Origem: Livro: Os Evangelistas

Mateus 14 – 16:27

Este novo período das obras do Senhor, após este intervalo de Mateus 13, abre com um evento muito sério. Herodes havia matado João Batista.

A experiência de Herodes nessa época é terrivelmente significativa do estado do coração do homem. Lemos sobre ele: “Naquele tempo, ouviu Herodes, o tetrarca, a fama de Jesus. E disse aos seus criados: Este é João Batista; ressuscitou dos mortos, e, por isso, estas maravilhas operam nele”.

Uma má consciência é uma habitante muito viva e agitada do seio humano – uma boa consciência é calma e silenciosa. Uma má consciência é propensa a agir precipitadamente, alarmando-se com tudo e qualquer coisa, temendo onde não há medo. Foi isso que, nos irmãos de José, chamou a culpa à lembrança, em um dia de inocência e falsa acusação.

A consciência de Herodes sempre guardou diante dele a imagem de João morto, e, em sua mente, a coisa mais longínqua facilmente se associaria com essa imagem. As obras de Jesus sugeririam a ele que João havia ressuscitado dos mortos; e o pensamento era um tormento para Herodes.

Pois verdadeiramente a ressurreição de um homem que foi morto deve ser intolerável ao coração daquele que o matou. Ela lhe declara que Aquele, em cujas mãos estão as fontes da vida e da morte, Se colocou ao lado de sua vítima. E foi assim, neste momento, nas apreensões de Herodes, e será assim, em breve, nas apreensões do mundo; pois no dia da manifestação do poder de Jesus, a Quem o mundo está agora rejeitando, reis, homens poderosos, escravos, homens livres, tribunos, grandes homens e homens ricos, todos clamarão aos montes e rochedos para escondê-los do rosto d’Aquele que está assentado no trono e da ira do Cordeiro (Ap 6:16).

Esta experiência de Herodes tem, portanto, uma voz para o ouvido do mundo. Pois a ressurreição diz ao mundo que Deus nas alturas Se colocou ao lado d’Aquele a Quem o homem desprezou e rejeitou.

A notícia deste martírio de João é trazida ao Senhor, e é evidente que Ele é movido por isso. Ele entra no peso disto sobre Si mesmo; pois isto pesou diretamente sobre Sua própria segurança pessoal. Se o mensageiro fosse tratado assim, o que o Senhor do templo poderia esperar? Se João foi morto, o que será feito com Jesus? Tal seria a sugestão natural de Sua alma neste momento. Depois disto, Ele disse aos Seus discípulos, falando de João: “fizeram-lhe tudo o que quiseram. Assim farão eles também padecer o Filho do Homem”; e Seu espírito, eu acredito, neste momento, estava antecipando tal declaração; pois lemos que Ele imediatamente Se retira para um lugar deserto, apartado (Mt 14:13). Como O vemos no Evangelho de João repetidamente deixando a Judeia, porque os Judeus procuravam matá-Lo (Jo 7:1; 10:31, 40); então agora, ao ouvir que Herodes havia matado João, Ele Se retira; e daquele momento, por um tempo; isto é, de Mateus 14:13 a Mateus 17:22, Ele continua em partes distantes da terra. Ele estava ciente do perigo, e Ele não o enfrentaria descuidadamente. Ele Se retirará do alcance do perigo, se isso puder ser feito sem qualquer sacrifício do que Lhe convinha. Ele, portanto, por um tempo, não é visto em Seu caminho habitual, em Cafarnaum ou nas partes ao redor dela, nem na Judeia ou em Jerusalém.

