Origem: Livro: Breves Meditações
O Filho do Homem no Céu
A segunda carta de Lucas ao seu amigo Teófilo não retoma de maneira rígida e formal a narrativa inspirada exatamente de onde a primeira havia parado; há, ao contrário, um entrelaçamento ou envolvimento fácil e gracioso das duas: a segunda remonta um pouco às cenas e aos períodos que encerraram a primeira, conferindo-lhes o mesmo caráter geral com algumas tênues características distintivas. Mas cada uma dessas cartas, “o Evangelho segundo Lucas” e “os Atos dos Apóstolos”, tem, é claro, como não preciso dizer, seu próprio tema.
Nos primeiros capítulos dos “Atos dos Apóstolos”, e aos quais agora me dirijo por um instante, temos um relato de Jesus como o Homem glorificado nos céus; assim como nos primeiros capítulos do Evangelho de Lucas temos um relato do Deus manifestado em carne na Terra. Quer dizer, isso é característico, separadamente, de cada um deles. A Pessoa é, certamente, uma e a mesma em ambos: o Deus-Homem.
Aprendemos muitas coisas relacionadas ao Filho do Homem no céu com os evangelistas, onde esse mistério é antecipado de tempos em tempos. O próprio Senhor nos diz que Ele será visto lá pela fé durante toda esta era presente, assentado à destra do Poder; e que no devido tempo Ele surgirá de lá sobre as nuvens do céu (Mt 26:64). Ele também nos diz que, quando Ele surgir, Ele Se assentará no trono da Sua glória (Mt 25:31). Estas são apenas meras amostras da maneira como este grande mistério foi assim antecipado. Mas a Pessoa vista nos evangelistas é Deus manifestado em carne e, como tal, em ação na Terra. Nestes capítulos dos Atos, que sucede aos evangelistas, trata-se, por outro lado, do Homem glorificado no céu e agindo ali.
No capítulo 1, Jesus Nazareno, que era Deus manifestado em carne aqui, é visto ascendendo aos céus.
No capítulo 2, o Espírito prometido é concedido, e Pedro inicia sua pregação tomando esse dom, segundo a profecia de Joel, como seu texto. E, após citá-la, diz: “Homens israelitas, escutai estas palavras: A Jesus Nazareno, Homem aprovado por Deus entre vós com maravilhas, prodígios e sinais, que Deus por Ele fez no meio de vós, como vós mesmos bem sabeis; A Este que vos foi entregue pelo determinado conselho e presciência de Deus, prendestes, crucificastes e matastes pelas mãos de injustos”. E ele então mostra, a partir dos Salmos 16 e 110, que este Homem, assim aprovado por Deus na Terra, havia agora ressuscitado dentre os mortos e sido glorificado à destra de Deus no céu.
Assim se estabelece o mistério, o mistério do Filho do Homem, Jesus Nazareno, exaltado nos céus. Assim como os evangelistas já haviam contemplado Jesus enquanto Ele andava, ministrava, labutava e sofria aqui na Terra, agora, em sua pregação neste e nos capítulos seguintes, Pedro nos apresenta alguns dos caminhos e virtudes deste mesmo Jesus agora ascendido ao céu.
Assim, neste mesmo capítulo 2, com Joel ainda como texto, ele nos diz que Ele é o Deus mencionado naquela profecia, que agora enviou o Espírito. Segundo Joel, portanto, é o Deus de Israel Quem realiza esta grande maravilha pentecostal; segundo Pedro, é o Homem agora no céu que a realiza.
Esta é certamente uma maneira magnífica de começar a história das virtudes e glórias de Jesus Nazareno, agora glorificado nas alturas à destra de Deus; onde Pedro também O declara assentado, até que chegue o dia em que fará dos Seus inimigos o escabelo dos Seus pés, como o “Meu Senhor” do Salmo 110. E então, com a autoridade destas coisas, Pedro convoca toda a casa de Israel a reconhecer o Homem outrora crucificado como Senhor e Cristo. E quando vários dos seus ouvintes são despertados por esta pregação, ele lhes proclama a virtude do “nome” d’Este glorificado, que pode assegurar a vida eterna e o dom do Espírito a todos os pecadores que O recebem.
Então, no capítulo 3, o mesmo apóstolo nos conta várias outras grandes coisas sobre Jesus nos céus: que foi o Seu nome, pela fé nele, que tinha acabado de curar o mendigo coxo na porta do templo; que Ele era o Profeta prometido por Moisés em Deuteronômio 18; que os céus agora O estão retendo, mas que Ele os deixará novamente no devido tempo, e trará tempos de refrigério e a restauração de todas as coisas, com Ele de volta à Terra.
