Origem: Livro: Os Evangelistas
Lucas 12
É, no entanto, para seguir Seu caminho como um Mestre, embora em outros lugares, que o Senhor assim Se retira de entre os escribas, os doutores da lei e os fariseus. Ele entra na multidão e imediatamente retoma Seu ensino, tomando como Seu assunto o que lhe foi sugerido na casa do fariseu – a hipocrisia e a perseguição com as quais um remanescente justo tinha que enfrentar.
Assim, temos a Lâmpada aqui, o Grande Mestre, como no capítulo anterior, fazendo Sua santa obra. Mas observo que, embora muito do assunto deste capítulo seja encontrado em Mateus, ele nos é apresentado de uma maneira diferente. Lá é simplesmente como um discurso do Senhor, mas aqui surge como resposta a outros. Mas essa distinção ainda está no caráter deste Evangelho; porque nele, como já observei, o Senhor está tratando com o homem, e trazendo seus pensamentos, consciência e afeições ao exercício, para que possam ser corrigidos e formados pela mente de Cristo segundo Deus. O ensinamento do Senhor, portanto, é, muitas vezes, como neste capítulo, no caminho da resposta às indagações e pensamentos de outros. E, como observei no final do capítulo anterior, muito do que é trazido em Mateus, como vindo de um tribunal, surge em Lucas em uma mesa de jantar, então posso dizer aqui, que o que tinha sido como um sermão de um lugar elevado ou púlpito em Mateus 5-7, surge aqui como palavras ditas no coração de uma multidão que se aglomerava ao redor d’Ele. Havia mais da facilidade e descontração da vida social aqui.
E aqui novamente, como no capítulo anterior, temos um testemunho do poder de Suas palavras, pois “um da multidão”, julgando, como parece, pelo rumo do discurso do Senhor, que Ele estava contra a opressão e as presunções dos ricos, busca-O para tratar de sua acusação contra um irmão seu, que o havia tratado de maneira injusta e prejudicial. Mas o Senhor tem apenas que agir como a luz que repreende as trevas onde quer que as encontre, e Ele agora, entre a multidão, dirige uma palavra contra a avareza, como pouco antes, entre os principais, Ele estava dirigindo outra palavra contra o orgulho religioso e a hipocrisia.
Sobre tal assunto, bem poderíamos fazer uma pausa. E especialmente aqui, porque, depois dessa interrupção, parece levar os pensamentos de nosso Senhor quase ao fim de Sua fala atual.
O amor de ter, de adquirir e possuir, que é cobiça, é, como sabemos, um dos grandes princípios que formam o curso deste mundo maligno: “a concupiscência dos olhos”, como João a chama. A grande contradição disso, como de qualquer outro princípio que anima “o velho homem”, foi expressa tanto na vida, bem como nos ensinamentos de Jesus. N’Ele, vemos perfeitamente essa descrição do apóstolo sendo cumprida – em uma grande prova de aflição, a abundância de Seu gozo e Sua profunda pobreza abundaram nas riquezas de Sua liberalidade. Sua pobreza era profunda. Ele não tinha onde reclinar a cabeça. E quando Ele quis uma moeda, para dizer uma palavra sobre a imagem e inscrição que ela continha, Ele teve que pedir para que lhe mostrassem uma. E certamente Sua generosidade era abundante. Ele tinha uma grande bolsa, por assim dizer, mas Ele nunca a abriu, a não ser para outros. Ele tinha os recursos de toda a criação à Sua disposição. Ele podia ordenar pão para milhares a partir de alguns pães, e depois reunir fragmentos em cestas cheias. Ele podia transformar água em vinho. Ele podia invocar uma moeda do mar e, como o Senhor da Terra, reivindicar o animal de um estranho. Esta era certamente uma grande bolsa. Mas Ele não a abriu para Seu próprio uso. Ele preferia ir a pé, e ter sede e fome. E até mesmo de Sua própria escassa reserva – os poucos pães e peixes que Ele tinha para Si e Seus discípulos, Ele ainda pouparia algo para os outros (João 13:29).
