Origem: Livro: Os Evangelistas

Lucas 19:28 – Lucas 23

Lucas 19:28 – 20:47

Jesus entra na cidade com dignidade real. O quinto período do nosso Evangelho começa com esta ação. A multidão assume o tom da ocasião e suas boas-vindas, seus ramos de palmeira e sua exultação, preenchem a cena desta procissão real. O clamor de um Rei estava entre eles. Mas a questão ainda era: Sião se regozijaria? Os filhos de Israel ficariam jubilosos em seu Rei? Jerusalém exultaria porque Ele estava vindo, manso e humilde, e montado em um jumento (Zc 9:9)?

Esta era a inquirição agora realizada. E sabemos a resposta. Em uma linguagem ou outra, todos os evangelistas a dão. “Não quisestes”, é dito aos filhos de Jerusalém. “Veio para o que era Seu, e os Seus não O receberam”, é novamente a palavra sobre Israel. E todo o curso da ação aqui registrada dá a mesma resposta. Jerusalém – aquele “assento favorecido de Deus na terra, aquele céu abaixo do céu” – havia se contaminado. O templo está imundo; os anciãos do povo são descrentes; a hipocrisia e o amor ao mundo mancham os sacerdotes, escribas e principais; eles desafiam em vez de aceitar Jesus; e armadilhas e laços são colocados para Seus pés onde a coroa deveria ter sido preparada para Sua cabeça.

A ação desses capítulos, dessa forma, se junta ao testemunho universal contra Jerusalém; e Jesus tem que chorar por aquela “cidade de paz”. Ela tinha sido, antigamente, Seu desejo. “Este é o Meu repouso”, Ele havia dito sobre ela. E como os dons e o chamado de Deus são sem arrependimento, Ele não busca alívio em outras cidades aqui, mas chora por esta infiel. E, até que Jerusalém seja restaurada, a Terra, de uma ponta a outra, é um Boquim para o espírito de Jesus em Seus santos. O gozo deles é divino e celestial até então; pois a Terra não lhes concede gozo, se Jerusalém for desobediente.

É muito abençoado ver que o lugar que o Senhor escolheu para Sua morada na Terra foi Salém, a cidade da paz. Ali, em tempos muito antigos, Sua santa testemunha e ministro se manifestou (Gn 14). E assim, quando Ele mesmo realmente desceu à Terra, Ele veio como o “Príncipe da paz”, buscando Jerusalém; Seus arautos proclamando “Paz na Terra” (Lc 2). Mas o homem não estava pronto para isso. O homem havia construído anteriormente uma cidade de confusão (Gn 11); e os construtores de Babel dificilmente poderiam estar preparados para um rei de Salém. O “filho da paz” (ARA) não estava na Terra para responder à saudação do “Príncipe da paz” do céu. Jerusalém, em seus dias, não conhecia as coisas que pertenciam à sua paz. Ele tinha, portanto, como vemos aqui, apenas que chorar por ela. Seus cidadãos O recusaram, disseram que Ele não reinaria sobre eles; e Ele tem que retornar à “terra remota” (a sede suprema e fonte de todo poder), para tomar novamente o Seu título ao reino.

Tudo isso, no entanto, nos diz que, quando Ele retornar, será em um novo caráter. Seu retorno será em um “dia de vingança”, visto que esta visitação em “paz” foi recusada. E, ao prometer-Lhe este dia de vingança sobre os cidadãos, o Senhor diz a Ele, ao chegar àquela “terra remota”: “Assenta-Te à Minha direita, até que Eu ponha os Teus inimigos por escabelo de Teus pés”. A Pedra que foi primeiramente oferecida como pedra fundamental, firme e preciosa, foi rejeitada pelos edificadores; e, portanto, agora, antes que Ela possa alcançar Seu lugar de honra destinado (isto é, encher, como um grande monte, toda a Terra), Ela deve primeiro ferir a imagem. O reino que será tomado pelo Nobre que retorna deve primeiro ter todas as coisas que causam escândalo retiradas dele. A incredulidade e a rebelião do homem moldaram assim o curso do Senhor do céu e da Terra; e Ele agora tem que ascender à Sua glória e reino por meio de um “dia de vingança”. [Este dia de vingança será sobre os gentios, bem como sobre Israel; sobre “todas as nações” (Is 34, 63); pois Pôncio Pilatos com os gentios, bem como Herodes com os Judeus, rejeitaram a Pedra principal da esquina (Atos 4:27)].

Mas (que a Terra nunca mais tenha um momento tão irado), Ele ainda tomará a cidade da paz para ser Sua morada, e Salém ainda será fiel ao seu nome: como Ele diz por Seu profeta Ageu, “e neste lugar darei a paz”; pois somente esta é Sua “forte cidade” (Is 26); seus muros serão salvação, e seus portões louvor. A “cidade forte” do homem então terá sido transformada em ruína (Sl 108; Is 26). O dia da vingança terá cumprido isso, pois a cidade da confusão e a cidade da paz não podem permanecer juntas. E então, quando Ele tiver estabelecido Sua própria paz, com a derrubada da cidade da confusão do homem, a Terra aprenderá a responder à saudação do céu, e a dizer: “Paz no céu”, da qual as aclamações aqui nos dão a garantia e o exemplo (veja Lucas 2:14, 19:38).

