Origem: Livro: Os Evangelistas

Lucas 9

No início deste capítulo, temos, em ordem, a missão dos Doze. Mas o Senhor não limita seus labores aqui, como em Mateus, “às ovelhas perdidas da casa de Israel”, estando esta distinção ainda de acordo com o caráter geral de cada um dos dois Evangelhos.

O exercício da consciência de Herodes é então notado, e talvez um pouco mais amplamente do que em Mateus ou Marcos, e é novamente mencionado no capítulo 23. Isso ainda está de acordo com nosso evangelista. Mas o martírio do Batista, por outro lado, não é tão completamente detalhado; pois isso foi um fato no curso e na história da apostasia Judaica, e estava, portanto, menos dentro do aviso do Espírito em Lucas.

A transfiguração nos é então dada, e mais particularmente, também, do que em Mateus ou Marcos.

A prova completa da incredulidade de Israel agora havia sido feita. (Essa prova é apresentada de forma mais completa e ordenada no Evangelho de Mateus do que em qualquer um dos outros). Israel havia se recusado a receber os seus. Eles não haviam descoberto em Jesus de Nazaré a Luz que deveria iluminar o mundo e ser sua glória. Portanto, a Terra, estava, por enquanto, perdida para Jesus. Pois Sião, por decreto antigo (Sl 2), é a sede do domínio divino na Terra. Todavia, como o Senhor aqui prenuncia uma cruz, e não uma coroa, O aguarda.

Mas se a Terra esta fechada para Ele, os céus devem e se abrirão para Ele, e para Seus santos agora, no dia de Sua recusa aqui, reunindo-se ao redor d’Ele por fé. E o propósito dessa visão no monte santo é dar a Seus santos uma garantia de um pouco daquela glória nos céus que é a herança deles.

Não houve momento como esse. Esta foi a hora da passagem da Terra para o céu. O segredo de Deus, em visão, foi aqui revelado. A Jerusalém celestial ficou, por um momento, com seus portões abertos, diante daqueles discípulos favorecidos, Pedro, Tiago e João. Moisés e Elias aparecem em glória com Jesus; mas Pedro, Tiago e João a contemplam. Havia, desta maneira, tanto companheiros como testemunhas da glória. Como no vindouro reino milenar, a Noiva do Cordeiro descerá, assim como esta glória agora repousa no monte, e as nações daqueles que são salvos andarão na luz dela (Ap 21).

Considero ser esse o grande propósito desta visão, que chamamos de “a transfiguração”. Há uma sugestão no versículo 37, de que ela foi testemunhada à noite. Uma circunstância de muito significado, eu acredito. Pois assim como esse era o lugar da glória celestial, e como aquele lugar não precisará nem de Sol nem de Lua, mas a glória de Deus o iluminará, assim este monte está agora iluminado como pelo corpo do Senhor glorificado. (Assim, o “Santo dos Santos” no templo, outra figura do lugar celestial, não tinha luz senão a da glória).

Novamente, observo que esses estrangeiros celestiais e glorificados falam com Jesus sobre Sua morte. Tema adequado para tal momento! Pois essa morte é para ser tida em eterna lembrança. A glória a celebrará (Ap 5). Toda a ordem do céu, os redimidos, os anjos e toda a criação a reconhecerão, como vemos naquele lugar do Apocalipse. Pois a glória deve sua existência à cruz – como a trombeta que inaugurou o jubileu foi ouvida apenas no dia da expiação; o tempo de restauração e refrigério, dessa maneira, reconhecendo sua dependência no Cordeiro ferido de Deus (Lv 25), ou da “morte” de Jesus.

E mais, eu acho que essa jornada até o monte (percorrida como foi, sob a promessa de que ela levaria ao reino – v. 27), foi um pouco demais para os discípulos. O Senhor está em oração até que a glória apareça, mas eles estão pesados de sono. Isso também tem significado. A natureza estava revelando sua fraqueza – a carne era um peso e não podia percorrer tal caminho. Era uma jornada difícil para o pobre homem. As virgens sábias dormem. Tudo isso é assim. Mas ainda assim, quando Pedro e seus companheiros acordam, sua palavra é “Senhor, bom é estarmos aqui” – isso nos dizendo que seu coração e desejo estavam realmente no lugar certo, embora a carne fosse fraca; como as virgens sábias, embora durmam, têm óleo em seus vasos para reabastecer suas lâmpadas, quando o Noivo vem – esse azeite, como esta palavra do pobre e amoroso Pedro, nos dizendo que, no desejo real do coração deles, eles esperavam por Jesus.

Este é outro ponto de interesse e conforto. E no final, em plena harmonia com o grande propósito principal desta visão, e da qual falei, “a magnífica glória” aparece (2 Pedro 1:17). A nuvem vem para levar a família celestial para casa. O Senhor e Seus companheiros entram nela, enquanto Pedro, Tiago e João ficam do lado de fora.