Onde há riquezas de liberalidade como essa? O que era tudo isso na vida diária constante de Jesus, senão a contradição do curso cobiçoso do mundo? Os homens não podiam louvá-Lo por Ele fazer bem a Si mesmo (Sl 49:18). Com que decisão de coração Ele estava sempre esquecendo de Si mesmo, e com que autoridade santa e consciente Ele poderia resistir ao impulso daquele que, na ocasião deste capítulo, cobiçosamente desejou uma parte da herança. Ele trata com a interrupção assim ocasionada como se um assunto tivesse sido sugerido a Ele; um assunto que era demasiado importante para ser resolvido rapidamente. Ele continua com isso, aos ouvidos de Seus discípulos, até que Ele lhes mostra como este princípio, este desejo de ter, esta preocupação em adquirir e possuir, nos manterá despreparados para Sua vinda – um assunto que Ele então de maneira profunda e maravilhosa abre ao nosso coração e à nossa consciência. Ele pretende trazer esse assunto moralmente muito perto de nós, mostrando que há três maneiras diferentes pelas quais a alma deve se ocupar com esse objeto, ou ter comunhão com o grande fato do segundo advento do Senhor (a vinda do Senhor é a esperança adequada do santo; Sua vinda como um ladrão é para o mundo); primeira, como a vinda de um ladrão à noite para surpreender a casa; segunda, de um senhor para recompensar seus fiéis administradores; e, terceira, de um mestre amado, para fazer seus servos vigilantes felizes pela restauração de sua presença.
Mateus sugere o mesmo em Mateus 24-25; apenas com esta diferença, que a figura de servos vigilantes e desejosos é alterada para a de virgens esperando o noivo. Mas a moral é a mesma. E a variedade dessas figuras tem uma grande lição para nós; porque nos diz que Jesus busca alcançar nosso coração completamente. Apresentando Seu retorno ao nosso coração sob formas tão diferentes – um ladrão na noite, um mestre e um noivo – Ele afirma ser o Objeto, o Supremo Objeto, das diferentes paixões de nossa alma. Medo, esperança e alegria, respectivamente, surgiriam no peito do pai da família, dos mordomos e dos servos vigilantes ou das virgens, em poder de comando. O medo do ladrão, a esperança de compartilhar as recompensas ou a alegria da presença do noivo seriam supremos no coração naquele momento. E isso é feliz, embora possa ser solene. É feliz saber que nosso Senhor reivindica nossas afeições. Ele sabe que tem o direito de ser nosso Supremo Objeto. E a paixão que não Lhe oferece o seu mais elevado exercício não é uma paixão de adoração.
Isso é santo e solene. Pois podemos perguntar: É assim conosco? A sede de nossas afeições é um lugar de adoração? Jesus está ali na sala principal? “Quem ama o pai ou a mãe mais do que a Mim não é digno de Mim”, Ele diz; e novamente, e isso também neste mesmo capítulo, “não temais os que matam o corpo… Mas Eu vos mostrarei a Quem deveis temer: temei Aquele que, depois de matar, tem poder para lançar no inferno”. A vigilância do medo e a vigilância do desejo são ambas evocadas. Todo movimento no coração só é totalmente correto quando faz confissão ao senhorio ou supremacia de Jesus.
A interrupção feita ao nosso Senhor O levou a esse caminho. Dessa maneira, a luz n’Ele irrompeu. Pois este mundo era apenas o lugar das trevas do homem; a luz do céu era, portanto, em todos os lugares onde entrava, uma luz condenadora (Ef 5:13). Os ricos e os pobres, os príncipes e as multidões, eram igualmente expostos por ela. Como Jeremias, em seus dias, encontrou os “pobres” e descobriu que eles não conheciam o caminho do Senhor, e os “grandes”, e descobriu que eles haviam rompido completamente as ataduras (Jr 5:1-5). E assim é aqui com o Senhor de Jeremias. Jesus tinha estado no meio dos instruídos escribas e fariseus, e entre a multidão, mas tudo estava fora de ordem.
As impressões mais solenes foram deixadas em Sua mente (vs. 49-59). Ele queria curar os homens. Ele veio pregando a paz, e enviou os Doze e os Setenta, com paz a cada cidade e casa. Mas a paz tinha que retornar a Ele e a eles. Divisão agora, e julgamento pelo fogo em breve, eram a porção da Terra. Havia tanto inteligência quanto contenda sobre as coisas presentes, mas o testemunho de Deus não foi discernido, e o homem estava satisfeito consigo mesmo.
