionando que o seio de Abraão é o melhor lugar que um judeu poderia desejar. Este lugar é para nós o seio de Jesus, desde que, ao terminar Sua obra, foi sentar-se nos lugares celestiais. Neste mesmo relato o Senhor ensinou que as almas dos que haviam recebido seus bens durante sua vida e que não se voltaram para Deus, estão num lugar de tormento, isto é, em outra região do Seol.

Finalmente, Jesus revelou que não há nenhuma ligação possível entre estas duas regiões ou partes do Seol e que a sorte dos que se acham ali está irremediavelmente determinada (leia Lucas 16: 19-31). Portanto, não se deve falar em um “desenvolvimento gradual” ou que “passou de uma esfera para outra mais elevada”. A Palavra de Deus destrói com uma só afirmação essa teorias tolas: “E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tão pouco os de lá passar para cá” (Lucas 16:26).

O Paraíso é o Terceiro Céu 

Na cruz, onde o Senhor levou a cabo a expiação ou perdão, Ele não apresenta mais o lugar invisível na forma de uma parábola ou algo semelhante. Abriu em todo seu esplendor os olhos do pobre malfeitor convertido: “Hoje mesmo estarás comigo no paraíso” (Lucas 23:43). O paraíso é o terceiro céu, ao qual corresponde, em figura, o lugar santíssimo do templo, porque o templo estava dividido em três partes: o átrio, o lugar santo e o lugar santíssimo.

Palavras Inefáveis 

Não há um quarto céu, de modo que o paraíso é o lugar mais alto, é o céu de Deus, “o paraíso de Deus

(Apocalipse 2:7). Para ali foi arrebatado o apóstolo Paulo. Como? Só Deus tem esse conhecimento; porém, Paulo estava seguro de que podia estar ali, tanto como alma separada do corpo, como no corpo. “Conheço um homem em Cristo que há catorze anos (se no corpo não sei, se fora do corpo não sei; Deus o sabe) foi arrebatado até ao terceiro céu…ao paraíso; e ouviu palavras inefáveis, de que ao homem não é lícito falar” (II Coríntios 12: 2-4).

Nesse estado, o apóstolo era semelhante aos discípulos no monte da transfiguração, com a diferença de que só tinha ouvido, mas não visto. Todavia, o que ouviu foi mais do que a voz do Pai dizendo: “Este é meu Filho amado… escutai-o” (Mateus 17:5). Aquelas eram palavras inefáveis, absolutamente inexprimíveis em qualquer linguagem humana. Paulo não as podia revelar a ninguém, porquanto nenhum ser humano as haveria compreendido. Também ocorre isso com relação às almas que estão no paraíso com Jesus. Nossa curiosidade não encontra nada com que alimentar-se a respeito disso. As coisas que aquelas almas entendem não são do nosso domínio.

Paraíso e Glória 

Notemos ainda, que o paraíso não é a glória. Não há a menor dúvida de que a glória está ali onde Cristo se encontra; porém nós só podemos entrar na glória como seres completos; ou seja, quando tivermos o corpo e a alma reunidos e não nos acharmos em um estado intermediário. Geralmente nós fazemos uma falsa ideia da glória ao considerá-la como um lugar. A glória é uma manifestação. E a manifestação do conjunto das perfeições divinas: majestade, magnificência, sabedoria, verdade, poder, santidade, justiça e amor. Nós contemplamos em Cristo essa glória. A mesma que tinha com o Pai antes que o mundo existisse e que recebeu dele como homem glorificado; porém, quando formos semelhantes a Cristo, teremos parte em Sua glória e esta se manifestará também em nós (João 17: 22-24). O paraíso não é a glória, mas um invisível lugar de delícias.

Nos Reconheceremos no Céu? 

As vezes os Cristãos se perguntam se reconheceremos no céu aos que foram antes de nós. Pessoalmente não duvido disso; e reconheceremos também aos que não havíamos conhecido neste mundo, da mesma maneira que os discípulos reconheceram no monte da transfiguração a Moisés e a Elias em glória, enquanto que estes não faziam mais que falar com Jesus. Mas, ainda que se diga pouco de nos reunirmos, depois de nossa partida, com aqueles que temos amado (II Samuel 12:23), nos é dito, não que eles irão antes ou que nós nos adiantares a eles, mas que nós, os que vivemos, uma vez transformados, seremos arrebatados juntamente com nossos amados, ressuscitados dentre os mortos para o encontro com Senhor.

Num momento, todos os santos seremos reunidos no ar para sermos levados pelo Senhor em um abrir e fechar de olhos (I Coríntios 15:51, 52; I Tessalonicenses 4:13-18), os afetos e vínculos, tal como temos conhecido na terra, já não terão valor algum na glória.

Um mesmo amor e um sentir comum, concentrados sobre o mesmo e único objeto, se apoderarão de todas as forças, todas as aspirações e esforços de nosso ser. O que não conheça bem ao Salvador, talvez possa pensar que ali encontrará coisas que interessam mais do que o Autor de sua salvação. Porém, o Cristão entendido sabe que Jesus preenche o terceiro céu com Sua presença, como antigamente, diante do profeta, a cauda de seus vestidos enchia o templo (Isaías 6:1). E também: “Isaías disse isto quando viu a sua glória e falou dele” (João 12:41).

Como é o Céu? 

O céu tem diferentes objetos cuja enumeração se prolongaria indefinidamente se quiséssemos contar. Os capítulos 2 a 5 e 19 a 22 de Apocalipse contém, sob a forma de símbolos, uma interminável lista desses objetos.

Devemos buscar as coisas invisíveis, que são de cima e que só podem ser distinguidas pelo olhar da fé (II Coríntios 4:18). Devemos pensar nestas coisas e não nas que são aqui da terra (Colossenses 32). Porém, recordemos que a Bíblia as resume todas em uma só palavra ao dizer: “as coisas que são de cima, onde Cristo está assentado à destra de Deus” (Colossenses 3:1).

Esta deve ser nossa ocupação neste mundo, assim como é a ocupação das almas despojadas do corpo e a que será eternamente de todos os redimidos, ressuscitados e glorificados, juntos em uma perfeita unidade de amor e de línguas ao redor de nosso Salvador.

Cristãos, que nada nem ninguém nos impeça de pensarmos e ocuparmos primeiramente com nosso bendito Redentor e Senhor!

“E o que estava assentado sobre o trono disse… Escreve; porque estas palavras são verdadeiras e fiéis. E disse-me mais: Está cumprido. Eu sou o Alfa e o Ômega, o princípio e o fim. A quem quer que tiver sede, de graça lhe darei da fonte da água da vida. Quem vencer, herdará todas as coisas e eu serei seu Deus, e ele será meu filho. Mas, quanto aos tímidos, e aos incrédulos, e aos abomináveis, e aos homicidas, e aos fornicários, e aos feiticeiros, e aos idólatras e a todos os mentirosos, a sua parte será no lago que arde com fogo e enxofre; o que é a segunda morte” (Apocalipse 21:5-8).

H. L. Rossier

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