E quão perfeito, como tudo o mais, é este caminho do nosso Mestre, durante este solene e interessante tempo! Seja qual for a Sua glória pessoal (e sabemos que Ele não era nada menos que Deus sobre todos, bendito eternamente), ainda assim Ele era Homem em todas as sensibilidades próprias da humanidade. Aqueles contatos e passagens em Sua história, que revelam a fraqueza de Suas circunstâncias entre os homens, são tão preciosos quanto as maravilhas que Ele operou para eles naquela força que era divina. O cansado Viajante no poço de Sicar é uma visão tão bem-vinda quanto o transfigurado Senhor da glória no monte. E nesse período, do tempo de Mateus 14:13 ao tempo de Mateus 17:22, nós O vemos na fraqueza das circunstâncias humanas. Sua vida está em perigo pela mão do homem, e Ele Se retira; enquanto O seguimos, durante esse tempo, primeiro em um lugar deserto, depois em um monte solitário, depois em Genesaré, depois nas fronteiras mais distantes a oeste, depois em um monte novamente, depois nas costas de Magdala, no extremo leste, depois no ponto mais alto do norte e, por fim, em um alto monte à parte, que, em espírito ou em mistério, era o próprio céu (Mt 14:13, 23, 34; 15:21, 29, 39; 16:13; 17:1).

Belo e perfeito caminho natural para os pés deste Glorioso; neste momento, Aquele exposto, Aquele em perigo, o Davi, caçado como uma perdiz nos montes.

Mas embora conscientemente em perigo, e, portanto caminhando em relativo retiro, não Se expondo descuidadamente, Ele nos mostra que não temia o inimigo que O ameaçava, nem era desatento ao amor e serviço que, em graça, Ele devia ao povo. Pois é durante esse tempo que Ele responde, repetidas vezes, aos desafios de Seus adversários, e alimenta, repetidas vezes, as multidões que aguardam por Ele.

Quão cheio de glória moral é tudo isso! E este é o Jesus cujo caminho brilha diante de nós. Ele não desprezaria o perigo que O ameaçava; e ainda assim Ele não seria perturbado por isso a ponto de esquecer como Se conduzir, seja para amigos ou inimigos, para dependentes ou perseguidores. Fruto precioso na estação desta Árvore, que havia sido plantada junto aos ribeiros de águas!

E ainda há mais do que isso.

Enquanto estava nas costas de Tiro e Sidom, durante esse tempo, Ele é procurado por uma mulher cananeia. Ela traz sua tristeza a Ele. Ela deposita n’Ele sua confiança.

Ela O usaria; exatamente aquilo no que o amor se deleita; o próprio gozo no qual Ele veio ao mundo colher das mãos e corações dos pecadores. Ela sabe que Ele é capaz e pronto para servi-la. A ocasião é de interesse muito terno e comovente.

Aparentemente, apesar de toda a tristeza dela, o Senhor afirma os princípios de Deus e a ignora. Aos discípulos, Ele diz, aos ouvidos dela: “Eu não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel”. E a ela mesma, Ele diz: “Não é bom pegar o pão dos filhos e deitá-lo aos cachorrinhos”. Mas ela se curva. Ela O reconhece como o Ministrador da verdade de Deus, e não suporia por um momento que Ele renunciasse essa verdade por ela e suas necessidades. Ela deixa que Deus seja glorificado de acordo com Seus próprios conselhos, e Jesus continua a Testemunha fiel desses conselhos, embora ela ainda permanecesse em tristeza. “Sim, Senhor”, ela responde, justificando tudo o que Jesus havia dito; “mas também os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus senhores”.

Isto era admirável; foi perfeito em sua geração; fruto da obra divina em sua alma. Ela seria abençoada somente de acordo com os princípios e caminhos da graça e governo de Deus, dos quais ela recebeu o Senhor como a Testemunha segura e infalível.

A mãe em Lucas 2 está bem abaixo da gentia de Mateus 15. Ela não sabia que Jesus deveria estar tratando dos negócios de Seu Pai. Ela preferia que Ele a atendesse. Aquela estrangeira reconheceu que era dos negócios de Seu Pai que Ele sempre deveria estar tratando; e ela preferia deixar o caminho de Deus ser exaltado na mão fiel de Cristo, embora ela mesma fosse colocada de lado por isso. E tudo isso foi um belo testemunho de sua sujeição a Deus. Suas palavras foram profundamente bem-vindas ao coração do Senhor; e isso, também, em um momento em que esse mesmo coração estava bastante entristecido por tudo o que Ele estava encontrando entre Seu próprio povo.