Então, no capítulo 4, ele prega, por meio deste mesmo Jesus, “a ressurreição dentre os mortos” e proclama ainda que Ele era “a Cabeça da esquina”, segundo o Salmo 118, e o Único escolhido por Deus para a salvação neste mundo culpado. E, próximo ao final deste capítulo, ele e seus companheiros santos em Jerusalém apresentam o nome deste mesmo Jesus diante do Senhor Deus, o Criador do céu e da Terra, como toda a sua confiança e direito à bênção.
Então, no capítulo 5, Pedro e os outros apóstolos testificam diante do conselho Judaico que este mesmo Bendito a Quem eles mataram e penduraram num madeiro, Deus O exaltou com Sua destra para ser tanto Príncipe quanto Salvador, tudo de fato para Israel, seja para bênção ou governo.
Seguindo essas maneiras, no decorrer desta pregação, obtemos um amplo e variado testemunho do Homem no céu. E isso poderia bem continuar; o testemunho inefavelmente solene e bendito dos evangelistas sobre o Filho do Pai, Deus manifestado em carne, na Terra. Mas aqui, com este quinto capítulo, termina o testemunho apostólico sob o Espírito dado. Passamos dele para uma visão. Pois, depois de ouvir sobre o Homem glorificado, nos é dada, por um breve momento, uma visão d’Ele. Pedro O estava pregando, Estêvão agora O verá. Eles são igualmente testemunhas, embora de maneiras diferentes, do mesmo grande mistério: que o Filho do Homem estava no céu à destra de Deus. Estêvão é levado por homens ímpios para fora da cidade para ser apedrejado, enquanto seu rosto brilha como o de um anjo; e seus olhos se abrem, e ele olha para cima e para dentro de um céu aberto, e ali vê a glória de Deus, e Jesus, “o Filho do Homem”, em pé à destra de Deus.
Assim, o Homem no céu é testemunhado pelos olhos de Estêvão, assim como o fora pelos lábios de Pedro. O Espírito preenche um com uma história inspirada sobre Ele, e Deus abre os olhos do outro com uma visão gloriosa d’Ele. Mas o Objeto é o mesmo – o Homem glorificado, o Filho do Homem no céu, Jesus Nazareno à destra da Majestade nas alturas; Aquele que, tendo sido “Deus manifestado em carne” aqui, humilhado, servindo, crucificado, sepultado e ressuscitado, estava agora, em Sua Humanidade, exaltado ao mais elevado lugar de honra ali.
Uma coisa, porém, ainda permanece na revelação deste grande mistério. No capítulo 9, este Homem glorificado desce do céu e Se mostra, por um breve momento, aqui na Terra. Em glória santa e pacífica, e na atitude de alguém que estava recebendo-o para Si mesmo com um acolhimento bem-aventurado e perfeito, Ele acabara de ser visto por Seu santo sofredor, como em Seu devido lugar no céu. Mas agora, em extraordinária Majestade, no ardente resplendor da glória judicial, Ele é visto pelo perseguidor de Seu santo, aqui na Terra; Ele assim aparece como Aquele pronto e Todo-Poderoso para vingar o sangue de Seu rebanho abatido. A misericórdia, de fato, triunfa sobre o julgamento no caso presente, e o perseguidor se tornará uma testemunha e um apóstolo; mas a visão nos diz que o Homem no céu aguarda ali, como em outros caracteres, assim também neste, o Vingador, no devido tempo, das injustiças cometidas na Terra. Assim é, e isso é aqui prometido e prenunciado. Pois sabemos que Jesus ascendeu em vários caracteres. Ele ascendeu como ao Seu lugar de origem, à glória que tinha com o Pai antes que o mundo existisse; ascendeu para preparar moradas na casa do Pai para os eleitos; ascendeu como o Precursor deles; ascendeu para assentar-Se no tabernáculo construído por Deus como nosso Sumo Sacerdote; ascendeu como Autor e Consumador da fé e como o Purificador dos pecados; mas ascendeu também para tomar Seu lugar como Adonai à destra de Jeová, até que faça dos Seus inimigos o escabelo dos Seus pés. E neste último caráter Ele deve retornar à Terra para cumprir, como agora Ele desce à estrada que ficava entre Jerusalém e Damasco para dar, por assim dizer, uma amostra disso, e para sentenciar à morte este perseguidor Saulo de Tarso.