Tudo isso está em harmonia, mas é tudo maravilhoso. Dentro desta nuvem, como vemos aqui, a glória estava assentada novamente – como nos tempos antigos, quando ela atravessava o deserto. Agora agia como o véu que separava o “lugar Santo” do “Santo dos Santos”; e é a honra peculiar dos santos transformados e ressuscitados, igualmente transfigurados ou glorificados, ter seu lugar nela, enquanto Israel e os poupados das nações apenas andam na luz dela. E assim, estando essa parte da visão um pouco além dos pensamentos presentes dos discípulos, eles temem, enquanto Jesus com Moisés e Elias estão envoltos naquela nuvem. Pois os lugares celestiais, ou o topo da escada mística, para o qual esta nuvem estava agora separando esses estrangeiros gloriosos, ainda não haviam sido revelados à fé Judaica. Jacó havia estado ao pé dela, e o povo de Jacó conhecia o Deus de Betel, e vivia na esperança da promessa a respeito da herança da terra. Mas, no topo da escada, nem Jacó nem eles conheciam algo a não ser a voz de Jeová que Se dirigia a ele. A transfiguração agora revela os segredos daquele lugar glorioso, e manifesta uma família celestial resplandecente ali com Jeová-Jesus. Esse era um mistério; que Deus teria uma família no lugar de onde a bênção deveria fluir, e a glória resplandecer; bem como um povo restaurado e uma criação sujeita aos pés, para desfrutar da bênção, e habitar na luz da glória.

Assim, esta visão foi um avanço, preenchendo a revelação do propósito de Sua vontade, que Deus encabeçará todas as coisas em Cristo, tanto as que estão no céu como as que estão na Terra (Ef 1:10). De fato, uma visão tão gloriosa como esta nunca havia sido desfrutada. A tocha de fogo que passou pelo sacrifício de Abraão era gloriosa, e a escada de Jacó era gloriosa. A visão da sarça ardente estava cheia de bênçãos. A visão do Deus de Israel por Moisés e os anciãos em Horebe, era gloriosa, e também a do Capitão armado sob os muros de Jericó. Anjos eram visitantes bem-vindos do céu para patriarcas e governantes da antiguidade, e a passagem do próprio Senhor diante do mediador (Êxodo 34), e do profeta (1 Reis 19), no monte de Deus, foram ambas perfeitas em seu tempo. Mas essa visão no topo do monte está além de todas elas. Aquilo que, talvez, mais se aproxima disso, é o arrebatamento de Elias na presença de Eliseu, pois essa foi a condução dos glorificados até o lugar onde eles são vistos agora. Mas isso, portanto, supera tudo, permitindo-nos ver a família celestial, não meramente em seu caminho para a glória, mas pacificamente à vontade nela; nada para aterrorizá-los, nenhuma surpresa como da luz que estava além deles, como com Isaías, Daniel e outros; mas tudo é a consciência de estar à vontade, embora no meio da resplandecência de tudo isso.

Excelente, no entanto, como era, isso estava destinado a dar lugar a algo ainda mais glorioso. Depois disso, Atos 7 nos dá o que é o monte da transfiguração de Estêvão. E então o próprio mártir é estampado com a glória celestial. Ele brilha com a luz dos filhos da ressurreição, que serão como os anjos (Mt 22:30). Não é que, como os discípulos aqui, ele veja essa luz refletida em outros, mas ele próprio a carrega imediatamente. Tampouco é que a glória é trazida para baixo do monte para que ele possa vê-la aqui, mas o próprio céu é aberto, e ele a vê lá, e Alguém esperando para recebê-lo nele. Seus olhos, e não outros O contemplam por si mesmo. E sua palavra diante do conselho é um comentário sobre tudo isso, mostrando uma linhagem de estrangeiros e sofredores (entre os quais ele ali toma seu lugar), conduzidos pelo “Deus da glória” até “a glória de Deus” (Atos 7:2, 55).

Seja, no entanto, ali com Estêvão, ou aqui com Pedro, Tiago e João, segredos celestiais são revelados, e a Igreja é mostrada como estando no topo da escada, na glória do próprio Filho. Há o celestial, assim como o terrenal. Os céus declaram a glória de Deus. O céu e a Terra devem ter em si o testemunho da redenção. A redenção é uma obra excelente demais para permanecer sem ser celebrada aqui ou ali. É uma obra que evocou o fluxo total do amor e poder divinos, e deve ser conhecida, portanto, no céu e na Terra. A Igreja é designada para contar sobre isso lá, e Israel com suas nações acompanhantes para falar sobre isso aqui; e esse testemunho celestial disso está aqui, por um momento passageiro, visto em seu lugar no topo do monte. Mas que graça e chamamento são esses! A própria concepção disso é divina. Ninguém, a não ser Deus, poderia ter concebido tal propósito; nada menos que amor infinito poderia ter formado o pensamento de uma família tirada dentre pecadores, para ser amada com o amor do Filho, e glorificada com a glória do Filho; para habitar em uma casa, e assentar-se em um trono com Ele. Mas, oh, quão pouco nosso coração miserável valoriza tanto a Ele quanto a Sua glória!

Depois que a visão passou, e eles estavam descendo do monte, o Senhor, nos outros Evangelhos, fala a eles sobre o ministério de Elias. Mas isso não é notado aqui; por ser um ministério Judaico, era menos adequado ao propósito do Espírito em Lucas. Além disso, não há nada característico neste capítulo, até chegarmos ao fim.

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