É fácil apreender isso, e o curso desses dois capítulos apresenta tudo isso para nós de forma muito simples. O fato de Jerusalém estar despreparada para Jesus de Nazaré, explica a necessidade de dois adventos, e para o retorno do Nobre em um dia de vingança. Mas podemos observar que, no meio de tudo isso, embora tenha sido negado a Ele tudo no presente pelos filhos dos homens, ainda assim Ele age na consciência de Seu senhorio de tudo. Ele reivindica o jumento do seu dono, porque Ele poderia dizer, falando de Si mesmo, “O Senhor precisa dele”. E é muito impressionante que, no curso de Sua vida e ministério, embora Ele fosse o rejeitado Galileu o tempo todo, não havia forma da antiga glória que Ele não tenha assumido. Eu já observei como a fé às vezes afastava o véu, e revelava Sua glória. Mas agora eu pergunto, Que glória? Todas as glórias de Jeová conhecidas e registradas antigamente – todas as glórias que ensinaram a Israel que seu Deus era o único Senhor do céu e da Terra. Assim: Ele curou a lepra, a honra peculiar bem conhecida de Deus (2 Rs 5:7); Ele afastou todas as doenças, como o antigo Jeová-Rafá de Israel (Êx 15:26); Ele alimentou as multidões nos desertos novamente; Ele acalmou as ondas, como se pudesse novamente dividir o Jordão e o Mar Vermelho; e Ele fez com que os peixes Lhe trouxessem tributo, como aqui Ele reivindica o jumento, tratando a Terra e sua plenitude como sendo todas Suas. Ele também preencheria a glória judicial de Jeová, quando a ocasião exigisse isso, pronunciando “ai” sobre o povo, ou deixando a cidade para a desolação; como, antigamente, Ele havia repetidamente julgado e castigado Seu povo, tanto no deserto quanto em Canaã. Todas as antigas formas de louvor e honra conhecidas em Jeová para Israel, Ele assim Se revestiu; o Redentor, o Líder, o Curador, o Alimentador e o Juiz também, de Seu povo. E, como que guiado pela fé de um gentio, Ele pôde mostrar-Se Um com Aquele que, no princípio, por Sua Palavra, havia feito os céus e a Terra, e todo o Seu exército (Lucas 7).

Pode muito bem ser um serviço feliz reunir esses fragmentos de Sua glória no meio de Sua humilhação. Mas posso observar ainda que as duas parábolas que ouvimos no decorrer desta ação nos conduzem, em grande medida, por todas as dispensações divinas. A parábola dos Trabalhadores na Vinha nos dá os tratamentos de Deus com Israel, desde o dia em que foram plantados como Seu povo em Canaã, até o tempo da missão e rejeição de Cristo, o Herdeiro da vinha. A parábola das Dez Minas retoma a economia divina a partir daquele momento e nos conduz por toda a era presente até a segunda vinda ou reino de Cristo. E em cada uma delas lemos sobre a ida do Senhor para uma terra remota (Lc 19:12, 20:9). O Senhor de Israel fez isso. Depois que Ele deixou Seu povo em sua herança, nos dias de Josué, Ele retirou-Se, em certo sentido, esperando que eles cultivassem a terra que Ele lhes dera, para Seu louvor na Terra. Mas a história deles e esta parábola nos contam a decepção total de todas essas esperanças. Então Cristo, o Herdeiro Rejeitado da vinha Judaica, fez isso também. Após Sua rejeição, Ele foi para a mesma “terra remota” (céu), deixando para trás, não uma porção terrenal aos cuidados dos trabalhadores Judeus, mas talentos, oportunidades de servi-Lo, com Seus servos, sob a promessa de Seu retorno com o pleno direito ao reino, para recompensá-los. E a parábola nos conta, assim como a história de nossa era presente nos contará, o final disto. Estas parábolas dão, desta maneira, uma visão muito completa dos grandes planos de Deus, surgindo aqui da maneira mais simples e natural, no curso desta ação.

Mas não é um pensamento terno o que é sugerido aqui – que os santos, nesta era, são deixados para servir seu Mestre em um lugar onde, após a mais completa deliberação, Ele foi recusado e expulso? Os cidadãos dela disseram que não O aceitarão; e o serviço, portanto, para ser totalmente de caráter correto, deve ser prestado com a lembrança desta rejeição.

E novamente; se a partir desta parábola aprendemos a natureza do serviço em geral, da história do servo inútil aprendemos a fonte do serviço. Este homem não conhecia a graça. Ele temia; ele julgou ser Cristo um homem austero; seu melhor cálculo era sair livre no dia do acerto de contas; a escravidão da lei encheu seu coração, e não a liberdade da verdade. Ele não era um Zaqueu, que carregava em sua alma, a alegria da comunhão com Jesus e a certeza de Seu amor, uma prontidão para dar metade de seus bens aos pobres e um propósito de restituir a qualquer um que ele tivesse prejudicado ainda mais do que a lei exigia. Mas este homem não era servo. Ele serviu a si mesmo, e não a Cristo. E assim fazem todos os que não começam conhecendo que Cristo os serviu primeiro, e que o serviço deles deve ser o serviço de amor grato. Amor grato! Quão feliz é o pensamento! Paulo serviu neste espírito. A vida que ele viveu, ele viveu pela fé no Filho de Deus, que o amou e Se entregou a Si mesmo por ele. O amor grato, no sentido de perdão selado e assegurado à sua alma, explica (sob o Espírito, certamente) a frutificação em Paulo; a falta desse amor – ignorância e desprezo por isso – no servo inútil, explica sua esterilidade.

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