O homem teria usado tal oportunidade para si mesmo. Se Israel O desprezou, o gentio O buscou. Se os perigos de Seu próprio povo O expulsaram, e os estrangeiros O receberam, certamente Ele pode mudar o Seu lugar; a natureza teria raciocinado assim. Uma siro-fenícia estava apelando a Ele, enquanto Israel estava recusando-O. Ele não mudará? Ele não cruzará a fronteira? Não. Ele era o Obediente. Ele não irá, como outro, passar para o rei de Gate, ou para a terra dos filisteus. Ele não consulta a carne e sangue, nem obtém Sua permissão de circunstâncias ou de providências. Ele havia sido enviado como o Ministro da circuncisão, para confirmar as promessas feitas aos pais; e embora Israel possa esquecer as vozes de seus profetas e as esperanças de sua nação, Ele não pode esquecer Sua comissão. Ele é deles, e não dos gentios; e isto Ele deixa que esta gentia saiba: nem Ele dispensará virtude a ela, ou deixará Suas misericórdias alcançarem suas necessidades, até que ela tome seu devido lugar gentio em sujeição a Israel. Então, de fato, que ela tome tudo o que ela quisesse. “Ó mulher, grande é a tua fé. Seja isso feito para contigo, como tu desejas”.

Isso é realmente perfeito. Quão cheio de glória moral é todo esse caminho, do princípio ao fim! O perigo separa o Senhor para montes e desertos retirados, mas Ele não recua diante da face do inimigo por medo, nem suspende Seus serviços de amor por ressentimento, nem esquece os direitos dos outros, embora em meio a injustiças e sofrimentos causados por eles.

Davi, sob circunstâncias semelhantes, como o vemos em 1 Samuel 18-30, não nos dá isso. De muitas maneiras, ele se comporta de forma bela. Mas, com tudo isso, Davi não é um modelo. Infelizmente, ele falhou então, por mais admirável e amável como ele era acima de muitos homens. Suas mentiras em Nobe custaram o sangue dos sacerdotes; suas mentiras em Gate, a captura de Ziclague. Ele concebeu vingança em seu coração, e seu propósito teve que ser desviado pela palavra de uma mulher. E ele teria sido encontrado lutando contra o povo de Deus nas fileiras dos incircuncisos, se a mão de Deus não tivesse influenciado as mentes dos príncipes dos filisteus.

E ainda assim Davi está de fato entre os mais escolhidos dos filhos dos homens. Mas o Davi de 1 Samuel 18-30 não é o Jesus de Mateus 14-16, embora em circunstâncias semelhantes. Cada um deles estava em retiro por causa do perigo e da ameaça do poder que havia, em seus respectivos dias, em Israel; mas as duas histórias apenas provam novamente que há apenas Um. Ninguém além d’Ele para os nossos pecados, e ninguém além d’Ele para a glória de Deus. Coisas boas podem ter sido ditas por aqueles do passado, coisas boas podem ter sido feitas por eles do passado, mas toda perfeição de todos os tipos está somente com Jesus. E feliz é o pensamento, bem-vindo de fato é o contraste. Ninguém além de Jesus! Somente n’Ele o pecador encontra seu alívio, Somente n’Ele Deus obtém Sua glória. E esses pensamentos surgem enquanto seguimos o caminho do Senhor por esta parte do nosso Evangelho. Há muito tempo, se alguém pode falar de si mesmo, tem sido a admiração da alma; e, de fato, é solene e interessante. Mas tem seu fim, e devemos olhar para seu fim. Isso alcançamos em Mateus 17.

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